Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5332829-60.2019.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
25/06/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/06/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA.
INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE
LABORAL TOTAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIOS INDEVIDOS.
INCAPACIDADE PARA ATIVIDADE HABITUAL. CAPACIDADE LABORAL RESIDUAL.
REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. DEVIDO AUXÍLIO-DOENÇA. APELAÇÃO DO INSS NÃO
PROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
- O auxílio-acidente, benefício de natureza indenizatória, é disciplinado pelo art. 86 da Lei n.
8.213/91 e pelo art. 104 do Decreto n. 3.048/99. Nos termos do art. 86 da Lei de Benefícios
Previdenciários, com a redação dada pela Lei n. 9.528/97, o benefício "será concedido, como
indenização, ao segurado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de
qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho
que habitualmente exercia".
- O conceito de "acidente de qualquer natureza ou causa" encontra-se, no artigo 30, parágrafo
único, do Decreto nº 3.048/1999.
- No caso, considerando a inexistência de um acidente que fundamente a concessão do
benefício, impositiva a reforma da sentença neste ponto.
- Por outro lado, também se discute o preenchimento dos requisitos para a concessão de
benefício por incapacidade à parte autora. São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade
de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra
atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária
(auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada
enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
- No caso, a perícia médica concluiu que a parte autora estava parcial e permanentemente
incapacitada para o trabalho habitual, ressalvando a possibilidade de exercer atividades
compatíveis.
- Não patenteada a incapacidade total e definitiva para quaisquer serviços, não é possível a
concessão de aposentadoria por invalidez. Devido, entretanto, o auxílio-doença.
- Segundo a Lei nº 8.213/91, o segurado com capacidade de trabalho residual deve ser
reabilitado, a teor do artigo 62 da Lei de Benefícios, não se admitindo que permaneça décadas
recebendo benefício em tais circunstâncias. Deverá ser proporcionada reabilitação profissional à
parte autora, serviço a ser concedido ex vi legis, pois apresenta capacidade laborativa residual,
nos termos da Lei nº 8.213/91.
- O benefício é devido desde o requerimento administrativo. Precedentes do STJ.
- Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017,
Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o
Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux,deferiu, excepcionalmente,efeito suspensivoaos
embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a
aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal
Federaldo pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947.
- Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês,
contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência
do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
- Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para
12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da
sentença, consoante súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º,
2º, 3º, I, e 11, do Novo CPC. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido, se
o caso, na hipótese do artigo 85, § 4º, II, do mesmo código, se a condenação ou o proveito
econômico ultrapassar duzentos salários mínimos.
- Apelação do INSS conhecida e não provida. Apelação adesiva da parte autora conhecida
eparcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5332829-60.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO FELIX RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO CARMONA DA SILVA - SP140057-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5332829-60.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO FELIX RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO CARMONA DA SILVA - SP140057-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelações interpostas em
face da r. sentença que condenou o INSS a conceder auxílio-acidente à parte autora, desde
2/8/2017 (DER), discriminados os consectários legais, antecipados os efeitos da tutela,
dispensado o reexame necessário.
Nas razões de apelo, a autarquia autora alega, em síntese, que a limitação apontada na perícia
não é oriunda de ausência de acidente de qualquer natureza e que a parte não está incapacitada
para o trabalho. Exora a reforma integral do julgado.
Por sua vez, a parte autora, em recurso adesivo, requer a concessão de aposentadoria por
invalidez ou, ao menos, auxílio-doença.
Contrarrazões apresentadas.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5332829-60.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO FELIX RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO CARMONA DA SILVA - SP140057-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos recursos, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
Preliminarmente, cabe consignar que, tendo a parte autora pleiteado na petição inicial o benefício
de aposentadoria por invalidez (renda mensal de 100% do salário-de-benefício), pode o juiz
conceder auxílio-acidente (renda mensal de 50% do salário-de-benefício).
Se nesses casos poderia ser concedido auxílio-doente com base nos mesmos fatos geradores
(acidente e incapacidade parcial), também pode ser concedido o auxílio-acidente, considerando-
se um minus, não um extra, em relação ao pedido.
Nesse diapasão:
"PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA - REMESSA OFICIAL - APELAÇÃO DO INSS - MATÉRIA PRELIMINAR -
JULGAMENTO EXTRA PETITA - APLICÁVEL A LEGISLAÇÃO VIGENTE AO TEMPO DO
ACIDENTE - MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA - REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO
PROVIDAS. I - A análise dos pressupostos para a concessão dos benefícios de aposentadoria
por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente difere tão-somente quanto à possibilidade ou não
de retorno ao mercado de trabalho, apesar da redução da capacidade laboral. Isto porque os
referidos benefícios têm origem na incapacidade para o exercício da atividade laboral, seja total
ou parcial, temporária ou definitiva, ou, ainda, na sua redução. A hipótese comporta a aplicação
do princípio iura novit curia, mormente em ações de natureza previdenciária, cuja legislação deve
ser interpretada à luz dos direitos sociais. II - Em matéria de concessão de benefício
previdenciário deve ser aplicada a lei vigente à época da contingência que dá direito à cobertura
previdenciária - tempus regit actum. Em se tratando de auxílio-acidente , a lei aplicável é a
vigente ao tempo do acidente. III- Os documentos anexados aos autos comprovam que o autor foi
vítima de acidente em 11.09.1992 ("trauma perfurante ocular olho esquerdo com vidro" - fl. 83) e
01.01.1993 ("amputação traumática 2º e 3º qdd com ferimento lacerante e perda de substância" -
fl. 87). Na data do fato, a cobertura previdenciária para acidente de qualquer natureza não tinha
previsão legal, o que foi efetivado com a alteração do art. 86 da Lei nº 8.213/91, com a redação
dada pela Lei nº 9.032/95. Portanto, o autor não tem direito ao benefício de auxílio-acidente
previdenciário. IV - Matéria preliminar rejeitada. V- Remessa oficial provida. VI- Apelação provida.
VII- Sentença reformada." (APELREE 1.171.256 Processo: 2007.03.99.003143-7 UF: SP Órgão
Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:28/02/2011 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:04/03/2011, p.
821 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS)
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-ACIDENTE . APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. NÃO PREENCHIMENTO. I - Não há que se
considerar sentença extra petita aquela que concede o auxílio-acidente em caso em que o
segurado postule apenas os benefícios de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, já que
todas essas benesses visam a dar guarida àquele que sofre prejuízo em sua capacidade
laborativa, sendo, portanto, espécies do gênero compreendido no conceito de benefícios por
incapacidade. II- As patologias do autor não se enquadram como decorrentes de acidente de
trabalho, a ensejar, inclusive, eventual discussão sobre a competência do Juízo para apreciação
da lide, tampouco configurando-se como seqüela de acidente ou por exposição a agentes
exógenos (físicos, químicos e biológicos), sendo indevido , portanto, o benefício de auxílio-
acidente tal como concedido. III- O perito judicial concluiu pela ausência de incapacidade laboral
do autor, não restando preenchidos, portanto, os requisitos para a concessão de quaisquer dos
benefícios em comento. IV - Remessa Oficial tida por interposta e Apelação do réu providas." (AC
1.661.693 Processo: 0004191-11.2010.4.03.6114 UF: SP Órgão Julgador: DÉCIMA TURMA Data
do Julgamento:18/10/2011 Fonte: TRF3 CJ1 DATA:26/10/2011 Relator: DESEMBARGADOR
FEDERAL SERGIO NASCIMENTO)
Todavia, na hipótese, indevida é a concessão desse benefício.
O auxílio-acidente, benefício de natureza indenizatória, é disciplinado pelo art. 86 da Lei n.
8.213/91 e pelo art. 104 do Decreto n. 3.048/99.
Nos termos do art. 86 da Lei de Benefícios Previdenciários, com a redação dada pela Lei n.
9.528/97, o benefício "será concedido, como indenização, ao segurado quando, após a
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que
impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia".
O conceito de "acidente de qualquer natureza ou causa" encontra-se, no artigo 30, parágrafo
único, do Decreto nº 3.048/1999:
"Art. 30. (...)
(...)
Parágrafo único. Entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele de origem
traumática e por exposição a agentes exógenos (físicos, químicos e biológicos), que acarrete
lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução permanente ou
temporária da capacidade laborativa".
De acordo com a perícia médica judicial, realizada em 8/1/2018, o autor, nascido em 1957,
motorista,está parcial e permanentemente incapacitadopara o trabalho, por ser portador
de"Hérnia de Disco Lombar CID M511, Espondilodiscoartrose Lombar CID M480, Hipertensão
Arterial Sistêmica CID I10, Diabetes Mellitus CID E149, Dislipidemia CID E782".
Esclareceu o perito (destaquei):
"Por todo exposto, diante do que se apurou durante a Perícia Médica e estudos posteriores, após
avaliação clínica, mediante anamnese, exame físico compatível e testes físicos específicos,
também após avaliação de documentos médicos complementares apresentados, considerando
ainda o histórico ocupacional, idade e grau de instrução, CONCLUO que as manifestações
clínicas das patologias que acometem o(a) periciado(a), atualmente impõem limitações apenas
para atividades laborativas que demandem realização de esforço físico de grande intensidade e
posições forçadas de tronco e membros inferiores, não sendo recomendado que o(a) periciado(a)
retorne a atividade laborativa habitual de motorista (Incapacidade Parcial), sem prognóstico de
recuperação desta limitação (Incapacidade Permanente)".
Apontou o início da incapacidade em maio de 2017 e ressalvou apossibilidade de reabilitação
profissional para atividades leves compatíveis.
Nesse passo, muito embora tenha sido constatada a presença de incapacidade parcial e
permanente, ela é decorrente de doença e não de acidente de qualquer natureza, não restando
configurado, portanto, o requisito fundamental e justificante do benefício de auxílio-acidente já
que a origem da doença não possui relação com os eventos que o dispositivo legal enumera
como passíveis de lhe originarem, quais sejam, trauma ou exposição a agentes exógenos.
Neste sentido, trago à colação o seguinte julgado (grifei):
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. REQUISITOS. LIMITAÇÃO PARCIAL
E PERMANENTE PARA DETERMINADAS FUNÇÕES. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO ATÉ A
EFETIVA REABILITAÇÃO. AVC - AUXÍLIO-ACIDENTE INDEVIDO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
TUTELA ESPECÍFICA. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. São três os requisitos para a
concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de segurado; b) o cumprimento do
período de carência de 12 contribuições mensais; c) a incapacidade para o trabalho, de caráter
permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença). 2. A concessão dos
benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a averiguação da
incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá
vigência enquanto permanecer ele nessa condição. 3. A prova pericial constitui o meio adequado
para se apurar a existência da incapacidade laborativa do requerente, sendo, no caso concreto,
desnecessária a oitiva de testemunhas para comprovar a alegação, eis que a perícia foi clara e
conclusiva. 4. . No caso dos autos, o laudo pericial indicou que a parte autora está incapacitada
para suas atividades habituais; entretanto, considerando que não se trata de pessoa idosa, bem
como que possui elevada instrução educacional, é viável, em tese, a reabilitação profissional.
Logo, mostra-se adequado o restabelecimento do auxílio-doença desde a cessação
administrativa. 5. Termo inicial do benefício na data da cessação administrativa, uma vez
evidenciado que a incapacidade estava presente àquela data. 6. Acidente vascular cerebral ou
encefálico (AVC ou AVE) é um termo técnico da área da medicina que não constitui fato gerador
do benefício de auxílio-acidente, ainda que consolide com redução parcial e permanente da
capacidade laborativa. 7. Declarada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do art.
1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, os juros moratórios devem
ser equivalentes aos índices de juros aplicáveis à caderneta de poupança (STJ, REsp
1.270.439/PR, 1ª Seção, Relator Ministro Castro Meira, 26/06/2013). No que tange à correção
monetária, permanece a aplicação da TR, como estabelecido naquela lei e demais índices oficiais
consagrados pela jurisprudência. 8. O cumprimento imediato da tutela específica independe de
requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia
mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497,
536 e parágrafos e 537 do CPC/2015." (TRF4 5004221-47.2014.404.7001, QUINTA TURMA,
Relator ROGER RAUPP RIOS, juntado aos autos em 30/06/2016).
Portanto, considerando a inexistência de um acidente que fundamente a concessão do benefício,
a reforma da r. sentença é medida de rigor.
Por outro lado, também se discute o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício
por incapacidade à parte autora.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da CF/99, com a redação data pela EC n°
20/98, que tem a seguinte redação: “Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma
de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que
preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:I - cobertura dos
eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (...)”
Já a Lei nº 8213/91, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, § único, III, da CF/88),
estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/91, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade
que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo
59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social,
Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005,
pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho.
São exigidos à concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou
auxílio-doença.
O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica,
por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil. Porém, o Juiz não está
adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais,
profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização são pertinentes a esse tema.
Súmula 33 da TNU, segundo a qual: “Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais
para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo,
esta data será o termo inicial da concessão do benefício”.
Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez.
Sumula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social.
Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
No caso em análise, como dito acima, a perícia médica judicial concluiu pela incapacidade parcial
e permanente do autor,ressalvando, contudo,a possibilidade de reabilitação profissional.
Nesse passo, não obstante a inaptidão para o trabalho habitual de motorista, o autor possui
capacidade laboral residual para exercer atividades compatíveis com as limitações apontadas,
não sendo possível a concessão de aposentadoria por invalidez.
Trata-se, pois, de caso típico de auxílio-doença, em que o segurado não está inválido, mas não
pode mais realizar suas atividades habituais.
Há precedentes sobre o tema, mesmo em casos de incapacidade parcial:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL
PARA O TRABALHO HABITUAL. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado
parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício
de outras atividades laborais. 2. Recurso improvido (REsp 501267 / SP RECURSO ESPECIAL
2003/0018983-4 Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO (1112) Órgão Julgador T6 -
SEXTA TURMA Data do Julgamento 27/04/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 28/06/2004 p.
427).
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. CARÊNCIA E
QUALIDADE DE SEGURADO. COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E
TEMPORÁRIA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO A
CONTAR DO LAUDO PERICIAL. I - A consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais -
CNIS comprova o preenchimento da carência exigida por Lei e a manutenção da qualidade de
segurado da autora quando do ajuizamento da ação. II - As conclusões obtidas pelo laudo pericial
comprovam a incapacidade total e temporária da autora para o exercício de atividade laborativa,
devendo ser concedido o auxílio-doença . III - Não houve fixação do início da incapacidade, razão
pela qual a data de início do benefício deve corresponder à data do laudo pericial. IV - Remessa
oficial e apelação do INSS parcialmente providas. Tutela antecipada (APELREE -
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 1497185 Processo: 2010.03.99.010150-5 UF: SP Órgão
Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:13/09/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/09/2010
PÁGINA: 836 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS).
Os demais requisitos para a concessão do benefício - filiação e período de carência - também
estão cumpridos e não foram impugnados nas razões recursais.
A contrario sensu, pode o autor, sim, exercer um sem número de atividades compatíveis com as
limitações apontadas na perícia.
Ora, segundo a Lei nº 8.213/91, o segurado com capacidade de trabalho residual deve ser
reabilitado, a teor do artigo 62 da Lei de Benefícios, não se admitindo que permaneça décadas
recebendo benefício em tais circunstâncias.
Deverá ser proporcionada reabilitação profissional à parte autora, serviço a ser concedido ex vi
legis, pois apresenta capacidade laborativa residual, nos termos da Lei nº 8.213/91, devendo ser
mantido o benefício de auxílio-doença até a conclusão de tal prestação.
O termo inicial do benefício fica mantido na data do requerimento administrativo, por estar em
consonância com os elementos de prova e com a jurisprudência dominante.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL.
1. O termo inicial da concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez é a
prévia postulação administrativa ou o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença. Ausentes a
postulação administrativa e o auxílio-doença, o termo a quo para a concessão do referido
benefício é a citação. Precedentes do STJ.
2. Agravo Regimental não provido." (AgRg no REsp 1418604/SC, Rel. Min. Herman Benjamin,
julgado em 11/02/2014)
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017,
Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o
Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux,deferiu, excepcionalmente,efeito suspensivoaos
embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a
aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal
Federaldo pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados
a partir da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do
CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux), observada, quanto ao
termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em
19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
É mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para
12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da
sentença, consoante súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º,
2º, 3º, I, e 11, do Novo CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido, se o caso, na hipótese do artigo
85, § 4º, II, do mesmo código, se a condenação ou o proveito econômico ultrapassar duzentos
salários mínimos.
Ante o exposto, conheço daapelação do INSS e lhe nego provimento; conheço da apelação
adesiva da parte autora e lhedou parcial provimento para considerar devido o benefício de auxílio-
doença, desde a DER,até a conclusão do procedimento de reabilitação profissional.
Comunique-se, via eletrônica, para o cumprimento do julgado no tocante à alteração do benefício
concedido.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA.
INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE
LABORAL TOTAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIOS INDEVIDOS.
INCAPACIDADE PARA ATIVIDADE HABITUAL. CAPACIDADE LABORAL RESIDUAL.
REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. DEVIDO AUXÍLIO-DOENÇA. APELAÇÃO DO INSS NÃO
PROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
- O auxílio-acidente, benefício de natureza indenizatória, é disciplinado pelo art. 86 da Lei n.
8.213/91 e pelo art. 104 do Decreto n. 3.048/99. Nos termos do art. 86 da Lei de Benefícios
Previdenciários, com a redação dada pela Lei n. 9.528/97, o benefício "será concedido, como
indenização, ao segurado quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de
qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho
que habitualmente exercia".
- O conceito de "acidente de qualquer natureza ou causa" encontra-se, no artigo 30, parágrafo
único, do Decreto nº 3.048/1999.
- No caso, considerando a inexistência de um acidente que fundamente a concessão do
benefício, impositiva a reforma da sentença neste ponto.
- Por outro lado, também se discute o preenchimento dos requisitos para a concessão de
benefício por incapacidade à parte autora. São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade
de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o
trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra
atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária
(auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada
enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
- No caso, a perícia médica concluiu que a parte autora estava parcial e permanentemente
incapacitada para o trabalho habitual, ressalvando a possibilidade de exercer atividades
compatíveis.
- Não patenteada a incapacidade total e definitiva para quaisquer serviços, não é possível a
concessão de aposentadoria por invalidez. Devido, entretanto, o auxílio-doença.
- Segundo a Lei nº 8.213/91, o segurado com capacidade de trabalho residual deve ser
reabilitado, a teor do artigo 62 da Lei de Benefícios, não se admitindo que permaneça décadas
recebendo benefício em tais circunstâncias. Deverá ser proporcionada reabilitação profissional à
parte autora, serviço a ser concedido ex vi legis, pois apresenta capacidade laborativa residual,
nos termos da Lei nº 8.213/91.
- O benefício é devido desde o requerimento administrativo. Precedentes do STJ.
- Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017,
Relator Ministro Luiz Fux). Contudo, em 24 de setembro de 2018 (DJE n. 204, de 25/9/2018), o
Relator da Repercussão Geral, Ministro Luiz Fux,deferiu, excepcionalmente,efeito suspensivoaos
embargos de declaração opostos em face do referido acórdão, razão pela qual resta obstada a
aplicação imediata da tese pelas instâncias inferiores, antes da apreciação pelo Supremo Tribunal
Federaldo pedido de modulação dos efeitos da tese firmada no RE 870.947.
- Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês,
contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência
do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
- Mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para
12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da
sentença, consoante súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º,
2º, 3º, I, e 11, do Novo CPC. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido, se
o caso, na hipótese do artigo 85, § 4º, II, do mesmo código, se a condenação ou o proveito
econômico ultrapassar duzentos salários mínimos.
- Apelação do INSS conhecida e não provida. Apelação adesiva da parte autora conhecida
eparcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação do INSS e lhe negar provimento; conhecer da
apelação adesiva da parte autora e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
