Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5275950-96.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
17/06/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 23/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE
SEGURADO. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA RECONHECIDA. CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 59 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e temporária e cumprimento do período de carência (12 meses) -
é de rigor a concessão do auxílio-doença.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Os
requisitos insertos no artigo 42, da Lei de Benefícios, devem ser observados em conjunto com as
condições sócio-econômica, profissional e cultural do trabalhador.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- Apelações das partes a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5275950-96.2020.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, HELENA ROCHA DOS
SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIS DAVID MATTOS DE OLIVEIRA - SP262377-N,
DRIELLE GOMES ALMEIDA RIOS - SP404385-N, PATRICIA GOMES SOARES - SP274169-N
APELADO: HELENA ROCHA DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogados do(a) APELADO: DRIELLE GOMES ALMEIDA RIOS - SP404385-N, PATRICIA
GOMES SOARES - SP274169-N, FRANCIS DAVID MATTOS DE OLIVEIRA - SP262377-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5275950-96.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, HELENA ROCHA DOS
SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIS DAVID MATTOS DE OLIVEIRA - SP262377-N,
DRIELLE GOMES ALMEIDA RIOS - SP404385-N, PATRICIA GOMES SOARES - SP274169-N
APELADO: HELENA ROCHA DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogados do(a) APELADO: DRIELLE GOMES ALMEIDA RIOS - SP404385-N, PATRICIA
GOMES SOARES - SP274169-N, FRANCIS DAVID MATTOS DE OLIVEIRA - SP262377-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença,
desde a data do requerimento administrativo (03.06.2019).
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
benefício do auxílio-doença, a partir do indeferimento administrativo.
O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso no duplo efeito. No
mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos
requisitos legais à concessão em questão. Ao final, prequestiona a matéria.
Por sua vez, a parte autora recorreu, pleiteando a reforma do decisum, sustentando, em
síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão da aposentadoria por invalidez.
Com contrarrazões da autora, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5275950-96.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, HELENA ROCHA DOS
SANTOS
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIS DAVID MATTOS DE OLIVEIRA - SP262377-N,
DRIELLE GOMES ALMEIDA RIOS - SP404385-N, PATRICIA GOMES SOARES - SP274169-N
APELADO: HELENA ROCHA DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogados do(a) APELADO: DRIELLE GOMES ALMEIDA RIOS - SP404385-N, PATRICIA
GOMES SOARES - SP274169-N, FRANCIS DAVID MATTOS DE OLIVEIRA - SP262377-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Requer o INSS, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando
eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado.
Não lhe assiste razão.
A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não
se coloca na hipótese dos autos.
A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a
apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo
inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a
produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou
revoga tutela provisória”.
Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido
diverso, "se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou
impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso" (CPC, art.
995, parágrafo único).
Neste caso, em que o recurso é interposto pelo INSS, não há nem urgência nem evidência para
que se conceda o efeito suspensivo. Pelo contrário, a urgência serve à parte autora, já que o
benefício previdenciário é considerado verba alimentar.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e
seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de
segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do
cumprimento da carência, quando exigida.
O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do
mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a
concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e
definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação
habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a
possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu
durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE
MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).
Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos
arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já
tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a
perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do
Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado
no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102
da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de
continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa.
Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível a existência de, pelo menos,
seis meses de recolhimento, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos
exatos termos do art. 27-A da Lei de Benefícios.
Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma
lei, a saber:
“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social
depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:
I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra
pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor
da aposentadoria por invalidez porventura concedida.
DO CASO DOS AUTOS (INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA)
Objetivando comprovar a qualidade de segurada, a autora juntou cópia do extrato do Cadastro
Nacional de Informações Sociais (CNIS), do qual se infere que recolheu contribuições
previdenciárias no período de 01.12.2016 a 31.05.2019.
Acostou, também, o Certificado da Condição de Microempreendedor Individual, em seu nome,
descrevendo a atividade principal “Serviços domésticos”, código 97.00-5/00, comdata de início
da atividade em 04.12.2016.
Assim, tornam-se desnecessárias maiores considerações a respeito desse requisito, restando
demonstrada a inocorrência da perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 15, inciso II,
da Lei n.º 8.213/91, e tendo em vista o ajuizamento da ação em 13.05.2019.
O requerimento administrativo foi apresentado em 03.06.2019.
Demonstrou, outrossim, ter atendido à exigência legal de recolhimento de 12 contribuições
previdenciárias para ensejar direito à aposentadoria por invalidez (art. 25 da Lei n.° 8.213/91).
No que concerne à incapacidade, a perícia médica concluiu ser, a requerente, portadora de
Transtornos dos discos intervertebrais – CID M51.1 Cervicalgia – CID M54.2 e HIV positivo.
Relatou o médico perito que possui “Histórico de HIV positivo desde 01/2015 em tratamento e
sem complicações sistêmicas. Histórico de dor em articulações sendo tratada como artrite
reumatoide, usando cloroquina, porém sem exame que comprove a doença e o exame clínico
não foi evidenciado alterações compatíveis com o diagnóstico. Histórico de síndrome do túnel
do carpo desde 2018 com exames de eletroneuromiografia alterado, porém com tratamento
clínico obteve melhora e não necessitou de cirurgia e o exame clínico nesta perícia evidenciou
quadro estabilizado, pois não apresenta alterações aos testes e manobras específicas para
doença. O exame clínico corroborou se seu histórico de dor em região cervical e alterações
evidenciadas na ressonância da coluna cervical que evidenciou alterações compatíveis com
diagnóstico de transtornos dos discos intervertebrais e quadro da síndrome álgica denominada
de cervicalgia”. Concluiu que “Há evidências de incapacidade desde o indeferimento
administrativo em 06/2019 considerando o exame clínico que corroborou o histórico e exame de
ressonância da coluna cervical. Estimo prazo médio de 120 (cento e vinte) dias a partir desta
perícia médica para reavaliação”.
É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico.
O médico nomeado pelo juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da
parte requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da
medicina, não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para
realização de perícias.
In casu, o laudo foi produzido por médico de confiança do juízo, que fez a devida anamnese do
periciando e respondeu a todos os quesitos das partes.
Além disso, conforme informou no laudo, foram analisados todos os exames e atestados
médicos apresentados.
A perícia revelou-se suficiente para a formação do convencimento do juízo, revelando, a
insurgência da parte autora, inconformismo insuficiente para gerar dúvidas quanto à integridade
do documento médico produzido.
Eventual contradição entre o laudo pericial e os atestados médicos apresentados não pode
motivar a nulidade de um ou outro documento médico.
Desse modo, constatada a incapacidade para o exercício de sua atividade habitual, o conjunto
probatório restou suficiente para reconhecer o direito da autora ao recebimento de auxílio-
doença.
O benefício deve ser mantido até que identificada melhora nas condições clínicas ora
atestadas, ou que haja reabilitação do segurado para atividade diversa compatível, facultada
pela lei a realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para
que se avalie a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da Lei
n.º 8.213/91.
A autarquia federal alega que, por ter a autora efetuado recolhimento de contribuição e laborado
no período concedido do benefício de auxílio-doença, forçoso reconhecer a necessidade de
compensação das remunerações percebidas sobre os valores vencidos, pois argumenta que a
finalidade do benefício concedido é a substituição do salário.
No entanto, em recente julgado representativo de controvérsia, o STJ fixou o tema repetitivo n.º
1.013, nos seguintes termos (REsp 1786590/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2020, DJe 01/07/2020):
O Tema Repetitivo 1.013/STJ é assim resolvido: "No período entre o indeferimento
administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez,
mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas
do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo
benefício previdenciário pago retroativamente."
Assim, é de se inferir que a atividade laboral realizada no período questionado pela autarquia
federal foi necessária para a sobrevivência da parte autora, ainda que ao sacrifício da própria
saúde, não havendo de se falar em compensação de valores.
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou
a dispostos constitucionais.
Posto isso, nego provimento às apelações do INSS e da parte autora.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE
DE SEGURADO. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA RECONHECIDA. CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 59 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade
de segurado, incapacidade total e temporária e cumprimento do período de carência (12 meses)
- é de rigor a concessão do auxílio-doença.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Os
requisitos insertos no artigo 42, da Lei de Benefícios, devem ser observados em conjunto com
as condições sócio-econômica, profissional e cultural do trabalhador.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- Apelações das partes a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento às apelações do INSS e da parte autora, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
