Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5005924-23.2021.4.03.6119
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
27/10/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/10/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS
INDEVIDAMENTE AO BENEFICIÁRIO EM RAZÃO DA CUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DESNECESSIDADE. BOA-FÉ OBJETIVA COMPROVADA.
NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NÃO CARACTERIZADA.
1.Conforme pacificado pelo E. STJ, "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu
desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a
hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo
com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido".
2. No caso, aparte autora era beneficiário do auxílio-acidente nº 94/081.342.927-7, concedido
com DIB em 08.02.1992.
3. No entanto, considerando que não houve a cessação do auxílio-acidente após a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição nº 42/163.847.175-1 à parte autora - o que gerou a
acumulação indevida dos benefícios -, a autarquia passou à cobrança do valor pago no período.
4.Não se mostra possível, porém, a cobrança dos valores pagos equivocadamente no período,
tendo em vista a natureza alimentar de tais verbas, bem como a comprovação da boa-fé objetiva
da parte autora no caso concreto.
5. Ademais, aindaque a boa-fé objetiva não tivesse sido demonstrada, não seria possível a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
repetição dos valores através da aplicação do decidido pelo C. STJ, uma vez que, conforme
modulação de efeitos definida pelo Colegiado, o entendimento estabelecido somente deve atingir
os processos distribuídos após a publicação do acórdão, ocorrida em 23.04.2021.
6. Aos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa deve
aplicar-se a majoração prevista no artigo 85, §11, do Código de Processo Civil, observados os
critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
7. A litigância de má-fé apenas se caracteriza em casos nos quais ocorre o dano à parte contrária
e configuração de conduta dolosa, o que não houve no presente caso, uma vez que não se
verifica presente quaisquer das hipóteses previstas no artigo 80 do CPC.
8. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os honorários advocatícios.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005924-23.2021.4.03.6119
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IPOJUCAN FORTUNATO BITTENCOURT FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005924-23.2021.4.03.6119
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IPOJUCAN FORTUNATO BITTENCOURT FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):Trata-se de ação proposta
porIPOJUCAN FORTUNATO BITTENCOURT FERNANDESem face do INSTITUTO NACIONAL
DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a declaração de inexigibilidade de débito referente a
valores recebidos a título de benefício de auxílio-acidente.
Juntados procuração e documentos.
Foi reconhecida a incompetência absoluta do Juizado Especial Federal e determinada a
remessa dos autos a uma das Varas Federais de Guarulhos/SP.
O processo foi distribuído à 4ª Vara Federal de Guarulhos/SP.
Foi proferida decisão declinando da competência e determinando a devolução dos autos ao
Juizado Especial Federal de Guarulhos/SP.
Opostos embargos de declaração pela parte autora, foi revogada a decisão anterior.
Deferidos os pedidos de gratuidade da justiça e de tutela de urgência.
O INSS apresentou contestação.
Réplica da parte autora.
O MM. Juízo de origem julgou procedente o pedido.
Inconformada, aautarquia interpôs recurso de apelação alegando, em síntese, ser devida a
restituição, pela parte autora, dos valores indevidamente recebidos, sob pena de configuração
de enriquecimento ilícito.
Com contrarrazões, nas quais a parte autora pugna pela manutenção da sentença recorrida, a
majoração dos honorários em sucumbência recursal (art. 85, § 11, CPC), bem como a
condenação da autarquia ao pagamento de multa por litigância de má-fé, subiram os autos a
esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005924-23.2021.4.03.6119
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IPOJUCAN FORTUNATO BITTENCOURT FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):A parte autora era beneficiário do
auxílio-acidente nº 94/081.342.927-7, concedido com DIB em 08.02.1992.
Após requerimento realizado administrativamente, também teve concedido, a partir de
06.03.2013, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição nº 42/163.847.175-1.
No entanto, considerando que não houve a cessação do auxílio-acidente na ocasião, o que
gerou a acumulação indevida dos benefícios, a autarquia passou à cobrança do valor
indevidamente pago no período.
Diante disso, a parte autora ajuizou a presente ação pretendendo a declaração de
inexigibilidade do aludido débito.
Em primeiro grau, a ação foi julgada procedente.
Em suas razões de recurso, contudo, alega o INSS ser devida a restituiçãodos valores
indevidamente pagos, sob pena de configuração de enriquecimento ilícito.
Conforme pacificado pelo E. STJ, "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido":
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991.
DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E
MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO.
POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS
ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA
PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada
ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à
hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio
também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou
assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e
similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à
suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte
tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por
força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência
Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má
aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má
aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque
também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser
aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a
sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução
dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível
que, além dcaráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença
da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas
situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma
inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração
previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos
objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale
dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro,
necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n.
3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou
indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de
erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o
devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com
desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste
representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável
interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a
centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os
processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste
acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a
cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se
estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de
simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na
exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos
benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da
vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos
efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente
pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015." (STJ, REsp nº
1.381.734 - RN, 1ª Seção, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, j. em 10.03.2021, DJe
23.04.2021
No caso dos autos, ainda que o benefício de auxílio-acidente tenha sido pago indevidamente a
partir da concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, não há elementos que
demonstrem a existência de má-fé por parte dobeneficiário.Ao contrário, é plausível até mesmo
se falar em boa-fé, diante da impossibilidade de se constatar o pagamento indevido.
Desse modo, conquanto o auxílio-acidente tenha sido pago equivocadamente no período, é
indevida a restituição desses valores, tendo em vista a natureza alimentar de tais verbas, bem
como a comprovação da boa-fé objetiva da parte autora no caso concreto.
Cumpre consignar, ademais, que ainda que a boa-fé objetiva não tivesse sido demonstrada,
não seria possível a repetição dos valores através da aplicação do decidido pelo C. STJ, uma
vez que, conforme modulação de efeitos definida pelo Colegiado, o entendimento estabelecido
somente deve atingir os processos distribuídos após a publicação do acórdão, ocorrida em
23.04.2021.
De rigor, portanto, a manutenção da r. sentença.
Aos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa deve
aplicar-se a majoração prevista no artigo 85, §11, do Código de Processo Civil, observados os
critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
Por fim, quanto à litigância de má-fé, não vislumbro a aplicação de quaisquer das hipóteses
descritas no artigo 80 do CPC. Ademais, partilho do entendimento de que a litigância de má-fé
apenas se verifica em casos nos quais ocorre o dano à parte contrária e configuração de
conduta dolosa, o que entendo não ter havido no processo ora analisado.
Ante o exposto,nego provimento à apelação do INSS, fixando, de ofício, os honorários
advocatícios na forma acima explicitada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS
INDEVIDAMENTE AO BENEFICIÁRIO EM RAZÃO DA CUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DESNECESSIDADE. BOA-FÉ OBJETIVA COMPROVADA.
NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NÃO CARACTERIZADA.
1.Conforme pacificado pelo E. STJ, "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido".
2. No caso, aparte autora era beneficiário do auxílio-acidente nº 94/081.342.927-7, concedido
com DIB em 08.02.1992.
3. No entanto, considerando que não houve a cessação do auxílio-acidente após a concessão
da aposentadoria por tempo de contribuição nº 42/163.847.175-1 à parte autora - o que gerou a
acumulação indevida dos benefícios -, a autarquia passou à cobrança do valor pago no período.
4.Não se mostra possível, porém, a cobrança dos valores pagos equivocadamente no período,
tendo em vista a natureza alimentar de tais verbas, bem como a comprovação da boa-fé
objetiva da parte autora no caso concreto.
5. Ademais, aindaque a boa-fé objetiva não tivesse sido demonstrada, não seria possível a
repetição dos valores através da aplicação do decidido pelo C. STJ, uma vez que, conforme
modulação de efeitos definida pelo Colegiado, o entendimento estabelecido somente deve
atingir os processos distribuídos após a publicação do acórdão, ocorrida em 23.04.2021.
6. Aos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa deve
aplicar-se a majoração prevista no artigo 85, §11, do Código de Processo Civil, observados os
critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
7. A litigância de má-fé apenas se caracteriza em casos nos quais ocorre o dano à parte
contrária e configuração de conduta dolosa, o que não houve no presente caso, uma vez que
não se verifica presente quaisquer das hipóteses previstas no artigo 80 do CPC.
8. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os honorários advocatícios. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e fixar, de ofício, os honorários
advocatícios, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
