
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004294-92.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DELIBIO ALVES MARTINS
Advogado do(a) APELADO: MERIDIANE TIBULO WEGNER - MS10627-A
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004294-92.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DELIBIO ALVES MARTINS
Advogado do(a) APELADO: MERIDIANE TIBULO WEGNER - MS10627-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de remessa oficial, havida como submetida, e de apelação em face de sentença proferida nos autos da ação de conhecimento em que se pleiteia a concessão do auxílio doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez.
O MM. Juízo a quo julgou procedente o pedido, condenando o réu a conceder o benefício do auxílio doença a partir da data do requerimento administrativo (06/09/2019) com conversão em aposentadoria por invalidez a partir da data da sentença, pagar as parcelas vencidas com correção monetária e juros de mora, custas processuais, e honorários advocatícios fixados no percentual mínimo sobre valor referente às prestações vincendas até a data da sentença.
Inconformado, apela o réu, arguindo, em preliminar, falta de interesse de agir, pois o autor teve o pedido de auxílio doença implantado, administrativamente, em 13/03/2020. No mérito, pleiteia a reforma da r. sentença. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004294-92.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DELIBIO ALVES MARTINS
Advogado do(a) APELADO: MERIDIANE TIBULO WEGNER - MS10627-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Por primeiro, a sentença que defere ou confirma a antecipação de tutela deve ser recebida apenas no efeito devolutivo.
Quanto à alegada falta de interesse de agir, cabe destacar que a presente ação foi ajuizada em março de 2020 após o indeferimento do pedido administrativo de auxílio doença apresentado em 06/09/2019.
Alega a autarquia-ré, em 03/02/2020, que foi concedido administrativamente o benefício por incapacidade referido, devendo, portanto, ser o processo extinto sem resolução do mérito pela falta de interesse de agir.
Nos termos do extrato de dossiê previdenciário (sistema SAPIENS), juntado com a apelação, o autor teve concedido o benefício do auxílio doença nos períodos de 09/11/2009 a 24/06/2010, 03/02/2011 a 15/05/2011, 22/09/2014 a 16/07/2019 e 03/02/2020 a 05/05/2023 (esse último ainda ativo quando da interposição do recurso).
Conforme se depreende do pedido inicial, o autor requer a concessão do auxílio doença desde o requerimento administrativo indeferido que gerou a controvérsia judicial (06/09/2019) com sua posterior conversão em aposentadoria por invalidez, a partir da prolação da sentença.
Como se vê, há um período em que o autor alega ter ficado sem receber o benefício por incapacidade e, ainda, o pedido de conversão em aposentadoria por invalidez, restando caracterizado o interesse de agir.
Acresça-se que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é pelo interesse de agir em caso análogo:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DE CONCESSÃO EM PERÍODO POSTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E ANTECEDENTE À AÇÃO JUDICIAL. INTERESSE DE AGIR CARACTERIZADO. DESNECESSIDADE DE RENOVAÇÃO DA POSTULAÇÃO ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE REAFIRMAÇÃO DA DER PARA A DATA DE IMPLEMENTO.
TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CITAÇÃO VÁLIDA. PRECEDENTES.
I - O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema n. 350/STF, fixou orientação segundo a qual a concessão de benefícios previdenciários depende de prévio requerimento do interessado na seara administrativa, porquanto para configurar o interesse de agir é preciso estar caracterizada a necessidade da prestação jurisdicional para a satisfação da pretensão do autor.
II - Havendo pedido de reconhecimento de tempo de contribuição, em relação ao qual o INSS se insurgiu, forçoso reconhecer o atendimento ao princípio da necessidade, pois o indeferimento desse pedido dá causa à demanda judicial.
III - A Primeira Seção, no julgamento dos Embargos de Declaração do Tema n. 995/STJ, deliberou pela impossibilidade de reafirmação da DER para a data de implemento dos requisitos de concessão quando o fato superveniente for posterior à propositura da ação.
IV - Não se obstou a viabilidade de reconhecimento do direito à prestação previdenciária nessas hipóteses, apenas rechaçou-se a possibilidade de reafirmação da DER para a data de implemento dos requisitos correspondentes ao benefício, impondo-se a fixação do termo inicial na data da citação válida do INSS.
V - Agravo interno parcialmente provido.
(AgInt no REsp 2018250/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/08/2023, DJe 31/08/2023)."
Passo à análise da matéria de fundo.
O benefício de auxílio doença está previsto no Art. 59, da Lei nº 8.213/91, que dispõe:
"Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos".
Portanto, é benefício devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize temporariamente o exercício de sua profissão.
Por sua vez, a aposentadoria por invalidez expressa no Art. 42, da mesma lei, in verbis:
"A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição".
A qualidade de segurado e a carência restaram demonstradas.
A presente ação foi ajuizada em março de 2020, após a cessação administrativa do benefício de auxílio doença em 19/07/2019 e novo requerimento administrativo, indeferido, realizado em 06/09/2019.
O laudo, referente ao exame realizado em 06/11/2020, atesta ser o autor portador de sequela de fratura em membro inferior e insuficiência venosa, apresentando incapacidade total e permanente omniprofissional, sem possibilidade de reabilitação.
Analisando o conjunto probatório e considerando o parecer do sr. Perito, é de se reconhecer o direito do autor ao auxílio doença e à sua conversão em aposentadoria por invalidez, vez que indiscutível a falta de capacitação e a impossibilidade de reabilitação para a assunção de outras atividades, sendo possível afirmar que se encontra sem condições de reingressar no mercado de trabalho.
Neste sentido já decidiu a Egrégia Corte Superior, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL. DATA DO PRIMEIRO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. O auxílio-doença é um benefício previdenciário de certa duração e renovável a cada oportunidade em que o segurado dele necessite. É um benefício pago em decorrência de incapacidade temporária. Se houver incapacidade total do segurado, poderá ser concedido o benefício aposentadoria por invalidez.
2. O termo inicial do benefício aposentadoria por invalidez, se o segurado estava em gozo de auxílio-doença, é o dia imediato da cessação deste benefício, nos termos do art. 43 da Lei 8.213/1991.
3. ... “omissis”.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1458133/SC, Rel.Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 20/10/2014);
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INEXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA. NECESSIDADE DE REEXAME DO QUADRO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL.
1. Aconcessão de aposentadoria por invalidez depende, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência, dacomprovação de incapacidade definitiva para atividade que garanta a subsistência do segurado. (g.n.)
2. ... "omissis".
3. ... "omissis".
4. Agravo regimental improvido.
(AgRg no REsp 907.833/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6a Turma, j. 20.5.08, DJe 25.8.08)”;
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE SEGUNDA PERÍCIA INDEFERIDO. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO JULGADOR. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OUAUXÍLIO-DOENÇAJULGADO IMPROCEDENTE PELAS INSTÂNCIAS DE ORIGEM POR AUSÊNCIA DEINCAPACIDADE TOTAL PERMANENTEOU TEMPORÁRIA. CIRCUNSTÂNCIA QUE REDUNDARIA NA FORMAÇÃO DE NOVO JUÍZO ACERCA DOS FATOS E PROVAS. AGRAVO DO PARTICULAR A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A impugnação do indeferimento da produção de nova perícia, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC/1973) e não o sistema de tarifação legal de provas. Assim, se o magistrado entendeu não haver necessidade de produção de uma segunda prova pericial para o julgamento da lide, não há que se falar em cerceamento de defesa na impugnação do pedido.
2. Oauxílio-doençaé concedido, nos termos do art. 59 da Lei 8.213/1991, ao segurado, que após cumprida a carência, seja considerado incapaz temporariamente para o trabalho.
3. Da mesma forma, para que seja concedida a aposentadoria por invalidez, necessário que o segurado, após cumprida a carência, seja considerado incapaz para o trabalho e insuscetível dereabilitaçãoem atividade que lhe garanta subsistência, nos termos do art. 42 da Lei 8.214/1991.
4. As instâncias ordinárias, com base no conjunto fático-probatório dos autos, concluíram que não ficou comprovada nos autos aincapacidade total permanenteou temporária do ora recorrente para a concessão da aposentadoria por invalidez ou doauxílio-doença,respectivamente.
5. Entendimento diverso, conforme pretendido, implicaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, circunstância que redundaria na formação de novo juízo acerca dos fatos e provas, e não de valoração dos critérios jurídicos concernentes à utilização da prova e à formação da convicção, o que impede o seguimento do Recurso Especial.
6. Agravo Interno do particular a que se nega provimento.
(AgIntno REsp 854230/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, PRIMEIRA TURMA, j. 20/02/2018, DJe 14/03/2018)”; e
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.INCAPACIDADELABORATIVA NÃO COMPROVADA. SÚMULA 7/STJ.
APLICAÇÃO.
1. Buscou-se, na origem, a concessão de aposentadoria por invalidez ou o restabelecimento de auxílio-doença. A sentença concluiu que o autor se encontra incapacitado temporariamente para o trabalho, concedendo-lhe o auxílio-doença. Tanto a Apelação como o Recurso Adesivo tiveram seus provimentos negados e acrescidos dos consectários legais corrigidos de ofício pela remessa oficial.
2. A parte autora não demonstrouincapacidade totalepermanentepara o trabalho. Não preenchido requisito legal da aposentadoria por invalidez.
3. A aposentadoria por invalidez é concedida, nos termos do art. 42 da Lei 8.213/1991, ao Segurado que seja considerado incapaz ou insusceptível dereabilitaçãopara o exercício de atividade laboral.
É benefício devido ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível dereabilitaçãopara o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
4. É inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial de que ficou condicionada à realização de procedimento cirúrgico para a reversão daincapacidadetemporária ou a recuperação para o trabalho, pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos para afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido de que aincapacidadeétotale temporária. Aplica-se, portanto, o óbice da Súmula 7/STJ.
5. Agravo conhecido para não conhecer do Recurso Especial.
(AREsp 1529706 / SP, Rel.MinistroHERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 19/12/2019).
À míngua de impugnação do autor, o termo inicial do benefício de auxilio doença deve ser mantido tal como fixado pelo douto Juízo sentenciante, ou seja, em 06/09/2019, e a conversão em aposentadoria por invalidez deverá ser feita a partir da data da sentença (24/02/2022), conforme expressamente requerido da inicial.
Destarte, é de se manter a r. sentença quanto à matéria de fundo, devendo o réu conceder o benefício de auxílio doença a partir de 06/09/2019, convertendo-o em aposentadoria por invalidez a partir de 24/02/2022, e pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora.
Convém ressaltar que do montante devido devem ser descontadas as parcelas pagas administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício concedido, na forma do Art. 124, da Lei 8.213/91.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
No que respeita às custas, a autarquia previdenciária não tem isenção no pagamento de custas na justiça estadual. Neste sentido, o entendimento consagrado na Súmula 178 do STJ, a saber:
"O INSS não goza de isenção do pagamento de custas e emolumentos, nas ações acidentárias e de benefícios, propostas na justiça estadual."
Com efeito, a regra geral é excetuada apenas nos Estados-membros onde a lei estadual assim prevê, em razão da supremacia da autonomia legislativa local.
Assim, nas ações em trâmite na Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, como é o caso dos autos, não há, na atualidade, previsão de isenção de custas para o INSS na norma local. Ao revés, atualmente vige a Lei Estadual/MS 3.779, de 11.11.2009, que prevê expressamente o pagamento de custas pelo INSS.
Por fim, quanto ao prequestionamento da matéria para fins recursais, não há afronta a dispositivos legais e constitucionais, porquanto o recurso foi analisado em todos os seus aspectos.
Ante o exposto, afastadas as questões trazidas na abertura do apelo, dou parcial provimento à remessa oficial, havida como submetida, e à apelação para adequar os consectários legais e os honorários advocatícios.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE.
1. O benefício de auxílio doença é devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize temporariamente o exercício de sua profissão. Já a aposentadoria por invalidez exige que o segurado seja considerado incapaz e insusceptível de convalescença para o exercício de ofício que lhe garanta a subsistência.
2. Laudo pericial conclusivo pela existência de incapacidade total e permanente omniprofissional.
3. Preenchidos os requisitos, é de se reconhecer o direito do autor à percepção do benefício de auxílio doença e à sua conversão em aposentadoria por invalidez, pois indiscutível a falta de capacitação e de oportunidades de reabilitação para a assunção de outras atividades, sendo possível afirmar que se encontra sem condições de reingressar no mercado de trabalho.
4. Aplica-se o disposto no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal no que tange aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora.
5. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
6. Nas ações em trâmite na Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, como é o caso dos autos, não há, na atualidade, previsão de isenção de custas para o INSS na norma local.
7.Remessa oficial, havida como submetida, e apelação providas em parte.
