Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5289692-91.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
10/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. DATA DE INÍCIO DO
BENEFÍCIO. DATA DE CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. DESCONTO DOS PERÍODOS
LABORADOS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA.
1. Comprovada a incapacidade para as atividades laborais, a condição de segurado e
cumprimento da carência é devido o benefício de auxílio-doença.
2. Conforme jurisprudência consolidada, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do
seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação (Súmula nº 576 do Superior
Tribunal de Justiça). Na hipótese de benefício cessado indevidamente, o termo inicial deve ser no
dia seguinte ao da cessação indevida. É possível a ressalva quando fixada a incapacidade em
momento posterior ao requerimento ou à cessação administrativa.
3. Quanto ao prazo de duração, nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei n.
8.212/91, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia
previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do
segurado.
4. A lei determina que o magistrado fixe data para a alta programada "sempre que possível". A
alta programada ora instituída por lei não impede a realização de perícia para se aferir a
necessidade ou não de manutenção do auxílio-doença.
5. Sendo possível a fixação de data para a alta programada, esta deve ser adotada como data de
cessação do benefício (DCB).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
6. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
7. Correção, de ofício, dos critérios de correção monetária e juros de mora.
8. Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5289692-91.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO JOSE VITORINO
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5289692-91.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO JOSE VITORINO
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Trata-se de ação previdenciária objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou
auxílio-doença.
A r. sentença (ID 137607075) julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a conceder a
parte autora o benefício de auxílio-doença, a partir do dia seguinte ao da cessação indevida do
benefício, até sua reabilitação profissional, com o pagamento das parcelas vencidas acrescidas
de correção monetária e juros de mora. Condenou, ainda, a autarquia ao pagamento dos
honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas
até a data da sentença. Por fim, concedeu a tutela antecipada.
Apelação do INSS (ID 137607079), requerendo a improcedência do pedido. Subsidiariamente,
pleiteia a fixação da data de início do benefício (DIB) na data da juntada do laudo e a fixação da
data de cessação do benefício (DCB) na data estabelecida pela perícia judicial. Por fim, requer
seja descontado o período laborado pela parte autora.
Contrarrazões (ID 137607087).
Sentença não submetida ao reexame necessário.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5289692-91.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FRANCISCO JOSE VITORINO
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente
regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de
adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse
recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do
artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
A Constituição Federal de 1988, a teor do preceituado no artigo 201, inciso I, garante cobertura
à incapacidade laboral.
Em regulamentação, a Lei Federal nº 8.213/91, nos artigos 42 a 47, estabelece que o benefício
previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em
regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais,
estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de
reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência
exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for
considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de
incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o
segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
Por sua vez, o auxílio-doença, nos termos dos artigos 59 a 63 da Lei Federal nº 8.213, é direito
do filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for
considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15
(quinze) dias consecutivos, in verbis:
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso,
o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
§1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando
a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.”
A implantação de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez exige carência de 12 (doze)
contribuições mensais nos termos dos artigos 25, inciso I, da Lei Federal nº 8.213/91.
No entanto, não se exige carência “nos casos de segurado que, após filiar-se ao RGPS, for
acometido de alguma das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos
Ministérios da Saúde e da Previdência Social, atualizada a cada 3 (três) anos, de acordo com
os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência ou outro fator que lhe confira
especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado”, conforme artigo 26, inciso
II, da Lei Federal nº 8.213/91.
Também independe de carência, para a concessão dos referidos benefícios, nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao RGPS, for acometido por uma das moléstias elencadas
taxativamente no art. 151 da Lei Federal nº 8.213/91.
É oportuno observar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
RGPS não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
A lei determina que para o implemento dos benefícios tela, é de rigor a existência do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as respectivas contribuições, àquele que
conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a
doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se
encontra, nos termos do art. 15 da Lei Federal nº 8.213, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
(...)
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º. O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já
tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a
perda da qualidade de segurado.
§ 2º. Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do
Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º. Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º. A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado
no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Observa-se, desse modo, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro)
meses o lapso da graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e
vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
O §2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido
de mais 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Na hipótese de perda de qualidade de segurado, é viável a implantação do benefício mediante
prova do cumprimento de metade da carência, conforme artigo 27-A, da Lei Federal nº
8.213/91.
No que tange às provas produzidas, é certo que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, na
medida em que, a teor do art. 479 do CPC: “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o
disposto noart. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar
de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”.
Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria
técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate depende da existência de
elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do
experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos
unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial,
circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a
ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Há precedentes do STJ nesse
diapasão (STJ, 4ª Turma, REsp nº 200802113000, Rel. Min. LUIÍS FELIPE SALOMÃO, DJe:
26/03/2013; 1ª Turma, AGA 200901317319, DJe: 12/11/2010, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES
LIMA).
No caso concreto, a qualidade de segurado e o cumprimento da carência não foram
impugnados.
Quanto à incapacidade, o perito judicial esclareceu os fatos (ID 137607056, grifei):
“a) Queixa que o(a) periciado(a) apresenta no ato da perícia.
R: Limitação MSD somado a quadro álgico.
b) Doença, lesão ou deficiência diagnosticada por ocasião da perícia (com CID).
R: A pericia não fez diagnostico constam nos autos: M75.1 - síndrome do manguito rotador;
m77.9 - entesopatia Não especificada; laudos conclusos com tendinopatia do Subescapular,
alterações degenerativas do lábio Glenoidal.
(...)
f) Doença/moléstia ou lesão torna o(a) periciado(a) incapacitado(a) para o exercício do último
trabalho ou atividade habitual? Justifique a resposta, descrevendo os elementos nos quais se
baseou a conclusão.
R: Sim, limitação em ombro direito somada a quadro álgico durante teste físicos.
g) Sendo positiva a resposta ao quesito anterior, a incapacidade do(a) periciado(a) é de
natureza permanente ou temporária? Parcial ou total?
R: Mediante avaliação temporária, total.
h) Data provável do início da(s) doença/lesão/moléstias(s) que acomete(m) o(a) periciado(a).
R: Relata inicio março 2019.
i) Data provável de início da incapacidade identificada. Justifique.
R: Mediante avaliação, documento nos autos Atestado medico especialista ortopedista HE
29/julho/2019.
(...)
p) É possível estimar qual o tempo e o eventual tratamento necessários para que o(a)
periciado(a) se recupere e tenha condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade
habitual (data de cessação da incapacidade)?
R: Sugiro 120 dias.
(...)
Primavera, 07 de Dezembro de 2019”
Embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, nos termos dos
artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de
prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
Assim sendo, é devido o benefício de auxílio-doença, nos termos do artigo 59, da Lei Federal
nº. 8.213/91.
Conforme jurisprudência consolidada, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do
seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação (Súmula nº 576 do Superior
Tribunal de Justiça).
Na hipótese de benefício cessado indevidamente, o termo inicial deve ser no dia seguinte ao da
cessação indevida.
É possível a ressalva quando fixada a incapacidade em momento posterior ao requerimento ou
à cessação administrativa.
A data de início da incapacidade (DII) foi fixada pelo perito judicial em 29/07/2019.
O benefício previdenciário foi cessado indevidamente em 10/11/2019 (ID 137607064).
Dessa forma, deve ser fixada a data de início do benefício (DIB) em 11/11/2019, no dia seguinte
ao da cessação indevida.
Incabível a reforma da sentença nesse ponto.
Quanto ao prazo de duração, nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei n.
8.212/91, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia
previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do
segurado.
A Lei Federal n.º 8.213/91:
Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do
afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da
incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. (Redação dada pela Lei n. 9.876, de
26.11.99)
(...).
§ 8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou
administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício. (Incluído pela Lei n.
13.457, de 2017).
§ 9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8º deste artigo, o benefício cessará após
o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-
doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do
regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei. (Incluído pela Lei n. 13.457, de 2017)
§ 10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá
ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua
concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei. (Incluído pela Lei n.
13.457, de 2017)
§ 11. O segurado que não concordar com o resultado da avaliação da qual dispõe o § 10 deste
artigo poderá apresentar, no prazo máximo de trinta dias, recurso da decisão da administração
perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária,
será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso
daquele que indeferiu o benefício. (Incluído pela Lei n. 13.457, de 2017).
A lei determina que o magistrado fixe data para a alta programada "sempre que possível".
A alta programada ora instituída por lei não impede a realização de perícia para se aferir a
necessidade ou não de manutenção do auxílio-doença.
O perito judicial estimou o prazo de duração da incapacidade em 120 (cento e vinte) dias, a
contar da perícia realizada em 07/12/2019, findando-se em 07/04/2020.
Sendo possível a fixação de data para a alta programada, esta deve ser adotada como data de
cessação do benefício (DCB).
Cabível a reforma da sentença nesse ponto.
No que tange à obrigatoriedade ou não de devolução de eventuais valores recebidos a título de
tutela antecipada pela parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução após a revisão
do entendimento firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal
de Justiça.
A questão da exclusão dos períodos de trabalho registrado foi objeto de análisepeloSuperior
Tribunal de Justiça em regime de repetitividade, nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ARTS.
1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. TEMA REPETITIVO 1.013/STJ. BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA. DEMORA NA
IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE REMUNERADA PELO
SEGURADO. NECESSIDADE DE SUBSISTÊNCIA DO SEGURADO. FUNÇÃO SUBSTITUTIVA
DA RENDA NÃO CONSUBSTANCIADA. POSSIBILIDADE DE RECEBIMENTO CONJUNTO
DA RENDA DO TRABALHO E DAS PARCELAS RETROATIVAS DO BENEFÍCIO ATÉ A
EFETIVA IMPLANTAÇÃO. TESE REPETITIVA FIXADA. IDENTIFICAÇÃO E DELIMITAÇÃO DA
CONTROVÉRSIA
1. O tema repetitivo ora controvertido consiste em definir a "possibilidade de recebimento de
benefício, por incapacidade, do Regime Geral de Previdência Social, de caráter substitutivo da
renda (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), concedido judicialmente em período de
abrangência concomitante àquele em que o segurado estava trabalhando e aguardava o
deferimento do benefício”.
2. Os fatos constatados no presente Recurso Especial consistem cronologicamente em: a) o
segurado teve indeferido benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez) na via administrativa; b) para prover seu sustento, trabalhou após o indeferimentoe
entrou com ação judicial para a concessão de benefício por incapacidade; c) a ação foi julgada
procedente para conceder o benefício desde o requerimento administrativo, o que acabou por
abranger o período de tempo em que o segurado trabalhou; e d) o debate, travado ainda na
fase ordinária, consiste no entendimento do INSS de que o benefício por incapacidade
concedido judicialmente não pode ser pago no período em que o segurado estava trabalhando,
ante seu caráter substitutivo da renda e à luz dosarts. 42, 46 e 59 da Lei 8.213/1991.
3. A presente controvérsia e, consequentemente, a tese repetitiva que for fixada não abrangem
as seguintes hipóteses:
3.1. O segurado está recebendo regularmente benefício por incapacidade e passa a exercer
atividade remunerada incompatível com sua incapacidade, em que não há o caráter da
necessidade de sobrevivência como elemento que justifique a cumulação, e a função
substitutiva da renda do segurado é implementada de forma eficaz. Outro aspecto que pode ser
analisado sob perspectiva diferente é o relativo à boa-fé do segurado. Há jurisprudência das
duas Turmas da Primeira Seção que analisa essa hipótese, tendo prevalecido a compreensão
de que há incompatibilidade no recebimento conjunto das verbas. A
exemplo:AgIntnoREsp1.597.369/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira
Turma,DJe13.4.2018;REsp1.454.163/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda
Turma,DJe18.12.2015; eREsp1.554.318/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma,DJe2.9.2016.
3.2. O INSS alega o fato impeditivo do direito (o exercício de trabalho pelo segurado) somente
na fase de cumprimento da sentença, pois há elementos de natureza processual prejudiciais à
presente tese a serem considerados, notadamente a aplicabilidade da tese repetitiva fixada
noREsp1.253.513/AL (Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção,DJede 20.8.2012).
RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA
4. Alguns benefícios previdenciários possuem a função substitutiva da renda auferida pelo
segurado em decorrência do seu trabalho, como mencionado nosarts. 2º, VI, e 33 da Lei
8.213/1991. Em algumas hipóteses, asubstitutividadeé abrandada, como no caso de ser
possível a volta ao trabalho após a aposentadoria por tempo de contribuição (art. 18, § 2º, da
Lei 8.213/1991). Em outras, asubstitutividaderesulta na incompatibilidade entre as duas
situações (benefício e atividade remunerada), como ocorre com os benefícios auxílio-doença
por incapacidade e aposentadoria por invalidez.
5. Desses casos de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, é pressuposto que a
incapacidade total para o trabalho seja temporária ou definitiva, respectivamente.
6. Como consequência, o Regime Geral de Previdência Social arca com os citados benefícios
por incapacidade para consubstanciar a função substitutiva da renda, de forma que o segurado
que não pode trabalhar proveja seu sustento.
7. A cobertura previdenciária, suportada pelo regime contributivo solidário, é o provimento do
sustento do segurado enquanto estiver incapaz para o trabalho.
8. É decorrência lógica da natureza dos benefícios por incapacidade, substitutivos da renda,
que a volta ao trabalho seja, em regra, causa automática de cessação desses benefícios, como
se infere do requisito da incapacidade total previsto nosarts. 42 e 59 da Lei 8.213/1991, com
ressalva ao auxílio-doença.
9. No caso de aposentadoria por invalidez, o art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social
(LBPS) estabelece como requisito a incapacidade "para o exercício de atividade que lhe
garanta a subsistência", e, assim, a volta a qualquer atividade resulta no automático
cancelamento do benefício (art. 46).
10. Já o auxílio-doença estabelece como requisito (art. 59) que o segurado esteja "incapacitado
para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual". Desse modo, a função substitutiva do
auxílio-doença é restrita às duas hipóteses, fora das quais o segurado poderá trabalhar em
atividade não limitada por sua incapacidade.
11. Alinhada a essa compreensão, já implícita desde a redação original da Lei 8.213/1991, a Lei
13.135/2015 incluiu os §§ 6º e 7º no art. 60 daquela, com a seguinte redação (grifos
acrescentados): "§ 6º O segurado que durante o gozo do auxílio-doença vier a exercer atividade
que lhe garanta subsistência poderá ter o benefício cancelado a partir do retorno à atividade. §
7º Na hipótese do § 6º, caso o segurado, durante o gozo do auxílio-doença, venha a exercer
atividade diversa daquela que gerou o benefício, deverá ser verificada a incapacidade para
cada uma das atividades exercidas."
12. Apresentado esse panorama legal sobre o tema, importa estabelecer o ponto diferencial
entre a hipótese fática dos autos e aquela tratada na lei: aqui o segurado requereu o benefício,
que lhe foi indeferido, e acabou trabalhando enquanto não obteve seu direito na via judicial; já a
lei trata da situação em que o benefício é concedido, e o segurado volta a trabalhar.
13. A presente controvérsia cuida de caso, portanto, em que falhou a função substitutiva da
renda, base da cobertura previdenciária dos benefícios auxílio-doença e aposentadoria por
invalidez.
14. O provimento do sustento do segurado não se materializou, no exato momento da
incapacidade, por falha administrativa do INSS, que indeferiu incorretamente o benefício, sendo
inexigível do segurado que aguarde a efetivação da tutela jurisdicional sem que busque, pelo
trabalho, o suprimento da sua subsistência.
15. Por culpa do INSS, resultado do equivocado indeferimento do benefício, o segurado teve de
trabalhar, incapacitado, para o provimento de suas necessidades básicas, o que doutrinária
ejurisprudencialmenteconvencionou-se chamar de sobre-esforço. Assim, a remuneração por
esse trabalho tem resultadoinafastávelda justa contraprestação pecuniária.
16. Na hipótese, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa atua contra a autarquia
previdenciária, pois, por culpa sua - indeferimentoequivocado do benefício por incapacidade -, o
segurado foi privado da efetivação da função substitutiva da renda laboral, objeto da cobertura
previdenciária, inerente aos mencionados benefícios.
17. Como tempero do elemento volitivo do segurado, constata-se objetivamente que, ao
trabalhar enquanto espera a concessão de benefício por incapacidade, está ele atuando de
boa-fé, cláusula geral hodiernamente fortalecida na regência das relações de direito.
18. Assim, enquanto a função substitutiva da renda do trabalho não for materializada pelo
efetivo pagamento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez, é legítimo que o
segurado exerça atividade remunerada para sua subsistência, independentemente do exame
da compatibilidade dessa atividade com a incapacidade laboral.
19. No mesmo sentido do entendimento aqui defendido:AgIntnoAREsp1.415.347/SP, Rel.
Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma,Jede 28.10.2019;REsp1.745.633/PR, Rel. Ministro
Francisco Falcão, Segunda Turma,DJede 18.3.2019;AgIntnoREsp1.669.033/SP, Rel. Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma,DJede 30.8.2018;REsp1.573.146/SP, Rel. Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma,DJede
13.11.2017;AgIntnoAgIntnoAREsp1.170.040/SP, Rel. Ministro SérgioKukina, Primeira
Turma,DJede 10.10.2018;AgIntnoREsp1.620.697/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves,
Primeira Turma,DJede 2.8.2018;AgIntnoAREsp1.393.909/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria,
Primeira Turma,DJede 6.6.2019; eREsp1.724.369/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma,DJede 25.5.2018.
FIXAÇÃO DA TESE REPETITIVA
20. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
21. Ao Recurso Especial deve-se negar provimento, pois o Tribunal de origem julgou o presente
caso no mesmo sentido do entendimento aqui proposto (fl. 142-143/e-STJ): "A permanência do
segurado no exercício das atividades laborativas decorre da necessidade de prover sua
subsistência enquanto a administração ou o Judiciário não reconheça sua incapacidade, não
obstando a concessão do benefício vindicado durante a incapacidade."
22. Consubstanciado o que previsto no Enunciado Administrativo 7/STJ, o recorrente é
condenado ao pagamento de honorários advocatícios de 10% (dez por cento) sobre o valor total
da verba sucumbencial fixada nas instâncias ordinárias, com base no § 11 do art. 85 do
CPC/2015.
CONCLUSÃO
23. Recurso Especial não provido, sob o rito dosarts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(STJ, 1ª Seção,REsp.1.786.590/SP, j. 24/06/2020,DJe01/07/2020, Rel. Min. HERMAN
BENJAMIN, grifei).
No caso concreto, a cronologia dos autos evidencia que o abatimento é indevido. O trabalho se
fez necessário para garantir a subsistência, diante da rejeição do pedido administrativo e da
pendência da discussão judicial.
Apliquem-se, para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos
pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à
época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE
870947.
Em virtude do acolhimento parcial do pedido, mantenho a condenação da autarquia ao
pagamento de honorários fixados no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da
condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de
Processo Civil/2015), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual
os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das
prestações vencidas após a data da prolação da sentença. Tendo a parte autora sucumbido em
parte do pedido, fica condenada ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$
1.000,00 (um mil reais), cuja exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº
1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça
gratuita.
Por tais fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS para fixar a data de cessação
do benefício (DCB) em 07/04/2020 e altero, de ofício, os critérios para o cálculo dos juros de
mora e correção monetária.
Providencie a Subsecretaria da Turma as medidas necessárias para comunicação ao setor
próprio do INSS para a cessação do benefício.
É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA:Acompanharei o Ilustre
Relator no presente caso, mas ressalvando meu entendimento, no tocante ao termo final do
benefício.
Com efeito, o auxílio-doença, previsto na Lei nº 8.213/91, artigo 59, é um benefício provisório,
que cessa com o término da incapacidade laboral, no caso de ser temporária, ou com a
reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade
for definitiva para o exercício da atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em
aposentadoria por invalidez, se o segurado vier a ser considerado insusceptível de recuperação
ou de reabilitação.
Nos casos em que o benefício é concedido com base na incapacidade temporária, a cessação
ocorre quando o segurado recupera a sua capacidade laboral, estando prevista na Lei nº
8.213/91, artigo 60, parágrafo 8º, a possibilidade de se estimar, quando da concessão, um
prazo de duração do benefício, que será de 120 dias, se não for previamente fixado (parágrafo
9º). E, se o segurado não estiver em condições de retornar ao trabalho dentro do prazo
estimado, cumpre a ele requerer a prorrogação do seu benefício, caso em que será submetido
a perícia médica administrativa.
De outro modo, se o auxílio-doença é concedido com base naincapacidade definitiva para
atividade habitual, a ele não se aplicam as regras contidas nos parágrafos 8º e 9º do referido
artigo 60, só podendo ser cessado após a reabilitação do segurado para o exercício de outra
atividade que lhe garanta a subsistência ou, na impossibilidade de reabilitá-lo, o benefício será
convertido em aposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 62, parágrafo 1º, da Lei nº
8.213/91.
No caso, considerando que o auxílio-doença, nestes autos, foi concedido com base na
incapacidade temporária para o exercício da atividade habitual, não é o caso de submeter a
parte autora a processo de reabilitação profissional. Por outro lado, não tendo a sentença fixado
um termo final do benefício e não estando o juiz obrigado a fazê-lo, mais razoável, no meu
entender, deixar que o INSS observe a regra do parágrafo 9º do artigo 60 da Lei nº 8.213/91,
para assim propiciar ao segurado a oportunidade de requerer, se for o caso, a prorrogação do
seu benefício.
Ante o exposto, ACOMPANHO o Ilustre Relator, mas com ressalva de entendimento, no tocante
ao termo final do benefício.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. DATA DE INÍCIO DO
BENEFÍCIO. DATA DE CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. DESCONTO DOS PERÍODOS
LABORADOS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA.
1. Comprovada a incapacidade para as atividades laborais, a condição de segurado e
cumprimento da carência é devido o benefício de auxílio-doença.
2. Conforme jurisprudência consolidada, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do
seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação (Súmula nº 576 do Superior
Tribunal de Justiça). Na hipótese de benefício cessado indevidamente, o termo inicial deve ser
no dia seguinte ao da cessação indevida. É possível a ressalva quando fixada a incapacidade
em momento posterior ao requerimento ou à cessação administrativa.
3. Quanto ao prazo de duração, nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei n.
8.212/91, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia
previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do
segurado.
4. A lei determina que o magistrado fixe data para a alta programada "sempre que possível". A
alta programada ora instituída por lei não impede a realização de perícia para se aferir a
necessidade ou não de manutenção do auxílio-doença.
5. Sendo possível a fixação de data para a alta programada, esta deve ser adotada como data
de cessação do benefício (DCB).
6. O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
7. Correção, de ofício, dos critérios de correção monetária e juros de mora.
8. Apelação do INSS parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS e alterar, de ofício, os critérios
para o cálculo dos juros de mora e correção monetária,
SENDO QUE A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA ACOMPANHOU O RELATOR COM
RESSALVA DE ENTENDIMENTO, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
