
| D.E. Publicado em 22/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, CONHECER DE PARTE DA APELAÇÃO DO INSS E, NA PARTE CONHECIDA, DAR-LHE PROVIMENTO, cassando a tutela antecipada deferida anteriormente, sem a necessidade de devolução dos valores recebidos, E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE180529616199 |
| Data e Hora: | 09/10/2018 19:31:01 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008464-37.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo procedimento ordinário objetivando a concessão do benefício de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou benefício assistencial.
Laudo social às fls. 67/69.
Laudo médico pericial às fls. 50/63.
O pedido foi julgado procedente, condenando-se o INSS a conceder o benefício assistencial desde a data da realização do laudo, corrigido monetariamente, bem como a arcar com honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da condenação até a data da sentença. Foi concedida a tutela antecipada (fls. 83/86).
Inconformado apela o INSS, às fls. 91/104, alegando que não restaram comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício. Subsidiariamente, requer a isenção de custas judiciais.
Contrarrazões da parte autora às fls. 107/108.
A parte autora interpôs recurso adesivo, às fls. 109/111, postulando a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez desde a data do indeferimento administrativo (04/12/2012).
Com as contrarrazões ao recurso adesivo (fls. 113/115), subiram os autos a esta Corte.
Em parecer, o MPF opinou pelo provimento ao recurso do INSS e pelo desprovimento do recurso adesivo interposto pela parte autora (fls. 121/122).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Inicialmente, não conheço de parte da apelação do INSS, no que tange à isenção em custas processuais, por ausência de interesse recursal, haja vista a inexistência de condenação nesse sentido.
No mais, o benefício da aposentadoria por invalidez está previsto no art. 42 e seguintes da Lei nº 8.213/91, pelo qual:
Por sua vez, o benefício de auxílio-doença consta do art. 59 e seguintes do referido diploma legal, a saber:
Os requisitos do benefício postulado são, portanto, a incapacidade laboral, a qualidade de segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei nº 8.213/91.
No tocante à incapacidade, o sr. perito concluiu que a parte autora encontra-se incapacitada de forma total e permanente desde novembro/2012, eis que portadora de alterações degenerativas de coluna vertebral, em grau leve no segmento cervical e moderado/severo na região lombar baixa. Afirmou também que: "Autor conserva capacidade funcional residual aproveitável em funções remuneradas com menor exigência em coluna vertebral e membros inferiores." (fls. 50/59).
De acordo com os dados constantes do extrato do CNIS de fl. 10, observo que o autor verteu contribuições, na qualidade de facultativo, somente até 30/11/2010, de modo que, na forma do disposto no Art. 15, VI, da Lei 8.213/91, é possível considerar a manutenção da qualidade de segurado apenas até 06/2011.
Dessarte, considerando-se a perda da qualidade de segurado em 06/2011, é forçoso concluir que, quando da fixação da DII pelo laudo pericial, em 11/2012, o autor não preenchia os requisitos necessários à concessão do benefício por incapacidade.
Nesse sentido, confiram-se:
Logo, considerando que a parte autora não comprovou a qualidade de segurada no momento da eclosão da incapacidade para o trabalho, torna-se despicienda a análise dos demais requisitos.
Quanto ao beneficio assistencial este deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições e encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.213/1991.
A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.742/1993:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que originariamente o dispositivo em análise estabelecia a idade mínima de 70 (setenta) anos como requisito para a obtenção do benefício, sendo estabelecida, ao mesmo tempo, regra de transição no art. 38 do mesmo estatuto legal, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos contados 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos em 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-51/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso, mediante a edição da Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, acabou-se por eleger a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário para a percepção do benefício assistencial, nos seguintes termos:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
Consoante perícia médica produzida é possível concluir que o estado clínico da parte-autora não sugere a existência de qualquer impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, não devendo, portanto, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
De fato, consta que o perito concluiu que o autor estava incapacitado de forma total e permanente para o trabalho atual - pedreiro - afirmando que "há limitações para ostoastose e/ou deambulação continuada bem como para atividades que exigem frequentes posturas de agachamentos". Porém, existe capacidade residual para outras atividades como porteiro, vendedor de jornais em bancas, etc. Pela análise dos autos verifica-se que o autor ajuizou a ação com 39 anos, razão pela qual pode ser readaptado a funções que atendam à sua limitação.
Ademais, o requisito da hipossuficiência econômica familiar também merece atenção. No Estudo Social produzido consta que o núcleo familiar era composto pelo autor, sua companheira e dois filhos, menores de idade. A casa na qual residem é própria, porém o autor informou que estavam em débito com o pagamento de IPTU, água e esgoto. A renda obtida era de R$ 700,00, proveniente de trabalhos informais que o autor fazia quando conseguia trabalhar. As despesas básicas mensais eram de R$ 727,00. Consta que a companheira do autor, à época (23.03.2015) contava com 27 anos e teve que parar de trabalhar para se dedicar mais à filha menor, devido a seus problemas de saúde. Depreende-se que a esposa, também de pouca idade, deveria ajudar no sustento do lar e das despesas. Caso haja necessidade de que um dos pais acompanhe a filha, o autor poderá fazê-lo, enquanto não consegue algum trabalho no qual possa readaptar-se.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos os requisitos necessários a justificar a concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Observo que, apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT, entendo que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE 734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de valores recebidos de boa fé, em razão de sua natureza alimentar.
Diante do exposto, CONHEÇO EM PARTE DA APELAÇÃO DO INSS E, NA PARTE CONHECIDA, DOU-LHE PROVIMENTO, cassando a tutela antecipada deferida anteriormente, sem a necessidade de devolução dos valores recebidos, E NEGO PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA.
Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a condição de beneficiário da assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei 13.105/15).
É COMO VOTO.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE180529616199 |
| Data e Hora: | 09/10/2018 19:30:58 |
