Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5183445-86.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
11/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 13/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. REQUISITOS
PREENCHIDOS. PRAZO DE DURAÇÃO. ARTIGO 77, §2º, V, "B", DA LEI Nº 8.213/91.
BENEFÍCIO DEVIDO POR APENAS QUATRO MESES. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO
DE VALORES. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O auxílio-reclusão é devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes de
segurado de baixa renda recolhido à prisão.
2. Em face dos ditames do artigo 16 da Lei 8.213/91, a dependência econômica da companheira
é presumida.
3. Demonstrada a alegada união estável entre a parte autora e o recluso, estando satisfeito o
requisito da qualidade de dependente.
4. Preenchidos os demais requisitos, faz jus a parte autora ao recebimento do benefício de
auxílio-reclusão.
5. O termo inicial deveria ser fixado na data do recolhimento do segurado à prisão. No entanto,
mantém-se na data do requerimento administrativo, como estabelecimento pela r. sentença, uma
vez que não houve apelação da parte autora.
6. Quanto ao prazo de duração do benefício, o artigo 77, §2º, inciso V, alínea "b", da Lei nº
8.213/91, aplicável ao presente caso, prevê que a cota do benefício cessará para o cônjuge ou
companheiro em 04 (quatro) meses, se o segurado não tiververtido 18 (dezoito) contribuições
mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 02 (dois)
anos antes do fato gerador.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
7. Não tendo sido comprovado o recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais, nem
aconvivência em união estável por prazo superior a 02 (dois) anos, conclui-se que a parte autora
faz jus a apenas 04 (quatro) parcelas do benefício, montante este já pago pela autarquia em
razão da concessão da tutela de urgência.
8. Não havendo prestações atrasadas, indevida a fixação de correção monetária e juros de mora.
9.Apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT,
entende-seque, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE 734242 AgR,
este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de
valores recebidos de boa-fé, em razão de sua natureza alimentar.
10. Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5183445-86.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE LOPES MANTOVANELLI - SP259069-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5183445-86.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE LOPES MANTOVANELLI - SP259069-N
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação proposta por
PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVAem face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS, objetivando a concessão do benefício de auxílio-reclusão.
Juntados procuração e documentos.
Deferido o pedido de gratuidade da justiça.
O INSS apresentou contestação.
Réplica da parte autora.
Foi realizada audiência de instrução e julgamento.
O MM. Juízo de origem julgou procedente o pedido.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação alegando, em síntese, que não restou
comprovada a união estável entre a parte autora e o falecido, não fazendo jus ao benefício.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal se manifestou pelo provimento dorecurso.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5183445-86.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE LOPES MANTOVANELLI - SP259069-N
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Estabelece o artigo 201, inciso IV, da
Constituição Federal que:
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
IV- salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;"
O artigo 80 da Lei 8.213/91, que regulamenta o citado dispositivo constitucional, assim dispunha à
época da prisão do instituidor:
"Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos
dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem
estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo
recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de
declaração de permanência na condição de presidiário."
Ainda, o art. 116, caput, do Decreto 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social), prevê:
"Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos
dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem
estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde
que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta
reais)."
Dessarte, em sede de auxílio-reclusão devia-se demonstrar, basicamente, os seguintes
requisitos: (a) o recolhimento do segurado à prisão; (b) a qualidade de segurado do recluso; (c) a
dependência econômica do interessado; e (d) o enquadramento do preso como pessoa de baixa
renda (o último salário-de-contribuição deve ser igual ou inferior ao limite legal), a teor dos artigos
201, IV, da CF, 80 da Lei 8.213/91 e 116 do Decreto nº 3.048/99.
O pedido foi instruído com comprovante do efetivo recolhimento à prisão do Sr. Arlindo Batista de
Oliveira Junior em 07/08/2018 (página 01 - ID 126127174).
Quanto ao requisito da qualidade de segurado, da análise do extrato do CNIS juntadoà página 01
- ID 126127195 extrai-se que seu último vínculo laboral encerrou-se em 19/06/2018. Tendo em
vista que a reclusão deu-se em 07/08/2018, conclui-se que o recluso mantinha sua condição de
segurado, nos termos do art. 15, II, da Lei nº 8.213/91.
Relativamente à qualidade de dependente, verifica-se do inciso I, do artigo 16, da Lei 8.213/91,
que a companheira é beneficiáriado Regime Geral de Previdência Social na condição de
dependentedo segurado. Ainda, determina o § 4º do referido artigo que a sua dependência
econômica é presumida:
"Art. 16. São beneficiários do regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes
do segurado:
I- o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição,
menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
II- "omissis"
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais
deve ser comprovada."
No caso, a parte autora alega ser companheira do segurado, sendo necessária a comprovação
da união estável entre eles.
Da análise dos autos, observa-se que foram trazidos documentos que podem ser considerados
como início de prova material da referida convivência, haja vista, principalmente: (i) a carteirinha
de visitante juntada à página 01 - ID 126127175, em que a parte autora consta como
companheira do recluso; (ii) a declaração de união estável colacionada às páginas 01/02 - ID
126127177, em que consta que conviviam havia aproximadamente 11 meses; (iii) as cartas
juntadas às páginas 01/26 - ID126127178, 01/02 - ID 126127179 e 01/06 - ID126127180; e (iv) as
fotos anexadas às páginas 01/03 - ID126127181.
Corroborando o início de prova material apresentado, a informante do juízo e atestemunha
confirmaram que a parte autora convivia em união estável com o recluso.
Neste contexto, diante da suficiência de provas que atestam a existência de vida comum, restou
comprovada a alegada união estável, sendo, portanto, presumida sua dependência econômica
em relação ao segurado.
Resta, ainda, analisar a renda do segurado recluso, conforme restou decidido no julgamento pelo
E. Supremo Tribunal Federal em Repercussão Geral, do RE 587365, publicado no DOU em
08/05/2009 e relatado pelo Ministro Ricardo Lewandowski, cuja ementa segue:
"PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-
RECLUSÃO. ART. 201, IV DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO
DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS
SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998.
SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
I- Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser
utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes.
II-Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que
restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da
seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários.
III-Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade.
IV- Recurso extraordinário conhecido e provido."
No caso, observa-se que, à época em que foi preso, o segurado estava desempregado, sendo
irrelevante o fato de seu último salário-de-contribuição ter sido superior ao limite estabelecido.
É o que dispõe o §1º do artigo 116, do Decreto 3.048/99:
"Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos
dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem
estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde
que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta
reais).
§ 1º É devido auxílio-reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário-de-
contribuição na data do seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de
segurado."
Neste sentido, a jurisprudência desta 10ª Turma:
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. EXISTÊNCIA DE OMISSÃO.
CARÁTER INFRINGENTE. POSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. 1- A condição de desempregado do segurado, no momento
imediatamente anterior à reclusão do mesmo, torna irrelevante a última contribuição
previdenciária feita, caracterizando erro material no acórdão, sujeito à revisão pela Corte
julgadora. 2- Excepcionalmente, o efeito modificativo dos embargos de declaração tem vez
quando, apenas, houver defeito material que, após sanado, obrigue a alteração do resultado do
julgamento, Precedente do STJ. 3- Embargos de declaração acolhidos." (TRF 3ª Região - 10ª
Turma; AC 00373676320104039999, Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, DJU 28.03.2012, decisão
unânime)
Logo, conclui-se que o segurado recluso possuía a condição de baixa renda para o fim de
concessão de auxílio-reclusão, cumprindo, dessa forma, todos os requisitos ensejadores do
pedido autoral, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida neste ponto.
O termo inicial do benefício deveria ser fixado na data do recolhimento do segurado à prisão. No
entanto, mantenho na data do requerimento administrativo, tal como fixado pela r. sentença, sob
pena de reformatio in pejus.
No que tange ao prazo de duração do benefício, o artigo 77, §2º, inciso V, alínea "b", da Lei nº
8.213/91, aplicável ao presente caso, prevê que a cota do benefício cessará para o cônjuge ou
companheiro em 04 (quatro) meses, se o segurado não tiver vertido 18 (dezoito) contribuições
mensais ou se o casamento ou a união estável tivereminiciadoem menos de 02 (dois) anos antes
do fato gerador.
No caso dos autos, além de não ter sido demonstrado o recolhimento de mais de 18 (dezoito)
contribuições pelosegurado, não restou comprovado que a união estável foi iniciada mais de 02
(anos) antes da prisão, já que a própria parte autora declarou a duração de aproximadamente 11
meses.
Dessarte, conclui-se que a parte autora faz jus a apenas 04 (quatro) parcelas do benefício.
Deve-se observar, ainda, que já tendo havido o pagamento das 04 (quatro) parcelas em razão da
tutela de urgência, indevida a fixação de correção monetária e juros de mora.
Cumpre consignar, por fim, que apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia
REsp nº 1.401.560/MT, entendo que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no
AR E 734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade
de devolução de valores recebidos de boa fé, em razão de sua natureza alimentar.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelaçãodo INSS, para determinar a concessão do
benefício por apenas quatro meses, haja vista o preceito legal do art. 77, §2º, V, “b” da Lei nº
8.213/91 c/c art. 80, caput, da Lei nº 8.213/91, tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. REQUISITOS
PREENCHIDOS. PRAZO DE DURAÇÃO. ARTIGO 77, §2º, V, "B", DA LEI Nº 8.213/91.
BENEFÍCIO DEVIDO POR APENAS QUATRO MESES. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO
DE VALORES. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. O auxílio-reclusão é devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes de
segurado de baixa renda recolhido à prisão.
2. Em face dos ditames do artigo 16 da Lei 8.213/91, a dependência econômica da companheira
é presumida.
3. Demonstrada a alegada união estável entre a parte autora e o recluso, estando satisfeito o
requisito da qualidade de dependente.
4. Preenchidos os demais requisitos, faz jus a parte autora ao recebimento do benefício de
auxílio-reclusão.
5. O termo inicial deveria ser fixado na data do recolhimento do segurado à prisão. No entanto,
mantém-se na data do requerimento administrativo, como estabelecimento pela r. sentença, uma
vez que não houve apelação da parte autora.
6. Quanto ao prazo de duração do benefício, o artigo 77, §2º, inciso V, alínea "b", da Lei nº
8.213/91, aplicável ao presente caso, prevê que a cota do benefício cessará para o cônjuge ou
companheiro em 04 (quatro) meses, se o segurado não tiververtido 18 (dezoito) contribuições
mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 02 (dois)
anos antes do fato gerador.
7. Não tendo sido comprovado o recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais, nem
aconvivência em união estável por prazo superior a 02 (dois) anos, conclui-se que a parte autora
faz jus a apenas 04 (quatro) parcelas do benefício, montante este já pago pela autarquia em
razão da concessão da tutela de urgência.
8. Não havendo prestações atrasadas, indevida a fixação de correção monetária e juros de mora.
9.Apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT,
entende-seque, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE 734242 AgR,
este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de
valores recebidos de boa-fé, em razão de sua natureza alimentar.
10. Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacao do INSS, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA