Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000078-49.2018.4.03.6335
Relator(a)
Juiz Federal HERBERT CORNELIO PIETER DE BRUYN JUNIOR
Órgão Julgador
6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
25/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 11/03/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-ACIDENTE – ACUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ - ERRO ADMINISTRATIVO – INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO - RESSARCIMENTO -
REPETIÇÃO DE VALORES – DESCONTO EM FOLHA. 1. Procede a cessação dos descontos
em folha, ficando, entretanto, dispensado o INSS da restituição dos valores já debitados. 2. Ante
a supremacia do interesse público e os princípios da legalidade e da vedação do enriquecimento
sem causa, não há razoabilidade em se determinar que a Administração proceda pela segunda
vez a um pagamento que, comprovadamente, foi indevido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000078-49.2018.4.03.6335
RELATOR:17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: ROBERTO DE SOUSA
Advogado do(a) RECORRENTE: CELESTINO PINTO DA SILVA - SP60734-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000078-49.2018.4.03.6335
RELATOR:17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: ROBERTO DE SOUSA
Advogado do(a) RECORRENTE: CELESTINO PINTO DA SILVA - SP60734-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte ré, em face de sentença que julgou procedente o
pedido inicial.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000078-49.2018.4.03.6335
RELATOR:17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: ROBERTO DE SOUSA
Advogado do(a) RECORRENTE: CELESTINO PINTO DA SILVA - SP60734-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A sentença atacada decidiu a lide nos seguintes termos:
(...)
A parte autora sustenta que a parte ré efetua descontos em seu benefício previdenciário
decorrente do recebimento cumulativo de auxílio-acidente com a aposentadoria por invalidez.
Aduz que a cumulação indevida de benefícios originou-se de erro da administração e que a
parte autora agiu de boa-fé.
Conforme processo administrativo anexado aos autos, o benefício de auxílio-suplementar por
acidente de trabalho, espécie B95, de titularidade da autora, foi revisto e considerado irregular a
partir de 07/11/2006, quando a parte autora passou a receber de forma cumulada com o
benefício de aposentadoria por invalidez, espécie B32 (fls. 01 do item 18 dos autos).
A decisão administrativa do Conselho de Recursos da Previdência Social evidencia que o
pagamento concomitante dos benefícios decorreu de erro da administração pública
previdenciária e que não houve má-fé da parte autora (fls. 19/20 do item 22 dos autos).
Não obstante haja regra expressa a respeito da repetição de benefício previdenciário pago
indevidamente, independente da causa, a jurisprudência pátria firmou-se no sentido de que,
cuidando-se de verba alimentar, exige-se a prova da má-fé do administrado para a repetição.
Nesse sentido:
(...)
Nesse caso, cabe ao INSS, no processo administrativo, com o devido contraditório, comprovar
a má-fé do segurado. No caso dos autos, não verifico prova de má-fé, cuidando-se, na verdade,
de falha administrativa.
No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais nº
1381734/RN afetado sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 979), firmou a seguinte tese:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por
cento) de valor do benefício pago ao segurado/ beneficiário, ressalvada a hipótese em que o
segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com
demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.”
Não merece prosperar a alegação do INSS, no sentido que no caso concreto, não se aplica a
tese acima, tendo em vista que a cumulação indevida de benefícios não ocorreu por decisão
administrativa não pautada em posição jurídica errada ou vício interpretativo da legislação.
Entretanto, como visto acima, a tese também se aplica no caso de erro administrativo, ainda
que não decorrente de fundamentação em posição jurídica errada ou vício interpretativo da
legislação.
Nesse caso, constatado o erro administrativo, cabe ao INSS revisar o ato administrativo, não se
incorporando ao patrimônio do beneficiário o valor pago a maior, embora obstada a repetição.
Assim, não resta demonstrada a má-fé, que impede, por conseguinte, a repetição do indébito.
Da mesma forma, a parte autora faz jus à restituição dos valores já descontados de seu
benefício a partir da competência 09/2017 (fls. 05 do item 02 dos autos).
DISPOSITIVO.
Posto isso, resolvo o mérito com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo
Civil de 2015 e ACOLHO o pedido, para declarar indevida a cobrança dos valores pagos à parte
autora no benefício de auxílio-suplementar por acidente de trabalho, espécie B95 a partir de
07/11/2006, determinar a cessação da consignação mensal no benefício de aposentadoria por
invalidez atual e condenar o INSS a restituir o quanto descontado, corrigido, a partir de cada
desconto, na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, com incidência de eventuais
alterações posteriores.
Sem condenação em honorários e custas nesta instância.
No caso, procede a inexigibilidade do débito, bem como a determinação de cessação dos
descontos, porquanto os valores foram pagos em decorrência de equívoco administrativo da
autarquia.
Relativamente à condenação do INSS à repetição dos valores já descontados da parte autora,
por sua vez, embora ainda grasse alguma polêmica a respeito, por estarem envolvidos
aspectos como a supremacia do interesse público e a vedação do enriquecimento ilícito, de um
lado, e, de outro, a ausência de má-fé, entendo que, ao contrário do decidido em sentença,
descabe a repetição por parte da autarquia. Isso em razão desses dois primeiros aspectos
aventados e, ainda, pelo fato de que, depois de descontado em meses anteriores, é dificultoso
falar-se em verba alimentar. Ademais, difícil falar em repetição do indébito pelo INSS se o valor,
na realidade, pertencia-lhe e nunca deveria ter sido pago; somente o foi em virtude do erro.
Em outras palavras, o acolhimento dessa pretensão equivaleria à determinação do pagamento
de verba sabidamente indevida. Da mesma forma que a concessão errônea do benefício
abinitio gerou direito ao recebimento do benefício até decisão em contrário, a restituição levada
a cabo na esfera administrativa deve seguir o mesmo princípio, ou seja, produzir efeitos até que
seja cessada, no caso, por ordem judicial.
É a decisão que prestigia a presunção de legalidade e de executoriedade dos atos
administrativos e que, em última instância, impede o enriquecimento sem causa.
Nesse sentido, decidiu o Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PAGO INDEVIDAMENTE. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ.
ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. INEXEGIBILIDADE DA RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO. 1.Não há
que se falar na incompetência da Justiça Estadual para apreciar a questão relativa à
necessidade de devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício
previdenciário, em virtude da competência federal delegada prevista no Art. 109, § 3º, da
Constituição Federal. 2. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal ser desnecessária
a restituição dos valores recebidos de boa fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do
princípio da irrepetibilidade dos alimentos (MS 26085, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal
Pleno; RE 587371, Relator Ministro Teori Zavascki, Tribunal Pleno; RE 638115, RE 638115,
Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno). 3. Pelo princípio da autotutela, a
Administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais,
porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação
judicial (Súmula nº 473/STF). 4. Uma vez descontado pelo INSS, não se pode cogitar na
hipótese de devolução de valores, compelindo a Administração a pagar algo que, efetivamente,
não deve. A natureza alimentar do benefício não abarca as prestações já descontadas e que
não eram devidas. 5. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as
disposições contidas nos §§ 2º, 3º, I, e 4º, do Art. 85, e no Art. 86, do CPC. 6. Apelação provida
em parte. (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 6088312-
34.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA,
julgado em 28/9/2021, DJEN DATA: 6/10/2021)
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS A MAIOR
AO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. BOA-FÉ. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO.
RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS JÁ DESCONTADAS PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE,
RESSALVADAS AQUELAS DESCONTADAS APÓS A CONCESSÃO DA TUTELA
ANTECIPADA. CONSECTÁRIOS LEGAIS FIXADOS DE OFÍCIO. 1. A parte autora é
beneficiária da pensão por morte nº 21/154.166.024-0, concedida a partir de 04/07/2010, em
razão do falecimento do seu ex-marido Antônio Bernardo da Silva. 2. No entanto, devido à
concessão do benefício à corré (na condição de companheira do segurado falecido), a pensão
por morte foi desdobrada, e, por ter pago o benefício a maior à parte autora durante certo
período, a autarquia procedeu à cobrança desses valores. 3. Contudo, não é possível a
cobrança dos valores pagos equivocadamente à parte autora, pois, conforme pacificado pelo E.
Supremo Tribunal Federal, os valores indevidamente recebidos somente devem ser devolvidos
quando demonstrada a má-fé do beneficiário, tendo em vista tratar-se de verbas de caráter
alimentar. 4. Entretanto, não há que se falar em restituição dos valores já descontados pela
autarquia, tendo em vista que realizados nos termos da Súmula 473 do STF, no exercício do
poder-dever do INSS de apuração dos atos ilegais, não se mostrando razoável impor à
Administração o pagamento de algo que, de fato, não deve. 5. Cumpre ressaltar, porém, que tal
entendimento não abrange a parte dos descontos realizada posteriormente àconcessão da
tutela antecipada, sendo de rigor a restituição à parte autora do montante indevidamente
descontado após à referida decisão judicial. 6. A correção monetária deverá incidir sobre as
prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação,
observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do
Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de
sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV,
conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida
expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17. 7. Embora o INSS seja isento do
pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte
vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º,
inciso I e parágrafo único). 8. Apelação do INSS parcialmente provida. Fixados, de ofício, os
consectários legais. (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0000507-
26.2014.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR,
julgado em 18/12/2019, Intimação via sistema DATA: 10/1/2020)
É relevante ressaltar que essa compreensão não alcança a parte dos descontos feitos
posteriormente à concessão da tutela antecipada, sendo de rigor a restituição do montante
indevidamente descontado depois desse ato processual.
Assim, é impositiva a reforma parcial da sentença, afastando a obrigação do réu de restituir os
valores já descontados.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso para isentar o INSS da repetição dos valores
já descontados em folha.
Sem condenação em honorários, nos termos do artigo 55 da lei 9.099/95.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-ACIDENTE – ACUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ - ERRO ADMINISTRATIVO – INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO - RESSARCIMENTO
- REPETIÇÃO DE VALORES – DESCONTO EM FOLHA. 1. Procede a cessação dos descontos
em folha, ficando, entretanto, dispensado o INSS da restituição dos valores já debitados. 2.
Ante a supremacia do interesse público e os princípios da legalidade e da vedação do
enriquecimento sem causa, não há razoabilidade em se determinar que a Administração
proceda pela segunda vez a um pagamento que, comprovadamente, foi indevido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma Recursal
dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária de São Paulo decidiu, por unanimidade,
DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
