
| D.E. Publicado em 13/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, conhecer do recurso do Ministério Público Federal, nos termos do voto da Desembargadora Federal Marisa Santos, que foi acompanhada pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan, vencido o Relator que não conhecia do recurso. Prosseguindo no julgamento, no mérito, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000882-88.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de agravo interno interposto em face da decisão monocrática que conheceu da apelação e lhe deu provimento, para julgar improcedente o pedido, cassando a tutela provisória de urgência.
Requer, o agravante, a reforma do julgado, de modo a ser a matéria reexaminada pela Turma, porquanto se subsume na condição de pessoa com deficiência. Sustenta estarem presentes os requisitos objetivo e subjetivo à concessão do benefício assistencial, cabendo à Turma, e não ao relator monocraticamente, o julgamento do recurso.
Dada ciência ao INSS.
Contraminuta não apresentada.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Não conhece do agravo interposto pelo MPF.
Com efeito, o Ministério Público não tem legitimidade para recorrer em favor da parte autora, devidamente representada nos autos.
A autora, no caso, foi considerada na perícia médica parcial e permanentemente incapacitada para o trabalho, em razão de doença física.
Não há doença mental, de modo que se encontra capaz para os atos da vida civil.
Seu advogado, devidamente representado, não interpôs recurso em face da decisão monocrática.
Trata-se de direito disponível, falecendo, ao final das contas, legitimidade ao Parquet, quando age como "custos legis", para substituir a parte na insurgência recursal, em hipótese de legitimação extraordinária não admitida na Constituição Federal.
Nesse diapasão:
AGRAVO INTERNO. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ILEGITIMIDADE RECURSAL. RENÚNCIA A BENEFÍCIO PARA OBTENÇÃO DE OUTRO MAIS VANTAJOSO. JULGADO RESCINDIDO. INEXIGIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. BOA-FÉ. AGRAVO DO MPF. NÃO CONHECIDO. AGRAVO DO RÉU. PROVIDO. 1. Embora personalíssimo, o direito a benefício previdenciário é disponível. O segurado, embora pessoa idosa, é capaz e se encontra devidamente representado por advogado constituído, não se evidenciando interesse público, social ou individual indisponível a justificar a intervenção recursal do Ministério Público Federal. 2. Há orientação firmada por esta 3ª Seção no sentido de que, exceto comprovada má-fé, é indevida a devolução dos valores recebidos a maior pelo segurado em decorrência do cumprimento de provimento judicial transitado em julgado que venha a ser rescindido. 3. Agravo interno do Ministério Público Federal não conhecido. 4. Agravo interno do réu provido para, em reforma da monocrática exarada, julgar improcedente o pedido para devolução dos valores recebidos por força do julgado rescindido, restando revogada a autorização para desconto dos valores recebidos por força do julgado rescindido e determinada a devolução dos valores eventualmente já descontados do segurado, acrescidos de juros de mora, contados da data deste julgamento, e correção monetária, desde a data de cada vencimento, calculados de acordo com o Manual de Cálculos e Procedimentos da Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o decidido pelo Plenário do e. Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n.º 870.947/SE (AR 00068598520154030000, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10332, Relator(a), DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, TRF3, TERCEIRA SEÇÃO, Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/12/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO). |
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM EMBARGOS DECLARATÓRIOS OPOSTOS EM FACE DE EMBARGOS INFRINGENTES. OMISSÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ILEGITIMIDADE RECURSAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS REJEITADOS. I - A parte embargante alega omissão no tocante à apreciação de artigos da Constituição Federal e da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). II - O v. acórdão embargado proferido por esta C. 3ª Seção de Julgamentos, à unanimidade, não conheceu de embargos de declaração anteriormente opostos pelo Ministério Público Federal, sob fundamento de carecer o órgão ministerial de legitimidade para interpor referido recurso. III - No caso em tela, o Parquet Federal não é parte no processo e a discussão em foco envolve direito patrimonial disponível, não se verificando quaisquer das situações elencadas no artigo 82 do CPC e na Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), de modo que configurada sua ilegitimidade recursal. IV - Embargos declaratórios rejeitados (EI 00057476420124036183, EI - EMBARGOS INFRINGENTES - 1833095, Relator(a) JUIZ CONVOCADO VALDECI DOS SANTOS, TRF3, TERCEIRA SEÇÃO, Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/06/2015). |
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LEGITIMIDADE RECURSAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. FALECIMENTO DO AUTOR APÓS O JULGAMENTO DA AÇÃO. INCORPORAÇÃO DE DIREITOS AO PATRIMÔNIO JURÍDICO DA PARTE AUTORA. PRETENSÃO DOS SUCESSORES DE RECEBEREM OS VALORES DEVIDOS. DECRETO 6.214/2007, ART. 23, PARÁGRAFO ÚNICO. HABILITAÇÃO DE HERDEIROS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. - Ilegitimidade do Ministério Público para agir em nome da herdeira, pleiteando sua habilitação e pagamento dos valores devidos ao falecido. - Legitimidade do Ministério Público, tão somente, para requerer a regularização processual. - Prejudicial de conhecimento do recurso afastada. - Inconteste na hipótese dos autos o direito dos herdeiros em receber os valores devidos ao de cujus, por força da decisão transitada em julgado. - Nos termos do art. 23, do Decreto nº 6.214/2007, o benefício de prestação continuada é intransferível, não gerando direito à pensão por morte aos herdeiros ou sucessores. - Porém, permanece a pretensão dos sucessores de receberem os valores eventualmente devidos, a teor do que dispõe o parágrafo único, do art. 23, do Decreto nº 6.214/2007. Precedentes. - Quanto à regularização processual, com a morte do beneficiário representado cessa a legitimidade do Ministério Público, devendo ser aplicado extensivamente à hipótese o disposto no art. 43 e 265, I, do Código de Processo Civil. - Nos termos dos arts. 1056, I, e 1060, I, do Código de Processo Civil, a habilitação pode ser requerida pela parte, em relação aos sucessores do falecido, procedendo-se nos autos da causa principal e independente de sentença quando promovida por herdeiros necessários. - Preliminar rejeitada. Apelação parcialmente provida (AC 00010831320014036106, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1029315, Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, TRF3, DÉCIMA TURMA, Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/11/2010 PÁGINA: 1533 ..FONTE_REPUBLICACAO). |
Forçoso acrescentar que o próprio Ministério Público Federal deixa de se manifestar em um sem número de casos, em que se discute a concessão de benefício assistencial, seja em ações movidas por idosos, seja por movidas por pretendentes à condição de pessoas com deficiência. Elenco alguns poucos casos, obtidos em pesquisa rápida no próprio sistema (GEDPRO) usado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em que fui eu próprio o relator:
- 2017.03.99.034104-3
- 2017.03.99.022014-8
- 2007.61.09.011495-0
- 2016.03.99.040537-5
- 2015.61.04.002294-1
Enfim, incabível é a tutela do Ministério Público para direitos individuais disponíveis.
Quanto à decisão monocrática, tal qual o pretérito 557 do CPC de 1973, a regra do artigo 932, IV e V, do Novo CPC reveste-se de plena constitucionalidade, ressaltando-se que alegações de descabimento da decisão monocrática ou nulidade perdem o objeto com a mera submissão do agravo ao crivo da Turma (mutatis mutandis, vide STJ-Corte Especial, REsp 1.049.974, Min. Luiz Fux, j. 2.6.10, DJ 3.8910).
Se vencido quanto à ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, reitero todos os termos da decisão monocrática (f. 172/174) quanto ao mérito, de modo a considerar ausentes ambos os requisitos da miserabilidade (renda mensal per capita superior a ½ salário mínimo) e da deficiência (incapacidade parcial, contingência tutelada pela previdência social, na forma do artigo 201, I, da CF/88).
Uma vez mais, entendo que o benefício assistencial de prestação continuada não pode ser postulado como mero substituto de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, por aqueles que não mais gozam da proteção previdenciária (artigo 15 da Lei nº 8.213/91), ou dela nunca usufruíram.
Muitos casos de incapacidade parcial temporária ou mesmo permanente para o trabalho devem ser tutelados exclusivamente pelo seguro social (artigo 201 da CF), à medida que a condição de saúde do interessado (física ou mental) não gera a segregação social ínsita à condição de pessoa com deficiência. De fato, somente em relação ao benefício assistencial há necessidade de abordar a questão da integração social.
Daí que a distinção entre as searas de cobertura da assistência e previdência sociais se faz pertinente, sobretudo porque a cobertura dos riscos sociais invalidez e doença depende do pagamento de contribuições, na forma dos artigos 201, caput e inciso I, da Constituição Federal, que têm a seguinte dicção:
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: |
I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)" |
A distinção é absolutamente necessária porque aberraria do senso lógico o legislador constitucional prever cobertura de certos eventos, mediante o pagamento de contribuições, e ao mesmo tempo oferecer cobertura gratuita dos mesmos eventos pela assistência social. Interpretação, essa, que colocaria em cheque todo o sistema contributivo da previdência social.
Haverá casos, dessarte, em que o interessado, conquanto incapaz total ou parcialmente, definitiva ou temporariamente, não fará jus ao benefício assistencial, à medida que não se enquadrará na condição de pessoa com deficiência.
Noutros termos, a pretendida ampliação do espectro da norma do artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93 encontra óbice na própria Constituição da República, segundo a qual caberá à Previdência Social a cobertura dos eventos "doença" e "invalidez" (artigo 201, I), observando-se que, no caso, sequer invalidez há.
Entendimento contrário poderá gerar ofensa aos princípios da seletividade e distributividade (artigo 194, § único, III, da Constituição Federal), à medida que obrigará a assistência social - de abrangência limitada por ser não contributiva - a cobrir necessidades sociais de responsabilidade da previdência social, gerando, com isso, desequilíbrio no aspecto do custeio de todo o sistema tripartite da seguridade social.
Estes fundamentos aqui apresentados constituem observações hoje necessárias, à luz da regra inserta no artigo 20, caput, da LINDB, in verbis:
"Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)" |
Sem querer ingressar no campo da futurologia, tenho que as consequências práticas da interpretação ampliativa do conceito de pessoa com deficiência, proposta pelo Ministério Público Federal, implicarão atribuir obrigações extraordinárias ao combalido Estado de Bem-Estar social criado pela Constituição Federal de 1988 (que, a propósito, foi promulgada na contramão da história, porque entrou em vigor um ano antes da queda do Muro de Berlim, e já passou por mais de cem emendas, sem falar nas mais de mil propostas de emenda em trâmite no Congresso Nacional, e também sem mencionar o entendimento de muitos pela necessidade de uma nova Assembleia Constituinte).
Impende reconhecer que, no Brasil, a assunção, pela assistência social, de coberturas constitucionalmente reservadas à contributiva previdência social, sem a necessária chancela do Legislativo e sem qualquer planejamento estratégico, pode gerar, a médico e longo prazos, efeitos econômicas e sociais muito sérios, cujos exatos contornos não cabem aqui ser discutidos (aumento de tributos e contribuições sociais, precarização da proteção previdenciária por queda de receitas, crescimento baixo, crises econômicas, déficit fiscal, inflação, desemprego, falta de competitividade etc, etc, etc), mas que, pelas experiências passadas, e como sói ocorrer, acabarão por prejudicar as camadas mais pobres da população.
Diante do exposto, não conheço do agravo interno, por ausência de legitimidade do Ministério Público Federal. Se vencido na preliminar, quanto ao mérito, voto por negar provimento ao agravo.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 03/12/2018 19:44:09 |
