
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5095234-35.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: GABRIELLE DOS SANTOS LOPES DE MELO
Advogados do(a) APELANTE: CAROLINE BEATRIZ ULLIAN PEREIRA - SP405811-N, JOSE AFFONSO CARUANO - SP101511-N, THAYS MARYANNY CARUANO FERREIRA DE SOUZA - SP312728-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5095234-35.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: GABRIELLE DOS SANTOS LOPES DE MELO
Advogados do(a) APELANTE: CAROLINE BEATRIZ ULLIAN PEREIRA - SP405811-N, JOSE AFFONSO CARUANO - SP101511-N, THAYS MARYANNY CARUANO FERREIRA DE SOUZA - SP312728-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício previdenciário de auxílio-reclusão.
A r. sentença julgou improcedente o pedido, por reputar não comprovada a união estável supostamente vivenciada entre a parte autora e o segurado recluso (id 302242495 – p. 1/3).
Em razões recursais, pugna a parte autora pela reforma da sentença e procedência do pedido, ao argumento de que restaram preenchidos os requisitos necessários a ensejar a concessão do benefício, notadamente no que se refere à sua dependência econômica em relação ao segurado recluso. Aduz ter sido comprovada a união estável vivenciada ao tempo da prisão. Sustenta que o requisito da baixa renda restou demonstrado, tendo em vista que, por ocasião do recolhimento prisional, seu companheiro se encontrava desempregado (id. 302242500 – p. 1/9).
Sem contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o relatório.
serg
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5095234-35.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: GABRIELLE DOS SANTOS LOPES DE MELO
Advogados do(a) APELANTE: CAROLINE BEATRIZ ULLIAN PEREIRA - SP405811-N, JOSE AFFONSO CARUANO - SP101511-N, THAYS MARYANNY CARUANO FERREIRA DE SOUZA - SP312728-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
DO AUXÍLIO-RECLUSÃO
Disciplinado inicialmente pelo art. 80 da Lei nº 8.213/91 (LBPS), "O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço".
Com a edição do Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, que aprovou o Regulamento da Previdência Social - RPS, foram definidos os critérios para a concessão do benefício (arts. 116/119).
Assim, a prestação é paga aos dependentes do preso, os quais detêm a legitimidade ad causam para pleiteá-lo, e não ele próprio, nos mesmos moldes da pensão por morte, consoante o disposto no art. 16 da LBPS.
Com efeito, as regras gerais da pensão por morte aplicam-se à concessão do auxílio-reclusão naquilo que se compatibilizar e não houver disposição em sentido contrário, no que se refere aos beneficiários, à forma de cálculo e à sua cessação, assim como é regido pela legislação vigente à data do ingresso à prisão, em obediência ao princípio tempus regit actum, sobretudo quanto à renda do instituidor. Precedentes STJ: 5ª Turma, RESP nº 760767, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 06/10/2005, DJU 24/10/2005, p. 377.
O segurado deve estar recolhido sob o regime fechado (penitenciária) ou semiaberto (colônia agrícola, industrial e similares), não cabendo a concessão nas hipóteses de livramento condicional ou de cumprimento da pena em regime aberto (casa do albergado) e, ainda, no caso de auferir qualquer remuneração como empregado, auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço.
Comprova-se a privação da liberdade mediante "certidão do efetivo recolhimento do segurado à prisão, firmada pela autoridade competente", a qual instruirá o pedido no âmbito administrativo ou judicial (art. 1º, § 2º, do RPS).
Embora o auxílio-reclusão prescinda de carência mínima (art. 26, I, da LBPS), exige-se a manutenção da qualidade de segurado no momento da efetiva reclusão ou detenção (art. 116, § 1º, do RPS), observadas, portanto, as regras do art. 15 da LBPS em todos os seus termos.
O Poder Constituinte derivado, pautado pelo princípio da seletividade, restringiu o benefício unicamente aos dependentes do segurado de baixa renda, ex vi da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, que deu nova redação ao art. 201, IV, do Texto Maior e instituiu o teto de R$360,00, corrigido pelos mesmos índices aplicados às prestações do Regime Geral da Previdência Social.
Daí, além da comprovação do encarceramento e da qualidade de segurado, os dependentes regularmente habilitados terão de atender ao limite da renda bruta mensal para a obtenção do auxílio-reclusão, nos termos do art. 116 do RPS, tendo por base inicial o valor acima.
Muito se discutiu acerca do conceito desse requisito, se tal renda se referiria à do grupo familiar dependente ou à do próprio segurado preso, dividindo-se tanto a doutrina como a jurisprudência.
Coube então ao Pleno do E. Supremo Tribunal Federal enfrentar o tema em sede de repercussão geral e dar a palavra final sobre a matéria, decidindo que "I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes. II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários. III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade" (RE nº 587365, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 25/03/2009, DJE 08/05/2009).
Nesse passo, o auxílio-reclusão será concedido ao segurado que, detido ou recluso, possuir renda bruta mensal igual ou inferior ao limite legal (originariamente fixado em R$360,00), considerado o último salário-de-contribuição vigente à época da prisão ou, à sua falta, na data do afastamento do trabalho ou da cessação das contribuições, e, em se tratando de trabalhador rural desprovido de recolhimentos, o salário mínimo. Precedentes TRF3: 7ª Turma, AG nº 2008.03.00.040486-7, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, j. 09/11/2009, DJF3 17/12/2009, p. 696; 10ª Turma, AC nº 2006.03.99.033731-5, Rel. Des. Fed. Diva Malerbi, j. 06/10/2009, DJF3 14/10/2009, p. 1314.
Por força da Emenda Constitucional nº 20/98, acometeu-se ao Ministério da Previdência Social a tarefa de atualizar monetariamente o limite da renda bruta mensal de R$360,00, segundo os índices aplicáveis aos benefícios previdenciários (art. 13), tendo a Pasta editado sucessivas portarias no exercício de seu poder normativo.
A renda bruta do segurado, na data do recolhimento à prisão, não poderá exceder os seguintes limites, considerado o salário-de-contribuição em seu valor mensal, nos respectivos períodos: até 31/05/1999 - R$360,00 (EC nº 20/98); de 1º/06/1999 a 31/05/2000 - R$ 376,60 (Portaria MPS nº 5.188/99); de 1º/06/2000 a 31/05/2001 - R$ 398,48 (Portaria MPS nº 6.211/00); de 1º/06/2001 a 31/05/2002 - R$ 429,00 (Portaria MPS nº 1.987/01); de 1º/6/2003 a 31/04/2004 - R$560,81 (Portaria MPS nº 727/03); de 1º/05/2004 a 30/04/2005 - R$586,19 (Portaria MPS nº479/04); de 1º/05/2005 a 31/3/2006 - R$623,44 (Portaria MPS nº 822/05); de 1º/04/2006 a 31/03/2007 - R$654,61 (Portaria MPS nº119/06); de 1º/04/2007 a 29/02/2008 - R$676,27 (Portaria MPS nº142/07); de 1º/03/2008 a 31/01/2009 - R$710,08 (Portaria MPS nº 77/08); de 1º/02/2009 a 31/12/2009 - R$752,12 (Portaria MPS nº 48/09); de 1º/01/2010 a 31/12/2010 - R$810,18 (Portaria MPS nº 333/2010); de 1º/01/2011 a 14/7/2011 - R$862,11 (Portaria MPS nº568/2010); de 15/7/2011 a 31/12/2011 - R$ 862,60 (Portaria MPS nº 407/2011); de 01/01/2012 a 31/12/2012- R$ 915,05 (Portaria MPS 02/2012); de 01/01/2013 e 31/12/2013- R$ 971,78 (Portaria MPS 15/2013); de 01/01/2014 a 31/12/2014- R$ 1.025,81 (Portaria MPS/MF 19/2014); de 01/01/2015 a 31/12/2015, R$ 1.089,72 (Portaria MPS/MF 13/2015); de 01/01/2016 a 31/12/2016- R$ 1.212,64 - (Portaria MTPS/MF Nº 1/2016). de 01/01/2017 a 31/12/2017 - R$ 1.292,43 (Portaria MF nº 8/2017); de 01/01/2018 a 31/12/2018 - R$ 1.319,18 (Portaria MF nº 15/2018); entre 01/01/2019 e 31/12/2019 – R$ 1.364,43 (Portaria nº 9/2019 – Ministério da Economia); entre 01/01/2020 e 31/12/2020 – R$ 1.425,56 (Portaria nº 914/2020- Ministério da Economia); de 01/01/2021 a 31/12/2021 - R$ 1.503,25 (Portaria nº 477/2021 - Ministério da Economia); de 01/01/2022 a 31/12/2022 – R$ 1.655,98 (Portaria MTP/ME 12/2022); De 01/01/2023 a 31/12/2023 – R$ 1.754,18 (Portaria MPS/MF 26/2023); A partir de 01 de janeiro de 2024 – R$ 1.819,26 (Portaria MPS/MF Nº 2/2024.
O termo inicial é fixado na data do efetivo recolhimento à prisão, se requerido no prazo de trinta dias a contar desta, ou se posterior a tal prazo, na do requerimento (art. 116, §4º, do RPS), respeitada a causa impeditiva de prescrição contra incapazes (art. 198 do CC).
A renda mensal inicial - RMI do benefício é calculada na conformidade dos arts. 29 e 75 da LBPS, a exemplo da pensão por morte, observadas as redações vigentes à época do encarceramento.
Até o advento da Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, convertida na Lei n. 13.846, de 18 de junho de 2019, a concessão do benefício não dependia de carência. Contudo, desde a vigência dessa norma, a qual conferiu nova redação ao art. 25, IV da Lei nº 8.213/91, passou a ser exigido o cumprimento de carência correspondente a 24 (vinte e quatro) contribuições mensais.
Ressalte-se, além disso, que até o advento da Medida Provisória nº 871, de 18 de janeiro de 2019, o pagamento do benefício dependia da comprovação do recolhimento à instituição prisional, em regime fechado (sujeito à execução de pena em estabelecimento de segurança máxima ou média) ou semiaberto (sujeito à execução em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar).
A partir da vigência da Medida Provisória nº 871, de 18/01/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18/06/2019, somente o encarceramento em regime fechado, autoriza a concessão do auxílio-reclusão, consoante a redação conferida ao art. 80, § 1º, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.
Constitui motivo de suspensão do benefício a fuga do preso, ressalvada a hipótese de recaptura, data a partir da qual se determina o restabelecimento das prestações, desde que mantida a qualidade de segurado, computando-se, a tal fim, a atividade desempenhada durante o período evadido (art. 117, §§ 2º e 3º).
DO CASO DOS AUTOS
Objetiva a autora a concessão do benefício previdenciário de auxílio-reclusão, na condição de companheira de Johnny Gabriel da Silva, que teria sido recolhido à prisão em outubro de 2017, contudo, olvidou-se de instruir os autos com a respectiva certidão de recolhimento prisional.
A qualidade de segurada restou comprovada. As informações constantes nos extratos do CNIS fazem prova de que seu último contrato de trabalho havia sido estabelecido entre 04 de agosto de 2016 e 31 de outubro de 2017.
No Código Civil, a união estável está disciplinada pelo artigo 1723, segundo o qual “é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
No mesmo sentido, é o artigo 1º da Lei 9.278/96, estabelecendo que “é reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”.
Ressentem-se os autos de início de prova material acerca do suposto convívio marital mantido entre a parte autora e o segurado recluso.
De fato, nenhum documento os vincula ao mesmo endereço ou indica que fossem companheiros.
Foi conferida pelo juízo a oportunidade para a produção de prova testemunhal, inclusive com a designação de audiência. Contudo, a parte autora dispensou a produção de prova testemunhal e requereu o julgamento antecipado na lide.
Neste contexto, ausente a comprovação da união estável, se torna inviável o acolhimento do pedido, porquanto não demonstrada a dependência econômica da parte autora em relação ao segurado recluso, sendo de rigor a manutenção do decreto de improcedência do pleito.
Em razão da sucumbência recursal, majoro em 100 % os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser beneficiário da Justiça Gratuita, enquanto persistir sua condição de miserabilidade.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo o decreto de improcedência do pleito e, em razão da sucumbência recursal, majoro em 100% os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. QUALIDADE DE SEGURADO INCONTROVERSA. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. OITIVA DE TESTEMUNHAS EM JUÍZO. DISPENSA PELA PARTE AUTORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.
- O auxílio-reclusão é benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado nos termos do artigo 80 da Lei n° 8.213/1991.
- A qualidade de segurada restou comprovada, visto que o último vínculo empregatício foi cessado no mês do recolhimento prisional (outubro de 2017).
- Ressentem-se os autos de início de prova material acerca do suposto convívio marital mantido entre a parte autora e o segurado recluso.
- Foi conferida pelo juízo a oportunidade para a produção de prova testemunhal, inclusive com a designação de audiência.
- A parte autora dispensou a produção de prova testemunhal e requereu o julgamento antecipado na lide.
- Não comprovada a dependência econômica, de rigor a manutenção do decreto de improcedência do pleito.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal, nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
- Apelação da parte autora a qual se nega provimento.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
