Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5065974-20.2018.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/02/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 01/03/2019
Ementa
E M E N T A
AUXÍLIO-DOENÇA PARENTAL. AUSÊNCIA DE AMPARO LEGAL. PRINCÍPIOS DA
LEGALIDADE E DA CONTRAPARTIDA. ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO
LEGISLADOR POSITIVO. VEDAÇÃO. BENEFÍCIO INDEVIDO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
- Pretende a autora a concessão de auxílio-doença parental, ou seja, o afastamento remunerado
de suas atividades laborais para acompanhar e cuidar de seu filho menor, portador de Síndrome
de Down e outras doenças associadas, o qual necessita de cuidados constantes. Segundo consta
da inicial, a autora não está incapacitada pra o exercício de suas atividades laborais.
- Indevida a concessão do benefício pretendido, por ausência de previsão legal (artigo 5º, II e 37,
caput, da Constituição Federal).
- Ademais, é vedado ao Poder Judiciário atuar como legislador positivo, em observância ao
princípio da separação de poderes.
- Também é vedada a criação de uma nova espécie de benefício previdenciário, ou mesmo a
concessão extensiva, sem a indicação da respectiva fonte de custeio, em evidente afronta ao art.
195, §5º da Constituição Federal.
- Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 17% (dezessete por cento) sobre o valor atualizado da causa, já
majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5065974-20.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: TAMARA ADRIANA FERRARI
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO (198) Nº 5065974-20.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: TAMARA ADRIANA FERRARI
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Cuida-se de apelação interposta pela
parte autora em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício
de auxílio-doença parental.
Em suas razões, a autora alega, preliminarmente, nulidade da sentença por cerceamento de
defesa pela não realização de perícia médica. No mérito, sustenta fazer jus ao afastamento
remunerado de suas atividades laborais para cuidar da saúde de sua filha menor, que se
encontra internada em hospital em estado vegetativo, em decorrência de meningite, necessitando
de cuidados constantes.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
APELAÇÃO (198) Nº 5065974-20.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: TAMARA ADRIANA FERRARI
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço do recurso, porquanto
presentes os requisitos de admissibilidade.
No caso dos autos, a parte autora, ajuizou a presente ação em face do INSS visando à
concessão de auxílio-doença parental para afastamento remunerado de suas atividades laborais
para cuidar de sua filha menor, que é portadora de meningite e necessita de cuidados constantes.
A r. sentença julgou improcedente o pedido, ao fundamento de inexistir a possibilidade de
concessão de auxílio-doença de modo extensivo a familiares do enfermo.
De fato, a teor do artigo 59 da Lei 8.213/1991, a disposição legal autoriza a concessão de auxílio-
doença apenas ao segurado que "havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência
exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais
de 15 (quinze) dias consecutivos".
Segundo consta da inicial, a autora não está incapacitada para o exercício de suas atividades
laborais.
Não obstante tratar-se de uma situação delicada, é indevida a concessão do benefício pretendido,
haja vista a ausência de previsão legal.
Ademais, tal como consignado pelo e. Desembargador Gilberto Jordan, nos autos da Apelação
Cível 0020095-46.2016.4.03.9999, "é vedado ao Poder Judiciário atuar como legislador positivo,
ainda mais, na hipótese, de se criar uma nova espécie de benefício previdenciário, sem a
indicação da respectiva fonte de custeio, em evidente afronta ao art. 195, §5º da Constituição
Federal".
Transcrevo, por oportuno, referido dispositivo legal que conforma o princípio da contrapartida:
“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta,
nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
(...)
§ 5º Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido
sem a correspondente fonte de custeio total.”
Nesse passo, não se revela possível, ao Poder Judiciário, sob fundamento de aplicação de
princípios constitucionais, conceder, em sede jurisdicional, benefício previdenciário, quando
inexistente, na lei, a indicação da correspondente fonte de custeio total, sob pena de o órgão
judicante, se assim proceder, atuar na condição de legislador positivo, violando, desse modo, o
princípio da separação de poderes, previsto no artigo 2º da Constituição Federal.
Ademais, a "concessão extensiva" de benefício previdenciário, além de submetida à regra da
contrapartida acima mencionada, também depende, para efeito de sua legítima adequação ao
texto constitucional, da observância do princípio da reserva de lei formal.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado, mutatis mutandis:
REVISÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 9.032/95 A
BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DE SUA VIGÊNCIA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO,
NESSE DIPLOMA LEGISLATIVO, DE SUA APLICAÇÃO RETROATIVA. INEXISTÊNCIA, AINDA,
NA LEI, DE CLÁUSULA INDICATIVA DA FONTE DE CUSTEIO TOTAL CORRESPONDENTE À
MAJORAÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO
LEGISLADOR POSITIVO. VEDAÇÃO. RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
- Os benefícios previdenciários devem regular-se pela lei vigente ao tempo em que preenchidos
os requisitos necessários à sua concessão. Incidência, nesse domínio, da regra "tempus regit
actum", que indica o estatuto de regência ordinariamente aplicável em matéria de instituição e/ou
de majoração de benefícios de caráter previdenciário. Precedentes.
- A majoração de benefícios previdenciários, além de submetida ao postulado da contrapartida
(CF, art. 195, § 5º), também depende, para efeito de sua legítima adequação ao texto da
Constituição da República, da observância do princípio da reserva de lei formal, cuja incidência
traduz limitação ao exercício da atividade jurisdicional do Estado. Precedentes.
- Não se revela constitucionalmente possível, ao Poder Judiciário, sob fundamento de isonomia,
estender, em sede jurisdicional, majoração de benefício previdenciário, quando inexistente, na lei,
a indicação da correspondente fonte de custeio total, sob pena de o Tribunal, se assim proceder,
atuar na anômala condição de legislador positivo, transgredindo, desse modo, o princípio da
separação de poderes. Precedentes.
- A Lei nº 9.032/95, por não veicular qualquer cláusula autorizadora de sua aplicação retroativa,
torna impertinente a invocação da Súmula 654/STF." (STF; RE-AgR 461904RE-AgR; AG. REG.
NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO)
Portanto, a concessão do benefício pretendido é ilegal e despropositada, por violar os princípios
da legalidade (artigo 5º, II e 37, caput, da Constituição da República) e da contrapartida (artigo
195, § 5º, da Constituição Federal).
Não cabe ao Judiciário conceder benesses não previstas no direito positivo, pois se assim
pudesse fazê-lo, agiria com base no arbítrio, dando margem a toda sorte de idiossincrasias na
interpretação do fenômeno jurídico.
Não ofende a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da CF/88) a decisão judicial que cumpre
os termos da Constituição e das leis do país.
Por fim, tomo a liberdade de transcrever trecho de livro antigo, e pertinente, de Elcir Castelo
Branco, a respeito de concessões indevidas de benefício com base em sentimentalismos: "A
previdência em si já é um instrumento social, por isso não vinga o pretexto de aplicar a lei com
vista no interesse social. Este raciocínio é falso. O interesse social maior é que o seguro funcione
bem, conferindo as prestações a que se obrigou. Se lhe é transmitida uma carga acima do
previsto, compromete-se a sua liquidez financeira: ponto nevrálgico da eficiência de qualquer
seguro. O prius que se outorga sairá do próprio conjunto de segurados, em virtude da
pulverização do risco entre eles. Nesta circunstância o seguro se torna custoso e socialmente
desinteressante, indo refletir no preço dos bens produzidos, influindo de maneira maléfica sobre
os demais contribuintes, os quais têm de suportar o que se outorga alargando as obrigações do
órgão segurador em favor de pretensões lamuriosas" (Elcir Castello Branco, Segurança Social e
Seguro Social, 1º volume, Livraria e Editora Universitária de Direito Ltda, 1975, São Paulo,
páginas 127/128).
Dessa feita, não há como ser concedido o benefício vindicado, por falta de amparo legal, sendo
impositiva a manutenção da r. sentença.
Por consequência, a preliminar aventada de cerceamento de defesa pela não realização de
perícia médica fica prejudicada, já que é totalmente despropositada e irrelevante para a solução
da lide.
Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 17% (dezessete por cento) sobre o valor atualizado da causa, já
majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
Ante o exposto, conheço da apelação e nego-lhe provimento.
É o voto.
E M E N T A
AUXÍLIO-DOENÇA PARENTAL. AUSÊNCIA DE AMPARO LEGAL. PRINCÍPIOS DA
LEGALIDADE E DA CONTRAPARTIDA. ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO
LEGISLADOR POSITIVO. VEDAÇÃO. BENEFÍCIO INDEVIDO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
- Pretende a autora a concessão de auxílio-doença parental, ou seja, o afastamento remunerado
de suas atividades laborais para acompanhar e cuidar de seu filho menor, portador de Síndrome
de Down e outras doenças associadas, o qual necessita de cuidados constantes. Segundo consta
da inicial, a autora não está incapacitada pra o exercício de suas atividades laborais.
- Indevida a concessão do benefício pretendido, por ausência de previsão legal (artigo 5º, II e 37,
caput, da Constituição Federal).
- Ademais, é vedado ao Poder Judiciário atuar como legislador positivo, em observância ao
princípio da separação de poderes.
- Também é vedada a criação de uma nova espécie de benefício previdenciário, ou mesmo a
concessão extensiva, sem a indicação da respectiva fonte de custeio, em evidente afronta ao art.
195, §5º da Constituição Federal.
- Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 17% (dezessete por cento) sobre o valor atualizado da causa, já
majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC.
Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação e lhe negar provimento, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA