Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5319146-19.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
25/05/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE
SEGURADO. AUSÊNCIA DE REGISTRO EM CTPS OU NO CNISINSUFICIENTE PARA
COMPROVAÇÃO DE DESEMPREGO. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE OUTRAS PROVAS.
CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. O E. STJ consolidou entendimento no sentido de que a mera ausência de anotação de contrato
de trabalho em CTPS ou no CNIS não é suficiente para, por si só, comprovar a situação de
desemprego, sendo necessária a presença de outros elementos que corroborem tal condição.
2. Osdocumentos apresentados não são suficientes para se apurar se a parte autoraficou
efetivamente desempregado após o fim do seu último vínculo- condição esta que poderia lhe
assegurar a condição de segurado da Previdência Social à época da eclosão da incapacidade-,
sendo imprescindível, portanto, para o fim em apreço, oportunizar a produção das provas
pertinentes.
3. O impedimento à produção das provas pertinentes, com prévio julgamento da lide por
valorização da documentação acostada aos autos caracterizou, por conseguinte, cerceamento de
defesa, que deve ser reparado.
4. Sentença anulada, de ofício. Prejudicada a análise daapelação.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5319146-19.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS AUGUSTO OTTENGY
Advogado do(a) APELADO: ANNA PAULA FERREIRA DA ROSA - SP311936-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5319146-19.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS AUGUSTO OTTENGY
Advogado do(a) APELADO: ANNA PAULA FERREIRA DA ROSA - SP311936-N
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo procedimento
ordinário objetivando a concessão do benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por
invalidez.
Sentença pela procedência do pedido, condenando o INSS a conceder o benefício de
aposentadoria por invalidez, a partir de 21.10.2014, com parcelas em atraso corrigidas
monetariamente e com a incidência de juros de mora, além de honorários advocatícios
arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação,considerando-se como tal a
soma das prestações vencidas até a prolação, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Inconformada, a autarquiainterpôs recurso de apelação alegando, em síntese, que a parte
autora não faz jus ao benefício em razão da perda da qualidade de segurado e da ausência de
carência (novo ciclo de 06 recolhimentos). Subsidiariamente, requer a alteração do termo inicial
do benefício.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5319146-19.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CARLOS AUGUSTO OTTENGY
Advogado do(a) APELADO: ANNA PAULA FERREIRA DA ROSA - SP311936-N
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):O benefício deaposentadoria por
invalidez está previsto no art. 42 e seguintes da Lei nº 8.213/91, pelo qual:
"[...] A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de
incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o
segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança [...]".
Por sua vez, o benefício de auxílio-doença consta do art. 59 e seguintes do referido diploma
legal, a saber:
"[...] será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência
exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por
mais de 15 (quinze) dias consecutivos [...]".
Os requisitos do benefício postulado são, portanto, a incapacidade laboral, a qualidade de
segurado e a carência, esta fixada em 12 contribuições mensais, nos termos do art. 25 e
seguintes da Lei nº 8.213/91. Deve ser observado ainda, o estabelecido no art. 26, inciso II e
art. 151, da Lei 8.213/1991, quanto aos casos que independem do cumprimento da carência;
bem como o disposto no art. 27-A, da Lei 8.213/1991.
"Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para
que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos
meses de suas competências."
"Art. 27-A. Na hipótese de perda da qualidade de segurado, para fins da concessão dos
benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez, de salário-maternidade e de
auxílio-reclusão, o segurado deverá contar, a partir da data da nova filiação à Previdência
Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25 desta Lei."
Quanto à qualidade de segurado, estabelece o art. 15 da Lei nº 8.213/91, que mantém a
qualidade de segurado, independentemente de contribuições: (...) II - até 12 (doze) meses após
a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada
abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração.
O prazo mencionado será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já
houver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a
perda da qualidade de segurado.
Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só serão
computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à
Previdência Social, com uma parcela do mínimo legal de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido. Inicialmente, esse mínimo
correspondia a 1/3 (um terço) do tempo previsto para a carência originária, conforme constava
do parágrafo único do art. 24 da Lei 8.213/1991, sendo atualmente elevado para metade, na
forma do disposto no art. 27-A da Lei de Benefícios, incluído pela Lei 13.457 de 26.06.2017.
No presente caso, o pedido foi julgado procedente, reconhecendo-se a qualidade de segurado
da parte autora.
Entretanto, considerando que seu último recolhimento deu-se em 31.08.2013 e o início da
incapacidade foi fixado em 21.10.2014, a parte autora já teria perdido a qualidade de segurado
na ocasião.
Diante disso, em sede de contrarrazões, a parte autora afirma que possuía a qualidade de
segurado uma vez que fazia jus à prorrogação do período de graça em razão do desemprego.
Quanto a esta questão, o C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que apesar
de ser dispensável o registro do desemprego perante o Ministério do Trabalho e Previdência
Social para a extensão do período de graça, a mera ausência de anotação de contrato de
trabalho na CTPS não é suficiente para, por si só, comprovar tal situação, admitindo-se,
contudo, a comprovação por outros meios de prova:
"PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI
FEDERAL. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. ART. 15 DA LEI 8.213/91.
CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO. DISPENSA DO REGISTRO PERANTE O MINISTÉRIO DO
TRABALHO E DA PREVIDÊNCIA SOCIAL QUANDO FOR COMPROVADA A SITUAÇÃO DE
DESEMPREGO POR OUTRAS PROVAS CONSTANTES DOS AUTOS. PRINCÍPIO DO LIVRE
CONVENCIMENTO MOTIVADO DO JUIZ. O REGISTRO NA CTPS DA DATA DA SAÍDA DO
REQUERIDO NO EMPREGO E A AUSÊNCIA DE REGISTROS POSTERIORES NÃO SÃO
SUFICIENTES PARA COMPROVAR A CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO. INCIDENTE DE
UNIFORMIZAÇÃO DO INSS PROVIDO.
1. O art. 15 da Lei 8.213/91 elenca as hipóteses em que há a prorrogação da qualidade de
segurado, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
2. No que diz respeito à hipótese sob análise, em que o requerido alega ter deixado de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social, incide a disposição do inciso II e dos
§§ 1o. e 2o. do citado art. 15 de que é mantida a qualidade de segurado nos 12 (doze) meses
após a cessação das contribuições, podendo ser prorrogado por mais 12 (doze) meses se
comprovada a situação por meio de registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da
Previdência Social.
3. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, esse
dispositivo deve ser interpretado de forma a proteger não o registro da situação de desemprego,
mas o segurado desempregado que, por esse motivo, encontra-se impossibilitado de contribuir
para a Previdência Social.
4. Dessa forma, esse registro não deve ser tido como o único meio de prova da condição de
desempregado do segurado, especialmente considerando que, em âmbito judicial, prevalece o
livre convencimento motivado do Juiz e não o sistema de tarifação legal de provas. Assim, o
registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprido quando for
comprovada tal situação por outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal.
5. No presente caso, o Tribunal a quo considerou mantida a condição de segurado do requerido
em face da situação de desemprego apenas com base no registro na CTPS da data de sua
saída no emprego, bem como na ausência de registros posteriores.
6. A ausência de anotação laboral na CTPS do requerido não é suficiente para comprovar a sua
situação de desemprego, já que não afasta a possibilidade do exercício de atividade
remunerada na informalidade.
7. Dessa forma, não tendo o requerido produzido nos autos prova da sua condição de
desempregado, merece reforma o acórdão recorrido que afastou a perda da qualidade de
segurado e julgou procedente o pedido; sem prejuízo, contudo, da promoção de outra ação em
que se enseje a produção de prova adequada.
8. Incidente de Uniformização do INSS provido para fazer prevalecer a orientação ora firmada.
(Pet 7115/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em
10/03/2010, DJe 06/04/2010)
No caso, a única prova trazida pela parte autora foia ausência de registros na Carteira de
Trabalho e no CNIS, não lhe tendo sido oportunizada a comprovação por outros meios de
prova.
O julgamento antecipado da lide somente é cabível nas hipóteses previstas nos incisos do
artigo 355 doCódigo de Processo Civil:
"Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de
mérito, quando:
I - não houver necessidade de produção de outras provas;
II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na
forma do art. 349."
Nesse contexto, verifico que od. Juízo de origem entendeu desnecessária a produção de outras
provas e julgou a lide.
Contudo, os documentos apresentados não são suficientes para se apurar se a parte
autoraficou efetivamente desempregado após o fim do seu último vínculo- condição esta que
poderia lhe assegurar a condição de segurado da Previdência Social à época da eclosão da
incapacidade-, sendo imprescindível, portanto, para o fim em apreço, oportunizar a produção
das provas pertinentes.
A sentença de mérito surpreendeu as partes, que não puderam ver plenamente desenvolvido o
devido processo legal, compreendendo a garantia da ampla defesa. Ao Tribunal, por também
ser destinatário da prova, é permitido o reexame de questões pertinentes à instrução probatória,
não se podendo falar em preclusão. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é neste
sentido:
"PROVA. DISPENSA PELAS PARTES. DILAÇÃO PROBATÓRIA DETERMINADA PELA 2ª
INSTÂNCIA. ADMISSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO.
Em matéria de cunho probatório, não há preclusão para o Juiz. Precedentes do STJ. Recurso
especial não conhecido [...]."(REsp 262.978 MG, Min. Barros Monteiro, DJU, 30.06.2003, p.
251)
"PROCESSO CIVIL. INICIATIVA PROBATÓRIA DO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO POR
PERPLEXIDADE DIANTE DOS FATOS. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DEMANDA.
POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. PEDIDO DE
RECONSIDERAÇÃO QUE NÃO RENOVA PRAZO RECURSAL CONTRA DECISÃO QUE
INDEFERIU PROVA PERICIAL CONTÁBIL. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA.
PROVIMENTO DO RECURSO PARA QUE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA PROSSIGA NO
JULGAMENTO DA APELAÇÃO.
Os juízos de primeiro e segundo graus de jurisdição, sem violação ao princípio da demanda,
podem determinar as provas que lhes aprouverem, a fim de firmar seu juízo de livre convicção
motivado, diante do que expõe o art. 130 do CPC.
A iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização de provas de
ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da
Justiça.
Não é cabível a dilação probatória quando haja outros meios de prova, testemunhal e
documental, suficientes para o julgamento da demanda, devendo a iniciativa do juiz se restringir
a situações de perplexidade diante de provas contraditórias, confusas ou incompletas
[...]."(REsp 345.436 SP, Min. Nancy Andrighi, DJU, 13.05.2002, p. 208)
O impedimento à produção das provas e o prévio julgamento da lide por valorização da
documentação acostada aos autos caracterizou, por conseguinte, cerceamento de defesa,
impondo-se assim a anulação da r. sentença, a fim de restabelecer a ordem processual e
assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos.
Ante o exposto, ANULO, de ofício,a r. sentença e determino o retorno dos autos ao Juízo de
origem para regular processamento do feito, oportunizando-se a produção das provas
pertinentes à comprovação da situação de desemprego da parte autora, com oportuna prolação
de nova decisão de mérito, sem prejuízo da tutela de urgência já deferida.
Prejudicado o exame daapelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE
SEGURADO. AUSÊNCIA DE REGISTRO EM CTPS OU NO CNISINSUFICIENTE PARA
COMPROVAÇÃO DE DESEMPREGO. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE OUTRAS
PROVAS. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. O E. STJ consolidou entendimento no sentido de que a mera ausência de anotação de
contrato de trabalho em CTPS ou no CNIS não é suficiente para, por si só, comprovar a
situação de desemprego, sendo necessária a presença de outros elementos que corroborem tal
condição.
2. Osdocumentos apresentados não são suficientes para se apurar se a parte autoraficou
efetivamente desempregado após o fim do seu último vínculo- condição esta que poderia lhe
assegurar a condição de segurado da Previdência Social à época da eclosão da incapacidade-,
sendo imprescindível, portanto, para o fim em apreço, oportunizar a produção das provas
pertinentes.
3. O impedimento à produção das provas pertinentes, com prévio julgamento da lide por
valorização da documentação acostada aos autos caracterizou, por conseguinte, cerceamento
de defesa, que deve ser reparado.
4. Sentença anulada, de ofício. Prejudicada a análise daapelação. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu anular, de ofício, a r. sentença e julgar prejudicada a apelação, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA