
D.E. Publicado em 09/05/2017 |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO ACIDENTE. ARTIGO 86 DA LEI Nº 8.213, DE 24.07.1991. SEGURADO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. ART. 18, §1º DA LEI N° 8.213/91. DESCABIMENTO. SENTENÇA REFORMADA. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
- O direito controvertido foi inferior ao patamar fixado no art. 475, parágrafo 2º, do CPC/1973, de 60 salários mínimos, razão pela qual não há que se falar em remessa necessária.
- O benefício de auxílio-acidente está disciplinado no artigo 86 da Lei nº 8.213/91, e estabelece sua concessão, como indenização ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.
- Consoante disciplina expressamente o § 1º do artigo 18 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, tem direito à percepção do benefício auxílio-acidente, nas hipóteses em que preenchidos os pressupostos do artigo 86 do mesmo diploma legal, o segurado empregado (art. 11, inciso I), o trabalhador avulso (art. 11, inciso IV) e o segurado especial (art. 11, inciso VII). Conquanto tenha havido ampliação do risco social ensejador da prestação, a fim de alcançar também os acidentes de qualquer natureza, o sistema rejeita conferir auxílio-acidente ao segurado contribuinte individual.
- Não preenchendo o demandante os requisitos necessários à concessão do benefício de auxílio- acidente, a improcedência do pedido é de rigor.
- Apelação Autárquica a que se dá provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da Remessa Oficial e dar provimento à Apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0002642-16.2011.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Trata-se de Apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face da r. Sentença proferida na data de 31/07/2014 (fls. 84/90), que julgou parcialmente procedente a demanda, condenando a autarquia previdenciária a conceder à parte autora o benefício de auxílio-acidente, desde 01/02/2009, condenando-a ao pagamento dos valores das parcelas em atraso, com correção monetária e juros de mora. Sem custas. O ente previdenciário foi condenado, também, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, considerando as parcelas vencidas até a Sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ. Concessão, de ofício, da tutela específica, para implantação do benefício. Decisão submetida ao reexame necessário.
Em seu recurso, a autarquia previdenciária (fls. 112/125) alega em síntese, que o contribuinte individual e empregada doméstica não fazem jus ao auxílio-acidente, a teor do disposto no artigo 18, §1º, da Lei de Benefícios. Assevera, também, que a mera caracterização do acidente ou da doença, não é suficiente para ensejar a concessão de qualquer benefício por parte do INSS. Subsidiariamente, requer a reforma da r. Sentença quanto aos critérios de incidência dos juros de mora e correção monetária. Pede a aplicação do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009.
Subiram os autos, com contrarrazões (fls. 207-210 e 213-214).
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal Fausto De Sanctis:
Do reexame necessário
Conforme Enunciado do Fórum Permanente de Processualistas Civis n° 311: "A regra sobre remessa necessária é aquela vigente ao tempo da prolação da sentença, de modo que a limitação de seu cabimento no CPC não prejudica os reexames estabelecidos no regime do art. 475 CPC/1973" (Grupo: Direito Intertemporal e disposições finais e transitórias).
Pela análise dos autos, o direito controvertido foi inferior ao patamar fixado no art. 475, parágrafo 2º, do CPC/1973, de 60 salários mínimos, razão pela qual não há que se falar em remessa necessária.
Nestes termos, não conheço da remessa oficial, visto que estão sujeitas ao reexame necessário as sentenças em que o valor da condenação e o direito controvertido excedam a 60 (sessenta) salários mínimos, nos termos do parágrafo 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil de 1973, com a redação dada pela Lei nº 10.352/2001.
Passo à análise do mérito.
Cumpre, primeiramente, apresentar o embasamento legal relativo aos benefícios previdenciários concedidos em decorrência de incapacidade para o trabalho.
Nos casos em que está configurada uma incapacidade laboral de índole total e permanente, o segurado faz jus à percepção da aposentadoria por invalidez. Trata-se de benefício previsto nos artigos 42 a 47, todos da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Além da incapacidade plena e definitiva, os dispositivos em questão exigem o cumprimento de outros requisitos, quais sejam: a) cumprimento da carência mínima de doze meses para obtenção do benefício, à exceção das hipóteses previstas no artigo 151 da lei em epígrafe; b) qualidade de segurado da Previdência Social à época do início da incapacidade ou, então, a demonstração de que deixou de contribuir ao RGPS em decorrência dos problemas de saúde que o incapacitaram.
É possível, outrossim, que a incapacidade verificada seja de índole temporária e/ou parcial, hipóteses em que descabe a concessão da aposentadoria por invalidez, mas permite seja o autor beneficiado com o auxílio-doença (artigos 59 a 62, todos da Lei nº 8.213/1991). A fruição do benefício em questão perdurará enquanto se mantiver referido quadro incapacitante ou até que o segurado seja reabilitado para exercer outra atividade profissional.
Acrescento que, com relação ao auxílio-acidente, assim disciplina o artigo 86 da Lei nº 8.213/91:
"Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia."
Da leitura deste dispositivo, pode-se extrair que quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado; (b) a superveniência de acidente de qualquer natureza; (c) a redução parcial da capacidade para o trabalho habitual, e (d) o nexo causal entre o acidente a redução da capacidade.
Neste ponto, vale destacar o entendimento dos doutrinadores Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, comentando a Lei de Benefícios da Previdência Social, que esclarecem:
"Na redação original da Lei de Benefícios, o auxílio acidente era devido apenas quando o segurado sofresse acidente do trabalho, o qual acarretasse uma redução da capacidade laborativa, ou exigisse maior esforço para o exercício da mesma atividade desempenhada na época do acidente, ou, ainda, lhe impedisse o seu desempenho (LBPS, art. 86). Atualmente, é concedido como pagamento de indenização mensal, quando após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar seqüelas que impliquem na redução da capacidade de labor do segurado."
... "Mencionando a lei atualmente acidente de qualquer natureza, em lugar de acidente do trabalho, como na redação originária, entende-se que houve uma ampliação das hipóteses fáticas para a concessão do benefício. O conceito de acidente do trabalho é legal, sendo, portanto, mais restrito, devendo ser compreendido à luz dos arts. 19 e 21 da Lei de Benefícios. Por acidente de qualquer natureza deve ser entendido qualquer evento abrupto que cause a incapacidade, ainda que não guarde relação com a atividade laboral do segurado. Poderá ser um acidente doméstico, automobilístico ou esportivo." (Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, Ed. Livraria do Advogado, 2ª Ed., 2002, p. 255 - grifei)
Feitas as considerações acima, passo à análise das questões suscitadas pelos apelantes.
O deslinde da controvérsia resume-se no exame da possibilidade de se conceder o benefício de auxílio-acidente ao segurado contribuinte individual.
Conforme se depreende dos dados do CNIS (fls.92/96) o autor é contribuinte individual e há informação nos autos que trabalha como pedreiro e, pretende, através da presente ação, a concessão do auxílio-acidente por acidente de qualquer natureza. No caso, na época do acidente (11/05/2004), conforme consta do laudo médico pericial de fls. 54/58, o autor ostentava a condição de segurado da Previdência Social, porque efetuava recolhimentos na condição de contribuinte individual (autônomo).
Consoante disciplina expressamente o § 1º do artigo 18 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, tem direito à percepção do benefício auxílio-acidente, nas hipóteses em que preenchidos os pressupostos do artigo 86 do mesmo diploma legal, o segurado empregado (art. 11, inciso I), o trabalhador avulso (art. 11, inciso IV) e o segurado especial (art. 11, inciso VII). Conquanto tenha havido ampliação do risco social ensejador da prestação, a fim de alcançar também os acidentes de qualquer natureza, o sistema rejeita conferir auxílio-acidente ao segurado contribuinte individual.
O trabalhador autônomo, caso dos autos, espécie de contribuinte individual, não se enquadra no dispositivo supra. Somente os segurados empregados e avulsos, já que para estes as empresas contribuem para o seguro de acidentes de trabalho. O segurado individual não figura como contribuinte da Seguridade Social em decorrência dos riscos ambientais do trabalho.
Tal entendimento encontra amparo constitucional, ressaltando-se que o parágrafo 10 do artigo 201 da CF/88, incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998, diz que Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente de trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado. A referida lei já existe (Lei n° 8212, de 24/7/1991), e estabelece, em seu artigo 22, inciso II, alineas "a" a "c", a previsão de custeio apenas para o segurado empregado e avulso. Portanto, estão fora o segurado contribuinte individual e facultativo.
Ademais, o § 5° do artigo 195 da CF/88 proíbe a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio total. E só há no momento fonte de custeio relativa a segurados empregados e avulsos.
Em sendo assim, deferir-lhe a prestação vindicada é ofender a regra do art. 195, § 5º, da CF (regra da contrapartida).
No sentido do decidido, a jurisprudência:
"BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PERÍCIA PARCIALMENTE FAVORÁVEL. CONSTATADA INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA PREESENTES. SEGURADO QUE NÃO TEM DIREITO AO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-ACIDENTE. ROL DO ART. 18, §1°, DA LEI 8213/91. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL/FACULTATIVO. EXTINÇÃO DO PROCESSO COM JULGAMENTO DO MÉRITO. PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS. 1. Ação proposta para obtenção do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez cujo pedido fora julgado procedente para concessão do benefício de auxílio- acidente. 2. Laudo pericial parcialmente favorável no qual constatou-se a incapacidade apenas parcial e permanente. Prova realizada por perito de confiança do juízo cujas conclusões estão embasadas nos documentos médicos constantes dos autos e principalmente no exame clínico direto 3. Contudo, a legislação previdenciária (art. 18, §1° da Lei 8213/91 e art. 104, caput, do Decreto n. 3048/99) restringe a concessão do auxílio-acidente aos segurados empregados, o empregado doméstico, o avulso e o especial. Portanto, os segurados contribuintes individuais e os facultativos, ainda que com perícia favorável, não tem direito ao benefício. 4. Reforma da sentença, para julgar improcedente o pedido. 6. Casso a antecipação dos efeitos da tutela, mas ressalto que por se tratar de benefício com natureza alimentar que a parte autora recebeu de boa-fé, lastreada por decisão judicial, não há obrigação de devolução dos valores recebidos. 7. Oficie-se ao INSS para cancelamento do benefício. 8. Sem condenação em honorários por força da lei. É como voto."
(TRF3, Juizado Especial Cível - 3ª Turma Recursal-SP - Proc 0004855260074036315 , v.u, j. 24.04.13, e-DJF3 de 09.05.13).
"PREVIDENCIÁRIO - AUXÍLIO-ACIDENTE - ART. 18, §1º DO CPC - SEGURADO NÃO EMPREGADO. DESCABIMENTO. I- O autor não faz jus à concessão do benefício de auxílio-acidente, nos termos do art. 18, §1º, da Lei nº 8.213/91, vez que estava filiado à Previdência Social, como contribuinte individual, à época da fixação do início de sua incapacidade laboral. II- Não há condenação do autor ao ônus da sucumbência, por ser beneficiário da assistência judiciária gratuita (STF, RE 313.348/RS, Min. Sepúlveda Pertence). III- Remessa Oficial tida por interposta e Apelação do réu providas."
(TRF3, AC 00081876520114039999, 10ª Turma, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, v.u, j. 22.05.12, e-DJF3 de 30.05.12).
Por fim, ressalto que não há eiva de inconstitucionalidade na restrição legal. A Previdência Social é regida pelos primados da universalidade da cobertura e da seletividade (art. 194, parágrafo único, III, da CF/88). Não são princípios excludentes, ainda que o da seletividade desempenhe papel redutor do da universalidade.
No caso, ainda que o contribuinte individual figure entre os segurados da Previdência Social (universalidade subjetiva), o legislador restringiu seletivamente sua proteção, negando-lhe acesso ao auxílio-acidente, ante sua peculiar condição social e econômica.
De acordo com a legislação de regência, não deve prosperar a pretensão do segurado, pois o autor não se enquadra dentre nenhuma das hipóteses legais a autorizar a concessão do benefício auxílio-acidente ora pretendido.
Por conseguinte, não prospera o pleito de auxílio-acidente, deduzido nestes autos.
Revogo o benefício de auxílio acidente, concedido na r. Sentença, e, consequentemente, revogo a tutela antecipada determinada pelo r. Juízo a quo.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, devendo-se observar o disposto no artigo 98, § 3°, do CPC/2015.
Nesse sentido, é o julgado da Suprema Corte abaixo transcrito:
"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REMUNERAÇÃO TOTAL. SALÁRIO-MÍNIMO. ABONO. BASE DE CÁLCULO. VANTAGENS PESSOAIS. HONORÁRIOS. JUSTIÇA GRATUITA. 1. As questões relativas aos honorários sucumbenciais hão de ser resolvidas na execução do julgado, quando se discutirá se a ausência da condenação, base de cálculo erigida pelo juiz para fixação dos honorários advocatícios, restou ou não inexeqüível. Precedentes. 2. Os beneficiários da Justiça gratuita devem ser condenados aos ônus da sucumbência, com a ressalva de que essa condenação se faz nos termos do artigo 12 da Lei 1.060/50 que, como decidido por esta Corte no RE 184.841, foi recebido pela atual Constituição por não ser incompatível com o artigo 5º, LXXIV, da Constituição. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (RE-AgR 514451, MINISTRO RELATOR EROS GRAU, votação unânime, 2ª TURMA, STF, julgado em 11.12.207) (grifei)
Oficie-se ao INSS para que proceda ao imediato cancelamento do benefício em voga.
Posto isto, NÃO CONHEÇO a Remessa Oficial e, em consonância com o art. 1.013, § 1°, do CPC/2015, voto por DAR PROVIMENTO à Apelação Autárquica, nos termos expendidos na fundamentação.
É o voto.
Desembargador Federal
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