D.E. Publicado em 11/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, para conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença, desde a data da constatação da incapacidade, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0028125-36.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por PEDRO ANTONIO RUSSO em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido deduzido na inicial, condenando-o ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 10% sobre o valor da causa, a serem executados nos termos do artigo 98, §3º, do NCPC, haja vista ser o sucumbente beneficiário da gratuidade judiciária.
Visa o recurso à concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, sustentando a existência de incapacidade laborativa. Prequestiona a matéria para fins recursais (fls. 282/290).
A parte apelada deixou de apresentar contrarrazões (fl. 298).
É o relatório.
VOTO
Conheço do recurso de apelação, uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade, conforme o artigo 1.011 do NCPC.
Discute-se o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) ou a incapacidade temporária (auxílio-doença), observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 - cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 09/06/2014 visando à concessão de auxílio-doença ou, alternativamente, de aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação administrativa, ocorrida em 06/05/2014 (fl. 188).
Realizada a perícia médica em 15/09/2015, o laudo apresentado considerou o autor, nascido em 30/12/1974, açougueiro e com o ensino fundamental incompleto, parcial e permanentemente incapacitado para o exercício de suas atividades habituais, por ser portador de cirrose (CID 10 K70.3) e etilismo crônico (CID 10 F10).
Informou o expert que o periciando possui "limitações para realizar atividades que exijam grandes esforços físicos. Pode realizar atividades de natureza mais leve como é o caso de comerciante. Pode realizar a atividade de açougueiro desde que não tenha que carregar grandes peças de carne" (fls. 243/247).
O perito fixou a DII em 07/2011, quando o autor foi diagnosticado e iniciou o tratamento médico no HC de Ribeirão Preto.
Insta consignar que, em 25/04/2016, realizou-se audiência de instrução e julgamento, oportunidade em que foram colhidos os depoimentos de duas testemunhas da parte autora.
Hermantino Geraldo da Silva declarou que conhece o autor desde a infância; que este trabalhou como lavrador, servente de pedreiro, pedreiro; que o recorrente foi proprietário de uma casa de carnes, onde trabalhava sozinho; que não possui mais o açougue há cerca de 01 ano a 01 ano e meio, quando adoeceu. Por sua vez, João Luis da Silva atestou que conhece a parte autora há cerca de 20 anos; que este trabalhava como pedreiro; que há, aproximadamente, seis anos tornou-se proprietário de uma casa de carnes, a qual manteve até meados de 2013; que o autor trabalhava sozinho na grande maioria do tempo, recebendo auxílio da esposa esporadicamente.
Por sua vez, os dados do CNIS revelam que a parte autora manteve diversos vínculos empregatícios de 1973 a 1989, bem como verteu contribuições à Previdência Social, na qualidade de autônomo (04/1990 a 04/1991 e 06/1991 a 10/1999) e de contribuinte individual (11/1999 a 11/2000, 12/2001 a 04/2002, 06/2002 a 10/2002, 01/2003 a 01/2004, 06/2004 a 09/2004, 01/2005, 04/2005 a 09/2005, 10/2005 a 05/2006, 11/2008 a 12/2013 e 01/2014 a 10/2014), sendo que o no período correspondente a 11/2008 a 12/2013 as contribuições foram recolhidas tendo como tomador seu próprio comércio (Pedro Antonio Russo Açougue). Consta, ainda, o recebimento de auxílio-doença de 01/04/2014 a 05/05/2014, o qual foi reativado judicialmente por força da concessão de tutela antecipada no presente feito, em 11/06/2014 (fl. 168).
Dessa forma, conclui-se que, no momento do surgimento da incapacidade, a parte autora tinha carência e qualidade de segurado.
E não apresentada, de um lado, incapacidade total e definitiva (ou seja, invalidez) para o trabalho, a aposentadoria é indevida. De outro lado, resta devido a concessão do auxílio-doença, na esteira dos seguintes precedentes:
No mesmo sentido, os seguintes julgados da E. Nona Turma desta Corte: ApReeNec 00309707520164039999, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, v.u., e-DJF3 30/10/2017; Ap 00227306320174039999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, v.u., e-DJF3 02/10/2017; Ap 00414239520174039999, Relator Juiz Federal Convocado Otavio Port, v.u, e-DJF3 07/03/2018; ApReeNec 00364137020174039999, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, v.u., e-DJF3 07/03/2018.
Ressalte-se que o fato de a parte autora ter voltado a trabalhar após a constatação da incapacidade não afasta sua inaptidão ao labor, uma vez que as atividades laborativas tiveram por fim garantir sua sobrevivência, ante a resistência ofertada pela autarquia previdenciária. Nesse sentido, precedentes desta Corte:
O termo inicial do auxílio-doença concedido deve ser fixado na data seguinte à cessação administrativa do benefício, ocorrida em 05/05/2014 (fl. 167), uma vez que o conjunto probatório dos autos permite concluir que a incapacidade advém desde então.
Nesse sentido, cito julgado do Superior Tribunal de Justiça:
A mesma orientação tem sido seguida por esta Turma: APELREEX 00016975820004036104, Rel. Des. Fed. Nelson Bernardes, v.u., e-DJF3 Judicial 1: 08/04/2011; AC 00017125120144036002, Rel. Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, v.u., e-DJFe Judicial 1: 04/05/2013.
Quanto à duração do auxílio-doença ora concedido, assinale-se que da instrução do feito não exsurge a possibilidade de determinação do termo final do benefício, pois a perícia não estimou prazo de recuperação da capacidade laboral e foi realizada antes da vigência das Medidas Provisórias ns. 739/2016 e 767/2017, esta última convertida na Lei n. 13.457/2017, que incluiu os §§ 8º e 9º do artigo 60 da Lei n. 8.213/1991. Ademais, o conjunto probatório dos autos revela a necessidade de reabilitação do demandante para outra atividade compatível com as limitações apontadas no laudo pericial.
Considerando-se que os esforços físicos (como carregar grandes peças de carne) são inerentes ao desempenho da função de açougueiro, bem como que o perito não descartou a possibilidade de readaptação do autor em funções mais leves, o benefício em tela deverá ser mantido enquanto não realizado o procedimento de reabilitação a cargo da autarquia, nos termos do art. 62 da Lei de Benefícios, afastando-se o termo final da benesse fixado pelo Juízo a quo.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n. 11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso, incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Deve o INSS arcar com os honorários advocatícios em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 85 do NCPC, observando-se o disposto nos §§ 3º, 5º e 11 desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício (Súmula n. 111 do STJ).
Quanto às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, nos termos das Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03 (Estado de São Paulo). Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Os valores já pagos, seja na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de quaisquer benefícios por incapacidade, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO, para conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença, desde a data seguinte à cessação administrativa do benefício (05/05/2014), fixando-se a correção monetária, os juros de mora e os honorários advocatícios, nos termos da fundamentação.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 27/09/2018 19:50:05 |