Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6150544-82.2019.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado na Titularidade Plena LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
10/08/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 14/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE
QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE AO REINGRESSO NO RGPS.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO.
APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
2. Observa-se que, de fato, não há nos autos qualquer prova contemporânea do trabalho rural
alegadamente desenvolvido pela parte autora. Apesar de na CTPS acostada sob ID 103328425 -
Págs. 1/2 constar três vínculos da autora como trabalhadora rural, o último vínculo tem como data
fim 25/10/2000, ou seja, há mais de 19 anos. Desse modo, não restou comprovada a qualidade
de segurada especial da parte autora.
3. Cumpre destacar que, consoante o laudo pericial judicial, os problemas de saúde da autora,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
que ensejaram a incapacidade laborativa, foram diagnosticados em 2012, quando a autora não
estava filiada ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
4. Em consulta ao CNIS, verifica-se que, de fato, a parte autora apenas reingressou no Regime
Geral de Previdência Social – RGPS como contribuinte individual em 01/05/2015, quando já tinha
ciência de que estava doente, ou seja, quase três anos após o diagnóstico médico indicado pela
perícia judicial. Antes dessa nova filiação, o último vínculo constante no CNIS teve data de saída
em 25/10/2000.
5. Registre-se que não foi demonstrado pela parte autora, ora apelante, mediante documentação
médica suficiente, que houve, de fato, efetiva progressão ou agravamento da moléstia que a
acomete apenas após a sua nova filiação ao RGPS. Com efeito, o fato de constar no laudo
pericial a existência de agravamento, sem outras especificações, por si só, não tem o condão de
ensejar a concessão de benefício por incapacidade.
6. Destarte, mesmo tendo sido constatada pela perita médica judicial a existência de
incapacidade laborativa total e permanente da autora, uma vez configurada a existência de
doença preexistente ao ingresso no RGPS como contribuinte individual em 01/05/2015, conforme
inteligência dos artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, não é cabível a concessão de
benefício por incapacidade.
7.É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973
e do artigo 479 do CPC/2015.
8. Reconhecimento da improcedência da pretensão.
9. Apelação não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6150544-82.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MARIA APARECIDA DE CASTRO RAMALHO
Advogado do(a) APELANTE: ARLETE ALVES DOS SANTOS MAZZOLINE - SP141845-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6150544-82.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MARIA APARECIDA DE CASTRO RAMALHO
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta por MARIA APARECIDA DE CASTRO RAMALHO contra a
sentença que julgou improcedente o pedido na ação previdenciária ajuizada em face do INSS,
objetivando a parte autora a concessão de benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por
invalidez, desde o requerimento administrativo formulado em 06/02/2018 (ID 103328460).
Condenou-se a parte autora nas custas processuais e nos honorários advocatícios, arbitrados em
10% sobre o valor corrigido da causa, observando-se, na espécie, a justiça gratuita concedida à
demandante (ID 103328460 - Pág. 3).
Laudo pericial pela existência de incapacidade laborativa total e definitiva (ID 103328435).
Em suas razões recursais, sustenta a autora, em suma, possuir os requisitos legais para a
concessão de benefício por incapacidade. Alega que a doença teve início em 2012, e veio a
agravar-se a ponto de incapacitá-la apenas em 2018. Pugna pela reforma integral do julgado,
determinando-se a concessão de aposentadoria por invalidez (ID 103328465).
Decorrido, “in albis”, o prazo para contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte Regional.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6150544-82.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MARIA APARECIDA DE CASTRO RAMALHO
Advogado do(a) APELANTE: ARLETE ALVES DOS SANTOS MAZZOLINE - SP141845-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Discute-se nos autos o direito da parte autora à concessão de benefício por incapacidade.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
A cobertura da contingência invalidez/incapacidade permanente é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II - Da Seguridade Social, no artigo 201, inciso I, da Constituição da
República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade
avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
Com efeito, a Reforma da Previdência de 2019 (EC nº 103/2019) modificou a denominação da
invalidez para incapacidade permanente.
A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social
(PBPS), disciplina em seus artigos 42, caput, e 59, caput, as condições à concessão de
benefícios por incapacidade, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”
Aaposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 do PBPS, é o benefício destinado ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o seu
trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou em
razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Desse modo, o evento determinante para a concessão desses benefícios consiste na
incapacidade para o trabalho.
Na hipótese de incapacidade temporária, ainda que de forma total e permanente, será cabível a
concessão de auxílio-doença, o qual posteriormente será convertido em aposentadoria por
invalidez (caso sobrevenha incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se for extinta a
incapacidade temporária e o segurado permanecer com sequela permanente que enseje a
redução da sua capacidade laboral) ou cessado (quando ocorrer a cura do segurado).
São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de
segurado, a carência e a incapacidade laborativa.
1. O primeiro, consiste na qualidade de segurado, consoante o art. 15 da LBPS. É cediço que
mantém a qualidade de segurado aquele que, ainda que esteja sem recolher as contribuições,
preserve todos os seus direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, ao
qual a doutrina denominou "período de graça", de acordo com o tipo de segurado e a sua
situação, conforme dispõe o art. 15 da Lei de Benefícios, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação
dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Releva observar que o § 1º do art. 115 da Lei nº 8.213/1991 prorroga o período de graça por 24
meses àqueles que contribuíram por mais de 120 meses, sem interrupção que acarrete a perda
da qualidade de segurado.
Ademais, restando comprovado o desemprego do segurado, mediante registro perante o órgão
próprio do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos do inciso II ou do § 1º do
art. 115 da Lei de Benefícios serão acrescidos de mais 12 meses (art. 15, § 2°, da Lei n.
8.213/1991).
É evidente que a situação de desemprego deve ser comprovada, pela inscrição perante o
Ministério do Trabalho (artigo 15, § 2º, da Lei n.8.213/1991), ou por qualquer outro meio
probatório (v.g., prova documental, testemunhal, indiciária etc.).
Importa esclarecer que, consoante o disposto no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 14
do Decreto nº 3.048/99 (que aprova o Regulamento da Previdência Social – RPS), com a redação
dada pelo Decreto nº 4.032/2001, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do
segundo mês seguinte ao término do prazo estabelecido no art. 30, inciso II, da Lei nº 8.212/1991
para recolhimento da contribuição, ensejando, por conseguinte, a caducidade do direito
pretendido, exceto na hipótese do § 1º do art. 102 da Lei nº 8.213/91, isto é, quando restar
comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir foi decorrente da
incapacidade laborativa.
Frise-se que com o decurso do período de graça, as contribuições anteriores à perda da
qualidade de segurado apenas serão computadas para efeitos de carência após o recolhimento
pelo segurado, a partir da nova filiação ao RGPS, conforme o caso, de, ao menos, 1/3 (um terço)
do número de contribuições necessárias para o cumprimento da carência exigida para benefícios
por incapacidade, ou seja, quatro contribuições (durante a vigência do art. 24, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91) ou metade deste número de contribuições (de acordo com o art. 27-A da Lei de
Benefícios, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
2. O segundo requisito diz respeito à carência de 12 (doze) contribuições mensais, consoante o
disposto no art. 25 da Lei nº 8.213/1991, a saber:
“Art.25.A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
No entanto, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após
filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas no art. 151 da Lei de Benefícios, que
dispõe:
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada.(Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)”
3. O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho de modo permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e na incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos
(auxílio-doença).
Anote-se que para a concessão de benefícios por incapacidade é preciso a demonstração de
que, ao tempo da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto se a
incapacidade sobrevier em decorrência de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
Estabelecem os artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
“Art. 42. (...)
§ 2ºA doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
“Art. 59. (...)
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Logo, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura
óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou
agravamento da moléstia, ex vi do art. 42, § 2º, da Lei de Benefícios.
Na hipótese de ser reconhecida a incapacidade somenteparcialpara o trabalho, o magistrado
deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Ademais, pode conceder auxílio-acidente, nos
moldes do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, se a incapacidade parcial decorre de acidente de
trabalho ou de qualquer natureza, ou ainda, de doença profissional ou do trabalho (art. 20, incisos
I e II, da Lei de Benefícios).
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o
magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros
elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais,
sociais e profissionais.
Confira-se alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que dizem respeito a
esse tema:
Súmula 47 da TNU: "Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez".
Súmula 53 da TNU:"Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social".
Súmula 77 da TNU:"O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual".
O art. 43, §1º, da Lei nº 8.213/1991 preceitua que a concessão da aposentadoria por invalidez
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame
médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial
consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o
segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido
entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da
Seguridade Social.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência
permanente de outra pessoa (grande invalidez), é possível, com supedâneo no art. 45 da Lei de
Benefícios, o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez.
DO CASO CONCRETO
Sustenta a parte autora, na peça exordial, que é trabalhadora rural braçal, porém, em razão de
problemas de saúde, não tem mais condições de exercer a sua atividade laboral (ID 103328412).
Conforme a perícia médica judicial, a parte autora é acometida de “Gonartrose CID M17” e
“Lombalgia CID M545” (resposta ao quesito “b” do Juízo, ID 103328435 - Pág. 4).
De acordo com a conclusão do laudo pericial acostado aos autos: “Mediante o estudo do
processo e evidências do exame pericial, conclui-se que a periciada apresenta uma incapacidade
total e definitiva, inapta para atividades laborativas, considerando ainda sua idade e nível
educacional." (ID 103328435 - Pág. 5).
Consta do laudo pericial que a autora tem diagnóstico desde 2012 (cf. resposta ao quesito “h” do
Juízo, ID 103328435 - Pág. 5). Não houve indicação, pela perita do juízo, da data provável de
início da incapacidade (vide quesito “j” do Juízo, considerado prejudicado pela expert, ID
103328435 - Pág. 5).
Em resposta ao quesito “j” do Juízo, a perita afirmou que a incapacidade é decorrente de
“agravamento do quadro”, no entanto, não justificou este ponto do laudo pericial e não especificou
a partir de quando teria ocorrido o agravamento (ID 103328435 - Pág. 5).
É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973 e
do artigo 479 do CPC/2015.
Lecionam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero que:
“Quanto à valoração da perícia, é certo que não fica o juiz adstrito às conclusões do perito. Tendo
aplicação o princípio da persuasão racional (art. 479), pode o juiz, para julgar o mérito, fundar-se
em prova que aponta em sentido contrário à prova pericial, desde que fundamente o seu julgado,
demonstrando as razões que o levaram a desconsiderar o resultado da prova pericial. O mesmo
se diga em relação à denominada 'segunda perícia': ela não se sobrepõe ou substitui a primeira,
devendo ambas ser cotejadas, segundo o prudente critério do magistrado.” (MARINONI, Luiz
Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Manual do Processo Civil. 5. ed. São
Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 349).
Nesse passo, depreende-se do laudo pericial judicial (ID 103328435) e do conjunto probatório
acostado aos autos, notadamente pelo exame de ressonância magnética do joelho (ID
103328426 - Pág. 2), que os problemas de saúde da autora que ensejaram sua incapacidade
foram diagnosticados em novembro/2012.
Pois bem.
Na espécie, o pedido de concessão de benefício por incapacidade foi julgado improcedente por
entender aMM. Magistradade primeira instância que restou configurada a hipótese de lesão
preexistente ao reingresso ao RGPS. Destaco, da sentença vergastada, o seguinte excerto:
“[...]
O pedido fundamenta-se no fato de que a autora faria jus ao benefício pleiteado uma vez que é
segurada especial da previdência e, com isso, seus problemas de saúde a tornariam inválida para
o labor.
Contudo, conforme se verifica da inicial, não consta nos autos nenhuma prova contemporânea do
trabalho rural desenvolvido pela autora. Em que pese a CTPS juntada às fls.09/14 constar dois
vínculos da autora como trabalhadora rural, o último vínculo data do ano de 1987, ou seja, há
mais de 30 anos.
Nesse sentido, houve ainda o julgamento proferido pelo TRF da 3ª Região nos autos da apelação
nº 0010624-11.2013.4.03.9999/SP, que não reconheceu o labor rural desenvolvido pela autora,
nos seguintes termos: "As testemunhas ouvidas (fls. 55/56) afirmaram conhecê-la e que ela
trabalhou na lavoura entre 1995 e 2000 para o Sr. Jorge Ota, não informando mais sobre seu
labor rural. Desse modo, não havendo comprovação do tempo de carência exigido em lei para a
concessão do benefício, que, neste caso, seria de 180 meses, não há como concedê-lo".
Com isso, ainda que o Laudo Pericial tenha sido positivo no sentido de incapacidade total e
permanente, não há nos autos qualquer prova do labor rural exercido pela autora, e, com isso, da
sua qualidade de segurada especial.
Cabe ressaltar também, que segundo o Laudo Pericial de fls.37/45 os problemas de saúde da
autora, os quais ensejaram a incapacidade, data de novembro de 2012, data esta em que a
autora não era segurada da previdência social.
Conforme se verifica do CNIS de fls.70/74, a autora iniciou os recolhimentos como contribuinte
individual a partir do ano de 01/05/2015 (fl.72), três anos após o diagnóstico médico, apontado
pela perícia judicial. Antes disso, o último recolhimento data do mês de novembro de 2000.
Portanto, a autora não estava segurada quando do surgimento da moléstia, seja como segurada
especial, seja como segurada facultativa.
[...]” (ID 103328460 - Pág. 2, grifos no original).
Observa-se que, de fato, não há nos autos qualquer prova contemporânea do trabalho rural
alegadamente desenvolvido pela parte autora. Apesar de na CTPS acostada sob ID 103328425 -
Págs. 1/2 constar três vínculos da autora como trabalhadora rural, o último vínculo tem como data
fim 25/10/2000, ou seja, há mais de 19 anos. Desse modo, não restou comprovada a qualidade
de segurada especial da parte autora.
Cumpre destacar que, consoante o laudo pericial judicial, os problemas de saúde da autora, que
ensejaram a incapacidade laborativa, foram diagnosticados em 2012, quando a autora não estava
filiada ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
Em consulta ao CNIS, verifico que, de fato, a parte autora apenas reingressou no Regime Geral
de Previdência Social – RGPS como contribuinte individual em 01/05/2015, quando já tinha
ciência de que estava doente, ou seja, quase três anos após o diagnóstico médico indicado pela
perícia judicial. Antes dessa nova filiação, o último vínculo constante no CNIS teve data de saída
em 25/10/2000.
Registre-se que não foi demonstrado pela parte autora, ora apelante, mediante documentação
médica suficiente, que houve, de fato, efetiva progressão ou agravamento da moléstia que a
acomete apenas após a sua nova filiação ao RGPS. Com efeito, o fato de constar no laudo
pericial a existência de agravamento, sem outras especificações, por si só, não tem o condão de
ensejar a concessão de benefício por incapacidade.
Destarte, mesmo tendo sido constatada pela perita médica judicial a existência de incapacidade
laborativa total e permanente da autora, uma vez configurada a existência de doença preexistente
ao ingresso no RGPS como contribuinte individual em 01/05/2015, conforme inteligência dos
artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, não é cabível a concessão de benefício por
incapacidade.
Nesse cenário, impõe-se a improcedência da pretensão. Portanto, a sentença deve ser mantida.
Honorários advocatícios
Em razão da sucumbência recursal, mantenho a condenação da parte autora em custase
despesas processuaise majoro os honorários advocatícios fixados na sentença em 2% (doispor
cento), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 4º, III, 5º, e 11,do CPC, suspensa a sua
exigibilidade, tendo em vista o benefício da assistência judiciária gratuita.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da segurada, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE
QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE AO REINGRESSO NO RGPS.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO.
APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
2. Observa-se que, de fato, não há nos autos qualquer prova contemporânea do trabalho rural
alegadamente desenvolvido pela parte autora. Apesar de na CTPS acostada sob ID 103328425 -
Págs. 1/2 constar três vínculos da autora como trabalhadora rural, o último vínculo tem como data
fim 25/10/2000, ou seja, há mais de 19 anos. Desse modo, não restou comprovada a qualidade
de segurada especial da parte autora.
3. Cumpre destacar que, consoante o laudo pericial judicial, os problemas de saúde da autora,
que ensejaram a incapacidade laborativa, foram diagnosticados em 2012, quando a autora não
estava filiada ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
4. Em consulta ao CNIS, verifica-se que, de fato, a parte autora apenas reingressou no Regime
Geral de Previdência Social – RGPS como contribuinte individual em 01/05/2015, quando já tinha
ciência de que estava doente, ou seja, quase três anos após o diagnóstico médico indicado pela
perícia judicial. Antes dessa nova filiação, o último vínculo constante no CNIS teve data de saída
em 25/10/2000.
5. Registre-se que não foi demonstrado pela parte autora, ora apelante, mediante documentação
médica suficiente, que houve, de fato, efetiva progressão ou agravamento da moléstia que a
acomete apenas após a sua nova filiação ao RGPS. Com efeito, o fato de constar no laudo
pericial a existência de agravamento, sem outras especificações, por si só, não tem o condão de
ensejar a concessão de benefício por incapacidade.
6. Destarte, mesmo tendo sido constatada pela perita médica judicial a existência de
incapacidade laborativa total e permanente da autora, uma vez configurada a existência de
doença preexistente ao ingresso no RGPS como contribuinte individual em 01/05/2015, conforme
inteligência dos artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, não é cabível a concessão de
benefício por incapacidade.
7.É assente que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do artigo 436 do CPC/1973
e do artigo 479 do CPC/2015.
8. Reconhecimento da improcedência da pretensão.
9. Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da segurada, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
