Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5162839-03.2021.4.03.9999
Relator(a) para Acórdão
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Relator(a)
Desembargador Federal MONICA APARECIDA BONAVINA CAMARGO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
22/02/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 25/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO POR INCAPACIDADE. DOENÇAS
OCUPACIONAIS. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA FEDERAL. ARTIGO 109, I, da
CF/1988. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 327, §1º, CPC.
- Nos termos do artigo 20, incisos I e II, da Lei 8.213/1991, consideram-se acidente do trabalho,
"doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho
peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do
Trabalho e da Previdência Social" e " doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou
desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se
relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I".
- Trata-se, portanto, de hipótese em que resta configurada a incompetência absoluta da Justiça
Federal para apreciar a matéria, conforme o disposto no artigo 109, inciso I, da Constituição
Federal.
- A competência ratione materiae define-se pela causa de pedir e pelo pedido constantes na
inicial. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
- À luz do § 1º do artigo 327 do Código de Processo Civil, a cumulação de pedidos é lícita desde
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
que os pedidos sejam compatíveis entre si e seja competente para conhecer deles o mesmo
juízo.
- O pedido subsidiário de concessão de benefício previdenciário possui juízo competente diverso
do principal e, portanto, não atende aos requisitos de admissibilidade da cumulação.
- Declaração de incompetência absoluta da Justiça Federal para apreciação e julgamento do feito
e demais incidentes dele decorrentes.
- Determinada a remessa do feito ao Tribunal de Justiça de São Paulo.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5162839-03.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - JUÍZA CONVOCADA MONICA BONAVINA
APELANTE: PAULO DONIZETE DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: EDGARD PAGLIARANI SAMPAIO - SP135327-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5162839-03.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - JUÍZA CONVOCADA MONICA BONAVINA
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda voltada à obtenção do benefício de auxílio-acidente por acidente do
trabalho e ulterior conversão em aposentadoria por invalidez por acidente do trabalho e,
subsidiariamente, do benefício de aposentadoria por invalidez por acidente do trabalho, ou,
sucessivamente, do benefício de auxílio-doença previdenciário.
Processado o feito, com realização de perícia médica, sobreveio sentença julgando
improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, condenando o requerente ao pagamento de
eventuais despesas processuais, bem como de honorários advocatícios fixados em 15% sobre
o valor da causa.
Apelou, o proponente, suscitando, em preliminar, a nulidade da sentença, por cerceamento de
defesa, com vistas à complementação do laudo e/ou à realização de nova perícia médica. No
mérito, pretende que seja reformado o julgado, sustentando, em síntese, a presença dos
requisitos à outorga das benesses.
Decorrido, in albis, o prazo para as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal DALDICE SANTANA: Não obstante os judiciosos
fundamentos, ouso divergir da eminenteRelatora pelos seguintes fundamentos.
No caso dos autos, a parte autora formulou pedido de concessão de benefício acidentário por
incapacidade e, subsidiariamente, benefício previdenciário por incapacidade.
Na petição inicial, alega estar totalmente incapacitada para o trabalho, por ser portadora de
doenças profissionais adquiridas em razão do exercício do seu trabalho na função de soldador.
Confiram-se (destaquei):
“(...) Em 10/04/2000 o autor foi contratado como empregado da empresa Facchini S/A, para
exercer a função de ajudante de produção, na Unidade 4, localizada na Av. José Marão Filho,
8754, Votuporanga-SP. Logo, em seguida passou a exercer a função de soldador (na CTPS
consta que em 01/04/2001 o autor já era soldador – fl. 33 da CTPS mais antiga).
(...) A lesão de que o autor é portador está relacionada ao trabalho, já que foi em função dele
que este passou a se desenvolver a doença em razão de ter que realizar esforço físico intenso
com os braços e operações repetitivas na montagem das carrocerias.
Portanto, ao autor foi vítima de um acidente do trabalho atípico, ou seja, de doença ocupacional
(doença do trabalho). (...)”
Nos termos do artigo 20, incisos I e II, da Lei 8.213/1991, consideram-se acidente do trabalho,
"doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho
peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do
Trabalho e da Previdência Social" e " doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou
desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se
relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I".
Note-se, que a própria parte autora refere a competência da Justiça Estadual para o
processamento e julgamento do feito.
De fato, trata-se de hipótese em que resta configurada a incompetência absoluta da Justiça
Federal para apreciar a matéria, conforme o disposto no artigo 109, inciso I, da Constituição
Federal:
"Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - As causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem
interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as
de acidente do trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do trabalho".
O Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 15, segundo a qual "Compete à Justiça
estadual processar e julgar os litígios decorrentes de acidente do trabalho".
Esse édito não faz senão eco à orientação já pacificada pelo Supremo Tribunal Federal que, a
respeito, também, publicou a Súmula n.501, com o seguinte enunciado:
"Compete à Justiça ordinária estadual o processo e o julgamento, em ambas as instâncias, das
causas de acidente do trabalho, ainda que promovidas contra a União, suas autarquias,
empresas públicas ou sociedades de economia mista."
Anote-se ter a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assentado que a competência
ratione materiae define-se pela causa de pedir e pelo pedido constantes na inicial (CC
88.999/SC, 2ª Seção, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJe de 4/8/2008; CC 78.695/RJ,
3ª Seção, Rel. Min. Carlos Fernando Mathias - Juiz convocado do TRF 1ª Região -, DJ de
1º/10/2007).
O fato de o laudo pericial ter afastado a existência de nexo causal não tem o condão de alterar
a competência para apreciação da matéria.
Além disso, a formulação de pedido subsidiário de concessão de benefício previdenciário pela
parte autora encontra óbice no ordenamento jurídico.
Nos termos do §1º do artigo 327 do Código de Processo Civil abaixo transcrito, a cumulação de
pedidos é licita desde que os pedidos sejam compatíveis entre si e seja competente para
conhecer deles o mesmo juízo.
Confiram-se (destaquei):
“Art. 327.É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos,
ainda que entre eles não haja conexão.
§ 1ºSão requisitos de admissibilidade da cumulação que:
I- os pedidos sejam compatíveis entre si;
II- seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; (...)”
No caso em análise, o pedido subsidiário formulado pela parte autora possui juízo competente
diverso do principal e, portanto, não preencheu os requisitos de admissibilidade da cumulação.
Assim, tendo em vista que o pedido principal refere-se a benefício de natureza acidentária e
que as Súmulas 235 e 501 do Supremo Tribunal Federal e a Súmula 15 do Superior Tribunal de
Justiça proclamam competir à Justiça Estadual, em ambas as instâncias, julgar as causas de
natureza acidentária, inclusive as relativas a reajuste de proventos (a propósito: STF, RE
345.486/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 24/10/2003, p. 30; STF, AI 154.938/RS, Rel. Min. Paulo
Brossard, DJ 24/6/94, p. 16.641; STJ CC 18.259, Rel. Min. Gilson DIPP, DJ 21/2/2000, p. 83;
STJ REsp 337.795, Min. Vicente Leal, DJ 16/9/2002, p. 238; STJ CC 38.962, Rel. Min. Laurita
Vaz, DJ 28/10/2002, p. 189), reconheço a incompetência absoluta deste Tribunal para apreciar
e julgar este feito e demais incidentes dele decorrentes.
Em consequência, determino a remessa dos autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, com as nossas homenagens.
É como voto.
Desembargadora Federal Daldice Santana
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5162839-03.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - JUÍZA CONVOCADA MONICA BONAVINA
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Trata-se de ação voltada à concessão de benefício por incapacidade de natureza acidentária
ou, subsidiariamente, previdenciária.
Inicialmente, transcrevo o histórico retratado na peça vestibular (doc. 196486269, negritos no
original):
"Em 10/04/2000 o autor foi contratado como empregado da empresa Facchini S/A, para exercer
a função de ajudante de produção, na Unidade 4, localizada na Av. José Marão Filho, 8754,
Votuporanga-SP. Logo, em seguida passou a exercer a função de soldador (na CTPS consta
que em 01/04/2001 o autor já era soldador – fl. 33 da CTPS mais antiga).
A partir de 01/04/2001 até 31/12/2010 o autor exerceu a função de soldador (vide o perfil
profissiográfico previdenciário –PPP anexo), sendo que foi em 31/07/2009 que foi feito o
diagnóstico de tendinopatia no ombro direito (vide o prontuário médico do autor e o exame de
ressonância magnética do ombro direito feita no dia 22/07/2009), lesão que acabou
incapacitando o requerente. Portanto, a função habitualmente exercida antes da incapacitação
era soldador.
A empresa construía carrocerias metálicas de caminhões e a atividade dela era de metalúrgica.
Entre as tarefas exercidas pelo requerente estava a soldagem e montagem de carrocerias. Para
realizar seu serviço precisava esforço físico intenso com os braços, pois era obrigado a carregar
peças muito pesadas nos ombros. Ele realizava operações repetitivas e devia cumprir metas
estabelecidas pela empresa. O autor trabalhava no setor de montagem de carrocerias diversas.
Ao exercer a função de soldador o autor estava sujeito a: a) posições forçadas; b) gestos
repetitivos; c) ritmo de trabalho penoso; e, d) vibrações localizadas.
Depois de alguns anos trabalhado nestas condições o autor passou a sofrer de tendinopatia no
ombro direito (tendinite). Em 14/07/2009 ele foi submetido a um exame médico em razão de
estar sentindo dor no ombro direito (vide o prontuário médico dele junto ao Dr. Onildo José da
Silveira, médico ortopedista).
Desde então o autor foi submetido a diversos exames médicos por solicitação do médico acima
citado e aos poucos a situação foi se agravando, já que o autor continuava a exercer as
mesmas funções e no mesmo setor (de montagem de carrocerias diversas).
Em 15/12/2009 o médico ortopedista do requerente informou por meio de atestado dirigido ao
médico do trabalho da empresa empregadora que o paciente apresentava tendinopatia no
ombro direito e apresentava dor aos movimentos de repetição e sugeriu que fosse feita a:
“READAPTAÇÃO AO TRABALHO” (vide documento anexo).
Em 2010 houve agravamento do quadro, sendo que em 01/2011 a empresa reconheceu que o
autor não podia mais continuar exercendo a função de soldador e nem poderia continuar no
setor em que trabalhava. A empresa readaptou o autor para outra função e então em 01/2011
ele foi remanejado para a função de atendente de recepcionista, no setor de “Portaria” ou
segurança patrimonial.
Para comprovar a readaptação na função vide fl. 27 da CTPS e os holerites dos meses de
dezembro de 2010 (no qual consta a função de soldador no setor de montagem de eixo
agrícola) e de janeiro de 2011 (no qual consta função de atendente recepcionista do setor de
segurança patrimonial).
Ainda para comprovar a readaptação na função apresentamos o atestado de saúde ocupacional
realizado no dia 01/01/2011, no qual consta que foi feito o exame para efeito de mudança de
função.
Mas o problema continuou, pois a doença é irreversível e não tem cura.
Portanto, considerando que a partir de 01/04/2001 até 01/2011 o autor exerceu a função de
soldador e que foi em 2009 que foi feito o diagnóstico de tendinopatia no ombro direito, conclui-
se que a profissão habitualmente exercida antes do início da incapacidade era de soldador.
A lesão de que o autor é portador está relacionada ao trabalho, já que foi em função dele que
este passou a se desenvolver a doença em razão de ter que realizar esforço físico intenso com
os braços e operações repetitivas na montagem das carrocerias.
Portanto, ao autor foi vítima de um acidente do trabalho atípico, ou seja, de doença ocupacional
(doença do trabalho)."
Em 07/06/2019, o requerente agilizou requerimento administrativo visando à concessão do
benefício de auxílio-doença previdenciário NB 31/628.291.367-9, indeferido, ao final, sob o
fundamento de ausência de incapacidade laborativa. O proponente debate que o indeferimento
foi indevido, visto "que ainda está incapaz para o trabalho" devido ao quadro de tendinopatia,
tendo, assim, o "direito de receber, por ora, um benefício de auxílio-doença".
Reiterando, então, o nexo causal ocupacional da enfermidade, o autor pleiteia a concessão do
benefício de auxílio-acidente por acidente do trabalho, "com termo inicial a partir de 31/07/2009,
data em que foi feito o diagnóstico de tendinopatia no ombro direito e que é considerada a data
do acidente do trabalho". Requer, ainda, a conversão do referido benefício, em aposentadoria
por invalidez por acidente do trabalho, a partir de 07/06/2019, data de entrada do requerimento
do benefício NB 31/628.291.367-9.
Subsidiariamente, postula a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez por
acidente do trabalho ou, sucessivamente, do benefício de auxílio-doença previdenciário, ambos,
também, a partir de 07/06/2019.
Pois bem. Realizada a perícia médica judicial em 16/10/2019, o laudo coligido ao doc.
196486351 e complementado no doc. 196486391 considerou o autor, então, com 49 anos de
idade, escolaridade: 2º grau completo, profissão: porteiro (3 anos), soldador (11 anos), ajudante
de produção em fabrica de móveis (1 ano), cobrança em cooperativa (2 anos), ajudante de
estoque (2 anos) e auxiliar administrativo, portador de tendinopatia no ombro direito.
Segue a anamnese retratada no laudo:
"Periciado adentrou a sala de pericias deambulando sem claudicação, alegando dores no
ombro direito, diagnosticado com tendinopatia em 2009, motivo pelo qual foi remanejado de
função na empresa e desde então realiza tratamento medicamentoso. Em 2010 houve
agravamento do quadro. Hoje alega dores no ombro direito, até mesmo para pegar pesos leves
como um capacete, pentear cabelo e realizar movimentos repetitivos com carga.
Refere fazer uso de medicações como flotar para alivio das dores. Não realiza fisioterapia.
Refere realizar acompanhamento com ortopedista anualmente."
O perito atestou, contudo, que a patologia diagnosticada não acarreta limitações funcionais,
redução da capacidade laboral, tampouco, incapacidade para o desempenho das atividades
laborativas desempenhadas atualmente pelo proponente.
O louvado registrou que há documentos médicos indicando início da doença, em 07/2009,
"quando exercia função de soldador, mas não é possível afirmar que a doença ao tempo era
incapacitante, pois em exame complementar não há sinais de ruptura ou gravidades. Foi
reabilitado para função de portaria em 01/2011. Exame complementar de 09/2010 apresenta
ligeira piora, com mínimo aumento da lesão, ainda sem ruptura ou gravidade, tanto que
periciado continuou a laborar até 12/2010".
Consignou, ainda, que, em 08/2012, a doença estava presente, porém sem gravidade. A partir
daí, há exame acusando pequena ruptura, todavia, nesse interregno, o periciado já estava
exercendo atividade leve, para a qual não havia impedimentos ou incapacidade.
Afirmou que a doença está presente e em evolução, mas não causa limitações para as
derradeiras funções exercidas pelo requerente, por serem leves.
Por fim, o expert afastou o nexo ocupacional da enfermidade e concluiu que não há
enquadramento nas situações previstas pelo Anexo III do Decreto n. 3.048/99.
O laudo judicial corrobora aquele realizado pelo INSS em 13/06/2019, na senda administrativa
(doc. 196486366), no qual, ao avaliar-se o quadro de tendinite de ombro, concluiu-se pela
ausência de sinais de fase álgica incapacitante, bem como pela inexistência de nexo causal
laboral da patologia.
Veja-se, mais, que, nem mesmo do laudo médico produzido em 16/09/2020, na ação trabalhista
nº 0010308-74.2020.5.15.0027, trazido pelo autor (doc. 196486383), extrai-se o nexo
ocupacional da doença, senão, como concausa e no estágio inicial da afecção, sem
repercussões, portanto, como fator de relevância na evolução do quadro:
"15 - Existe nexo causal ou concausa entre a lesão do ombro direito do reclamante com o seu
histórico laboral na Reclamada?
R= como descrito no laudo pericial:
“...é possível concluir a existência de concausalidade temporária entre a doença em seu estagio
inicial ao trabalho de soldador. A partir de 2011 o autor foi readaptado de função, mas a doença
continuou agravando, evoluindo para ruptura parcial de tendão supraespinhoso, manutenção de
fatores inflamatórios, presença de processos artríticos e agudização dos sintomas. Portanto,
devem ser considerados fatores extra-laborais de maior relevância na evolução da doença do
autor.”
Não resulta comprovado, nesse cenário, que a patologia ostentada pelo demandante tenha sido
desencadeada pelo exercício da atividade de soldador. Ainda que o mencionado ofício tenha
atuado como causa concorrente, tal se deu no estágio inicial da doença. Antes mesmo do
agravamento do quadro - quando houve pequena ruptura do tendão - em 2012, o promovente já
havia sido readaptado para função mais leve, em relação à qual não havia limitações.
De se refrisar, além disso, que se controverte, na presente demanda, o indeferimento, na via
administrativa, do requerimento de concessão do benefício de auxílio-doença NB 628.291.367-
9, espécie 31. Portanto, de natureza previdenciária.
Consoante entendimento consolidado do c. Superior Tribunal de Justiça, "a definição da
competência para a causa se estabelece levando em consideração os termos da demanda".
A propósito, cito o seguinte julgado:
"CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL E JUSTIÇA ESTADUAL.
DEMANDA DEDUZINDO PEDIDOS PARA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS
PREVIDENCIÁRIOS. COMPETÊNCIA ESTABELECIDA LEVANDO-SE EM CONSIDERAÇÃO
OS TERMOS DA PETIÇÃO INICIAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. A definição da competência para a causa se estabelece levando em consideração os termos
da demanda (e não a sua procedência ou improcedência, ou a legitimidade ou não das partes,
ou qualquer outro juízo a respeito da própria demanda). O juízo sobre competência é, portanto,
lógica e necessariamente, anterior a qualquer outro juízo sobre a causa. Sobre ela quem vai
decidir é o juiz considerado competente (e não o Tribunal que aprecia o conflito). Não fosse
assim, haveria uma indevida inversão na ordem natural das coisas: primeiro se julgaria (ou pré-
julgaria) a causa e depois, dependendo desse julgamento, definir-se-ia o juiz competente (que,
portanto, receberia uma causa já julgada, ou, pelo menos, pré-julgada). Precedentes: CC
51.181-SP, 1ª Seção, Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 20.03.2006; AgRg no CC 75.100-RJ, 1ª
Seção, Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 19.11.2007; CC 87.602-SP, 1ª Seção, Min. Teori
Albino Zavascki, DJ de 22.10.2007.
2. No caso, a autora ajuizou, em face do INSS, pedidos para concessão de benefícios
previdenciários (e não de natureza acidentária). Nos termos como proposta, a causa é da
competência da Justiça Federal.
3. Conflito conhecido e declarada a competência da Justiça Federal, a suscitada."
(CC 121.013/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
28/03/2012, DJe 03/04/2012)
Destarte, a causa de pedir e o pedido deduzidos na petição inicial, consorciados aos demais
elementos dos autos, atraem a competência deste e. Tribunal Regional Federal em sede
recursal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal.
Passo, assim, ao exame do apelo autoral, uma vez que cumpridos os requisitos de
admissibilidade, a teor do disposto no art. 1.011 do Código de Processo Civil.
Suscita, o apelante, em preliminar, a ocorrência de cerceamento de defesa.
No entanto, tal não se vislumbra, na espécie.
Com efeito, embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões da prova técnica, ela é
essencial nas causas que versem sobre a concessão de benefício por incapacidade, devendo
retratar o real estado de saúde da parte autora, de acordo com os documentos constantes dos
autos e outros eventualmente apresentados na realização da perícia.
Adite-se que o laudo pericial produzido nestes autos, elaborado por perito de confiança do juízo,
contém elementos bastantes para esquadrinhamento da alegada incapacidade, ao lume das
condições clínicas da parte autora, figurando desnecessária a realização de nova perícia, ou
mesmo, a complementação do laudo, para esclarecimentos ou análise de quesitos outros.
Acrescente-se que cabe, ao magistrado, no uso de seu poder instrutório, avaliar a suficiência da
prova para formular seu convencimento. Cite-se, a respeito, o art. 370 do Código de Processo
Civil.
No mérito, discute-se o direito da parte autora à concessão de benefício por incapacidade.
Nos termos do art. 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez - atualmente
denominada aposentadoria por incapacidade permanente, pela Emenda Constitucional n.
103/2019 - é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença - cuja
denominação foi, também, alterada pela EC n. 103/2019, para auxílio por incapacidade
temporária - for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o
exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio por incapacidade temporária é devido ao segurado temporariamente
incapacitado, nos termos do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não
para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade
habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do
Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra
atividade que garanta a subsistência - aposentadoria por invalidez/aposentadoria por
incapacidade permanente, ou a incapacidade temporária - auxílio-doença/auxílio por
incapacidade temporária, observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 -
cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração
de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da
Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou
agravamento dessa doença ou lesão.
Já o auxílio-acidente "será concedido, como indenização, ao segurado quando, após
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas
que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia." (art. 86, da
Lei n. 8.213/91).
Averbe-se que as lesões ou perturbações funcionais que impliquem na redução permanente da
capacidade para o trabalho habitual do segurado devem ser decorrentes de acidente de
qualquer natureza ou causa, ou seja, aquele de origem traumática e por exposição a agentes
exógenos, conforme conceito delimitado no parágrafo único do art. 30 do Decreto nº
3.048/1999, desde a sua redação original, atual § 1º do mesmo dispositivo legal, incluído pelo
Decreto nº 10.410/2020.
SITUAÇÃO DOS AUTOS
Consoante referenciado, o autor é portador de tendinopatia no ombro direito. Não obstante, o
laudo médico produzido em Juízo foi categórico em sua conclusão, no sentido de que a
patologia não impinge limitações funcionais ao postulante, redução da sua capacidade laboral,
ou mesmo, inaptidão para o exercício de sua atividade laborativa habitual.
Corroborando as conclusões do perito, transcrevo o resultado dos exames realizados, a
evidenciar o bom estado geral da parte autora:
"Exame Físico:
Peso: 68kg
Altura: 165cm
Estado Geral: Bom Estado Geral, corado, hidratado, acianótico e anictérico. Comparece sem
acompanhante à perícia.
Neurológico: Orientado e consciente, pensamentos estruturados e discurso conexo.
Coordenação motora dentro dos limites da normalidade para idade. Reflexos osteotendinosos
presentes e simétricos.
Cabeça e Pescoço: Mimica facial normal, sem desvio de rima.
Tórax: Coração: Bulhas normorrítmicas, normofonéticas, em dois tempos sem sopro. Ausência
de estase jugular. Pulmão: Murmúrio vesicular fisiológico, sem ruídos adventícios.
Abdome: Globoso 1+/4+, flácido, indolor à palpação, sem visceromegalia.
Membros superiores: Força muscular preservada, sem limitação dolorosa em membros
superiores. Ausência de sinais inflamatórios. Ausência de edema. Ombros: Teste de Neer:
Negativo. Teste de Jobe: Negativo. Teste de Hawkins: Negativo. Teste de Gerber: Negativo.
Teste de Yocum: Negativo. Aplicou força contraria durante os testes, na tentativa de impedi-los.
Coloca as mãos na nuca tranquilamente, abre e fecha os braços.
Membros inferiores: Força muscular preservada, sem limitação dolorosa em membrosinferiores.
Ausência de sinais inflamatórios. Ausência de edema.
Coluna: Sem alterações.
Pele: Sem alterações.
Não apresentou alterações nos testes específicos aplicados para membros superiores,
inferiores, coluna cervical e lombar."
O laudo médico considerou, na análise do caso, os dados e informações pessoais da parte
autora, a exposição dos fatos, bem assim os exames subsidiários apresentados.
De seu turno, os documentos médicos carreados aos autos pela parte autora não se mostram
hábeis a abalar a conclusão do laudo médico produzido em juízo, que foi exposto de forma
fundamentada após o estudo da documentação apresentada e das avaliações realizadas no
momento do exame pericial, analisando as moléstias constantes dos aludidos documentos.
Assim, constatada divergência entre o laudo e os documentos ofertados pela parte autora, o
primeiro deve prevalecer, uma vez que se trata de prova técnica realizada por profissional
habilitado e sob o crivo do contraditório, sendo certo, ainda, que a doença, por si só, não gera
direito à obtenção dos benefícios previdenciários ora pleiteados, fazendo-se necessário, em
casos que tais, a presença do pressuposto da incapacidade laborativa, ausente na espécie.
De se lembrar que os benefícios previdenciários decorrentes de incapacidade são regidos pela
cláusula "rebus sic stantibus", de modo que, havendo agravamento da moléstia ou alteração do
quadro de saúde da parte autora, pode ela postular administrativamente a concessão de novo
benefício.
Destarte, embora o magistrado não esteja adstrito às conclusões da perícia médica, podendo
fundamentar seu convencimento em outros elementos de prova, ex vi do citado art. 370 do
Código de Processo Civil, o conjunto probatório dos autos não demonstra a existência de
inaptidão ou redução da capacidade para o trabalho habitual da parte autora, restando
prejudicada a análise dos demais requisitos exigidos para a concessão dos benefícios
pleiteados, uma vez que estes são cumulativos, consoante os seguintes julgados desta 9ª
Turma: AC n. 0001402-03.2013.403.6124, Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS, e-
DJF3 de 02/12/2015; AC 0004282-76.2016.403.9999, Desembargadora Federal MARISA
SANTOS, e- DJF3 02/03/2016.
Ante o exposto, FIRMADA A COMPETÊNCIA DESTE E. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL EM
SEDE RECURSAL, REJEITO A PRELIMINAR SUSCITADA E, NO MÉRITO, NEGO
PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO POR INCAPACIDADE. DOENÇAS
OCUPACIONAIS. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA FEDERAL. ARTIGO 109, I, da
CF/1988. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 327, §1º, CPC.
- Nos termos do artigo 20, incisos I e II, da Lei 8.213/1991, consideram-se acidente do trabalho,
"doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho
peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do
Trabalho e da Previdência Social" e " doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou
desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se
relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I".
- Trata-se, portanto, de hipótese em que resta configurada a incompetência absoluta da Justiça
Federal para apreciar a matéria, conforme o disposto no artigo 109, inciso I, da Constituição
Federal.
- A competência ratione materiae define-se pela causa de pedir e pelo pedido constantes na
inicial. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
- À luz do § 1º do artigo 327 do Código de Processo Civil, a cumulação de pedidos é lícita
desde que os pedidos sejam compatíveis entre si e seja competente para conhecer deles o
mesmo juízo.
- O pedido subsidiário de concessão de benefício previdenciário possui juízo competente
diverso do principal e, portanto, não atende aos requisitos de admissibilidade da cumulação.
- Declaração de incompetência absoluta da Justiça Federal para apreciação e julgamento do
feito e demais incidentes dele decorrentes.
- Determinada a remessa do feito ao Tribunal de Justiça de São Paulo. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
maioria, decidiu reconhecer a incompetência absoluta deste Tribunal para apreciar e julgar o
feito e demais incidentes dele decorrentes, nos termos do voto da Desembargadora Federal
Daldice Santana, que foi acompanhada pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan e pelo
Juiz Federal Convocado Nilson Lopes (4º voto). Vencida a Relatora, que reconhecia a
competência deste Tribunal, rejeitava a preliminar suscitada e, no mérito, negava provimento à
apelação da parte autora. Julgamento nos termos do disposto no art. 942, caput e § 1º, do CPC.
Lavrará acórdão a Desembargadora Federal Daldice Santana
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
