D.E. Publicado em 11/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e à apelação do réu e dar parcial provimento à apelação do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000731-77.2014.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelações interpostas contra sentença proferida em ação de conhecimento, em que se pleiteia a concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho especial nos períodos de 17.05.84 a 02.06.87, 22.06.87 a 01.02.90, 12.03.90 a 18.06.91, 01.07.91 a 28.08.91, 01.11.91 a 12.09.92, 01.10.92 a 12.07.93, 14.07.93 a 26.10.93, 01.11.93 a 08.02.00, 01.03.00 a 17.05.02, 01.10.02 a 05.05.06 e de 11.12.06 a 30.04.10, mais indenização em danos morais.
O MM. Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo como especiais os períodos de 01.10.92 a 12.07.93, 01.11.93 a 05.03.97 e de 19.11.03 a 05.05.06, determinando sua averbação, fixando a sucumbência recíproca.
Apela o autor, pleiteando a reforma parcial da r. sentença, requerendo o reconhecimento de todos os períodos pleiteados na inicial, bem como o pagamento da indenização por danos morais.
Apela o réu, pleiteando a reforma da r. sentença. Prequestiona a matéria debatida.
Subiram os autos, com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Para a obtenção da aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
Por sua vez, a Emenda Constitucional 20/98 assegura, em seu Art. 3º, a concessão de aposentadoria proporcional aos que tenham cumprido os requisitos até a data de sua publicação, em 16/12/98. Neste caso, o direito adquirido à aposentadoria proporcional, faz-se necessário apenas o requisito temporal, ou seja, 30 (trinta) anos de trabalho no caso do homem e 25 (vinte e cinco) no caso da mulher, requisitos que devem ser preenchidos até a data da publicação da referida emenda, independentemente de qualquer outra exigência.
Em relação aos segurados que se encontram filiados ao RGPS à época da publicação da EC 20/98, mas não contam com tempo suficiente para requerer a aposentadoria - proporcional ou integral - ficam sujeitos às normas de transição para o cômputo de tempo de serviço. Assim, as regras de transição só encontram aplicação se o segurado não preencher os requisitos necessários antes da publicação da emenda. O período posterior à Emenda Constitucional 20/98 poderá ser somado ao período anterior, com o intuito de se obter aposentadoria proporcional, se forem observados os requisitos da idade mínima (48 anos para mulher e 53 anos para homem) e período adicional (pedágio), conforme o Art. 9º, da EC 20/98.
A questão tratada nos autos diz respeito ao reconhecimento do tempo trabalhado em condições especiais com a conversão em tempo comum.
Define-se como atividade especial aquela desempenhada sob certas condições peculiares - insalubridade, penosidade ou periculosidade - que, de alguma forma cause prejuízo à saúde ou integridade física do trabalhador.
A contagem do tempo de serviço rege-se pela legislação vigente à época da prestação do serviço.
Até 29.04.95, quando entrou em vigor a Lei 9.032/95, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, nos termos do Art. 295 do Decreto 357/91; a partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10.03.1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física; após 10.03.1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho, consoante o Art. 58 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97. Quanto aos agentes ruído e calor, é de se salientar que o laudo pericial sempre foi exigido.
Nesse sentido:
Atualmente, no que tange à comprovação de atividade especial, dispõe o § 2º, do Art. 68, do Decreto 3.048/99, que:
Assim sendo, não é mais exigido que o segurado apresente o laudo técnico, para fins de comprovação de atividade especial, basta que forneça o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, assinado pela empresa ou seu preposto, o qual reúne, em um só documento, tanto o histórico profissional do trabalhador como os agentes nocivos apontados no laudo ambiental que foi produzido por médico ou engenheiro do trabalho.
Por fim, ressalte-se que o formulário extemporâneo não invalida as informações nele contidas. Seu valor probatório remanesce intacto, haja vista que a lei não impõe seja ele contemporâneo ao exercício das atividades. A empresa detém o conhecimento das condições insalubres a que estão sujeitos seus funcionários e por isso deve emitir os formulários ainda que a qualquer tempo, cabendo ao INSS o ônus probatório de invalidar seus dados.
Em relação ao agente ruído, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79 consideravam nociva à saúde a exposição em nível superior a 80 decibéis. Com a alteração introduzida pelo Decreto n. 2.172, de 05.03.1997, passou-se a considerar prejudicial aquele acima de 90 dB. Posteriormente, com o advento do Decreto 4.882, de 18.11.2003, o nível máximo tolerável foi reduzido para 85 dB (Art. 2º, do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Estabelecido esse contexto, esclareço que, anteriormente, manifestei-me no sentido de admitir como especial a atividade exercida até 05/03/1997, em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis, e a partir de tal data, aquela em que o nível de exposição foi superior a 85 decibéis, em face da aplicação do princípio da igualdade.
Contudo, em julgamento recente, a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a questão submetida ao rito do Art. 543-C do CPC, decidiu que no período compreendido entre 06.03.1997 e 18.11.2003, considera-se especial a atividade com exposição a ruído superior a 90 dB, nos termos do Anexo IV do Decreto 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o nível para 85 dB (REsp 1398260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Por conseguinte, em consonância com o decidido pelo C. STJ, é de ser admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 05.03.97, e 90 decibéis no período entre 06.03.97 e 18.11.03 e, a partir de então até os dias atuais, em nível acima de 85 decibéis.
No que diz respeito ao uso de equipamento de proteção individual, insta observar que este não descaracteriza a natureza especial da atividade a ser considerada, uma vez que tal equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos. Nesse sentido: TRF3, AMS 2006.61.26.003803-1, Relator Desembargador Federal Sergio Nascimento, 10ª Turma, DJF3 04/03/2009, p. 990; APELREE 2009.61.26.009886-5, Relatora Desembargadora Federal Leide Pólo, 7ª Turma, DJF 29/05/09, p. 391.
Ainda que o laudo consigne a eliminação total dos agentes nocivos, é firme o entendimento desta Corte no sentido da impossibilidade de se garantir que tais equipamentos tenham sido utilizados durante todo o tempo em que executado o serviço, especialmente quando seu uso somente tornou-se obrigatório com a Lei 9732/98.
Igualmente nesse sentido:
Por demais, em recente julgamento proferido pelo e. Supremo Tribunal Federal, em tema com repercussão geral reconhecido pelo plenário virtual no ARE 664335/SC, restou decidido que o uso do equipamento de proteção individual - EPI pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido.
A propósito, transcrevo os seguintes tópicos da ementa:
Cabe ressaltar que a necessidade de comprovação de trabalho "não ocasional nem intermitente, em condições especiais" passou a ser exigida apenas a partir de 29.04.95, data em que foi publicada a Lei 9.032/95, que alterou a redação do Art. 57, § 3º, da lei 8.213/91, não podendo, portanto, incidir sobre períodos pretéritos. Nesse sentido: TRF3, APELREE 2000.61.02.010393-2, Relator Desembargador Federal Walter do Amaral, 10ª Turma, DJF3 30/6/2010, p. 798 e APELREE 2003.61.83.004945-0, Relator Desembargador Federal Marianina Galante, 8ª Turma, DJF3 22/9/2010, p. 445.
No mesmo sentido colaciono recente julgado do c. Superior Tribunal de Justiça:
Tecidas essas considerações gerais a respeito da matéria, passo a análise da documentação do caso em tela.
Assim fazendo, verifico que a parte autora comprovou que exerceu atividade especial de maneira habitual e permanente nos seguintes períodos e empresas:
- de 17.05.84 a 02.06.87, de 22.06.87 a 01.02.90 e de 14.07.93 a 26.10.93 na Indústria e Comércio de Calçados Status Ltda. - ME, nas funções de sapateiro e montador, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme cópia da CTPS às fls. 31 e 37;
- de 12.03.90 a 18.06.91, 01.11.91 a 12.09.92, na Calçados Stephani Ltda., na função de moldador, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme cópia da CTPS às fls. 32/33;
- de 01.07.91 a 28.08.91, na Sparks Calçados Ltda. - ME, na função de moldador, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme cópia da CTPS à fl. 32;
- de 01.10.92 a 12.07.93 e de 01.11.93 a 28.04.95, na H. Bettarello S.A. Curtidora e Calçados, nas funções de sapateiro e moldador de mocassins, exposto aos componentes da cola de sapateiro, como hidrocarbonetos, agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme cópia da CTPS às fls. 33 e 38;
- de 01.10.02 a 05.05.06, na H. Bettarello S.A. Curtidora e Calçados, na função de moldador de mocassins do setor de montagem, submetido ao agente nocivo ruído de intensidade média equivalente a 85dB, descrito no 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, conforme descrito no Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 43/44, e
- de 11.12.06 a 15.01.13, na Empresa São José Ltda., na função de lubrificador, exposto aos agentes nocivos óleos minerais, graxas e solventes, previstos no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64, conforme Perfil Profissiográfico Previdenciário de fls. 45/46. Observo que, ainda que conste do referido documento que a exposição era ocasional e intermitente, a descrição das atividades do autor informa que sua função era "lubrificar máquinas e equipamentos (...), selecionar material de limpeza e ferramentas para lubrificação, retirar excessos de lubrificantes (...), verificar impurezas em lubrificantes (...), conservar ferramentas e matérias para lubrificação (...)", pelo que é possível inferir que a exposição era de fato habitual e permanente.
O período de 29.04.95 a 08.02.00 não pode ser reconhecido como especial, vez que o PPP de fls. 40 está incompleto.
Na data do requerimento administrativo (15.01.13 - fl. 95), o autor contava com 16 anos, 09 meses e 26 dias de atividade exercida em condições especiais, insuficiente para a aposentadoria especial.
Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença, devendo o réu averbar no cadastro do autor como trabalhados em condições especiais os períodos de 17.05.84 a 02.06.87, de 22.06.87 a 01.02.90, de 14.07.93 a 26.10.93, de 12.03.90 a 18.06.91, 01.11.91 a 12.09.92, de 01.07.91 a 28.08.91, de 01.10.92 a 12.07.93, de 01.11.93 a 28.04.95, de 01.10.02 a 05.05.06, e de 11.12.06 a 15.01.13.
De sua vez, no que se refere ao dano moral, para que se configure a responsabilidade civil do agente, devem estar presentes os requisitos de dolo ou culpa na conduta lesiva, o dano sofrido e o nexo causal entre ambos.
Assim, não se afigura razoável supor que a demora na implantação do benefício, lastreada em normas legais, ainda que sujeitas à interpretação jurisdicional controvertida, tenha o condão de, por si só, constranger os sentimentos íntimos do segurado. Ainda que seja compreensível o dissabor derivado de tal procedimento, não se justifica o pedido de indenização por danos morais.
Na lição de Humberto Theodoro Júnior "viver em sociedade e sob o impacto constante de direitos e deveres, tanto jurídicos como éticos e sociais, provoca, sem dúvida, frequentes e inevitáveis conflitos e aborrecimentos, com evidentes reflexos psicológicos, que, em muitos casos, chegam mesmo a provocar abalos e danos de monta. Para, no entanto, chegar-se à configuração do dever de indenizar, não será suficiente ao ofendido demonstrar sua dor. Somente ocorrerá a responsabilidade civil se se reunirem todos os seus elementos essenciais: dano, ilicitude e nexo causal. Se o incômodo é pequeno (irrelevância) e se, mesmo sendo grave, não corresponde a um comportamento indevido (ilicitude), obviamente não se manifestará o dever de indenizar (...)" (in Dano Moral, São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 6).
Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:
Destarte, é de se reformar em parte a r. sentença, devendo o réu averbar como trabalhado em condições especiais os períodos de 17.05.84 a 02.06.87, de 22.06.87 a 01.02.90, de 14.07.93 a 26.10.93, de 12.03.90 a 18.06.91, 01.11.91 a 12.09.92, de 01.07.91 a 28.08.91, de 01.10.92 a 12.07.93 de 01.10.02 a 05.05.06 e de 11.12.06 a 15.01.13.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, vez que não reconhecido o direito à aposentadoria especial e à indenização por danos morais, é de se aplicar a regra contida no Art. 86, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas, emolumentos e despesas processuais.
Quanto ao prequestionamento da matéria para fins recursais, não há falar-se em afronta a dispositivos legais e constitucionais, porquanto o recurso foi analisado em todos os seus aspectos.
Posto isto, nego provimento à remessa oficial e à apelação do réu e dou parcial provimento à apelação do autor.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 29/08/2017 18:22:55 |