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PREVIDENCIÁRIO. AUXILIO-RECLUSÃO. REQUISITOS PARA CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE RURAL DO SEGURADO RECLUSO NO PERÍODO PREVISTO EM LEI. INÍCIO DE PROV...

Data da publicação: 15/07/2020, 09:36:15

PREVIDENCIÁRIO. AUXILIO-RECLUSÃO. REQUISITOS PARA CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE RURAL DO SEGURADO RECLUSO NO PERÍODO PREVISTO EM LEI. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDO CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVADA A QUALIDADE DE SEGURADO ANTES DA RECLUSÃO. ENTENDIMENTO DO STJ. AUSÊNCIA DE REGISTRO EM CTPS COMO PROVA DE CONDIÇÃO DA BAIXA RENDA. TRABALHADOR RURAL SEM VÍNCULO. PECULIARIDADES DO TRABALHO NO CAMPO. AUSÊNCIA DE RENDA. - Não se exige o prévio requerimento administrativo em ações ajuizadas anteriormente a 03/09/2014, se há insurgência quanto ao mérito, em contestação, nos termos do que foi decidido pelo STF, em repercussão geral (RE 631240/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 10/112014). - Não é caso de remessa oficial. Sentença proferida na vigência do CPC/1973 com condenação não superior a 60 salários mínimos (conforme informação do sistema CNIS/Dataprev, o benefício deixou de ser pago em 01/06/2017). - Os dependentes do segurado têm direito ao auxílio-reclusão, na forma do art. 201, IV, da CF/88. Para a concessão do benefício, é necessário comprovar a qualidade de segurado do recluso, a dependência econômica do beneficiário e o não recebimento, pelo recluso, de remuneração, auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, nos termos do art. 80 da Lei 8.213/91. - O auxílio-reclusão é benefício que independe do cumprimento de carência, à semelhança da pensão por morte, nos termos da legislação vigente à época da reclusão. A dependência econômica dos filhos do recluso é presumida, por serem dependentes de primeira classe, nos termos do art. 16 da Lei nº 8.213/91. - A reclusão em 29/06/2013 foi comprovada nos autos. - Início de prova material do trabalho do pai dos autores como rurícola no período previsto em lei. - Prova testemunhal suficiente para corroborar o início de prova material da atividade. - Conforme o entendimento dominante do STJ, ao qual passo a aderir com ressalva, quando o recluso mantém a qualidade de segurado e comprova o desemprego na data do encarceramento, fica assegurado o recebimento do benefício aos dependentes, pelo princípio in dubio pro misero. - No caso, comprovada a atividade rural sem registro de remuneração formal no período anterior à reclusão, suficiente para a manutenção da qualidade de segurado, pelo início de prova material e pela prova testemunhal. Não é caso de segurado desempregado. - Patente a insurgência da autarquia quanto ao cumprimento do que foi determinado em juízo. Fixo, porém, o valor da multa em R$ 1.000,00, valor que melhor se adequa a benefício que ora se fixa em um salário mínimo mensal, em analogia à concessão da aposentadoria por idade rural. - A verba honorária foi fixada nos termos do inconformismo da autarquia. - Apelação parcialmente conhecida a que se dá parcial provimento para reduzir o valor da multa fixada, nos termos da fundamentação. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2176147 - 0025283-20.2016.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO OTAVIO PORT, julgado em 30/10/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/11/2017 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 21/11/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0025283-20.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.025283-2/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado OTAVIO PORT
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:SP269451 RUBENS JOSE KIRK DE SANCTIS JUNIOR
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):BRUNA SILVA DE MATOS incapaz e outro(a)
:BRUNO SILVA DE MATOS incapaz
ADVOGADO:SP272816 ANA MARIA FRIAS PENHARBEL HOLTZ MORAES
REPRESENTANTE:MARLENE DA CRUZ SILVA
ADVOGADO:SP272816 ANA MARIA FRIAS PENHARBEL HOLTZ MORAES
No. ORIG.:14.00.00022-0 2 Vr PIEDADE/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. AUXILIO-RECLUSÃO. REQUISITOS PARA CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE RURAL DO SEGURADO RECLUSO NO PERÍODO PREVISTO EM LEI. INÍCIO DE PROVA MATERIAL VÁLIDO CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVADA A QUALIDADE DE SEGURADO ANTES DA RECLUSÃO. ENTENDIMENTO DO STJ. AUSÊNCIA DE REGISTRO EM CTPS COMO PROVA DE CONDIÇÃO DA BAIXA RENDA. TRABALHADOR RURAL SEM VÍNCULO. PECULIARIDADES DO TRABALHO NO CAMPO. AUSÊNCIA DE RENDA.
- Não se exige o prévio requerimento administrativo em ações ajuizadas anteriormente a 03/09/2014, se há insurgência quanto ao mérito, em contestação, nos termos do que foi decidido pelo STF, em repercussão geral (RE 631240/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 10/112014).
- Não é caso de remessa oficial. Sentença proferida na vigência do CPC/1973 com condenação não superior a 60 salários mínimos (conforme informação do sistema CNIS/Dataprev, o benefício deixou de ser pago em 01/06/2017).
- Os dependentes do segurado têm direito ao auxílio-reclusão, na forma do art. 201, IV, da CF/88. Para a concessão do benefício, é necessário comprovar a qualidade de segurado do recluso, a dependência econômica do beneficiário e o não recebimento, pelo recluso, de remuneração, auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, nos termos do art. 80 da Lei 8.213/91.
- O auxílio-reclusão é benefício que independe do cumprimento de carência, à semelhança da pensão por morte, nos termos da legislação vigente à época da reclusão.
A dependência econômica dos filhos do recluso é presumida, por serem dependentes de primeira classe, nos termos do art. 16 da Lei nº 8.213/91.
- A reclusão em 29/06/2013 foi comprovada nos autos.
- Início de prova material do trabalho do pai dos autores como rurícola no período previsto em lei.
- Prova testemunhal suficiente para corroborar o início de prova material da atividade.
- Conforme o entendimento dominante do STJ, ao qual passo a aderir com ressalva, quando o recluso mantém a qualidade de segurado e comprova o desemprego na data do encarceramento, fica assegurado o recebimento do benefício aos dependentes, pelo princípio in dubio pro misero.
- No caso, comprovada a atividade rural sem registro de remuneração formal no período anterior à reclusão, suficiente para a manutenção da qualidade de segurado, pelo início de prova material e pela prova testemunhal. Não é caso de segurado desempregado.
- Patente a insurgência da autarquia quanto ao cumprimento do que foi determinado em juízo. Fixo, porém, o valor da multa em R$ 1.000,00, valor que melhor se adequa a benefício que ora se fixa em um salário mínimo mensal, em analogia à concessão da aposentadoria por idade rural.
- A verba honorária foi fixada nos termos do inconformismo da autarquia.
- Apelação parcialmente conhecida a que se dá parcial provimento para reduzir o valor da multa fixada, nos termos da fundamentação.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer parcialmente da apelação e, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 30 de outubro de 2017.
OTAVIO PORT
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): OTAVIO HENRIQUE MARTINS PORT:10241
Nº de Série do Certificado: 375D834FE46558B9
Data e Hora: 31/10/2017 19:14:57



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0025283-20.2016.4.03.9999/SP
2016.03.99.025283-2/SP
RELATOR:Juiz Federal Convocado OTAVIO PORT
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:SP269451 RUBENS JOSE KIRK DE SANCTIS JUNIOR
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):BRUNA SILVA DE MATOS incapaz e outro(a)
:BRUNO SILVA DE MATOS incapaz
ADVOGADO:SP272816 ANA MARIA FRIAS PENHARBEL HOLTZ MORAES
REPRESENTANTE:MARLENE DA CRUZ SILVA
ADVOGADO:SP272816 ANA MARIA FRIAS PENHARBEL HOLTZ MORAES
No. ORIG.:14.00.00022-0 2 Vr PIEDADE/SP

RELATÓRIO

Ação proposta por Bruna e irmão, representados pela mãe, contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de auxílio-reclusão.

João Rodrigues de Matos, pai dos autores, foi recolhido à prisão em 29/06/2013. Era o mantenedor da família que, por isso, passou por dificuldades financeiras no período.

Com a inicial, junta documentos.

Deferida a gratuidade da justiça.

Citado, o INSS contestou o pedido.

Audiência de instrução e julgamento em 23/06/2015, onde ouvidas duas testemunhas.

O juízo a quo julgou procedente o pedido, concedendo o benefício desde a citação. Pagamento das parcelas em atraso com juros e correção monetária, nos termos das Leis 9.494/97 e 11.960/2009. Juros contados a partir da citação. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, consideradas as prestações devidas até a data da sentença. Antecipada a tutela, fixada multa de R$ 5.000,00, a contar do 15º dia seguinte à intimação da ordem, em caso de descumprimento.

Sentença não submetida ao reexame necessário, proferida em audiência.

Oficiada a agência da autarquia para o cumprimento da antecipação da tutela (ofício de fls. 77, datado de 29/07/2015), solicitou ao juízo o envio da declaração de entrada no sistema prisional do instituidor do benefício, atendida a providência na mesma data do pedido (26/08/2015, fls. 78).

Intimação pessoal do procurador do INSS em 09/09/2015 (fls. 78-verso).

O INSS apelou, alegando que não foram preenchidos os requisitos para a concessão do benefício. Insurge-se quanto à concessão da tutela antecipada e da fixação de multa diária anteriormente ao descumprimento da obrigação, presumido o descumprimento e o dolo. Requer, ao menos, sua redução ao limite de 1/30 do salário mínimo a fim de se evitar o enriquecimento sem causa, com ampliação do prazo para cumprimento. Alega, ainda, a ausência de prévio requerimento administrativo. Pleiteia que a verba honorária seja fixada em 10% do valor das parcelas vencidas, consideradas as prestações devidas até a data da sentença.

Em despacho datado de 18/11/2015 (publicação em 27/01/2016), o juízo de primeiro grau determinou novamente a implantação da tutela deferida, ao que o INSS solicitou o envio de cópia legível do CPF do instituidor e declaração de recolhimento prisional (fls. 103, Ofício 21.038.120/11144/2015/APSDJ/INSS-Gex Sorocaba, protocolo em 09/11/2015).

Os autores informaram o não cumprimento da determinação, em petições protocoladas em fevereiro de 2016. Na petição de 25/02/2016, o autor junta novamente cópias do CPF e certidão de recolhimento prisional, documentos que já constavam da inicial.

Com contrarrazões.

Novo requerimento dos autores para a implantação da tutela, protocolo em maio/2016, com nova juntada do CPF do recluso.

O juízo de primeiro grau encaminhou os documentos solicitados pela autarquia no Ofício 21.038.120/11144/2015/APSDJ/INSS-Gex Sorocaba em 05/05/2016 (fls. 123).

Os autos subiram a este Tribunal em 30/06/2016, distribuição em 20/07/2016.

O MPF opinou pela reforma da sentença.

Foi determinado o encaminhamento de ofício ao INSS para comprovar o cumprimento da tutela. Sem resposta, reiterada a determinação ao Procurador-Chefe do INSS.

Comunicada a implantação do benefício em 13/06/2016, conforme documento de fls. 137/139. Pagamento da parcela relativa a maio em julho/2016.

É o relatório.


VOTO

A ação foi ajuizada em fevereiro/2014.

Não se exige o prévio requerimento administrativo em ações ajuizadas anteriormente a 03/09/2014, se há insurgência quanto ao mérito, em contestação, nos termos do que foi decidido pelo STF, em repercussão geral (RE 631240/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 10/112014).

O STJ também passou a adotar o mesmo entendimento. Nesse sentido o julgamento do REsp 1.369.834/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 02.12.2014:


PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO RE 631.240/MG, JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob rito do artigo 543-B do CPC, decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo, evidenciando situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014).
2. Recurso especial do INSS parcialmente provido a fim de que o Juízo de origem aplique as regras de modulação estipuladas no RE 631.240/MG. Julgamento submetido ao rito do artigo 543-C do CPC.

Tendo em vista que a sentença foi proferida na vigência do CPC/1973, não é caso de remessa oficial, uma vez que a condenação não ultrapassa 60 salários mínimos (conforme informação do sistema CNIS/Dataprev, o benefício deixou de ser pago em 01/06/2017).

Os dependentes do segurado têm direito ao auxílio-reclusão, na forma do art. 201, IV, da CF/88. Para a concessão do benefício, é necessário comprovar a qualidade de segurado do recluso, a dependência econômica do beneficiário e o não recebimento, pelo recluso, de remuneração, auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, nos termos do art. 80 da Lei 8.213/91.

O auxílio-reclusão é benefício que independe do cumprimento de carência, à semelhança da pensão por morte, nos termos da legislação vigente à época da reclusão.

A reclusão em 29/06/2013 foi comprovada nos autos.

A dependência econômica dos filhos do recluso é presumida, por serem dependentes de primeira classe, nos termos do art. 16 da Lei nº 8.213/91.

O STF, em repercussão geral, decidiu que a renda do segurado preso é a que deve ser considerada para a concessão do auxílio-reclusão e não a de seus dependentes:


PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes.
II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários.
III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade.
IV - Recurso extraordinário conhecido e provido.
(RE 587365/SC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, Repercussão Geral, DJE 08/05/2009).

A questão principal dos autos é o reconhecimento de trabalho rural do recluso no período anterior à prisão.

A certidão de nascimento dos autores (Bruna, em 2007 e Bruno em 2000) trazem como profissão do pai lavrador. A CTPS do recluso traz vínculo de trabalhador rural de 02/03/2009 a 01/06/2009.

Tratando-se de trabalhador rural diarista/bóia-fria, a omissão da legislação dificulta seu correto enquadramento previdenciário.

Até a promulgação da CF de 1967, a atividade dos trabalhadores rurais não tinha disciplina jurídica.

A Lei Complementar n. 11, de 25/5/1971, criou o PRORURAL, regime de proteção social exclusivo para os trabalhadores rurais.

O art. 3º, § 1º, da LC 11/71 fornecia o conceito de trabalhador rural: "a pessoa física que presta serviço de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie". O conceito legal, entretanto, dificultava o enquadramento dos empregados e dos chamados diaristas, tarefeiros e bóias-frias.

A LC 11/71 foi alterada pela Lei Complementar n. 16, de 30-10-1973, que deu nova redação ao art. 3º e remeteu o conceito de trabalhador rural para o art. 4º:


Art. 4º Os empregados que prestam exclusivamente serviços de natureza rural às empresas agroindustriais e agrocomerciais são considerados beneficiários do PRORURAL, ressalvado o disposto no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. Aos empregados referidos neste artigo que, pelo menos, desde a data da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, vem sofrendo, em seus salários, o desconto da contribuição devida ao INPS é garantida a condição de segurados desse Instituto, não podendo ser dispensados senão por justa causa, devidamente comprovada em inquérito administrativo a cargo do Ministério do Trabalho e Previdência Social.

Com essa alteração, o bóia-fria continuou sem proteção social.

Com a vigência da Constituição Federal de 1988, que prestigiou os direitos sociais, o legislador infraconstitucional tentou enquadrar na Lei 8.213/91 as diferentes relações de trabalho vividas no meio rural. Foi a partir dessa nova ordem jurídica que a trabalhadora rural passou a ter direito ao salário-maternidade.

Entretanto, apesar da tentativa inicial e das constantes alterações da Lei 8.213/91, o diarista/bóia-fria ainda não tem enquadramento previdenciário expresso em lei.

A realidade da vida no campo não pode ser ignorada, sob pena de negar-se proteção a esses trabalhadores tão sofridos. As características da atividade exercida por esses trabalhadores, com subordinação e salário, comprovam que devem ser enquadrados como empregados, entendimento sufragado pela jurisprudência:


PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. ART. 557, §1º, DO CPC. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADA. ... II - A regulamentação administrativa da própria autarquia previdenciária (ON 2, de 11/3/1994, artigo 5º, item "s", com igual redação da ON 8, de 21/3/97) considera o trabalhador volante, ou bóia-fria, como empregado. III - A responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias relativa à atividade rural exercida pelo de cujus, na condição de empregado, cabia aos seus empregadores, não podendo recair tal ônus sobre seus dependentes. ...
(AC 200803990604685, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, DJF3 CJ1 17/03/2010).

O enquadramento do bóia-fria/diarista como segurado empregado foi reconhecido pela Instrução Normativa INSS/DC n. 78, de 18/7/2002, entendimento mantido pelas normas administrativas posteriores.

Tal interpretação é corroborada pela lição de Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 14ª Ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, fls. 165:


É antes crer que o legislador haja querido exprimir o conseqüente e adequado à espécie do que evidentemente injusto, descabido, inaplicável, sem efeito. Portanto, dentro da letra expressa, procure-se a interpretação que conduza a melhor conseqüência para a coletividade.

Também não cabe punir o trabalhador rural pela falta de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias, obrigação que é dos empregadores rurais em relação àqueles que lhes prestam serviços, pois cabe ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS fiscalizar para impedir esse procedimento ilegal.

Para comprovar a continuidade da condição de segurado do recluso, é necessária a comprovação do trabalho como diarista/bóia-fria, por meio de início de prova material, que deve ser corroborado por prova testemunhal.

Documentos expedidos por órgãos públicos, nos quais consta a qualificação do recluso como lavrador, podem ser utilizados como início de prova material, como exige a Lei 8213/91 (art. 55, § 3º), para comprovar a condição de rurícola, desde que confirmada por prova testemunhal.

Existente início de prova material, configurado nos documentos públicos apresentados e na CTPS (vínculo também constante no CNIS/Dataprev).

A prova testemunhal corroborou o trabalho rural do pai dos autores, até a reclusão.

Em recurso repetitivo (Resp 1352791-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgamento em 27/11/2013), o STJ firmou posicionamento de que os períodos em que o rurícola trabalhou com registro em CTPS na atividade rural devem ser computados para efeito de carência, para efeitos de outra modalidade de aposentadoria. Isto porque o responsável pelo recolhimento para o Funrural era o empregador, não o empregado.

A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, em 19 de agosto de 2015, firmou a tese de que o INSS deve computar, para efeito de carência, o período trabalhado como empregado rural, registrado por empresas agroindustriais ou comerciais, no caso da aposentadoria por tempo de serviço rural (Processo nº 0516170-28.2009.4.05.8300).

Anteriormente, entendi não ser o caso de se considerar que, inexistindo salário de contribuição no mês da reclusão, a renda do segurado seria zero.

Isso porque considerava necessária a existência de um parâmetro concreto, e não fictício, para a apuração da renda.

Porém, o STJ, em reiteradas decisões, tem se manifestado de maneira diversa, aceitando expressamente a ausência de registro em CTPS como prova da condição de baixa renda do recluso.

No caso do empregado rurícola, a ausência de registro é mais um fator de comprovação, especialmente pelas peculiaridades no trabalho no campo.

Modifico entendimento anterior, ressalvando entendimento pessoal, nos termos do julgado que segue:


DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CRITÉRIO ECONÔMICO PARA CONCESSÃO DO AUXILIO-RECLUSÃO.
Na análise de concessão do auxilio-reclusão a que se refere o art. 80 da Lei 8.213/1991, o fato de o recluso que mantenha a condição de segurado pelo RGPS (art. 15 da Lei 8.213/1991) estar desempregado ou sem renda no momento do recolhimento à prisão indica o atendimento ao requisito econômico da baixa renda, independentemente do valor do último salário de contribuição.
Inicialmente, cumpre ressaltar que o Estado entendeu por bem amparar os que dependem do segurado preso e definiu como critério econômico para a concessão do benefício a baixa renda do segurado (art. 201, IV, da CF). Diante disso, a EC 20/1998 estipulou um valor fixo como critério de baixa renda que todos os anos é corrigido pelo Ministério da Previdência Social. De fato, o art. 80 da Lei 8.213/1991 determina que o auxilio-reclusão será devido quando o segurado recolhido à prisão "não receber remuneração da empresa". Da mesma forma, ao regulamentar a concessão do benefício, o § 1º do art. 116 do Decreto 3.048/1999 estipula que "é devido auxilio-reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário de contribuição na data do seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado". É certo que o critério econômico da renda deve ser constatado no momento da reclusão, pois é nele que os dependentes sofrem o baque da perda do provedor. Ressalte-se que a jurisprudência do STJ assentou posição de que os requisitos para a concessão do benefício devem ser verificados no momento do recolhimento à prisão, em observância ao princípio tempus regit actum (AgRg no REsp 831.251-RS, Sexta Turma, DJe 23/5/2011; REsp 760.767-SC, Quinta Turma, DJ 24/10/2005; e REsp 395.816-SP, Sexta Turma, DJ 2/9/2002).
(REsp 1.480.461-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 23/9/2014).

A questão é tema de julgamento em repercussão geral, cuja análise ainda não foi concretizada, quanto ao mérito:


O recurso especial discute questão relativa à definição do critério de renda (se o último salário de contribuição ou a ausência de renda) do segurado que não exerce atividade remunerada abrangida pela Previdência Social no momento do recolhimento à prisão para a concessão do benefício de auxilio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), afetada pelo Ministro Herman Benjamin, sob o rito dos recursos repetitivos, à Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça nos autos dos Recursos Especiais Repetitivos nºs 1.485.416/SP e 1.485.417/MS (DJe 10/10/2014), vinculados ao Tema nº 896.
Assim, é imperiosa a devolução dos autos ao eg. Tribunal de origem para observância da sistemática dos recursos repetitivos, consoante determina o art. 2º da Resolução STJ n.º 17, de 4 de setembro de 2013, verbis:
Art. 2º Verificada a subida de recursos fundados em controvérsia idêntica a controvérsia já submetida ao rito previsto no art. 543-C do Código de Processo Civil, o presidente poderá:
I determinar a devolução ao tribunal de origem, para nele permanecerem sobrestados os casos em que não tiver havido julgamento do mérito do recurso recebido como representativo de controvérsia;
II determinar a devolução dos novos recursos ao tribunal de origem, para os efeitos dos incisos I e II do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil, ressalvada a hipótese do § 8º do referido artigo, se já proferido julgamento do mérito do recurso representativo da controvérsia.
Ante o exposto, determino a devolução dos autos à origem, onde deve permanecer suspenso o recurso especial, até o pronunciamento definitivo do STJ sobre o tema, e, após, observe-se a sistemática prevista nos arts. 1.040 e 1.041 do CPC.
Publique-se. Intimem-se.
(REsp 1585077, Relator Ministro Francisco Falcão, publicação em 14/04/2016).

Conforme o entendimento dominante do STJ, ao qual passo a aderir com ressalva, quando o recluso mantém a qualidade de segurado e comprova o desemprego na data do encarceramento, fica assegurado o recebimento do benefício aos dependentes, pelo princípio in dubio pro misero.

No caso, comprovada a atividade rural sem registro de remuneração formal no período anterior à reclusão, suficiente para a manutenção da qualidade de segurado, pelo início de prova material e pela prova testemunhal. Não é caso de segurado desempregado.

Atendidos os requisitos legais, mantenho a concessão do benefício, nos termos da sentença.

A imposição de multa como meio coercitivo indireto no cumprimento de obrigação de fazer encontra amparo no § 4º do artigo 461 do CPC/1973, que inovou no ordenamento processual ao conferir ao magistrado tal faculdade, visando assegurar o cumprimento de ordem expedida e garantir a efetividade do provimento inibitório.

De outra parte, é cediço que as balizas orientadoras da dosimetria da multa cominatória são os critérios da proporcionalidade entre o seu valor e a restrição dela emergente como fator cogente no cumprimento da tutela inibitória, além de sua adequação e necessidade como meio executivo.

O § 6º do artigo 461 do CPC/1973, ao conferir poderes do Juiz de revisão da multa cominatória, instituiu a regra da manutenção da proporcionalidade entre o quantum da multa diária e o período da mora verificada, visando preservar a sua finalidade inibitória, e é inspirada na cláusula rebus sic stantibus, de maneira que a execução da multa somente é admitida como forma de superar a inércia no cumprimento da decisão judicial, sem almejar o enriquecimento da parte contrária.

Sua finalidade da multa é compelir o devedor ao efetivo cumprimento da obrigação de fazer.

Tenho determinado a fixação oportuna em caso de descumprimento da antecipação da tutela.

Contudo, ficou patente a insurgência da autarquia quanto ao cumprimento do que foi determinado em juízo. Somente após a reiteração do cumprimento da tutela neste Tribunal, por duas vezes à autoridade administrativa e por uma vez ao Procurador-Chefe da autarquia é que a providência foi cumprida, após mais de um ano da primeira determinação do juízo de origem.

Os documentos solicitados estavam à disposição da autarquia. O compulsar dos autos bastaria para a implantação do que foi determinado.

Porém, reduzo o valor fixado em primeiro grau, que considero exorbitante, para fixá-lo em R$ 1.000,00, valor que melhor se adequa a benefício que ora se fixa em um salário mínimo mensal, em analogia à concessão da aposentadoria por idade rural.

Segue jurisprudência adotando tal entendimento em execução de sentença:


PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. REMESSA OFICIAL. DESCABIMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DEMORA NO CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. APLICAÇÃO DE MULTA. CABIMENTO. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
...
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orientou-se no sentido de que é permitido ao Juízo da execução a imposição de multa em desfavor da Fazenda Pública, de ofício ou a requerimento da parte, pelo descumprimento de obrigação de fazer. (STJ - REsp 504321/RS; 5ª Turma; Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA; DJ 11.12.2006 p. 407).
4. Quanto ao prazo estabelecido na sentença exeqüenda para cumprimento da obrigação, entende-se não ser o momento oportuno para discussão, em face do trânsito em julgado do decisum.
5. A multa diária pode ser reduzida de ofício pelo juiz para impedir o enriquecimento ilícito da parte e em observância ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.
6. Levando-se em conta o valor da obrigação principal (R$ 5.591,00), verifica-se que a multa no montante de R$19.380,00 é excessiva. Assim, afigura-se razoável e compatível com o caráter coercitivo da cominação, a redução da multa aplicada para o valor total de R$ 1.000,00 (mil reais).
7. Honorários advocatícios em compensação, face à sucumbência recíproca (art. 21 do CPC). 8. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal (§ 3º do art. 109 da CF/88), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, inc. I, da Lei n. 9.289/96, abrangendo, inclusive, as despesas com oficial de justiça. 9. Apelação parcialmente provida. Remessa oficial não conhecida.
(TRF da 1ª Região, AC 00134109620094019199 0013410-96.2009.4.01.9199, Relator Desembargador Federal Francisco de Assis Betti, publicação em 02/10/2015 e-DJF1).

A verba honorária foi fixada nos termos do inconformismo da autarquia.


NÃO CONHEÇO DE PARTE da apelação e, na parte conhecida, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO para reduzir o valor da multa fixada, nos termos da fundamentação.


É o voto.


OTAVIO PORT
Juiz Federal Convocado


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