Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5076636-43.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
30/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO.
INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
1. Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
2. Constatada a perda da qualidade de segurado impõe-se a improcedência da pretensão.
3. Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5076636-43.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: MARIA REGINA DOS SANTOS ZANQUE
Advogado do(a) APELADO: ELIAS SALES PEREIRA - SP304234-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5076636-43.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA REGINA DOS SANTOS ZANQUE
Advogado do(a) APELADO: ELIAS SALES PEREIRA - SP304234-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentençaque julgou procedente em parte o
pedido inicial, para CONDENAR a parte requerida a conceder o benefício de auxílio-doença a
partir da data do laudo (23/02/2018). Indeferida a antecipação dos efeitos da tutela. Discriminados
os consectários, com verba honorária fixada à ordem de 5% do valor das prestações vencidas até
a sentença (ID8602566 – Pág. 04).
A sentença foi submetida à remessa necessária.
Em suas razões recursais, o INSSsustentaa ausência de preenchimento dos requisitos legais à
concessão do benefício, alegando a falta da qualidade de segurado. Pugna pela reforma para que
seja julgado improcedente o pedido. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Aparte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
sd
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5076636-43.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA REGINA DOS SANTOS ZANQUE
Advogado do(a) APELADO: ELIAS SALES PEREIRA - SP304234-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva (Relatora):
DO REEXAME NECESSÁRIO E DO RECURSO DE APELAÇÃO
Preliminarmente
A sentença foi publicada na vigência do CPC de 2015 (após 18/03/2016), razão pela qual aplica-
se o Enunciado Administrativo nº 3, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: " Aos
recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de
18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo
CPC".
Depreende-se do artigo 496, inciso I, § 3º, inciso I, que apenas as causas cuja condenação
alcançar 1.000 (mil) salários mínimos devem ser submetidas à remessa necessária.
Não se desconhece que, sob a égide do CPC de 1973, o C. STJ cristalizou o entendimento no
sentido de que era obrigatória a remessa necessária na hipótese de sentença ilíquida contra a
União e suas autarquias, inclusive o INSS, conforme o precedente emanado do julgamento do
Recurso Especial nº 1.101.727/PR, sob a técnica dos repetitivos (Rel. Min. Hamilton Carvalhido,
Corte Especial, j. 04/11/2009). Tendo, inclusive, editado a Súmula 490 que estabelece que: "A
dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for
inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas" (STJ, Corte Especial, j.
28/06/2012).
Verifica-se, entretanto, que o C. STJ, aplicando a técnica do overrinding, em homenagem à
redação do artigo 496, inciso I, § 3º, inciso I, do CPC de 2015, revisitou o tema anteriormente
professado no Recurso Especial nº 1.101.727/PR, quanto às demandas previdenciárias,
considerando que as condenações nesses casos, ainda que ilíquidas, regra geral não superam o
valor de 1.000 (mil) salários mínimos, concluindo, assim, pela dispensa da remessa necessária.
Precedentes: STJ, REsp 1844937/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 22/11/2019; TRF 3ª Região, 9ª Turma,
Remessa Necessária Cível - 6078868-74.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal
GILBERTO RODRIGUES JORDAN, j. 02/04/2020.
Nesse diapasão, ainda que aparentemente ilíquida a sentença, resta evidente que a condenação
ou o proveito econômico pretendido pela parte autora não excede o novo valor de alçada do CPC
de 2015, consistente em mil salários mínimos.
Assim sendo, não conheço da remessa oficial.
DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA
A cobertura da contingência invalidez/incapacidade permanente é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II - Da Seguridade Social, no artigo 201, inciso I, da Constituição da
República, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, in verbis:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência
Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade
avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”
Com efeito, a Reforma da Previdência de 2019 (EC nº 103/2019) modificou a denominação da
invalidez para incapacidade permanente.
A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social
(PBPS), disciplina em seus artigos 42, caput, e 59, caput, as condições à concessão de
benefícios por incapacidade, in verbis:
“Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida,
será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.”
“Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o
período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua
atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.”
Aaposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 do PBPS, é o benefício destinado ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Oauxílio-doençaé devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o seu
trabalho ou atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos, por motivo de doença ou em
razão de acidente de qualquer natureza (artigos 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Desse modo, o evento determinante para a concessão desses benefícios consiste na
incapacidade para o trabalho.
Na hipótese de incapacidade temporária, ainda que de forma total e permanente, será cabível a
concessão de auxílio-doença, o qual posteriormente será convertido em aposentadoria por
invalidez (caso sobrevenha incapacidade total e permanente), auxílio-acidente (se for extinta a
incapacidade temporária e o segurado permanecer com sequela permanente que enseje a
redução da sua capacidade laboral) ou cessado (quando ocorrer a cura do segurado).
São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a qualidade de
segurado, a carência e a incapacidade laborativa.
1. O primeiro, consiste na qualidade de segurado, consoante o art. 15 da LBPS. É cediço que
mantém a qualidade de segurado aquele que, ainda que esteja sem recolher as contribuições,
preserve todos os seus direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, ao
qual a doutrina denominou "período de graça", de acordo com o tipo de segurado e a sua
situação, conforme dispõe o art. 15 da Lei de Benefícios, in verbis:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício, exceto do auxílio-acidente; (Redação
dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver
pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da
qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado
desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério
do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a
Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no
Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês
imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.”
Releva observar que o § 1º do art. 15 da Lei nº 8.213/1991 prorroga o período de graça por 24
meses àqueles que contribuíram por mais de 120 meses, sem interrupção que acarrete a perda
da qualidade de segurado.
Ademais, restando comprovado o desemprego do segurado, mediante registro perante o órgão
próprio do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos do inciso II ou do § 1º do
art. 15 da Lei de Benefícios serão acrescidos de mais 12 meses (art. 15, § 2°, da Lei n.
8.213/1991).
É evidente que a situação de desemprego deve ser comprovada, pela inscrição perante o
Ministério do Trabalho (artigo 15, § 2º, da Lei n.8.213/1991), ou por qualquer outro meio
probatório (v.g., prova documental, testemunhal, indiciária etc.).
Importa esclarecer que, consoante o disposto no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 14
do Decreto nº 3.048/99 (que aprova o Regulamento da Previdência Social – RPS), com a redação
dada pelo Decreto nº 4.032/2001, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do
segundo mês seguinte ao término do prazo estabelecido no art. 30, inciso II, da Lei nº 8.212/1991
para recolhimento da contribuição, ensejando, por conseguinte, a caducidade do direito
pretendido, exceto na hipótese do § 1º do art. 102 da Lei nº 8.213/91, isto é, quando restar
comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir foi decorrente da
incapacidade laborativa.
Frise-se que com o decurso do período de graça, as contribuições anteriores à perda da
qualidade de segurado apenas serão computadas para efeitos de carência após o recolhimento
pelo segurado, a partir da nova filiação ao RGPS, conforme o caso, de, ao menos, 1/3 (um terço)
do número de contribuições necessárias para o cumprimento da carência exigida para benefícios
por incapacidade, ou seja, quatro contribuições (durante a vigência do art. 24, parágrafo único, da
Lei nº 8.213/91) ou metade deste número de contribuições (de acordo com o art. 27-A da Lei de
Benefícios, incluído pela Lei nº 13.457/2017).
2. O segundo requisito diz respeito à carência de 12 (doze) contribuições mensais, consoante o
disposto no art. 25 da Lei nº 8.213/1991, a saber:
“Art.25.A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende
dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”
No entanto, independe de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, assim como ao segurado que, após
filiar-se ao RGPS, for acometido das doenças elencadas no art. 151 da Lei de Benefícios, que
dispõe:
“Art. 151. Até que seja elaborada a lista de doenças mencionada no inciso II do art. 26, independe
de carência a concessão de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez ao segurado que,
após filiar-se ao RGPS, for acometido das seguintes doenças: tuberculose ativa, hanseníase,
alienação mental, esclerose múltipla, hepatopatia grave, neoplasia maligna, cegueira, paralisia
irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose
anquilosante, nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante),
síndrome da deficiência imunológica adquirida (aids) ou contaminação por radiação, com base
em conclusão da medicina especializada.(Redação dada pela Lei nº 13.135, de 2015)”
3. O terceiro requisito consiste na incapacidade para o trabalho de modo permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e na incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos
(auxílio-doença).
Anote-se que para a concessão de benefícios por incapacidade é preciso a demonstração de
que, ao tempo da filiação ao RGPS, o segurado não era portador da enfermidade, exceto se a
incapacidade sobrevier em decorrência de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
Estabelecem os artigos 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei nº 8.213/1991, in verbis:
“Art. 42. (...)
§ 2ºA doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de
Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.”
“Art. 59. (...)
§ 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência
Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a
incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão.
(Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”
Logo, a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao RGPS não configura
óbice à concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade decorrer de progressão ou
agravamento da moléstia, ex vi do art. 42, § 2º, da Lei de Benefícios.
Na hipótese de ser reconhecida a incapacidade somenteparcialpara o trabalho, o magistrado
deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Ademais, pode conceder auxílio-acidente, nos
moldes do artigo 86 da Lei nº 8.213/1991, se a incapacidade parcial decorre de acidente de
trabalho ou de qualquer natureza, ou ainda, de doença profissional ou do trabalho (art. 20, incisos
I e II, da Lei de Benefícios).
A existência de incapacidade, total ou parcial, é reconhecida mediante realização de perícia
médica, por perito nomeado pelo Juízo, consoante o Código de Processo Civil. No entanto, o
magistrado não está adstrito unicamente às conclusões periciais, podendo valer-se de outros
elementos constantes dos autos para formar a sua convicção, tais como questões pessoais,
sociais e profissionais.
Confira-se alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) que dizem respeito a
esse tema:
Súmula 47 da TNU: "Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez".
Súmula 53 da TNU:"Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social".
Súmula 77 da TNU:"O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual".
O art. 43, §1º, da Lei nº 8.213/1991 preceitua que a concessão da aposentadoria por invalidez
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva para o trabalho, mediante exame
médico-pericial a cargo da Previdência Social. Todavia, o entendimento jurisprudencial
consolidou-se no sentido de que também enseja direito ao aludido benefício a incapacidade
parcial e definitiva para o trabalho, desde que atestada por perícia médica, que inabilite o
segurado de exercer sua ocupação habitual, inviabilizando a sua readaptação. Referido
entendimento consubstancia o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da
Seguridade Social.
Acrescente-se que em hipóteses específicas, quando demonstrada a necessidade de assistência
permanente de outra pessoa (grande invalidez), é possível, com supedâneo no art. 45 da Lei de
Benefícios, o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) ao valor da aposentadoria por invalidez.
DO CASO CONCRETO
Realizada a perícia médica em 22/01/2018, o laudo apresentado (23/02/2018 - ID8602521)
considerou a autora, nascida em 30/03/1972, trabalhadora rural (corte de cana), incapacitada total
e temporariamente para a atividade rural e para qualquer atividade laboral que exija o uso
repetitivo dos punhos e destreza manual. Isso em virtude de ser portadora de Síndrome do Túnel
de Carpo (CID G56) e Cisto de Pâncreas (CID k86).
Incontroversa a existência de incapacidade laboral da parte autora, remanescendo a discussão
apenas acerca da condição de segurada, qualidade apontada pelo INSS como faltante em suas
razões recursais.
No âmbitoadministrativo, do mesmo modo, o benefício restou indeferido pela entidade autárquica
ao fundamento de que faltavaa condição de segurada da parte autora(ID8602340).
A fim de comprovar o trabalho nas lidas campesinas, a parte autora apresentou sua CTPS com
os seguintes vínculos empregatícios: 08/07/1991 a 14/11/1991; 26/05/1993 a 08/06/1993;
26/05/1995 a 09/12/1995; 11/05/1998 a janeiro de 2000; 17/07/2001 a 21/11/2001; 27/05/2002 a
30/10/2002; 24/02/2003 a 01/11/2003 – Destilaria Alcídia S/A; 16/07/2004 a 27/01/2005;
01/07/2005 a 27/03/2006 – Usina de Açúcar Santa Teresinha Ltda; 16/10/2006 a (data ilegível) –
Usina de Açúcar Santa Teresinha Ltda; 02/06/2011 a 27/03/2013 – Usina de Açúcar Santa
Teresinha Ltda (ID8602346).
Consoante informações do CNIS (ID8602409) a parte autora laborou até 25/02/2013, diferença de
1 mês do quanto indicado em sua carteira profissional.
O perito fixou como data do início da incapacidade o ano de 2014, sem especificar uma data
possível para o surgimento damoléstia incapacitante. Diante de tal fato, mister analisar a
documentação médica acostada nos autos que serviram de indicativo para o apontamento da
referida data.
Oapontamento médico mais antigo que indicaa incapacidade laboral da parte autora data de
setembro de 2014, ocasião em que foi solicitada perícia médica com afastamento de 120 dias da
atividade laboral (ID8602351 - p. 2). O outro documento indicativo da mesma doença
incapacitante, por sua vez, data de novembro do mesmo ano (ID8602351 - p.1).
Assim sendo, entre o último vínculo laboral (27/03/2013) a setembro/2014 transcorreram quase
18 meses.
Nos termos do artigo 15, II e §§ 1º e 2º da Lei nº 8.213/91, o período de graça será de 12 meses,
após a cessação das contribuições; prorrogáveis para até 24 meses na hipótese de o segurado já
tiver pago mais de 120 contribuições previdenciárias; e, ainda, com a possibilidade do acréscimo
de mais 12 meses no caso de desemprego involuntário, totalizando 36 meses de período de
graça.
Assim, como as contribuições da parte autoraforam inferiores a 120 (cento e vinte) - somando-se
um total de 9 anos e 8 meses -, manteve a qualidade de seguradaaté 15/05/2014, não fazendo
jus ao recebimento do benefício.
Para prorrogar o referido período por mais 12 (doze) meses, necessário seria demonstrar seu
desemprego involuntário, situação que não foi sequer aventada nestes autos.
Consigno que a Terceira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, em proteção ao segurado
desempregado, não dispensou o ônus probatório da condição de desemprego, mas relativizou a
exigência de registro no órgão responsável do Ministério do Trabalho e da Previdência Social,
entendendo que, para fins de concessão de mais 12 meses do período de graça ao segurado
desempregado (art. 15, § 2º, da Lei nº 8.213/91), tal condição poderá ser demonstrada por outros
meios de provas, como o recebimento de seguro desemprego e a testemunhal.
Nesse sentido, confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. QUALIDADE DE SEGURADO. PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE GRAÇA.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DESEMPREGO PERANTE O ÓRGÃO DO MINISTÉRIO
DE TRABALHO OU DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. INSUFICIÊNCIA DE ELEMENTOS
PROBATÓRIOS. COMPROVAÇÃO DO DESEMPREGO POR OUTROS MEIOS DE PROVA.
POSSIBILIDADE. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.
1. No caso concreto, no que diz respeito à demonstração da qualidade de segurado do
recorrente, a Corte de origem, ao se embasar unicamente na ausência de comprovação do
desemprego perante o órgão do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, destoou da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, razão pela qual merece prosperar a irresignação.
2. Com efeito, segundo entendimento da Terceira Seção do STJ, a ausência de registro perante o
Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá ser suprida quando for comprovada a
situação de desemprego por outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal. (AgRg
na Pet 8.694/PR, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 26.9.2012, DJe
9.10.2012). (g. m.)
3. Recurso Especial provido, determinando o retorno dos autos à origem para que oportunize ao
recorrente a produção de provas e, então, julgue a causa como entender de direito.
(REsp 1668380/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
13/06/2017, DJe 20/06/2017)
A ausência de anotação na CTPS, por si só, não é o suficiente para comprovar a condição de
desemprego involuntário. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. QUALIDADE DE SEGURADO. MANUTENÇÃO. ART. 15 DA LEI
8.213/91. CONDIÇÃO DE DESEMPREGADO. DISPENSA DO REGISTRO PERANTE O
MINISTÉRIO COMPETENTE QUANDO A SITUAÇÃO DE DESEMPREGO FOR AFERIDA POR
OUTRAS PROVAS. PEDIDO NÃO VEICULADO NAS RAZÕES DO RECURSO ESPECIAL.
INOVAÇÃO DE TESE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I. "A ausência de anotação laboral na CTPS do requerido não é suficiente para comprovar a sua
situação de desemprego, já que não afasta a possibilidade do exercício de atividade remunerada
na informalidade." (Pet 7115/PR, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA
SEÇÃO, DJ 06/04/2010) (g. m.)
(...)
IV. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 13.701/SC, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em
03/05/2012, DJe 10/05/2012)
No mesmo sentido, cito julgadoproferido por esta E. 9ª. Turma:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. COMPANHEIRA E FILHOS MENORES.
DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO.
DECORRIDO MAIS DE DOZE MESES APÓS A CESSAÇÃO DO ÚLTIMO CONTRATO DE
TRABALHO. DESEMPREGO NÃO COMPROVADO. ARTIGO 15, §§ 1º E 2º DA LEI DE
BENEFÍCIO. INAPLICÁVEL A AMPLIAÇÃO DO PERÍODO DE GRAÇA.
(...)
- Cessado o último contrato de trabalho em 16 de janeiro de 2013, a qualidade de segurado foi
mantida até 15 de março de 2014, não abrangendo a data da prisão (23/05/2014).
- Inaplicáveis ao caso as ampliações do período de graça preconizadas pelo artigo 15, §§ 1º e 2º
da Lei nº 8.213/91.
- A mera ausência de registro em CTPS não constitui prova bastante da situação de desemprego.
Precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça. (g. m.)
- Ausente a qualidade de segurado ao tempo do recolhimento prisional, se torna inviável a
concessão do benefício previdenciário de auxílio-reclusão.
(...)
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5000608-82.2018.4.03.6103, Rel.
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 18/06/2020, Intimação
via sistema DATA: 19/06/2020)
Diante dos esclarecimentos, assiste razão ao INSS, visto que na época da DII não detinha mais a
autora qualidade de segurada (29/09/2014).
Desta forma, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício
pretendido.
Inverto o ônus da sucumbência que fica condicionada ao disposto no § 3º do artigo 98 do CPC,
por ser a parte beneficiária de assistência judiciária gratuita.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, não conheço da remessa oficial edou provimento à apelação do INSS.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO.
INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
1. Constituem requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: (I) a qualidade de
segurado; (II) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida; e (III) a
incapacidade para o trabalho de modo permanente e insuscetível de recuperação ou de
reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a
incapacidade temporária, por mais de 15 dias consecutivos (auxílio-doença), assim como a
demonstração de que, ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), o segurado
não apresentava a alegada doença ou lesão, salvo na hipótese de progressão ou agravamento
destas.
2. Constatada a perda da qualidade de segurado impõe-se a improcedência da pretensão.
3. Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária e dar provimento à apelação do
INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
