Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0025889-45.2020.4.03.6301
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
25/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/03/2022
Ementa
E M E N T A
AUXÍLIO-RECLUSÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. UNIÃO ESTÁVEL NÃO COMPROVADA.
IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0025889-45.2020.4.03.6301
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DE LURDES DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRENTE: PAULO MENDES SANTANA - SP348115-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0025889-45.2020.4.03.6301
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DE LURDES DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRENTE: PAULO MENDES SANTANA - SP348115-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual requereu a concessão/restabelecimento de
auxílio-reclusão.
O juízo singular proferiu sentença e julgou improcedente o pedido.
Inconformada, a demandante interpôs o presente recurso. Postulou a reforma da sentença.
Alegou, em síntese, que, no dia do encarceramento do segurado, vivia em união estável com o
segurado.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0025889-45.2020.4.03.6301
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DE LURDES DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRENTE: PAULO MENDES SANTANA - SP348115-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo à análise do recurso.
Além da previsão no art. 201, IV, da Constituição Federal, o auxílio-reclusão encontra-se
disciplinado pelo art. 80 da Lei 8.213/1991, art. 2º da Lei 10.666/2003 e arts. 116 a 119 do
Regulamento da Previdência Social (Decreto 3.048/1999).
Segundo Frederico Amado (“Curso de Direito e Processo Previdenciário”. 9. ed. Salvador:
JusPodivm, 2017, p. 931 e 945), trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes
do segurado de baixa renda recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa, nem
estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria de qualquer espécie ou abono de
permanência em serviço (benefício extinto).
Assim, para os dependentes terem direito a auxílio-reclusão, o instituidor deverá preencher
quatro requisitos: (i) qualidade de segurado; (ii) recolhimento à prisão; (iii) não receber
remuneração de empresa, nem estar recebendo auxílio-doença, aposentadoria ou abono de
permanência em serviço; e (iv) seu último salário de contribuição não pode ser superior ao
estipulado em portaria ministerial.
Por força do art. 26, I, da Lei 8.213/1991, o benefício independe de carência.
No caso em análise, a controvérsia recursal adstringe-se à questão da dependência econômica.
Nos termos do art. 16, § 4º, da Lei 8.213/1991, a dependência da companheira é presumida.
Interpretando-se o art. 1.723, caput, do Código Civil conforme a Constituição, nos moldes
fixados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADPF 132/RJ, pode-se dizer que a
união estável é a entidade familiar que se configura com a convivência pública, contínua e
duradoura de duas pessoas – de sexos diferentes ou do mesmo sexo –, estabelecida com o
objetivo de constituição de família.
Dada a informalidade com que surge, a união estável demanda maior esforço probatório por
parte dos conviventes, ao contrário do casamento, que, em regra, se prova pela simples
certidão do registro (art. 1.543, caput, do CC).
No caso concreto, a autora não se desincumbiu do seu ônus probatório.
O segurado foi preso em 26/10/2018 (evento 11, p. 9).
Os documentos trazidos pela demandante não revelam a existência de uma vida em comum
com o segurado na data da prisão. Embora a prova testemunhal corrobore a alegação de
convivência pública, contínua e duradoura entre a requerente e o instituidor do benefício, não é
suficiente, posto que não está apoiada em razoável início de prova material.
Como bem observou o juízo a quo:
“(...) Resta analisar o requisito da dependência da autora em relação ao segurado, eis que a
parte autora alega a sua qualidade de dependente enquanto companheira, para a obtenção do
benefício de auxílio-reclusão ora pretendido. Na tentativa de comprovar a aludida dependência,
apresentou a parte autora os seguintes documentos: ANEXO 02 (DOCUMENTOS ANEXOS DA
PETIÇÃO INICIAL.pdf): certidão de recolhimento prisional de Clodoaldo de Lima, em que
consta a data de 26/10/2018 como dia inicial da prisão, encontrando-se recolhido na
Penitenciária Flórida Paulista, desde 07/07/2019 (fl. 02); declaração de amásia da parte autora,
firmada em 29/06/2020, com firma reconhecida em cartório, acompanhada de duas
testemunhas, sendo informado como seu endereço a Travessa Dona Luiza Úrsula, n. 107-A,
Jardim Jaraguá – SP, em que declarou conviver maritalmente com o segurado há 25 anos e 03
meses (fl. 03). ANEXO 11 (DOCUMENTO ANEXO DA PETIÇÃO COMUM - JUNTADA DE.pdf):
cópia do processo administrativo referente ao NB 194.856.011 -6: comunicação de
indeferimento do benefício tendo em vista que não houve a comprovação do efetivo
recolhimento à prisão (fls. 05/06); envelope destinado à parte autora, sem indicação do
remetente, em que indica o nome da autora com a apresentação “para meu grande amor”,
remetido para a Travessa Dona Luiza Úrsula, n. 107 – A, Parque Industrial – Itaim Paulista –
São Paulo – SP, com data de postagem em 28/07/2020, cujo carimbo é proveniente de Flórida
Paulista (fl. 08); certidão de recolhimento prisional de Clodoaldo de Lima, em que consta a data
de 26/10/2018 como dia inicial da prisão, encontrando-se recolhido na Penitenciária Flórida
Paulista, desde 07/07/2019 (fl. 09).
A estes documentos materiais seguiu -se a prova oral , colhida em audiência pela Magistrada,
consubstanciada pelo depoimento pessoal da autora e pela oitiva de testemunha.
No que se refere ao depoimento pessoal, a parte autora relata ter 57 anos de idade; tem dois
filhos com o Sr. Clodoaldo de Lima. Sua filha mais velha tem 20 anos e o Clodoaldo passou a
morar com a autora após o nascimento da filha, há dezenove anos. A autora tem filhos de
outros relacionamentos. A autora trabalha como diarista, e agora fez um curso par trabalhar
como cuidadora. O Sr. Clodoaldo vivia com a autora como marido e mulher, os pertences dele
ficavam na casa da autora, até ele ser preso. O motivo da prisão foi por roubo de carga. O
segurado tem 51 anos; perguntada sobre os vínculos empregatícios do segurado terem
perdurado apenas por meses, não completando sequer dois anos ao todo, a autora alegou que
o Sr. Clodoaldo tem problemas de audição. Desconhece porque ele não parava nos empregos,
a autora disse que isto a incomodava. O Sr. Clodoaldo praticou roubos de cargas, não era
envolvido com álcool e drogas. Devido a estes problemas, a autora chegou a se separar, mas
retornou a conviver com o Sr. Clodoaldo em 2001, ela alegou precisar de ajuda para cuidar da
filha. Disse que nesta época o recluso voltou a trabalhar, informalmente, com pintura. O Sr.
Clodoaldo foi preso anteriormente, ele ficou quatro anos preso, e quando saiu voltou a
trabalhar. A autora requereu o benefício por duas vezes; na primeira vez foi pessoalmente ao
INSS, na segunda contratou um advogado para fazê-lo; alegou ter apresentado todos os
documentos pela primeira vez, mas mesmo assim o benefício foi negado. Segundo seu relato, a
funcionária do INSS lhe disse que poderia pedir o benefício em nome de seu filho mais novo,
que está com treze anos de idade. A autora sabe que o Sr. Clodoaldo tem filhos de outro
relacionamento, mas tanto a autora quanto o próprio segurado não têm contato com eles.
Quanto à oitiva da testemunha Anderson Pereira Pacheco, este afirmou conhecer a autora e o
segurado do bairro. Conhece o casal há aproximadamente doze anos. A autora e o segurado
moravam juntos e se apresentavam como se fossem casados. Não sabe com o que o Sr.
Clodoaldo trabalha, ou se comumente está ligado à atividade criminosa, ou ainda se foi preso
outras vezes. A Sra. Maria de Lurdes trabalha como auxiliar de limpeza. A autora e o segurado
têm filhos em comum, o mais novo chama-se Renato. Eles moraram sempre na mesma
residência.
Cotejando-se os elementos trazidos aos autos, vejo que não restou suficientemente
demonstrada tanto a existência de união estável, quanto a existência da alegada dependência
econômica da parte autora quando da data da reclusão do segurado. Os elementos de prova
colacionados pela parte autora são, em rigor, insuficientes para a comprovação dos fatos
articulados na exordial. Vejamos.
No que concerne à comprovação da união estável, a prova documental foi absolutamente frágil
neste sentido, haja vista que não há um comprovante de endereço sequer em nome do
segurado nos autos, anterior à data da reclusão. A autora cingiu-se a apresentar apenas uma
declaração de união estável firmada em cartório, posterior à reclusão, e um envelope destinado
à parte autora, sem indicação do remetente, com data de postagem também posterior à prisão.
A autora alega que teria permanecido com o segurado desde 2001, só se separando dele nas
ocasiões em que o segurado veio a ser preso. Diante de referido lapso temporal, não se afigura
crível não possuir provas documentais mais robustas para comprovar tal união, tais como
documentos médicos, cópias de contas de água, luz, telefone, entre outros.
E nem se alegue que a prova oral foi apta a infirmar tal entendimento, posto que frágil e
insuficiente a corroborar as alegações da inicial.
Inicialmente, a autora, em sua oitiva, não apresentou dados que demonstrassem que
efetivamente convivesse com o segurado. Tanto no depoimento pessoal quanto na prova
testemunhal não foram apresentadas minúcias sobre o alegado convívio marital anterior ao
casamento. Desta forma, não há como reconhecer a alegada união estável, de molde a ensejar
a concessão do benefício previdenciário postulado. Entendo que nada restou provado quanto à
convivência pública, duradoura, contínua, e ininterrupta entre a autora e o segurado
anteriormente à reclusão.
O mesmo sucede em relação à dependência econômica. A autora não apresentou qualquer
meio de prova hábil a demonstrar que fosse dependente do segurado. Ademais, consoante se
afere do depoimento pessoal colhido em audiência, a autora Maria de Lurdes declarou de forma
inquestionável ser pessoa economicamente ativa, dado ter sempre trabalhado como diarista,
durante todo o alegado período de convivência com o segurado. No que tange ao Sr.
Clodoaldo, este sequer tinha vínculo empregatício quando houve a prisão, haja vista que o
encerramento de seu último vínculo deu-se em novembro de 2017, ou seja, não auferia
qualquer renda quando de seu encarceramento. Aliás, importa registrar que o segurado
permanecia por meses nos empregos, em seu último vínculo empregatício permaneceu por
sete meses (de 11/04/2017 a 28/11/2017). Assim, diante deste histórico, não há como
considerar que a autora contava sobremaneira com a renda do recluso para o sustento do lar e
a sua própria sobrevivência. Ademais, ainda que se aceitasse a versão de que o segurado
laborava de maneira informal como pintor, como relatou a parte autora em seu depoimento
pessoal, eventual colaboração por ele dispensada não poderia ser considerada como
ininterrupta e, mais que isso, significativa para a provisão das necessidades da autora. Logo, a
renda obtida pelo segurado poder-se-ia representar um complemento da renda familiar, mas
nunca a única fonte de sustento da autora, quanto mais a fonte de subsistência da mesma. O
máximo poder-se-ia falar em eventual auxílio financeiro, o que certamente está longe de
caracterizar responsabilidade pela subsistência de alguém.
Ademais, as provas dos autos são contundentes em demonstrar ser a parte autora pessoa
economicamente ativa. Logo, a autora sempre arcou com suas despesas, e nesta condição
jamais poderia ser considerada como dependente do recluso para prover sua subsistência.
Assim, embora presentes os requisitos do recolhimento da condição prisional, da qualidade de
segurado, e do valor do salário-de-contribuição, não restou comprovada tanto a união estável
quanto a existência de dependência econômica entre a autora e o segurado, exigido pelo
ordenamento jurídico vigente para a concessão do benefício. Tudo considerado, portanto, a
improcedência da demanda é medida que se impõe.
(...)”. (destaquei)
Não demonstrada a condição de dependente, desnecessário prosseguir na análise dos demais
requisitos, pois a improcedência do pedido é medida que se impõe.
Nessa esteira, conclui-se que a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos, nos
termos do art. 46 da Lei 9.099/1995. Destaco que o Supremo Tribunal Federal, sob a
sistemática da repercussão geral, chancelou essa prática, fixando a seguinte tese:
“Não afronta a exigência constitucional de motivação dos atos decisórios a decisão de Turma
Recursal de Juizados Especiais que, em consonância com a Lei 9.099/1995, adota como
razões de decidir os fundamentos contidos na sentença recorrida” (STF, Plenário Virtual, RE
635.729 RG/SP, rel. min. Dias Toffoli, j. 30/6/2011, DJe 23/8/2011, Tema 451).
Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso da parte autora, nos termos da
fundamentação acima.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), limitados a 06 (seis) salários mínimos, devidos pela parte
recorrente vencida. A parte ré ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for
assistida por advogado ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte
autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos
valores mencionados ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
AUXÍLIO-RECLUSÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. UNIÃO ESTÁVEL NÃO COMPROVADA.
IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora,
nos termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
