Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5019272-18.2018.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
24/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 29/09/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL TEMPORÁRIA.
REQUISITOS PREENCHIDOS. DESCONTO DO PERÍODO DE CONTRIBUIÇÃO
CONCOMITANTE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. TEMA REPETITIVO. AUXÍLIO-ACIDENTE.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência - doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovada a incapacidade laboral da parte autora para as atividades laborais habituais por
meio da perícia médica judicial e preenchidos os demais requisitos para a concessão do benefício
– qualidade de segurado e carência –, é devido auxílio-doença.
- No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de
aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RGPS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente (Tema
Repetitivo n. 1.013 do STJ, REsp n. 1.786.590/SP e 1.788.700/SP, acórdão publicado em
1º/7/2020).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- O auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, é devido como indenização de
natureza previdenciária e não civil, e depende da consolidação das lesões decorrentes de
sinistro. Tem natureza compensatória para compensar o segurado da redução de sua capacidade
laboral.
- A ausência da consolidação das lesões do segurado decorrente de acidente de qualquer
natureza, atestada por meio de perícia médica judicial, afasta a possibilidade de concessão de
auxílio-acidente.
- Apelações não providas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5019272-18.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZABEL PEREIRA DE JESUS
Advogado do(a) APELADO: ERIKA MADI CORREA - SP315872-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5019272-18.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZABEL PEREIRA DE JESUS
Advogado do(a) APELADO: ERIKA MADI CORREA - SP315872-A
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelações interpostas pelas partes em face de sentença que julgou procedente o
pedido de auxílio-doença, no período de 7/8/2018 a 7/2/2020, discriminados os consectários
legais.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
A autarquia alega, em síntese, a ausência de incapacidade laboral e exora a reforma integral do
julgado. Subsidiariamente, requer os descontos no benefício do período em que houve o
recolhimento de contribuições.
Em recurso adesivo, a autora requer a concessão de auxílio-acidente.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5019272-18.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZABEL PEREIRA DE JESUS
Advogado do(a) APELADO: ERIKA MADI CORREA - SP315872-A
V O T O
Conheço das apelações, em razão da satisfação de seus requisitos.
Discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício por
incapacidade à parte autora.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da CF/1988, com a redação dada pela
Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e
idade avançada (...)”
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade
que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo
59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social,
Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005,
p. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho.
São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de
auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n.
8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza,
ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica,
por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil. Contudo, o juiz não está
adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais,
profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização são pertinentes a esse tema:
Súmula 33 da TNU: Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para a concessão
da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta data será o
termo inicial da concessão do benefício.
Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez.
Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social.
Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
No caso dos autos, a perícia médica judicial, realizada em 13/8/2019, constatou a incapacidade
laboral total e temporária da autora (nascida em 1971, qualificada como promotora de vendas),
por ser portadora de luxação da prótese do joelho esquerdo.
O perito fixou a data de início da incapacidade em 7/8/2018 e estimou prazo de 9 meses para
tratamento e recuperação da capacidade laboral.
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial. Contudo, os demais
elementos de prova não autorizam convicção em sentido diverso.
Os relatórios médicos colacionados aos autos declaram a incapacidade laboral daautora e
corroboram a conclusão do perito.
Os demais requisitos para a concessão do benefício - filiação e período de carência - também
estão cumpridos (vide dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS) e não foram
discutidos nesta esfera recursal.
Em decorrência, impõe-se a manutenção da r. sentença nesse aspecto, na esteira dos
precedentes que cito:
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL
PARA O TRABALHO HABITUAL. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado
parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício
de outras atividades laborais. 2. Recurso improvido". (REsp 501267 / SP RECURSO ESPECIAL
2003/0018983-4 Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO (1112) Órgão Julgador T6 -
SEXTA TURMA Data do Julgamento 27/04/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 28/06/2004 p. 427)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. CARÊNCIA E
QUALIDADE DE SEGURADO. COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E
TEMPORÁRIA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO A
CONTAR DO LAUDO PERICIAL. I - A consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais -
CNIS comprova o preenchimento da carência exigida por Lei e a manutenção da qualidade de
segurado da autora quando do ajuizamento da ação. II - As conclusões obtidas pelo laudo pericial
comprovam a incapacidade total e temporária da autora para o exercício de atividade laborativa,
devendo ser concedido o auxílio-doença . III - Não houve fixação do início da incapacidade, razão
pela qual a data de início do benefício deve corresponder à data do laudo pericial. IV - Remessa
oficial e apelação do INSS parcialmente providas. Tutela antecipada". (APELREE -
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 1497185 Processo: 2010.03.99.010150-5 UF: SP Órgão
Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:13/09/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/09/2010
PÁGINA: 836 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS).
Quanto ao pedido de exclusão, da condenação, dos períodos em que foram efetuadas
contribuições previdenciárias após a data de início do benefício, a razão não assiste à autarquia.
O Superior Tribunal de Justiça julgou, em 24/6/2020, o mérito dos Recursos Especiais
1.786.590/SP e 1.788.700/SP, representativos da controvérsia descrita no Tema Repetitivo n.
1.013, cuja questão submetida a julgamento foi a “possibilidade de recebimento de benefício por
incapacidade do Regime Geral de Previdência Social de caráter substitutivo da renda (auxílio-
doença ou aposentadoria por invalidez) concedido judicialmente em período de abrangência
concomitante ao que o segurado estava trabalhando e aguardando o deferimento do benefício”.
Transcrevo, a seguir, a tese firmada no julgado, cujo acórdão de mérito foi publicado em
1º/7/2020:
"No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de
aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RGPS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente".
Em decorrência, nada há a reparar no julgado nesse ponto.
Quanto à pretensão de auxílio-acidente, melhor sorte não socorre a parte autora.
Na realidade, o auxílio-acidente, de cunho compensatório, é devido somente quando comprovada
a existência de sequela resultante de acidente de qualquer natureza e esta tenha provocado
redução da capacidade laborativa do segurado, dificultando-lhe a realização do trabalho.
É o que expressamente prevê o artigo 86 da Lei n. 8.213/1991 (g. n.):
“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que
impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.”
Por consequência, se as limitações são decorrentes de doenças adquiridas, e não de acidente,
não há direito à percepção de auxílio-acidente.
No presente caso, o perito esclareceu que a incapacidade da autora é temporária. Após o período
de tratamento ela poderia retornar a exercer sua atividade habitual sem impedimentos.
Assim, entendo que não houve a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer
natureza não estando patenteada a contingência necessária à concessão do benefício pleiteado.
É o que expressa a orientação jurisprudencial predominante:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL. AUXÍLIO-ACIDENTE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA.
INOCORRÊNCIA. BENEFÍCIO INDEVIDO. ENTENDIMENTO DO RESP 1.109.591/SC,
JULGADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-
PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. No REsp 1.109.591/SC, julgado sob o rito do
art. 543-C do CPC, a Terceira Seção do STJ fixou entendimento de que: "exige-se, para
concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que
implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido". 2. A Corte de origem, ao
analisar o conjunto fático-probatório, concluiu que a lesão sofrida pelo segurado não reduziu a
sua capacidade para o trabalho. Revisar tal entendimento implica revolvimento de matéria fático-
probatória, o que não é possível, tendo em vista o enunciado da Súmula 7/STJ. 3. Agravo
regimental não provido." (AGRESP 201400084845, AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL - 1430548, Relator(a) BENEDITO GONÇALVES, STJ, PRIMEIRA
TURMA, Fonte DJE DATA:21/05/2014).
Diante do exposto, nego provimento às apelações.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL TEMPORÁRIA.
REQUISITOS PREENCHIDOS. DESCONTO DO PERÍODO DE CONTRIBUIÇÃO
CONCOMITANTE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. TEMA REPETITIVO. AUXÍLIO-ACIDENTE.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência - doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Comprovada a incapacidade laboral da parte autora para as atividades laborais habituais por
meio da perícia médica judicial e preenchidos os demais requisitos para a concessão do benefício
– qualidade de segurado e carência –, é devido auxílio-doença.
- No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de
aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RGPS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente (Tema
Repetitivo n. 1.013 do STJ, REsp n. 1.786.590/SP e 1.788.700/SP, acórdão publicado em
1º/7/2020).
- O auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, é devido como indenização de
natureza previdenciária e não civil, e depende da consolidação das lesões decorrentes de
sinistro. Tem natureza compensatória para compensar o segurado da redução de sua capacidade
laboral.
- A ausência da consolidação das lesões do segurado decorrente de acidente de qualquer
natureza, atestada por meio de perícia médica judicial, afasta a possibilidade de concessão de
auxílio-acidente.
- Apelações não providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
