Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5148975-92.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NILSON MARTINS LOPES JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
15/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE
DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS
PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO
CONDICIONADA À RECUPERAÇÃO DO SEGURADO. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE
NOVA PERÍCIA ADMINISTRATIVA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.
- Comprovada a incapacidade total e temporária para as atividades laborativas, bem como
presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a
concessão do benefício de auxílio-doença.
- O termo inicial do benefício é a data do requerimento administrativo (14/10/2019 - Id 178948340
- Pág. 1), nos termos em que pleiteado na petição inicial e de acordo com a jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça.
- O benefício de auxílio-doença somente poderá ser cessado no momento em que for constatada
a recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia administrativa
posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar a reavaliação
médica periódica.
- Acessação do pagamento do benefício de auxílio-doença está vinculada à realização de perícia
administrativa comprovando o total restabelecimento da capacidade da parte autora para o
exercício de atividade laborativa que lhe garanta a subsistência.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, com as alterações
promovidas pela Resolução nº 658/2020 - CJF, de 10 de agosto de 2020.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015 e da Súmula 111 do STJ.
- Não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência
judiciária gratuita.
- Apelação da parte autora provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5148975-92.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - JUIZ CONVOCADO NILSON LOPES
APELANTE: MARIA CELIA PIRES
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO PETEAN - SP361367-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5148975-92.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - JUIZ FEDERAL CONVOCADO NILSON LOPES
APELANTE: MARIA CELIA PIRES
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO PETEAN - SP361367-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
OSenhorJuiz Federal Convocado NILSON LOPES(Relator): Proposta ação de conhecimento de
natureza previdenciária, objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez, sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao
pagamento de custas, despesas processuais, bem como honorários advocatícios fixados em
10% sobre o valor da causa, observando-se o disposto no art. 98, § 3º, do CPC.
A parte autora interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença, para julgar
procedente o pedido, uma vez que preenchidos os requisitos legais para concessão dos
benefícios pleiteados.
Sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5148975-92.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - JUIZ FEDERAL CONVOCADO NILSON LOPES
APELANTE: MARIA CELIA PIRES
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO PETEAN - SP361367-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
OSenhorJuiz Federal Convocado NILSON LOPES(Relator): Recebo o recurso de apelação, nos
termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil, haja vista que tempestivo.
Os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-doença, de acordo com os artigos 59 e
62 da Lei n.º 8.213/91 são os que se seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade temporária para o exercício das atividades
profissionais habituais, bem como incapacidade que, embora permanente, não seja total, isto é,
haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento e 4) não
serem a doença ou a lesão existentes antes da filiação à Previdência Social, salvo se a
incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas.
No caso dos autos, a qualidade de segurada da parte autora e a carência mínima de 12 (doze)
contribuições mensais, prevista no inciso I do artigo 25 da Lei 8.213/91, restaram comprovadas,
uma vez que em consulta ao CNIS, constam recolhimentos como contribuinte facultativo nos
seguintes períodos: 01/09/2010 a 31/01/2011; 01/04/2013 a 30/09/2013; 01/08/2014 a
31/10/2015; 01/11/2015 a 31/10/2016; 01/03/2018 a 30/09/2018; 01/11/2018 a 30/09/2019 e
01/04/2020 a 30/04/2020. Ressalte-se que não houve perda da qualidade de segurada, uma
vez que a ação foi ajuizada em 12/12/2019 e a data de início da incapacidade, apesar de haver
sido fixada pelo perito na data da perícia (16/12/2020), na verdade retroage a setembro de
2016, conforme atestado médico Id 178948337 - Pág. 5, ocasião em que a demandante detinha
a qualidade de segurada.
Por outro lado, para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica
produzida. Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência
foi atestada pelo laudo pericial (Id 178948362). Segundo referido laudo, a autora encontra-se
total e temporariamente incapacitada para as atividades laborativas, não havendo que falar, por
ocasião da perícia, em possibilidade de reabilitação.
Assim, preenchidos os requisitos legais, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença à
parte autora, nos termos da r. sentença.
O termo inicial do benefício é a data do requerimento administrativo (14/10/2019 - Id 178948340
- Pág. 1), nos termos em que pleiteado na petição inicial e de acordo com a jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça, conforme revela a ementa deste julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL .
O termo inicial do benefício de aposentadoria por invalidez, havendo negativa do pedido
formulado pelo segurado na via administrativa, recai sobre a data desse requerimento. Recurso
desprovido." (REsp nº 200100218237, Relator Ministro Felix Fischer. DJ 28/05/2001, p. 208).
Nos termos dos artigos 101 da Lei 8.213/1991 e 71 da Lei 8.212/91, o benefício de auxílio-
doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia previdenciária não está impedida de
reavaliar em exame médico as condições laborais do segurado.
Por outro lado, no tocante à fixação de prazo para o cancelamento do pagamento do benefício,
em que pesem as recentes alterações legislativas no art. 60, §§ 8º e 9º, da Lei nº 8.213/91,
incluídas pela Lei nº 13.457, de 2017, que possibilitam ao Poder Judiciário, sempre que
possível, estabelecer o limite temporal para o gozo do benefício de auxílio-doença, entendo que
somente poderá ser cessado o pagamento do benefício no momento em que for constatada a
recuperação da capacidade laborativa do segurado, sendo imprescindível para tanto, a
realização de nova perícia administrativa posteriormente à decisão judicial.
Portanto, o INSS tem prerrogativa legal de notificar a parte autora para realizar a reavaliação
médica periódica, mas não ao cancelamento automático do benefício.
Outrossim, entendo que a alteração inserida pela Lei nº 13.457/17, conflita com o disposto no
artigo 62 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelas Leis nºs. 13.457/17 e 13.846/19, que
dispõe:
"Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua
atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício
de outra atividade.
§ 1º. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado seja
considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou,
quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez."
O dispositivo legal supramencionado determina que o benefício somente poderá ser cessado no
momento em que for constatada a recuperação da capacidade laborativa do segurado, o que
somente pode ocorrer com a realização de nova perícia que constate a recuperação da
capacidade laborativa do segurado.
Com relação à matéria ora debatida, é firme a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça,
no sentido de que não é possível o cancelamento automático do pagamento do benefício de
auxílio-doença por meio da alta programada, sem que haja o prévio e devido procedimento
administrativo perante o INSS, in verbis:
"AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1790395 - RS (2020/0303580-4)
DECISÃO
Trata-se de agravo manejado pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS,
contra decisão que não admitiu recurso especial, este interposto com fundamento no art. 105,
III, a, da CF, desafiando acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim
ementado (fl. 115):
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. SEGURADO FACULTATIVO DE
BAIXA RENDA. MARCO INICIAL. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Comprovado pelo conjunto probatório que a parte autora é portadora de enfermidade(s) que
a incapacita(m) temporariamente para o trabalho desde quando tinha qualidade de segurada
(de baixa renda) e cumprido a carência, é de ser reformada a sentença para conceder o auxílio-
doença desde a data do laudo judicial.
2. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de
implementar o benefício de auxílio-doença, por se tratar de decisão de eficácia mandamental
que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu
previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine
intervallo).
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 153/157).
Nas razões do apelo especial, aponta o recorrente, violação do art. 60, §§ 8º e 9º, da Lei
8.213/91, sustentando a legalidade da cessação automática do benefício de auxílio-doença no
prazo de 120 dias após sua concessão, na hipótese de ausência de outra data para duração do
benefício e de pedido de prorrogação.
Afirma que "... uma vez proferida decisão judicial – provisória ou definitiva –sem a fixação do
prazo estimado de recuperação que permita a definição da DCB(§8º), vale a regra de direito
material que estabelece a duração inicial de 120 dias para o auxílio-doença, com possibilidade
de o segurado requerer a prorrogação do benefício (§9º)." (fl. 184).
Sem contrarrazões.
É O RELATÓRIO. SEGUE A FUNDAMENTAÇÃO.
A irresignação não comporta acolhida.
Isto porque, quanto à questão de fundo, esta Corte possui firme entendimento de que o
procedimento denominado "alta programada", em que a autarquia previdenciária, ao conceder
benefício de auxílio-doença, desde logo e independentemente de nova perícia, fixa prazo para o
retorno do segurado à atividade laborativa, não encontra respaldo na legislação federal.
Isso porque o art. 62 da Lei n. 8.213/91 determina que o benefício seja mantido até que o
segurado seja considerado reabilitado para o exercício de atividade laboral. Confiram-se os
termos do mencionado dispositivo legal, in verbis:
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade
habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra
atividade. (Redação dada pela Lei nº 13.457, de 2017)
Parágrafo único. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o
segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a
subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez.(Incluído
pela Lei nº 13.457, de 2017)
A cessação de benefício previdenciário por incapacidade pressupõe prévia avaliação médica,
sendo imprescindível, no caso concreto, que o INSS realize nova perícia, em ordem que o
segurado retorne às atividades habituais apenas quando efetivamente constatada a restauração
de sua capacidade laborativa.
A propósito, a Primeira Turma deste Tribunal, ao julgar o REsp 1.599.554/BA, DJe de
13/11/2017, Rel. Min. Sérgio Kukina, enfrentou a questão e confirmou o entendimento acima
exposto, consoante se vê da seguinte ementa:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTA PROGRAMADA. CANCELAMENTO
AUTOMÁTICO DO BENEFÍCIO À MÍNGUA DE NOVA PERÍCIA MÉDICA.
IMPOSSIBILIDADE.
1. O procedimento conhecido por "alta programada", em que a autarquia previdenciária, ao
conceder benefício de auxílio-doença, fixa previamente o prazo para o retorno do segurado à
atividade laborativa, à míngua de nova perícia, não encontra respaldo na legislação federal.
2. Em atenção ao art. 62 da Lei n. 8.213/91, faz-se imprescindível que, no caso concreto, o
INSS promova nova perícia médica, em ordem a que o segurado retorne às atividades habituais
apenas quando efetivamente constatada a restauração de sua capacidade laborativa.
3. No que regulamentou a "alta programada", o art. 78 do Decreto 3.048/99, à época dos fatos
(ano de 2006), desbordou da diretriz traçada no art. 62 da Lei n. 8.213/91.
4. Recurso especial do INSS improvido.
No mesmo sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RACIONALIDADE DE
TRATAMENTO MÉDICO. RECURSO ESPECIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. FIXAÇÃO PRÉVIA DE
TERMO FINAL PARA CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. ALTA MÉDICA PROGRAMADA
ANTERIOR A MP 736/2016. INCOMPATIBILIDADE COM A LEI 8.213/91, ART. 62. A
SUSPENSÃO DO BENEFÍCIO DEVE SER PRECEDIDA DE PERÍCIA MÉDICA.
PARECER MINISTERIAL PELO DESPROVIMENTO DO FEITO. AGRAVO INTERNO A QUE
SE NEGA PROVIMENTO.
1. O art. 62 da Lei 8.213/91 é taxativo em afirmar que o benefício de auxílio-doença só cessará
quando o Segurado seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe
garanta a subsistência, pelo que não se há de presumir esse estado de higidez e, menos ainda,
que ele possa se instalar por simples determinação ou deliberação do Esculápio.
2. Não há que se falar, portanto, em fixação de termo final para a cessação do pagamento do
benefício previdenciário de auxílio-doença através de uma perícia prévia inicial, que ganharia
um caráter de prova insofismável, atribuindo à perícia características típicas do positivismo
filosófico (exatidão, certeza, generalidade e previsibilidade), insusceptível de erro ou
inadequação à verdade.
3. Mostra-se inadmissível a prevalência da celeridade e da redução de gastos públicos em
detrimento da Justiça e dos direitos fundamentais do Trabalhador, na condução das demandas
previdenciárias em que se busca um benefício por incapacidade.
4. Logo, não há que se falar em alta presumida para a cessação do pagamento do benefício
previdenciário de auxílio-doença, uma vez que a perícia médica é condição indispensável à
cessação do benefício, nos termos do art. 62 da Lei 8.213/91, pois somente ela poderá atestar
se o Segurado possui condição de retornar às suas atividades ou não; além dessa previsão
legal, há, ainda, a lógica linear comum e o bom sendo que orientam a realidade das relações da
vida humana e social.
5. Registre-se que a edição da MP 736/2016, que acrescentou os §§ 8º. e 9º. ao art. 60 da Lei
8.213/91, consignando que sempre que possível o ato de concessão do auxílio-doença deverá
fixar o prazo estimado da duração do benefício, sob pena de cessação automática em 120 dias,
salvo requerimento de prorrogação formulado pelo Segurado, não modifica o entendimento aqui
fixado e sim reforça a tese aqui apresentada de que tal conduta carecia de previsão legal.
6. As questões previdenciárias regem-se pelo princípio tempus regit actum, razão pela qual as
alterações legislativas, especialmente aquelas restritivas de direitos, só serão aplicadas aos
benefícios concedidos após a sua publicação, o que não é a hipótese dos autos.
7. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.
(AgInt no REsp 1.601.741/MT, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 10/10/2017, DJe 26/10/2017) PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA.
CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO POR ALTA PROGRAMADA. IMPOSSIBILIDADE.
1. O Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que não é possível o cancelamento
automático do benefício previdenciário através do mecanismo da alta programada, sem que
haja o prévio procedimento administrativo, ainda que diante da desídia do segurado em
proceder à nova perícia perante o INSS.
2. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp nº 1.546.769/MT, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, DJe de 03/10/2017)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA.
AUXÍLIO-DOENÇA. ALTA PROGRAMADA. OFENSA AO ART. 62 DA LEI 8.213/1991.
NECESSIDADE DE PERÍCIA. SUSPENSÃO DO EXPEDIENTE FORENSE.
COMPROVAÇÃO. DOCUMENTO IDÔNEO. INTEMPESTIVIDADE AFASTADA. OFENSA AO
ART. 535 DO CPC/1973 NÃO DEMONSTRADA. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO.
SÚMULA 284/STF.
1. Trata-se na origem de Mandado de Segurança contra ato do Chefe de Agência do INSS que
cessou o benefício de auxílio-doença do ora recorrido com base no sistema de alta
programada.
2. O Agravo em Recurso Especial interposto pelo INSS não foi conhecido ante a sua
intempestividade.
3. O Superior Tribunal de Justiça passou a admitir a comprovação posterior da tempestividade
do Recurso Especial, em virtude de feriado local ou de suspensão de expediente forense no
Tribunal de origem, quando da interposição do Agravo Interno (AgRg no AREsp 137.141/SE,
Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Corte Especial, DJe 15/10/2012).
4. Não se conhece de Recurso Especial em relação à ofensa ao art. 535 do CPC/1973 quando
a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado.
Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF.
5. O sistema de alta programada estabelecido pelo INSS apresenta como justificativa principal a
desburocratização do procedimento de concessão de benefícios por incapacidade. Todavia,
não é possível que um sistema previdenciário, cujo pressuposto é a proteção social, se
abstenha de acompanhar a recuperação da capacidade laborativa dos segurados incapazes,
atribuindo-lhes o ônus de um auto exame clínico, a pretexto da diminuição das filas de
atendimento na autarquia.
6. Cabe ao INSS proporcionar um acompanhamento do segurado incapaz até a sua total
capacidade, reabilitação profissional, auxílio-acidente ou aposentadoria por invalidez, não
podendo a autarquia focar apenas no aspecto da contraprestação pecuniária.
7. Na forma do art. 62 da Lei 8.213/1991, "o segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível
de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação
profissional para o exercício de outra atividade", e "não cessará o benefício até que seja dado
como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência ou,
quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez". Transferir essa avaliação
ao próprio segurado fere gravemente o princípio da dignidade da pessoa humana.
8. Além disso, a jurisprudência que vem se firmando no âmbito do STJ é no sentido de que não
se pode proceder ao cancelamento automático do benefício previdenciário, ainda que diante de
desídia do segurado em proceder à nova perícia perante o INSS, sem que haja prévio
procedimento administrativo, sob pena de ofensa aos princípios da ampla defesa e do
contraditório.
9. Agravo Interno parcialmente conhecido para afastar intempestividade e, no mérito, não
provido.
(AgInt no AREsp 1.049.440/MT, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA,
julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017) Em suma, no que regulamentou a alta programada, o
art. 78 do Decreto 3.048/99, à época dos fatos , desbordou da diretriz traçada no art. 62 da Lei
n. 8.213/91.
ANTE O EXPOSTO, nego provimento ao agravo em recurso especial."
(AREsp 1790395, Relator Ministro SÉRGIO KUKINA, j. 18/03/2021, Dje 22/03/2021);
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. FIXAÇÃO DE
DATA DE CESSAÇÃO. CRIAÇÃO DA DENOMINADA "ALTA PROGRAMADA". ILEGALIDADE.
JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
1. Cinge-se a controvérsia a determinar se é possível fixar termo final do pagamento do
benefício de auxílio-doença, sem que a Autarquia realize nova perícia médica antes do
cancelamento do benefício a fim de verificar o restabelecimento do segurado.
2. O acórdão recorrido está no mesmo sentido da compreensão do STJ de que não é possível o
cancelamento automático do benefício auxílio-doença por intermédio do mecanismo da alta
programada, sem que haja prévio e devido procedimento administrativo perante o INSS. Nesse
sentido: REsp 1.597.725/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 1º/7/2019;
AgInt no AREsp 968.191/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe
20/10/2017; AgInt no REsp 1.601.741/MT, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira
Turma, DJe 26/10/2017.
3. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Especial."
(AREsp 1734777/SC, Relator Ministro Herman Benjamin, j. 01/12/2020, DJe 18/12/2020)
(grifamos);
Dessa forma, diante do quadro clínico apresentado pela parte autora e da jurisprudência
consolidada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, a cessação do pagamento do benefício
de auxílio-doença está vinculada à realização de perícia administrativa comprovando o total
restabelecimento da capacidade da parte autora para o exercício de atividade laborativa que lhe
garanta a subsistência.
Além do mais, conforme estabelecido no próprio laudo médico pericial, trata-se dedoença de
caráter degenerativo, a qual, por sua própria definição, compromete as funções vitais do
indivíduo, estabelecendo-seem caráter irreversívele crescente.
Não se trata, portanto de lesão ou doença decorrente de um evento certo e identificado, que
permite recuperação breve e passível de previsão, pois, conforme mencionado acima, trata-se
de doença incapacitante de caráter irreversível, de tal maneira que, somente mediante nova
avaliação médica no âmbito administrativo é que se torna possível aferir algum tipo de
recuperação que permita o retorno às atividades profissionais e habituais, não se aplicando em
tais situações a denominada alta programada.
Por fim, no que se refere à manutenção da qualidade de segurada da recorrente, a qual foi tida
como perdida na decisão de primeira instância,sob o fundamento de que, constatado pela
perícia médica que a doença já acometiaa autora da ação desde o ano de 2008, porém a
incapacidade somente poderia ser atestadadesde a data da perícia, realizada em dezembro de
2020, também se faz necessária uma pequena correção.
Conforme se verifica da inicial, o pedido administrativo foi apresentado em 14 de outubro de
2019 (NB nº 629.933.939-3), vindo a ser indeferido no dia 16 daquele mesmo mês e ano, tendo,
então, a autora proposto a presente ação menos de dois meses após aquele indeferimento,
sendo distribuída em 12 de dezembro de 2019.
A perícia médica, porém, veio a ser realizada somente em 16 de dezembro de 2020, ou seja,
um ano e quatro dias após a distribuição da ação e um ano e dois meses depois do
requerimento administrativo.
Diante de tal demora na realização do exame médico pericial, impor à autora a
responsabilidade pela perda de sua qualidade de segurada, assim considerada na data do
referido exame, quando, na época do requerimento administrativo e distribuição da ação
encontrava-se presente, significa atribuir a ela uma responsabilidade que não lhe cabe, pois
agiu tempestivamente postulando seu direito.
Não se pode deixar de considerar, ainda, a norma contida no inciso III do artigo 72 do Decreto
nº 3.048/99, segundo o qual, o auxílio-doença será devidoa contar da data de entrada do
requerimento, quando requerido após o trigésimo dia do afastamento da atividade, para todos
os segurados.
Portanto, independentemente da afirmação do Senhor Perito de que a incapacidade somente
pode ser considerada na data da realização do exame, necessário se faz considerar, tanto pela
data de início da doença, quando pela natureza da enfermidade, que tal incapacidade já
acometia a autora na época do requerimento administrativo, quando mantinha a qualidade de
segurada.
A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, com as alterações
promovidas pela Resolução nº 658/2020 - CJF, de 10 de agosto de 2020.
Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015 e da Súmula 111 do STJ.
Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos
termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo
acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o
que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta
a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na
lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a
autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para, reformando
a sentença, condenar o INSS a conceder o benefício de auxílio-doença, com termo inicial,
correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, na forma da fundamentação,
devendo o benefício ser mantido até que nova perícia seja realizada no âmbito administrativo, a
fim de que se verifique a manutenção ou não da incapacidade.
Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS, a fim de que se adotem as
providências cabíveis à imediata implantação do benefício de AUXÍLIO-DOENÇA, em nome de
MARIA CÉLIA PIRES, com data de início - DIB em 14/10/2019 e renda mensal inicial - RMI a
ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do CPC.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE
DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS
PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO
CONDICIONADA À RECUPERAÇÃO DO SEGURADO. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE
NOVA PERÍCIA ADMINISTRATIVA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.
- Comprovada a incapacidade total e temporária para as atividades laborativas, bem como
presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a
concessão do benefício de auxílio-doença.
- O termo inicial do benefício é a data do requerimento administrativo (14/10/2019 - Id
178948340 - Pág. 1), nos termos em que pleiteado na petição inicial e de acordo com a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
- O benefício de auxílio-doença somente poderá ser cessado no momento em que for
constatada a recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia
administrativa posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar
a reavaliação médica periódica.
- Acessação do pagamento do benefício de auxílio-doença está vinculada à realização de
perícia administrativa comprovando o total restabelecimento da capacidade da parte autora
para o exercício de atividade laborativa que lhe garanta a subsistência.
- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de
Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, com as alterações
promovidas pela Resolução nº 658/2020 - CJF, de 10 de agosto de 2020.
- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do
Novo Código de Processo Civil/2015 e da Súmula 111 do STJ.
- Não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência
judiciária gratuita.
- Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para,
reformando a sentença, condenar o INSS a conceder o benefício de auxílio-doença, com termo
inicial, correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, na forma da
fundamentação., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
