
| D.E. Publicado em 14/12/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, reconhecer, de ofício, a ocorrência de coisa julgada parcial em relação aos pedidos de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez e, por consequência, extinguir a ação sem resolução do mérito, julgando prejudicada a apelação nesta parte e, quanto ao benefício assistencial, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003428-53.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo procedimento ordinário objetivando a concessão do benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez e, subsidiariamente, benefício de amparo assistencial (LOAS).
Documentos às fls. 08/29.
Contestação e quesitos às fls. 46/49.
Laudo pericial às fls. 68/71.
Sentença às fls. 76/77, pela improcedência do pedido em razão da preexistência das moléstias que acometem a parte autora.
Inconformada, apela a parte autora, pugnando pela procedência dos pedidos (fls. 81/85).
Sem as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
Por decisão da lavra de Sua Excelência, Desembargador Federal Walter do Amaral, foi dado provimento ao recurso de apelação para, de ofício, reconhecer a nulidade da sentença por considerá-la citra petita, determinando o retorno dos autos à Vara de origem para que outra fosse proferida com a análise do pedido de concessão de benefício por amparo assistencial (LOAS), com a realização de prévio estudo social (fls. 92/94).
Estudo social às fls. 106/112.
Sentença às fls. 120/122, pela improcedência dos pedidos, em virtude da preexistência das moléstias que acometem a parte autora, no que se refere ao auxílio-doença e à aposentadoria por invalidez e, quanto ao pedido de concessão de benefício por amparo assistencial (LOAS), por entender não demonstrada a situação de miserabilidade que justificasse a concessão do benefício.
Irresignada, apela a parte autora, tempestivamente, argumentando que, embora a doença tenha sido considerada preexistente ao seu ingresso no RGPS, o estado incapacitante somente sobreveio em virtude de agravamento de seu quadro clínico inicial e, ainda, por se tratarem de doenças de notória progressividade em conformidade com a ciência médica. Subsidiariamente, quanto ao Benefício Assistencial, alega restarem preenchidos os requisitos necessários à sua concessão.
Decorrido o prazo para a oferta das contrarrazões, subiram novamente os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opina pelo desprovimento da apelação (fls. 145/147).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): De início, os institutos da litispendência e da coisa julgada já eram previstos no art. 267, V, do Código de Processo Civil/73:
No caso, verifica-se que a autora, anteriormente ao ajuizamento desta ação, propôs outra (fls. 12/19) em que pleiteava a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, fundamentada nas mesmas causas de pedir (fl. 12 - item 3) e com identidade de partes, perante a 1ª Vara Cível de Cachoeira Paulista/SP (autos nº 1222/2006).
Tal pedido foi julgado improcedente em 25/10/2010 em razão da preexistência das moléstias em relação ao seu ingresso no RGPS (fls. 18/19), sentença esta já transitada em julgado.
Nos presentes autos, os pedidos consistem na concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez e, subsidiariamente, na concessão do benefício de amparo assistencial (LOAS).
O pleito concernente à concessão do benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez encontra-se abrangido pela sentença cujo trânsito em julgado já sobreveio.
Assim, tendo em vista que a sentença proferida naqueles autos transitou em julgado e que parte da pretensão da autora, neste processo, é por ela abrangida, entendo esteja ela acobertada pelo manto da coisa julgada material, de acordo com o art. 485, V, do Código de Processo Civil/2015.
Ressalte-se, outrossim, ser infundada a alegação da parte autora de que a causa de pedir da presente demanda seria diferente em razão do agravamento do seu quadro clínico, uma vez que a primeira ação foi julgada improcedente pelo fato de a incapacidade ser preexistente à filiação ao RGPS, e não em razão de inexistência de incapacidade.
Sendo assim, o reconhecimento da eficácia da coisa julgada, que torna imutável e indiscutível a sentença prolatada naquela primeira ação, nos termos do art. 485, § 3º, do Código de Processo Civil/2015, é medida que se impõe. Nesse sentido, o entendimento deste E. Tribunal:
Assim, reconheço, de ofício, a coisa julgada e, por esta razão, extingo em parte a ação, restando prejudicada a apelação nesta parte.
Quanto ao beneficio assistencial este deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.213/1991.
A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.742/1993:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que originariamente o dispositivo em análise estabelecia a idade mínima de 70 (setenta) anos como requisito para a obtenção do benefício, sendo estabelecida, ao mesmo tempo, regra de transição no art. 38 do mesmo estatuto legal, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos contados 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos em 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-51/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso, mediante a edição da Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, acabou-se por eleger a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário para a percepção do benefício assistencial, nos seguintes termos:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
Consoante perícia médica produzida é possível concluir que o estado clínico da parte-autora sugere a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, portanto, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
Por outro lado, no tocante à demonstração da miserabilidade, o Estudo Social produzido indica que o núcleo familiar é integrado pela parte postulante e seu esposo. À época (03/2015) foi informado que a renda obtida era proveniente da aposentadoria do esposo, no valor de R$ 1.300,00. As despesas declaradas somam o valor de R$ 1.304,00. Consta, ainda, que a casa em que residem é própria e que os filhos auxiliam quando podem. Há a informação de que possuem, linha telefônica, cuja despesa é de R$ 40,00 ao mês, bem como, 3 televisores, sendo 2 de 40 polegadas e 1 de 50 polegadas. A parte autora informa, ainda, que ela e o esposo costumam realizar alguns tratamentos na rede pública e, outros, na rede particular. Informou, também, que a situação financeira do núcleo familiar não difere daquela do momento do requerimento administrativo.
Há que se esclarecer, por oportuno, que o pedido de prorrogação do benefício de auxílio doença, recebido anteriormente, foi realizado em 16/08/2011, conforme consta da carta de indeferimento de fl. 11. Não houve pedido administrativo de concessão do benefício assistencial.
Em consulta ao CNIS/PLENUS, na data de hoje, verifica-se que na época da citação, o esposo da parte autora recebia aposentadoria no valor de R$ 1.199,00; quando da realização do Estudo Social o benefício por ele recebido foi de R$ 1.419,00 e, atualmente (10/2017) é de R$ 1.915,00.
Conquanto a economia doméstica não fosse de fartura, a renda auferida em todo o momento se mostrava adequada ao suprimento das necessidades essenciais do núcleo familiar.
Anote-se que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o orçamento da Seguridade Social.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos os requisitos necessários a justificar a concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Diante do exposto, de ofício, reconheço a coisa julgada parcial em relação aos pedidos de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez e, por consequência, extingo a ação sem resolução do mérito, julgando prejudicada a apelação nesta parte e, quanto ao benefício assistencial, nego provimento à apelação.
É COMO VOTO.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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