Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5000775-17.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
21/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE
LABORATIVA PARCIAL E PERMANENTE. DOENÇA ORTOPÉDICA DEGENERATIVA.
REQUISITOS PREENCHIDOS. DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL DA
BENESSE.
- Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
- É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015, podendo considerar todos os elementos de prova constantes dos
autos.
- Não ter condições de trabalhar, improvável a recuperação da capacidade laboral e não ter
condições de se reabilitar em prazo razoável para o exercício de outra atividade que garanta o
sustento - e preenchidos os demais requisitos legais -, cabível a concessão de aposentadoria por
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
invalidez. Precedentes desta Corte.
- Data de início do benefício de aposentadoria por invalidez fixada no dia seguinte à cessação
indevida do auxílio-doença, na medida em que se trata de continuidade, sob nova espécie, de
uma benesse por incapacidade indevidamente interrompida
- Apelação não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000775-17.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: BENEDITA MARTINS DE MORAIS SOUZA
Advogado do(a) APELADO: JENNIFER SEVERINO DOS SANTOS MAGALHAES DE OLIVEIRA -
MS16508-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000775-17.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: BENEDITA MARTINS DE MORAIS SOUZA
Advogado do(a) APELADO: JENNIFER SEVERINO DOS SANTOS MAGALHAES DE OLIVEIRA -
MS16508-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelação autárquica interposta contra a r. sentença (ID nº 35747746 - Págs.
117/121), integrada pela decisão de ID 35747746 - Pág. 128, que julgou parcialmente procedente
o pedido “para o fim de condenar o INSS a implementar o benefício de aposentadoria por
invalidez em favor de Benedita Martins de Morais Souza, no valor a que faz jus, nos termos do
art. 61 da Lei 8.213/91, com termo inicial em 26/01/2017, data da cessação do benefício
concedido administrativamente (fl. 30), abatendo-se os valores recebidos após esse período sob
o mesmo título.”
Com relação aos valores em atraso “deverão ser corrigidos monetariamente e acrescidos de juros
de mora desta forma: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da
Lei 11.960/2009); correção monetária: INPC, em conformidade com o que restou decidido no RE
870.947 – SE e REsp 1.492.221 – PR. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do
precatório/RPV, conforme decidido em 19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal
quando do julgamento do RE 579431, com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve
ser observada a Súmula Vinculante nº 17” (ID 35747746 - Pág. 120).
Ao final, condenou ambas as partes em honorários advocatícios, na proporção da 50% (cinquenta
por cento) para cada um, fixados em 10% (dez por cento) das pensões vencidas até esta data,
nos termos da Súmula 111 do STJ, ressalvando a gratuidade da justiça ” (ID 35747746 - Pág.
121).
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Em suas razões recursais (ID 35747746 - Págs. 134/139), o INSSsustentaa ausência de
preenchimento dos requisitos legais à concessão do benefício, aduzindo restar ausente a
incapacidade total e permanente do segurado para o trabalho. Argumenta que a data inicial do
benefício deve ser fixada na data da juntada aos autos do laudo pericial e requer a reforma da
sentença prolatada.
Com contrarrazões (ID 35747746 - Págs. 145/151), subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000775-17.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: BENEDITA MARTINS DE MORAIS SOUZA
Advogado do(a) APELADO: JENNIFER SEVERINO DOS SANTOS MAGALHAES DE OLIVEIRA -
MS16508-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Discute-se nos autos o direito da parte autora à concessão de benefício por incapacidade.
Da aposentadoria por invalidez e do auxílio-doença
A cobertura da contingência invalidez/incapacidade permanente é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II - Da Seguridade Social, no artigo 201, inciso I, da Constituição da
República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade
avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
Com efeito, a Reforma da Previdência de 2019 (EC nº 103/2019) modificou a denominação da
invalidez para incapacidade permanente.
A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social
(PBPS), disciplina em seus artigos 42, caput, e 59, caput, as condições à concessão de
benefícios por incapacidade, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”
Aaposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 da LBPS, é o benefício destinado ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o seu
trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou em
razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Desse modo, o evento determinante para a concessão desses benefícios consiste na
incapacidade para o trabalho.
Na hipótese de incapacidade temporária, ainda que de forma total e permanente, será cabível a
concessão de auxílio-doença, o qual posteriormente será convertido em aposentadoria por
invalidez (caso sobrevenha incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se for extinta a
incapacidade temporária e o segurado permanecer com sequela permanente que enseje a
redução da sua capacidade laboral) ou cessado (quando ocorrer a cura do segurado).
São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de
segurado, a carência e a incapacidade laborativa.
1. O primeiro consiste na qualidade de segurado, consoante o art. 15 da LBPS. É cediço que
mantém a qualidade de segurado aquele que, ainda que esteja sem recolher as contribuições,
preserve todos os seus direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, ao
qual a doutrina denominou "período de graça", de acordo com o tipo de segurado e a sua
situação, conforme dispõe o art. 15 da Lei de Benefícios, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação
dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Releva observar que o § 1º do art. 15 da Lei nº 8.213/1991 prorroga o período de graça por 24
meses àqueles que contribuíram por mais de 120 meses, sem interrupção que acarrete a perda
da qualidade de segurado.
Ademais, restando comprovado o desemprego do segurado, mediante registro perante o órgão
próprio do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos do inciso II ou do § 1º do
art. 15 da Lei de Benefícios serão acrescidos de mais 12 meses (art. 15, § 2°, da Lei n.
8.213/1991).
É evidente que a situação de desemprego deve ser comprovada, pela inscrição perante o
Ministério do Trabalho (artigo 15, § 2º, da Lei n.8.213/1991), ou por qualquer outro meio
probatório (v.g., prova documental, testemunhal, indiciária etc.).
Importa esclarecer que, consoante o disposto no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 14
do Decreto nº 3.048/99 (que aprova o Regulamento da Previdência Social – RPS), com a redação
dada pelo Decreto nº 4.032/2001, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do
segundo mês seguinte ao término do prazo estabelecido no art. 30, inciso II, da Lei nº 8.212/1991
para recolhimento da contribuição, ensejando, por conseguinte, a caducidade do direito
pretendido, exceto na hipótese do § 1º do art. 102 da Lei nº 8.213/91, isto é, quando restar
comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir foi decorrente da
incapacidade laborativa.
Frise-se que com o decurso do período de graça, as contribuições anteriores à perda da
qualidade de segurado apenas serão computadas para efeitos de carência após o recolhimento
pelo segurado, a partir da nova filiação ao RGPS, conforme o caso, de, ao menos, 1/3 (um terço)
do número de contribuições necessárias para o cumprimento da carência exigida para benefícios
por incapacidade, ou seja, quatro contribuições (durante a vigência do art. 24, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91) ou metade deste número de contribuições (de acordo com o art. 27-A da Lei de
Benefícios, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
2. O segundo requisito diz respeito à carência de 12 (doze) contribuições mensais, consoante o
disposto no art. 25 da Lei nº 8.213/1991, a saber:
“Art.25.A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
No entanto, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após
filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas no art. 151 da Lei de Benefícios, que
dispõe:
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada.(Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)”
3. O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho de modo permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e na incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos
(auxílio-doença).
Anote-se que para a concessão de benefícios por incapacidade é preciso a demonstração de
que, ao tempo da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto se a
incapacidade sobrevier em decorrência de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
Estabelecem os artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
“Art. 42. (...)
§ 2ºA doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
“Art. 59. (...)
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Logo, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura
óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou
agravamento da moléstia, ex vi do art. 42, § 2º, da Lei de Benefícios.
Na hipótese de ser reconhecida a incapacidade somenteparcialpara o trabalho, o magistrado
deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Ademais, pode conceder auxílio-acidente, nos
moldes do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, se a incapacidade parcial decorre de acidente de
trabalho ou de qualquer natureza, ou ainda, de doença profissional ou do trabalho (art. 20, incisos
I e II, da Lei de Benefícios).
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o
magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros
elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais,
sociais e profissionais.
Confira-se alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que dizem respeito a
esse tema:
Súmula 47 da TNU: "Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez".
Súmula 53 da TNU:"Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social".
Súmula 77 da TNU:"O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual".
O art. 43, §1º, da Lei nº 8.213/1991 preceitua que a concessão da aposentadoria por invalidez
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame
médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial
consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o
segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido
entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da
Seguridade Social.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência
permanente de outra pessoa (grande invalidez), é possível, com supedâneo no art. 45 da Lei de
Benefícios, o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto
Por ocasião do laudo pericial confeccionado por médico especializado em ortopedia (ID 35747746
– p. 81/83), restou constatado que a parte autora está acometida de “Desidratação dos discos
lombares; abaulamentos de discos L4-L5, sem compressão radicular; Tendinopatia do tendão
supraespinal esquerdo, artrose acrômico – clavicular; Bursilte subacromial.”
Em resposta a quesito formulado, consignou que a periciada encontra-se incapacitada para o
trabalho por sofrer de doenças crônicas degenerativas e irreversíveis. Destacou que as patologias
podem ser “controladas sem comprometimento funcional e laboral com tratamento conservador
ou até mesmo cirurgia. Existem tratamentos para melhora das dores, tais como: acupuntura,
fisioterapia, osteopatia, ozonioterapia e medicamentos. E tratamento cirúrgico para reparo dos
tendões do manguito rotador.”
Afirmou, ainda, que a parte autora está temporariamente incapacitada para realizar atividades
laborais, em especial executar atividades que exigem serviço braçal e carregamento de peso.
Solicitados esclarecimentos complementares, acrescentou o médico perito (ID. 35747746 - Pág.
106):
“a periciada possui lesões degenerativas irreversíveis dos discos lombares (desidratação) e dos
tendões de manguito rotador.
A periciada poderá, através de tratamentos conservadores e/ou cirúrgicos, melhorar suas
funções, amenizar os sintomas e limitações, diminuir as dores, sem, entretanto, reverter o quadro
já instalado de lesões. Apenas uma melhora clínica.
Portanto, a periciada está temporariamente incapacitada para atividades laborais, mas com
possibilidade de tratamento para reversão deste quadro apresentado no momento da perícia.”
É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015, podendo considerar todos os elementos de prova constantes dos
autos.
Merece destaque trecho da r. sentença que acrescenta outras provas produzidas nos autos e que
não foram infirmadas pela entidade autárquica (ID 35747746 - p. 118):
“Pelos atestados médicos juntados às fls. 33/40, bem como pelo laudo pericial, verifica-se que a
autora possui patologia envolvendo a coluna vertebral e encontra-se em tratamento desde 2014,
com características evolutivas da doença, dado o seu caráter degenerativo, bem como estão de
acordo com a realidade demonstrada na concessão de auxílio doença a autora pelo período de
21.08.2014 a 23.10.2017 (fl. 171), ou seja, a autora permaneceu incapacitada, segunda a
autarquia, por mais de 3 anos.
Apesar de o laudo constatar que a doença gera incapacidade total e temporária, conclui que a
autora deve ficar de repouso absoluto de serviços braçais, sendo que no "atual momento, a
periciada encontra-se impossibilitada para realização de atividades que exigem serviço braçal e
carregamento de peso" (fl. 201)."
De acordo com a inicial e cópia da CTPS acostada aos autos, a parte autora exerceu as
atividades de empregada doméstica, serviços gerais e copeira.
Como bem consignado por ocasião da r. sentença, ainda que o laudo pericial tenha apontado
possibilidade de retorno ao trabalho com a realização de tratamentos conservadores, pelo fato de
a autora sofrer de doença crônica degenerativa e de caráter irreversível e em face da natureza
braçal da atividade exercida, bem como de sua avançada idade – nascida em 04/04/1961 –,
entendo pouco provável a recuperação da parte autora para que seja reabilitada em nova
atividade e tenha tempo de retornar ao mercado de trabalho para exercer outra atividade que lhe
garanta o sustento, uma vez que, em consulta ao cadastro do CNIS, a parte autora recebeu
auxílio-doença desde 2014 (NB 607.488.835-7).
Pelas razões expostas, entendo possível a concessão de aposentadoria por invalidez, até porque
preenchidos os demais requisitos legais– qualidade de segurado e período de carência -, quenão
foram impugnados pelo INSS em suas razões recursais.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados desta Egrégia Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE
PARCIAL E PERMANENTE. REQUISITOSPREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovada a incapacidade parcial e permanente da parte autora para as atividades laborais
por meio da perícia médica judicial, bem como analisadas as condições pessoais e sociais do
segurado e preenchidos os demais requisitos para a concessão do benefício - qualidade de
segurado e carência -, é devida a aposentadoria por invalidez.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Os honorários advocatícios ficam fixados em 10% (dez por cento) sobre a condenação,
excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do
Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Apelação da autora provida. Apelação da autarquia provida em parte.
(TRF3 - 9ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL: ApCiv 6072654-67.2019.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Daldice
Santana, DATA: 26/03/2020, DJe1)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
DOENÇA. REQUISITOS. PREENCHIMENTO. VERBAS ACESSÓRIAS. RECURSO ADESIVO
PREJUDICADO. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DA BENESSE DE APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ EM SUBSTITUIÇÃO AO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA.
I- Irreparávela r. sentença monocrática que concedeu o benefício de aposentadoria por invalidez
ao autor, ainda que tenha sido constatada a capacidade residual para o trabalho, contando
atualmente com 65 anos de idade e sendo portador de moléstia ortopédica de natureza
degenerativa, encontrando-se em gozo do benefício de auxílio-doença desde o ano de 2013,
razões pelas quais não há como se deixar de reconhecer a inviabilidade de seu retorno ao
trabalho, ou, tampouco, a impossibilidade de reabilitação para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência, Inconteste, portanto, o preenchimento da carência e qualidade de
segurado.
II-Resta prejudicado o recurso adesivo da parte autora, vez que despicienda a realização de
eventual prova oral, como requerido, porquanto os elementos probatórios são suficientes ao
deslinde da matéria.
III-A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado
em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta
de poupança a partir de 30.06.2009. IV- Determinada, independentemente do trânsito em julgado,
a comunicação ao INSS (Gerência Executiva), a fim de serem adotadas as providências cabíveis
para implantação do benefício de aposentadoria por invalidez, em substituição ao benefício de
auxílio-doença. V- Apelação do réu improvida. Recurso Adesivo da parte autora prejudicado.
(TRF3 - 10ª Turma, ApCiv 5791029-92.2019.4.03.9999 . Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento,
DATA: 27/03/2020, ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2:
..FONTE_PUBLICACAO3:.)
Data do Início do Benefício
Insurge-se o INSS quanto à data do início do benefício concedido, cujo termo inicial do benefício
foi fixado em 26/01/2017, data da cessação do benefício concedido administrativamente.
In casu, verifica-se que o termo inicial da aposentadoria por invalidez foi fixado pelo MM. Juízo de
primeira instância na data da cessação do auxílio-doença, em conformidade com a jurisprudência
do C. Superior Tribunal de Justiça, na medida em que se trata de continuidade, sob nova espécie,
de uma benesse por incapacidade indevidamente interrompida. Ademais, o conjunto probatório
dos autos permite concluir que a incapacidade laborativa advém desde então.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
TERMO INICIAL. DATA DA CESSAÇÃO INDEVIDA DO AUXÍLIO-DOENÇA. AGRAVO INTERNO
NÃO PROVIDO.
1. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que "o termo inicial da concessão do benefício
previdenciário de aposentadoria por invalidez é o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença,
no caso de ausência de prévia postulação administrativa. Incidência da Súmula 83/STJ." (AgRg
no AgRg no AREsp 813.589/MS, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 22/3/2016) 2.
Agravo interno não provido.”
(AgInt no AREsp 915.208/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 19/12/2016) (grifei)
“RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. RESTABELECIMENTO DE
BENEFÍCIO. TERMO INICIAL NA DATA DA CESSAÇÃO INDEVIDA.
O benefício de auxílio-doença cessado indevidamente tem como termo inicial a data da cessação
indevida, pois não constitui novo benefício, mas o restabelecimento de uma relação
erroneamente interrompida.
Recurso especial a que se nega provimento.”
(REsp 704.004/SC, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 06/10/2005, DJ
17/09/2007, p. 365) (grifei)
Considerando-se que o benefício NB 31/607.488.835-7 havia sido cessado de forma indevida em
26/01/2017 (ID 35747745 - Pág. 117), retifica-se erro material da sentença e respectiva decisão
integradora (IDs 35747746 - Págs. 117/121 e 35747746 - Pág. 128), para consignar que o termo
inicial da aposentadoria por invalidez deve ser no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença,
qual seja, 27/01/2017.
Conforme consignado na sentença, deverão ser abatidos os valores recebidos a título de
benefício por incapacidade, após 26/01/2017.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE
LABORATIVA PARCIAL E PERMANENTE. DOENÇA ORTOPÉDICA DEGENERATIVA.
REQUISITOS PREENCHIDOS. DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL DA
BENESSE.
- Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
- É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015, podendo considerar todos os elementos de prova constantes dos
autos.
- Não ter condições de trabalhar, improvável a recuperação da capacidade laboral e não ter
condições de se reabilitar em prazo razoável para o exercício de outra atividade que garanta o
sustento - e preenchidos os demais requisitos legais -, cabível a concessão de aposentadoria por
invalidez. Precedentes desta Corte.
- Data de início do benefício de aposentadoria por invalidez fixada no dia seguinte à cessação
indevida do auxílio-doença, na medida em que se trata de continuidade, sob nova espécie, de
uma benesse por incapacidade indevidamente interrompida
- Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
