Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001863-56.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
24/06/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 26/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. MAGISTRADO NÃO ADSTRITO AO LAUDO PERICIAL.
ELEMENTOS DOS AUTOS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. TERMO INICIAL.
CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I- Os requisitos previstos na Lei de Benefícios para a concessão da aposentadoria por invalidez
compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da
Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) a
incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no
que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
II- In casu, os extratos de consulta realizada no CNIS revelam os registros de atividades da
requerente nos períodos de 14/5/12 a 30/7/12 e 3/9/12 a 26/4/17, recebendo auxílio doença
previdenciário nos períodos de 12/12/13 a 27/2/14, 18/8/14ª 27/9/14, 21/12/14 a 6/11/16 e 9/12/16
a 8/4/17. A presente ação foi ajuizada apenas em 19/2/18. Nos termos do disposto no art. 15, inc.
II, da Lei nº 8.213/91, a qualidade de segurado fica mantida até doze meses após a cessação das
contribuições. Verificou-se que no último vínculo de trabalho no período de 3/9/12 a 26/4/17, com
a empregadora "Bello Alimentos Ltda.", a rescisão do contrato de trabalho deu-se sem justa
causa, por iniciativa do empregador, inclusive rescisão antecipada do contrato a termo. Dessa
forma, comprovada inequivocamente a situação de desempregado da demandante, torna-se
possível - e, mais do que possível, justa - a prorrogação do período de graça nos termos do § 2º,
do art. 15, da Lei nº 8.213/91, o que leva à manutenção da sua condição de segurada até 15/6/19
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
(vinte e quatro meses).
III- A incapacidade total e temporária ficou demonstrada pelos documentos acostados aos autos.
Cumpre ressaltar, a teor dos artigos 371 e 479 do CPC/15, que o juiz não está adstrito ao laudo
pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos.
Dessa forma, deve ser concedido o auxílio doença, devendo perdurar enquanto permanecer a
incapacidade. Consigna-se, contudo, que o benefício não possui caráter vitalício, tendo em vista o
disposto nos artigos 59 e 101, da Lei nº 8.213/91.
IV- O termo inicial deve ser fixado na data da internação hospitalar em 24/4/19.
V- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os posicionamentos firmados na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos processos relativos
a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A taxa de juros deve incidir de acordo
com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação
dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
VI- A verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação
remunera condignamente o serviço profissional prestado. No que se refere à sua base de cálculo,
considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal,
adota-se o posicionamento do C. STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do
recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o
marco final da verba honorária deve ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido,
que no caso corresponde ao acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial
nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, v.u., j. em 17/12/15, DJe
18/12/15).
VII- Rejeitada matéria preliminar. No mérito, apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001863-56.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: MICHELE DOS SANTOS SOUSA
Advogados do(a) APELANTE: ANA CAROLINA ALVES HENRIQUES - RS81518-A, THAYUANA
MAILLA FERNANDES DOS SANTOS GOMES DA COSTA - SP388589-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001863-56.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: MICHELE DOS SANTOS SOUSA
Advogados do(a) APELANTE: ANA CAROLINA ALVES HENRIQUES - RS81518-A, THAYUANA
MAILLA FERNANDES DOS SANTOS GOMES DA COSTA - MS22280-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 19/2/18 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando ao
restabelecimento de auxílio doença ou à concessão de aposentadoria por invalidez. Pleiteia,
ainda, a tutela de urgência.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e postergada a
análise da antecipação dos efeitos da tutela para após a instrução probatória.
A demandante impugnou o laudo pericial apresentado, requerendo a realização de nova perícia
médica, por neurologista, ou a aferição da incapacidade levando em consideração o prontuário
médico e fotos que retratam seu real quadro de saúde.
Ante a juntada de documentos novos a fls. 119/135 (id. 130223883 – págs. 117/133), foi dada
vista ao INSS para manifestação, no prazo de 15 (quinze) dias, tendo decorrido in albis o prazo
estabelecido (fls. 141 – id. 130223883 – pág. 139).
O Juízo a quo, em 24/7/19, julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de ausência de
constatação, na perícia judicial, da incapacidade laborativa. Condenou a parte autora ao
pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, fixados estes em 10% sobre o
valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/15. Foi
determinada a requisição do pagamento de honorários periciais.
Inconformada, apelou a parte autora, alegando em breve síntese:
a) Preliminarmente:
- a nulidade do laudo pericial, por ausência de fundamentação e embasamento técnico, sendo
que as respostas da expert aos quesitos são imprecisas, vagas e até mesmo contraditórias,
motivo pelo qual requer a realização de nova perícia com médico neurologista.
b) No mérito:
- a existência de incapacidade laborativa, pelo fato de ser portadora de diabetes, com feridas na
planta do pé direito infecionadas e que não cicatrizam, com recente internação para tratamento,
consoante documentação médica acostada aos autos;
- não haver sido observada pela Perita a patologia de neuropatia periférica associada ao
diabetes, na elaboração do laudo pericial, vez que apresenta oscilações em seu quadro clínico,
ora com períodos de melhora ora com crises agudas, porém, sem cura, impossibilitando o labor e
a realização de tarefas simples do dia-a-dia e
- a necessidade de ser levada em consideração as condições pessoais como o baixo grau de
instrução e a atividade habitual como trabalhadora braçal na aferição da incapacidade.
- Requer a reforma da R. sentença, para julgar procedente o pedido.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001863-56.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: MICHELE DOS SANTOS SOUSA
Advogados do(a) APELANTE: ANA CAROLINA ALVES HENRIQUES - RS81518-A, THAYUANA
MAILLA FERNANDES DOS SANTOS GOMES DA COSTA - MS22280-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Nos exatos
termos do art. 42 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será
devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-
lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
§ 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de
incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o
segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança.
§ 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão."
Com relação ao auxílio doença, dispõe o art. 59, caput, da referida Lei:
"O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período
de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade
habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos."
Dessa forma, depreende-se que os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez
compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da
Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c)
incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no
que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
Com relação ao recolhimento de contribuições previdenciárias, devo ressaltar que, em se
tratando de segurado empregado, tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o
dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser alegadas
em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser penalizado
pela inércia alheia.
Importante deixar consignado, outrossim, que a jurisprudência de nossos tribunais é pacífica no
sentido de que não perde a qualidade de segurado aquele que está impossibilitado de trabalhar,
por motivo de doença incapacitante.
Feitas essas breves considerações, passo à análise do caso concreto.
In casu, os extratos de consulta realizada no "CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais",
juntados a fls. 57/58 (id. 130223883 – págs. 55/56) revelam os registros de atividades da
requerente nos períodos de 14/5/12 a 30/7/12 e 3/9/12 a 26/4/17, recebendo auxílio doença
previdenciário nos períodos de 12/12/13 a 27/2/14, 18/8/14ª 27/9/14, 21/12/14 a 6/11/16 e 9/12/16
a 8/4/17. A presente ação foi ajuizada apenas em 19/2/18.
Nos termos do disposto no art. 15, inc. II, da Lei nº 8.213/91, a qualidade de segurado fica
mantida até doze meses após a cessação das contribuições.
Verificou-se que no último vínculo de trabalho no período de 3/9/12 a 26/4/17, com a
empregadora "Bello Alimentos Ltda.", a rescisão do contrato de trabalho deu-se sem justa causa,
por iniciativa do empregador, inclusive rescisão antecipada do contrato a termo.
Dessa forma, comprovada inequivocamente a situação de desempregado da demandante, torna-
se possível - e, mais do que possível, justa - a prorrogação do período de graça nos termos do §
2º, do art. 15, da Lei nº 8.213/91, o que leva à manutenção da sua condição de segurada até
15/6/19 (vinte e quatro meses).
Nem se argumente que o dispositivo legal acima mencionado, ao aludir ao "registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social", impeça a prorrogação do período de
graça àqueles que comprovaram a situação de desemprego, mas não o fizeram perante o órgão
designado.
Conforme tenho repetido à exaustão, citando Carlos Maximiliano, a lei não pode ser interpretada
em sentido que conduza ao absurdo, e não se poderá perder de vista, no presente caso, o caráter
eminentemente social do bem jurídico tutelado pela norma.
Em se tratando de um benefício no qual o caráter social afigura-se absolutamente inquestionável,
a função jurisdicional deve ser a de subordinar a exegese gramatical à interpretação sistemática -
calcada nos princípios e garantias constitucionais - e à interpretação axiológica, que exsurge dos
valores sociais na qual se insere a ordem jurídica.
Nesse sentido, dispõe o art. 1º da Lei 8.213/91 que é finalidade e princípio básico da Previdência
Social assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção por motivo de
desemprego involuntário.
Sob tal aspecto, parece lógico - ou, pelo menos, minimamente razoável - supor-se que a norma
legal em debate, ao aludir ao "registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da
Previdência Social", pretendeu beneficiar os segurados que se encontram involuntariamente
desempregados. A contrario sensu, não teriam direito à prorrogação da qualidade de segurado
aqueles empregados que, por iniciativa própria, rescindiram o contrato de trabalho, bem como os
contribuintes individuais que deixaram de efetuar os devidos recolhimentos.
Dessa forma, a ausência de registro da situação de desemprego no Ministério do Trabalho e
Previdência Social não impede a aplicação do § 2º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, desde que
comprovada que a rescisão do contrato de trabalho deu-se por iniciativa do empregador, como
ocorreu in casu.
Nesse sentido, merecem destaque os acórdãos abaixo, in verbis:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MANUTENÇÃO DA
QUALIDADE DE SEGURADO. ART. 15 DA LEI 8.213/91. CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO.
DISPENSA DO REGISTRO PERANTE O MINISTÉRIO DO TRABALHO E DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL QUANDO FOR COMPROVADA A SITUAÇÃO DE DESEMPREGO POR OUTRAS
PROVAS CONSTANTES DOS AUTOS. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO
DO JUIZ. RECURSO DO INSS DESPROVIDO.
1. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do Incidente de Uniformização de Interpretação
de Lei Federal (Pet 7.115/PR, DJe 6.4.2010) pacificou o entendimento de que o registro no
Ministério do Trabalho não deve ser tido como o único meio de prova da condição de
desempregado do segurado, especialmente considerando que, em âmbito judicial, prevalece o
livre convencimento motivado do Juiz e não o sistema de tarifação legal de provas.
Assim, o registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprido
quando for comprovada tal situação por outras provas constantes dos autos, inclusive a
testemunhal.
2. A ausência de anotação laboral na CTPS do autor não é suficiente para comprovar a sua
situação de desemprego, já que não afasta a possibilidade do exercício de atividade remunerada
na informalidade.
3. Tendo o Tribunal a quo considerado mantida a condição de segurado do autor em face da
situação de desemprego apenas com base no registro na CTPS da data de sua saída no
emprego, bem como na ausência de registros posteriores, devem os autos retornar à origem para
que seja oportunizada à parte a produção de prova da sua condição de desempregado.
4. Agravo Regimental do INSS desprovido."
(STJ, AgRg no Agravo de Instrumento nº 1.182.277/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes
Maia Filho, j. 26/10/10, v.u., DJE 6/12/10).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. REQUISITOS.
QUALIDADE DE SEGURADO MANTIDA. REGISTRO NO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO DO
TRABALHO. DESNECESSIDADE. RECURSO IMPROVIDO.
1. Nos termos do § 4º do art. 15 da Lei 8.213/91, ocorre a perda da qualidade de segurado "no dia
seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para
recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos
fixados neste artigo e seus parágrafos".
2. "A ausência de registro em órgão do Ministério do Trabalho não impede a comprovação do
desemprego por outros meios admitidos em Direito" (Súmula 27/TNU).
3. Recurso especial improvido."
(STJ, REsp nº 922.283/RS, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteve Lima, j. 11/12/08, v.u., DJE
2/2/09).
Por fim, destaco ainda a tese sumulada pela Turma de Uniformização Nacional da Jurisprudência
dos Juizados Especiais Federais:
"Súmula nº 27 - A ausência de registro em órgão do Ministério do Trabalho não impede a
comprovação do desemprego por outros meios admitidos em Direito."
Outrossim, no parecer técnico juntado a fls. 94/102 (id. 130223883 – págs. 92/100), cuja perícia
médica judicial foi realizada em 7/12/18, segundo relato da autora de 25 anos, estava trabalhando
em frigorífico de aves, quando lesionou o pé, vez que realizava evisceração nos frangos e os
dejetos das aves acumulavam dentro de sua bota, ocasionando grave infecção em seus pés.
Afirmou a esculápia encarregada do exame ser portadora de diabetes mellitus, diagnosticada em
2014, em uso de hipoglicemiantes oral, com informação clínica de neuropatia diabetoica plantar,
sem confirmação com exame complementar. "Apresenta lesão escarificada de 0,8 cm sob região
de interfalangeana de hálux direito, sem secreção, e bordas com queratose ao redor. Não foram
constatados sinais inflamatórios (edema, rubor, ou calor) em atividade. Não foi constatada
incapacidade laboral atual pelas alterações nos pés. Está gestante de 38 semanas. Após
nascimento do bebê necessitará tratar a infecção fúngica de unhas dos pés, pois é porta de
entrada para agentes infecciosos. Embora não confirmada a neuropatia periférica com exame
complementar (eletroneuromiografia), deverá utilizar sapatos adequados para evitar lesões nos
pés" (fls. 98 - id. 130223883 – pág. 96)
No entanto, cópia de relatório médico datado de 2/5/18, juntado a fls. 119 (id. 130223883 – pág.
117), atestou o médico assistente da Fundação Estatal de Saúde de Aparecida do Taboado/MS –
Fundação Enfermeiro Pedro Francisco Soares, que a paciente de 24 anos, "diabética insulino
dependente, faz uso de insulina NPH 40 u pela manhã e 20 u à noite. Apresenta quadro de
neuropatia periférica, que evolui com úlcera de 1 dedo de pé direito que se estende até região
plantar, com pioras e melhoras desde 2013. Agora encontra-se com aspecto cruento, bordos
necróticos, com risco de evolução de amputação. Paciente trabalhadora braçal, incapaz para o
trabalho por tempo indeterminado. CID G90/L97".
Por sua vez, foi acostada cópia do Prontuário Médico, referente à internação clínica da autora no
referido hospital, no período de 24/4 a 28/4/19, em razão de lesão infectada em pé direito, tendo
sido observada secreção purulenta, com realização de curativos (fls. 121/129 - id. 130223883 –
págs. 119/127).
Ademais, as fotografias acostadas a fls. 130/135 (id. 130223883 – págs. 128/133) revelam a
gravidade da lesão. Forçoso concluir que a autora estava incapacitada quando da internação em
24/4/19, época em que a requerente detinha a qualidade de segurada.
Em que pese o trabalho realizado pela Perita de confiança do Juízo, necessário se faz analisar a
moléstia e suas implicações, para aferição da incapacidade da parte autora, não ficando o
magistrado adstrito ao laudo judicial, conforme já decidido pelo C. Superior Tribunal de Justiça, in
verbis:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE
PARCIAL DO SEGURADO. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DOS REQUISITOS
NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, UTILIZANDO-SE
OUTROS MEIOS.
1. Ainda que o sistema previdenciário seja contributivo, não há como desvinculá-lo da realidade
social, econômica e cultural do país, onde as dificuldades sociais alargam, em muito, a fria letra
da lei.
2. No Direito Previdenciário, com maior razão, o magistrado não está adstrito apenas à prova
pericial, devendo considerar fatores outros para averiguar a possibilidade de concessão do
benefício pretendido pelo segurado.
3. Com relação à concessão de aposentadoria por invalidez, este Superior Tribunal de Justiça
possui entendimento no sentido da desnecessidade da vinculação do magistrado à prova pericial,
se existentes outros elementos nos autos aptos à formação do seu convencimento, podendo,
inclusive, concluir pela incapacidade permanente do segurado em exercer qualquer atividade
laborativa, não obstante a perícia conclua pela incapacidade parcial.
4. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, AgRg no Ag nº 1.102.739/GO, Relator Ministro Og Fernandes, 6ª Turma, j. 20/10/09, vu,
DJe 9/11/09, grifos meus).
Cumpre ressaltar, a teor dos artigos 371 e 479 do CPC/15, que o juiz não está adstrito ao laudo
pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos.
Dessa forma, tendo sido constatada a incapacidade total e temporária da autora, deve ser
concedido o benefício de auxílio doença conforme pleiteado na exordial, devendo perdurar
enquanto permanecer a incapacidade. Deixo consignado, contudo, que o benefício não possui
caráter vitalício, tendo em vista o disposto nos artigos 59 e 101, da Lei nº 8.213/91.
Com relação ao termo inicial, tenho entendido que o pressuposto fático da concessão do
benefício é a incapacidade da parte autora que, em regra, é anterior ao seu ingresso em Juízo,
sendo que a elaboração do laudo médico-pericial somente contribui para o livre convencimento
do juiz acerca dos fatos alegados, não sendo determinante para a fixação da data de aquisição
dos direitos pleiteados na demanda.
No presente caso, no entanto, observo que o laudo pericial não atestou a incapacidade laborativa.
Porém, em 24/4/19 a demandante passou por internação hospitalar, tendo em vista a lesão ativa
no pé direito, motivo pelo qual o termo inicial do benefício deve ser fixado nesta data.
Quadra ressaltar, ainda, que deverão ser deduzidos na fase de execução do julgado os eventuais
valores percebidos pela parte autora a título de tutela antecipada.
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários.
Quadra ressaltar haver constado expressamente do voto do Recurso Repetitivo que "a adoção do
INPC não configura afronta ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de
repercussão geral (RE 870.947/SE). Isso porque, naquela ocasião, determinou-se a aplicação do
IPCA-E para fins de correção monetária de benefício de prestação continuada (BPC), o qual se
trata de benefício de natureza assistencial, previsto na Lei 8.742/93. Assim, é imperioso concluir
que o INPC, previsto no art. 41-A da Lei 8.213/91, abrange apenas a correção monetária dos
benefícios de natureza previdenciária." Outrossim, como bem observou o E. Desembargador
Federal João Batista Pinto Silveira: "Importante ter presente, para a adequada compreensão do
eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência – INPC e IPCA-
E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a
TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo
STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões
judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação." (TRF-
4ª Região, AI nº 5035720-27.2019.4.04.0000/PR, 6ª Turma, v.u., j. 16/10/19).
A taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F
da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente
o serviço profissional prestado, nos termos do art. 85 do CPC/15 e precedentes desta Oitava
Turma.
No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi
reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C. STJ de que os
honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da
Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve ser o
decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao acórdão
proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator
Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação da
parte autora para conceder o auxílio doença desde 24/4/19, acrescido de correção monetária,
juros moratórios e honorários advocatícios na forma acima indicada.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. MAGISTRADO NÃO ADSTRITO AO LAUDO PERICIAL.
ELEMENTOS DOS AUTOS. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. TERMO INICIAL.
CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I- Os requisitos previstos na Lei de Benefícios para a concessão da aposentadoria por invalidez
compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da
Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) a
incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no
que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.
II- In casu, os extratos de consulta realizada no CNIS revelam os registros de atividades da
requerente nos períodos de 14/5/12 a 30/7/12 e 3/9/12 a 26/4/17, recebendo auxílio doença
previdenciário nos períodos de 12/12/13 a 27/2/14, 18/8/14ª 27/9/14, 21/12/14 a 6/11/16 e 9/12/16
a 8/4/17. A presente ação foi ajuizada apenas em 19/2/18. Nos termos do disposto no art. 15, inc.
II, da Lei nº 8.213/91, a qualidade de segurado fica mantida até doze meses após a cessação das
contribuições. Verificou-se que no último vínculo de trabalho no período de 3/9/12 a 26/4/17, com
a empregadora "Bello Alimentos Ltda.", a rescisão do contrato de trabalho deu-se sem justa
causa, por iniciativa do empregador, inclusive rescisão antecipada do contrato a termo. Dessa
forma, comprovada inequivocamente a situação de desempregado da demandante, torna-se
possível - e, mais do que possível, justa - a prorrogação do período de graça nos termos do § 2º,
do art. 15, da Lei nº 8.213/91, o que leva à manutenção da sua condição de segurada até 15/6/19
(vinte e quatro meses).
III- A incapacidade total e temporária ficou demonstrada pelos documentos acostados aos autos.
Cumpre ressaltar, a teor dos artigos 371 e 479 do CPC/15, que o juiz não está adstrito ao laudo
pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos.
Dessa forma, deve ser concedido o auxílio doença, devendo perdurar enquanto permanecer a
incapacidade. Consigna-se, contudo, que o benefício não possui caráter vitalício, tendo em vista o
disposto nos artigos 59 e 101, da Lei nº 8.213/91.
IV- O termo inicial deve ser fixado na data da internação hospitalar em 24/4/19.
V- A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros
moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora. Com relação aos índices
de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os posicionamentos firmados na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos processos relativos
a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A taxa de juros deve incidir de acordo
com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação
dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso
Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
VI- A verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação
remunera condignamente o serviço profissional prestado. No que se refere à sua base de cálculo,
considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal,
adota-se o posicionamento do C. STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do
recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o
marco final da verba honorária deve ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido,
que no caso corresponde ao acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial
nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, v.u., j. em 17/12/15, DJe
18/12/15).
VII- Rejeitada matéria preliminar. No mérito, apelação da parte autora parcialmente provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar parcial provimento à apelação
da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
