Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0025939-16.2012.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
13/04/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 16/04/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA.
I- Não merece prosperar a alegação da autarquia no sentido de ser necessário o prévio
requerimento administrativo, tendo em vista que o INSS insurgiu-se com relação ao mérito do
pedido, caracterizando, portanto, o interesse de agir pela resistência à pretensão, conforme
entendimento firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral reconhecida no
Recurso Extraordinário nº 631.240/MG.
II- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início
razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por
coerente e robusta prova testemunhal.
III- O Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que é possível
o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo acostado aos
autos como início de prova material, desde que amparado por prova testemunhal idônea.
IV- No caso concreto, o acervo probatório permite o reconhecimento da atividade rural em parte
do período pleiteado, exceto para fins de carência.
V- No que se refere à conversão do tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência é
pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à
luz do princípio tempus regit actum.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
VI- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta
a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite
foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi
reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
VII- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte do
período pleiteado.
VIII- No tocante à aposentadoria por tempo de contribuição, a parte autora cumpriu os requisitos
legais necessários à obtenção do benefício.
IX- Com relação aos índices de atualização monetária, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários.
X- Apelações parcialmente providas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0025939-16.2012.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUIZ CARLOS FELICIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO HENRIQUE ASSIS DE ARAUJO - SP250561-N
Advogado do(a) APELANTE: DIMITRI BRANDI DE ABREU - SP172540
APELADO: LUIZ CARLOS FELICIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: THIAGO HENRIQUE ASSIS DE ARAUJO - SP250561-N
Advogado do(a) APELADO: DIMITRI BRANDI DE ABREU - SP172540
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0025939-16.2012.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUIZ CARLOS FELICIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO HENRIQUE ASSIS DE ARAUJO - SP250561-N
Advogado do(a) APELANTE: DIMITRI BRANDI DE ABREU - SP172540
APELADO: LUIZ CARLOS FELICIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: THIAGO HENRIQUE ASSIS DE ARAUJO - SP250561-N
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 3/1/11 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do ajuizamento da ação,
mediante o reconhecimento dos períodos rurais e especiais mencionados na petição inicial.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quojulgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer o labor rural exercido no
período de 15/9/74 a 11/7/93, bem como condenar o INSS ao pagamento da aposentadoria por
tempo de contribuição a partir da data da citação, acrescida de correção monetária “na forma da
legislação de regência, observando-se a Súmula 148 do E. STJ e a Súmula 8 do E. TRF da 3ª
Região” (ID 105298177, p. 142) e juros de mora nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a
redação dada pela Lei nº 11.960/09 desde a citação. Os honorários advocatícios foram arbitrados
em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da R. sentença.
Inconformada, apelou a parte autora, pleiteando o enquadramento, como especial, das atividades
exercidas nos períodos de 12/7/93 a 29/6/99 e 1º/10/99 a 30/7/04.
A autarquia também recorreu, alegando falta de interesse de agir por ausência de prévio
requerimento administrativo. No mérito, sustenta a improcedência do pedido.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0025939-16.2012.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUIZ CARLOS FELICIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO HENRIQUE ASSIS DE ARAUJO - SP250561-N
Advogado do(a) APELANTE: DIMITRI BRANDI DE ABREU - SP172540
APELADO: LUIZ CARLOS FELICIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: THIAGO HENRIQUE ASSIS DE ARAUJO - SP250561-N
Advogado do(a) APELADO: DIMITRI BRANDI DE ABREU - SP172540
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente,
afasto a alegação da autarquia no sentido de ser necessário o prévio requerimento administrativo,
tendo em vista que o INSS insurgiu-se com relação ao mérito do pedido, caracterizando, portanto,
o interesse de agir pela resistência à pretensão, conforme entendimento firmado pelo C. Supremo
Tribunal Federal na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 631.240/MG.
Passo à análise do mérito.
No que tange ao reconhecimento de tempo de serviço rural, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei nº
8.213/91, in verbis:
"A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da
observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de
serviço é indispensável a existência de início de prova material, contemporânea à época dos
fatos, corroborado por coerente e robusta prova testemunhal. Outrossim, nos termos da Súmula
nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
da obtenção de benefício previdenciário."
O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia
nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo
de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento
mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por
testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves
Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a
regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o
reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que
amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
Ressalto, adicionalmente, que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso
Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do
tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo,
mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova
testemunhal robusta, conforme ementas a seguir transcritas:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
VALIDADE DOS DOCUMENTOS EM NOME DO CÔNJUGE, DESDE QUE COMPLEMENTADA
COM ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA DOS DOCUMENTOS
APRESENTADOS. PERÍODO ANTERIOR E POSTERIOR. VALORAÇÃO DO CONJUNTO
PROBATÓRIO POSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ AFASTADO.
1. O labor campesino, para fins de percepção de aposentadoria rural por idade, deve ser
demonstrado por início de prova material e ampliado por prova testemunhal, ainda que de
maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses
idêntico à carência.
2. São aceitos, como início de prova material, os documentos em nome do cônjuge que o
qualifiquem como lavrador, mesmo após seu falecimento, desde que a prova documental seja
complementada com robusta e idônea prova testemunhal, atestando a continuidade da atividade
rural.
3. No julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima,
submetido ao rito do art. 543-C do CPC, esta Corte, examinando a matéria concernente à
possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo
apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada aos autos possui
eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento,
desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
4. O juízo acerca da validade e eficácia dos documentos apresentados como o início de prova
material do labor campesino não enseja reexame de prova, vedado pela Súmula 7/STJ, mas sim
valoração do conjunto probatório existente (AgRg no REsp 1.309.942/MG, Rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 11/04/2014).
5. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.452.001/SP, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio
Kukina, j. em 5/3/15, v.u., DJ 12/3/15, grifos meus)
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
EXTEMPORÂNEO. RATIFICAÇÃO POR MEIO DE ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL.
MATÉRIA DEFINIDA EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. CUMULAÇÃO DE
APOSENTADORIA RURAL POR IDADE COM PENSÃO ESTATUTÁRIA. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. PERCEPÇÃO DE PENSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.
CARACTERIZAÇÃO. RENDAS NÃO MENSURADAS. SÚMULA 7/STJ.
1. Este Superior Tribunal firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período
anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para
complementar o início de prova material do tempo de serviço rural (Recurso Especial Repetitivo
1.348.633/SP - acórdão ainda não publicado).
2. Por serem benefícios com distintos fundamentos legais, não há óbice à cumulação de
aposentadoria rural com pensão estatutária.
3. Somente se descaracteriza o regime de economia familiar, caso a renda derivada de outra
atividade supere, ou dispense, a obtida no labor rural. No caso dos autos, entretanto, tal
cotejamento não foi mencionado pelo acórdão de origem, sendo inviável fazê-lo em sede de
recurso especial, em razão do óbice da Súmula 7/STJ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.347.289/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Og
Fernandes, j. em 24/4/14, v.u., DJ 20/5/14, grifos meus)
Anoto que o convencimento da verdade de um fato ou de uma determinada situação jurídica
raramente decorre de circunstância isoladamente considerada. Os indícios de prova material,
singularmente analisados, talvez não fossem, por si sós, suficientes para formar a convicção do
magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam. Mas a conjugação de
ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - torna
inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o
tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei,
será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes,
exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao
advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá
ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra
mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo
de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural
registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
No que se refere ao reconhecimento da atividadeespecial, a jurisprudência é pacífica no sentido
de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio
tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até
28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos
anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado
meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário
específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do
Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao
incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da
efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico,
motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a
adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir
6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos
Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C.
Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR,
Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no
AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u.,
DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados
Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº
0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel
Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº
1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual
alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a
admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes
nocivos. O art. 68 do Decreto nº 8.123/13 também traz considerações sobre o referido PPP.
Devo salientar que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede
a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no
ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes
nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era
menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do
trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela
própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando
sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo,
diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030, nos
quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para aposição
da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no PPP possa
prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua de
informação expressa com relação à habitualidade e permanência.
Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPInão é suficiente para
descaracterizar a especialidadeda atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do
aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do
agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo
referido agente agressivo, conforme o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário
do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário
com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux.
Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição do
segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na
Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à
aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de
elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de
trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do
referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário caso
apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao
empregado.
Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação
de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A respeito,
é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que "considerar que a
declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz consiste em condição
suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será desenvolvido adiante, para obter
relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos contrários ao cumprimento dessas
normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à Segurança do Trabalho).
Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da
realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente
ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos
econômicos.
Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de dados
confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não concorre
para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da ineficácia do
equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus de provar que o
trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se pode impor ao
empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de suportar
individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são
compartilhados por toda a sociedade.
Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima
mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio
para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra
que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio
financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da
figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a
concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88).
Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o
art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível
quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Com relação à conversão de tempo especial em comum, parece de todo conveniente traçar um
breve relato de sua evolução histórica na ordenação jurídica brasileira.
Inicialmente, observo que a aposentadoria especial foi instituída pelo art. 31 da Lei nº 3.807, de
26/8/60 (Lei Orgânica da Previdência Social).
A Lei nº 6.887/80 acrescentou o § 4º ao art. 9º, da Lei nº 5.890/73, dispondo: "O tempo de serviço
exercido alternadamente em atividades comuns e em atividades que, na vigência desta Lei,
sejam ou venham a ser consideradas penosas, insalubres ou perigosas, será somado, após a
respectiva conversão segundo critérios de equivalência a serem fixados pelo Ministério da
Previdência Social, para efeito de aposentadoria de qualquer espécie."
Após diversas alterações legislativas, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a aposentadoria especial em
seus artigos 57 e 58.
A possibilidade de conversão do tempo especial em comum havia sido revogada pela edição do
art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98. No entanto, o referido dispositivo legal foi
suprimido quando da conversão na Lei nº 9.711/98, razão pela qual, forçoso reconhecer que
permanece em vigor a possibilidade dessa conversão. Ademais, a questão ficou pacificada com a
edição do Decreto nº 4.827, de 3/9/03, que incluiu o § 2º ao art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
estabelecendo que "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em
tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período." Nesse sentido, cabe ressaltar que o C. Superior Tribunal de Justiça firmou
posicionamento no sentido de ser possível a conversão de tempo especial em comum no período
anterior a 1º/1/81, bem como posterior à edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de
28/5/98.
A questão relativa ao fator de conversão foi objeto de julgamento pelo C. Superior Tribunal de
Justiça no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.151.363/MG (2009/0145685-8).
O E. Relator Ministro Jorge Mussi, em seu voto, bem explicitou a regra que se deve adotar ao
asseverar: "Importa notar que a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a
caracterização e a comprovação da atividade sob condições especiais, conforme dispõe o § 1º
supra. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos
agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos
Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela
existência de laudo assinado por médico do trabalho. Diversamente, no tocante aos efeitos da
prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às
regras da legislação em vigor na data do requerimento. Por essa razão, o § 2º deixa expresso
que as regras de conversão do art. 70 aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Isso
é possível porque a adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do
tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve
corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que
corresponde a um mero cálculo matemático. Explica-se: O fator de conversão é o resultado da
divisão do numero máximo de tempo comum (35 para homem e 30 para mulher) pelo número
máximo de tempo especial (15, 20 e 25). Ou seja, o fator a ser aplicado ao tempo especial
laborado pelo homem para convertê-lo em comum será 1,40, pois 35/25=1,40. Se o tempo for
trabalhado por uma mulher, o fator será de 1,20, pois 30/25=1,20. Se o tempo especial for de 15
ou 20 anos, a regra será a mesma. Trata-se de regra matemática pura e simples e não de regra
previdenciária. Observando-se os Decretos ns. 53.831/1964 e 83.080/1979, os quais traziam a
lista de agentes nocivos e atividades insalubres, extrai-se a informação de que, em ambos os
decretos, o tempo máximo de exposição aos agentes a que esteve exposto o recorrido (ruído e
frio) era de 25 anos. Todavia, o tempo de serviço comum, para efeito de aposentadoria, constante
daqueles decretos, era de, no máximo, 30 anos; portanto, o fator de conversão utilizado nessa
hipótese era de 1,2. Destarte, o índice de 1,2 para conversão de tempo especial em
aposentadoria comum com 30 anos de contribuição e o índice de 1,4 em relação à aposentadoria
com 35 anos têm a mesma função. Converter para comum o tempo de serviço especial relativo à
atividade com limite de 25 anos utilizando o fator de 1,2 seria prejudicial ao segurado (homem),
porquanto a norma de regência exige, como tempo de contribuição, os 35 anos, como é de
notório conhecimento.(...) Nesse contexto, com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao
Decreto n. 3.048/99, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos
de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pelas novas regras da tabela definida no
artigo 70, que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos utiliza como fator de
conversão, para homens, o multiplicador 1, 40. É o que se denota do artigo 173 da Instrução
Normativa n. 20/2007". (grifos meus)
Quanto à aposentadoria por tempo de contribuição, para os segurados que cumpriram os
requisitos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, devem ser observadas as
disposições dos artigos 52 e 53, da Lei nº 8.213/91, em atenção ao princípio tempus regit actum.
Havendo a necessidade de utilização do período posterior à referida Emenda, deverão ser
observadas as alterações realizadas pela referida Emenda aos artigos 201 e 202 da Constituição
Federal de 1988, que extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço no âmbito do
regime geral de previdência social.
Transcrevo o §7º do art. 201 da Carta Magna com a nova redação:
"§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei,
obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido
em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam
suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e
o pescador artesanal."
Por sua vez, o art. 9º de referida Emenda criou uma regra de transição, ao estabelecer:
"Art. 9º - Observado o disposto no art. 4º desta Emenda e ressalvado o direito de opção a
aposentadoria pelas normas por ela estabelecidas para o regime geral de previdência social, é
assegurado o direito à aposentadoria ao segurado que se tenha filiado ao regime geral de
previdência social, até a data de publicação desta Emenda, quando, cumulativamente, atender
aos seguintes requisitos:
I - contar com cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se
mulher; e
II - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data da
publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior.
§ 1º - O segurado de que trata este artigo, desde que atendido o disposto no inciso I do "caput", e
observado o disposto no art. 4º desta Emenda, pode aposentar-se com valores proporcionais ao
tempo de contribuição, quando atendidas as seguintes condições:
I - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta anos, se homem, e vinte e cinco anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a quarenta por cento do tempo que, na data
da publicação desta Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea anterior;
II - o valor da aposentadoria proporcional será equivalente a setenta por cento do valor da
aposentadoria a que se refere o "caput", acrescido de cinco por cento por ano de contribuição que
supere a soma a que se refere o inciso anterior, até o limite de cem por cento.
§ 2º - O professor que, até a data da publicação desta Emenda, tenha exercido atividade de
magistério e que opte por aposentar-se na forma do disposto no "caput", terá o tempo de serviço
exercido até a publicação desta Emenda contado com o acréscimo de dezessete por cento, se
homem, e de vinte por cento, se mulher, desde que se aposente, exclusivamente, com tempo de
efetivo exercício de atividade de magistério."
Contudo, no que tange à aposentadoria integral, cumpre ressaltar que, na redação do Projeto de
Emenda à Constituição, o inciso I do §7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo
mínimo de contribuição (35 anos, para homem e 30 anos, para mulher) à idade mínima de 60
anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da
promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral tornou-se
inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I), a aposentadoria integral será
concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Quadra mencionar que, havendo o cômputo do tempo de serviço posterior a 28/11/99, devem ser
observados os dispositivos constantes da Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do
benefício, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo
Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089, de
Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Passo à análise do caso concreto.
Relativamente ao reconhecimento de tempo de serviço rural do autor, nascido em 15/9/64,
encontram-se acostadas aos autos as cópias dos seguintes documentos:
1) certidão de casamento do autor, lavrada em 26/7/84, qualificando-o como lavrador;
2) certidões de nascimento dos filhos do demandante, lavradas em 11/4/86 e 13/3/90, constando
a profissão de lavrador;
3) certificado de alistamento militar, datado de 11/1/82, no qual consta que o requerente exercia a
profissão de “Trab. Cult. Café”;
4) carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Moreira Salles em nome do autor, com data
de admissão em 12/9/84;
5) romaneios de movimentação de produtos agrícolas da Cooperativa Agropecuária Goioerê
Ltda., datados de 1992 e 1993, constando o nome do requerente na origem;
6) boletins escolares do autor dos anos letivos de 1977 e 1978 e
7) certidão do Cartório de Registro de Imóveis de Goioerê, constando a transcrição de um lote de
terras com área de 3,5 alqueires paulistas, situado no Município de Moreira Salles, adquirido pelo
genitor do autor, qualificado como lavrador, por escritura lavrada em 30/8/66.
Os documentos contemporâneos ao período pleiteado e que qualificam o autor como lavrador
constituem início razoável de prova material do labor rural.
Passo à análise da prova testemunhal, produzida em audiência realizada em 24/1/12:
A testemunha Álvaro Ribeiro Ávila declarou “que ficou em Moreira Sales de 73 até 88. Que era
vizinho do autor e este trabalhou durante todo o período em que lá ficou na lavoura de
propriedade de seu pai com a plantação e colheita de lavoura branca e café. Que a lavoura era
de produção familiar. Que o autor casou e teve filhos enquanto trabalhava na lavoura. Que o
autor trabalhava numa propriedade de aproximadamente 4 a 5 alqueires” (ID 105298177, p. 127).
A testemunha Antônio Carlos Elizário afirmou: “que ficou em Moreira Sales de 74 até 87. Que era
vizinho do autor e este trabalhou durante todo o período em que lá ficou na lavoura de
propriedade de seu pai com a plantação e colheita de lavoura branca e café. Que a lavoura era
de produção familiar. Que o autor casou e teve filhos enquanto trabalhava na lavoura. Que o
autor trabalhava numa propriedade de aproximadamente 4 a 5 alqueires. Que o autor lhe
informou que teria ficado em Moreira Sales na lavoura até 1993. Não sabe se o autor veio
diretamente de Moreira Sales para Indaiatuba” (ID 105298177, p. 129).
Os documentos considerados como início de prova material, somados aos depoimentos
testemunhais, formam um conjunto harmônico apto a demonstrar que a parte autora exerceu
atividades no campo, no período de 15/9/74 a 24/7/91. Ressalvo que o mencionado tempo não
poderá ser utilizado para fins de carência.
No que tange ao reconhecimento do trabalho exercido pelo autor, no período anterior aos 14 anos
de idade, verifico encontrar-se em pleno vigor o acórdão proferido na Ação Civil Pública nº
5017267-34.2013.4.04.7100, pela E. 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o qual,
com abrangência nacional, possibilitou o cômputo do "período de trabalho realizado antes dos 12
anos de idade", conforme ementa in verbis:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL PARA AFASTAR A IDADE MÍNIMA PREVISTA NO ART. 11 DA LEI 8.213/91 PARA
FINS DE RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO E DE CONTRIBUIÇÃO. INTERESSE
DE AGIR DO MPF. RECONHECIMENTO. EFEITOS JURÍDICOS DA SENTENÇA.
ABRANGÊNCIA NACIONAL DA DECISÃO PROLATADA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ART. 16 DA
LEI. 7.347/85. INTERPRETAÇÃO DO ART. 7º, XXXIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
TRABALHO INFANTIL X PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REALIDADE FÁTICA BRASILEIRA.
INDISPENSABILIDADE DE PROTEÇÃO PREVIDENCIÁRIA ÀS CRIANÇAS. POSSIBILIDADE
DE SER COMPUTADO PERÍODO DE TRABALHO SEM LIMITAÇÃO DE IDADE MÍNIMA. ACP
INTEGRALMENTE PROCEDENTE. JULGAMENTO PELO COLEGIADO AMPLIADO. ART. 942
DO CPC. RECURSO DO MPF PROVIDO. APELO DO INSS DESPROVIDO.
(...)
2. Não há falar em restrição dos efeitos da decisão em ação civil pública a limites territoriais, pois
não se pode confundir estes com a eficácia subjetiva da coisa julgada, que se estende a todos
aqueles que participam da relação jurídica. Isso porque, a imposição de limites territoriais,
prevista no art. 16 da LACP, não prejudica a obrigatoriedade jurídica da decisão judicial em
relação aos participantes da relação processual.
(...)
16. A despeito de haver previsão legal quanto ao limite etário (art. 13 da Lei 8.213/91, art. 14 da
Lei 8.212/91 e arts. 18, § 2º do Decreto 3.048/99) não se pode negar que o trabalho infantil, ainda
que prestado à revelia da fiscalização dos órgãos competentes, ou mediante autorização dos pais
e autoridades judiciárias (caso do trabalho artístico e publicitário), nos termos dos arts. 2º e 3º da
CLT, configura vínculo empregatício e fato gerador do tributo à seguridade, nos termos do inciso I
do art. 195 da Constituição Federal. 17. Assim, apesar da limitação constitucional de trabalho do
infante (art. 157, IX da CF/46, art. 165, X da CF/67 e art. 7º, XXIII, da CF/88), para fins de
proteção previdenciária, não há como fixar também qualquer limite etário, pois a adoção de uma
idade mínima ensejaria ao trabalhador dupla punição: a perda da plenitude de sua infância em
razão do trabalho realizado e, de outro lado, o não reconhecimento, de parte do INSS, desse
trabalho efetivamente ocorrido. 18. Ressalte-se, contudo, que para o reconhecimento do trabalho
infantil para fins de cômputo do tempo de serviço é necessário início de prova material, valendo
aquelas documentais existentes em nome dos pais, além de prova testemunhal idônea. 19.
Desse modo, para fins de reconhecimento de tempo de serviço e de contribuição pelo exercício
das atividades descritas no art. 11 da Lei 8.213/91, mostra-se possível ser computado período de
trabalho realizado antes dos 12 anos de idade, qual seja sem a fixação de requisito etário. 20.
Recurso do INSS desprovido. Apelação do MPF provida".
(TRF-4ª Região, 6ª Turma, Relatora para acórdão Des. Fed. Salise Monteiro Sanchotene, pm, j.
9/4/18.)
Quadra ressaltar que, após o advento da Lei nº 8.213/91, não é possível a utilização de tempo
rural, sem registro em CTPS, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição.
Com relação ao reconhecimento de tempo de serviço especial, pretende o autor comprovar que
exerceu atividades especiais nos seguintes períodos:
1) Períodos: 12/7/93 a 29/6/99 e 1º/10/99 a 30/7/04.
Empresa: PW Hidropneumática Ltda.
Atividade/função: ajudante geral e operador de máquina.
Agente(s) nocivo(s): ruído de 83,5 dB.
Enquadramento legal: Código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº
2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Prova: Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (ID 105298177, p. 66/67), datado de 21/10/10.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no
período de 12/7/93 a 5/3/97, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, ao
agente ruído acima do limite de tolerância. No entanto, não ficou comprovada a especialidade do
labor nos períodos de 6/3/97 a 29/6/99 e 1º/10/99 a 30/7/04, tendo em vista que a exposição ao
ruído foi inferior ao limite de tolerância.
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de apresentação
de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de 80 dB, nos
termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto
nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto
nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso EspecialRepetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.398.260/PR (2013/0268413-2),
firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº
4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no momento da prestação do serviço.
Dessa forma, observo que, somando os períodos reconhecidos nos presentes autos aos demais
períodos trabalhados, cumpriu a parte autora os requisitos necessários para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição com base no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I, da
CF/88).
Tratando-se de segurado inscrito na Previdência Social em momento anterior à Lei nº 8.213/91, o
período de carência é o previsto na tabela do art. 142 de referido diploma, o qual, no presente
caso, foi em muito superado.
Com relação aos índices de atualização monetária, devem ser observados os posicionamentos
firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso
Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos processos
relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. Quadra ressaltar haver
constado expressamente do voto do Recurso Repetitivo que “a adoção do INPC não configura
afronta ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (RE
870.947/SE). Isso porque, naquela ocasião, determinou-se a aplicação do IPCA-E para fins de
correção monetária de benefício de prestação continuada (BPC), o qual se trata de benefício de
natureza assistencial, previsto na Lei 8.742/93. Assim, é imperioso concluir que o INPC, previsto
no art. 41-A da Lei 8.213/91, abrange apenas a correção monetária dos benefícios de natureza
previdenciária.” Outrossim, como bem observou o E. Desembargador Federal João Batista Pinto
Silveira: “Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os
créditos dos segurados, que os índices em referência – INPC e IPCA-E tiveram variação muito
próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de
2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%;
INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas
não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.” (TRF-4ª Região, AI nº
5035720-27.2019.4.04.0000/PR, 6ª Turma, v.u., j. 16/10/19).
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer o caráter
especial das atividades exercidas no período de 12/7/93 a 5/3/97 e dou parcial provimento à
apelação do INSS para afastar o reconhecimento do labor rural no período de 25/7/91 a 11/7/93 e
ressalvar que o labor rural exercido no período de 15/9/74 a 24/7/91 não poderá ser utilizado para
fins de carência, devendo a correção monetária ser fixada na forma acima indicada.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA.
I- Não merece prosperar a alegação da autarquia no sentido de ser necessário o prévio
requerimento administrativo, tendo em vista que o INSS insurgiu-se com relação ao mérito do
pedido, caracterizando, portanto, o interesse de agir pela resistência à pretensão, conforme
entendimento firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral reconhecida no
Recurso Extraordinário nº 631.240/MG.
II- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início
razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por
coerente e robusta prova testemunhal.
III- O Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que é possível
o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo acostado aos
autos como início de prova material, desde que amparado por prova testemunhal idônea.
IV- No caso concreto, o acervo probatório permite o reconhecimento da atividade rural em parte
do período pleiteado, exceto para fins de carência.
V- No que se refere à conversão do tempo de serviço especial em comum, a jurisprudência é
pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à
luz do princípio tempus regit actum.
VI- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta
a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite
foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi
reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
VII- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte do
período pleiteado.
VIII- No tocante à aposentadoria por tempo de contribuição, a parte autora cumpriu os requisitos
legais necessários à obtenção do benefício.
IX- Com relação aos índices de atualização monetária, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários.
X- Apelações parcialmente providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
