Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0003988-70.2020.4.03.6317
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA ORTIZ TAVARES COSTA ZANONI
Órgão Julgador
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
25/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 02/12/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI N.
8742/93. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. IMÓVEL
PRÓPRIO E COM POTENCIAL DE RENDA. DESPESA COM PACOTE DE TELEVISÃO.
JULGAMENTO DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 567.985 E 580.963. MISERABILIDADE
NÃO DEMONSTRADA. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003988-70.2020.4.03.6317
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DO SOCORRO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: RUY MOLINA LACERDA FRANCO JUNIOR - SP241326-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003988-70.2020.4.03.6317
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DO SOCORRO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: RUY MOLINA LACERDA FRANCO JUNIOR - SP241326-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora pleiteou a concessão de benefício assistencial ao idoso. Houve a elaboração de
laudo socioeconômico. O juízo singular julgou improcedente o pedido formulado na inicial.
Desta forma, recorre a parte autora pleiteando a ampla reforma da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0003988-70.2020.4.03.6317
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DO SOCORRO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: RUY MOLINA LACERDA FRANCO JUNIOR - SP241326-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Não assiste razão à parte recorrente.
O benefício de prestação continuada de um salário mínimo foi assegurado pela Constituição
federal nos seguintes termos:
“Art.203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, conforme dispuser a lei”.
Assim, a norma constitucional estabelece como parâmetro para o exercício do direito ao
benefício assistencial a coexistência de dois pressupostos, de um lado, sob o aspecto subjetivo,
ser a pessoa idosa ou com deficiência, e de outro lado, sob o aspecto objetivo a
hipossuficiência econômica. A Lei n° 8.742, de 07.12.93, cuidou, originariamente, do Benefício
Assistencial, que veio sofrer alterações da Lei n. 12.435, de 06/07/2011, e da Lei n. 12.470, de
31/08/2011, cuja leitura deve ser feita dentro dos parâmetros da norma constitucional.
Requisito etário. A Lei n° 8.742, de 07.12.93, estabelecia na redação original do artigo 20 a
idade de 70 (setenta) anos para preenchimento do requisito etário. Contudo, a idade a ser
considerada foi reduzida para 65 (sessenta e cinco) anos de idade - artigo 33 da Lei n.
10.741/03 -, idade mantida com a nova redação do artigo 20.
Requisito dahipossuficiênciaeconômica. A lei exige para a concessão do benefício assistencial
que a renda mensal da família per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo.
Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do dispositivo legal
na ADIN nº. 1.232/DF, o que não impediu, contudo, que a exigência legal fosse mitigada
considerando as peculiaridades do caso concreto. A Corte Suprema pronunciou-se
recentemente acerca do tema, nos julgamentos dos Recursos Extraordinários nºs. 567.985 e
580.963, proferidos dentro da sistemática da repercussão geral, onde restou assentada não só
a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia do parágrafo 3° do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993
(RE n. 567.985/MS), mas também a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia
de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/2003 (RE n. 580.963/PR).
Nas decisões mencionadas, o STF esclareceu que ao longo dos últimos anos houve uma
proliferação de leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros
benefícios assistenciais (Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; Lei n. 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Informação; e a Lei n. 10.219/2001, que criou o
Bolsa Escola) e apontou a utilização do valor de meio salário mínimo como valor padrão da
renda familiar per capita para análise do preenchimento do requisito da hipossuficiência
econômica que deve ser analisado em conjunto com as peculiaridades do caso concreto.
Reconheceu, ainda, ao analisar o Art. 34 parágrafo único da Lei n. 10.741/03, que não há
justificativa plausível para a discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos,
bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de
benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.
Assim, adoto o critério de meio salário mínimo para análise do preenchimento do requisito da
hipossuficiência econômica.
Nos casos em que o valor do benefício previdenciário for superior ao do salário mínimo, fica
afastada a aplicação analógica da regra objetiva do artigo 34 da Lei nº 10.741/2003, o que não
exclui a leitura de que a percepção do benefício próximo ao mínimo legal, em muito se
assemelha a situação prevista em lei, o que autoriza a concessão do benefício desde que se
evidencie elementos de pobreza extrema no conjunto probatório.
Núcleo familiar. A redação atualizada da Lei n° 8.742, de 07.12.9, contempla como núcleo
familiar o requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, e na ausência de um deles, a madrasta
ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde
que vivam sob o mesmo teto - ex vi do art. 20, § 1º. De forma que não pode ser computada a
renda de familiares que constituíram nova família.
Assim, em princípio, os filhos que constituíram família, que tem dever de sustento de sua prole,
com despesas domésticas que consomem a renda, estão desobrigados do dever de sustento
imposto pelo artigo 229 da Constituição Federal. De forma que é fundamental a análise do caso
concreto à luz do princípio da razoabilidade, para considerar a situação econômica dos
ascendentes e descendentes, quando se verificar sinais de riqueza que imponha o dever de
alimentos.
De outro lado, evidenciado que a família possui parcas condições econômicas, emerge a
previsão do comando constitucional do capítulo relativo à assistência social, quando refere que
a assistência social será prestada pelo Estado ao Idoso ou deficiente que comprove não possuir
meios de prover sua subsistência ou tê-la provida por sua família - ex vi do inciso V do artigo
230 da Constituição Federal.
Da existência de imóvel com potencial de renda ou móvel que exteriorize sinais de riqueza. É
de se ponderar que a existência de bem imóvel com possibilidade de renda, afasta a
necessidade da tutela do Estado para subsidiar a situação econômica familiar, pelo menos
diante dos requisitos impostos pelo legislador. Da existência de patrimônio emerge a
possibilidade de renda e sinais de riqueza incompatíveis com a situação de miserabilidade. O
imóvel do núcleo familiar não é modesto, a revelar hipossuficiência econômica. A
desconsideração do patrimônio pode criar situação de desigualdade na concessão do benefício
assistencial, com a concessão para proprietário de imóvel de valor razoável, que poderia ser
fonte de renda, mas com renda per capita na forma da lei, e a não concessão para pessoa com
imóvel em local insalubre, mas com a renda superior à exigência da lei. Veja-se que nos dois
casos o patrimônio revela a existência ou não da hipossuficiência. No primeiro para excluir o
benefício, já que o interessado no benefício pode auferir renda do seu próprio patrimônio e no
segundo porque a condição do imóvel indica a sua condição socioeconômica desfavorável.
Ademais, é preciso considerar a existência de bens móveis, como televisores de valor alto,
computadores, carros, entre outros, que revelem a existência de renda não declarada.
No caso de que ora se cuida, o grupo familiar é composto apenas pela autora. Sua subsistência
é provida pela renda mensal de R$ 240,00 proveniente do trabalho informal como passadeira, e
com a ajuda do filho Marcelo, de uma ex-empregadora e de amigos, que doam alimentos e
ajudam a pagar as contas. De sorte que a renda "per capita" fica abaixo do meio salário
mínimo. Contudo, consta do laudo social que a autora reside em casa própria e há no mesmo
endereço outros 04 imóveis, em três residem familiares da autora e no outro reside uma
desconhecida sem vínculos familiares com a autora. Assim, o imóvel da parte autora tem
potencial para lhe proporcionar renda. Ademais, dentre as despesas da parte autora, consta o
valor de R$ 98,21 (abril/2021) referente a “Pacote de Televisão”, o que não condiz com a
alegada situação de miserabilidade. Por fim, observo que nas fotos da residência da parte
autora aparecem produtos demonstrando que, com a ajuda de familiares e amigos, está
conseguindo viver com relativo conforto e dignidade (sabonete líquido, amaciante de roupas,
sabão em pó da marca “Omo” e produto de limpeza da marca “Veja”). Dessa forma, entendo
que não restou caracterizada situação de penúria capaz de ensejar a concessão do benefício
pleiteado.
Assim, não há que ser concedido o benefício assistencial à parte autora, eis que a condição de
miserabilidade não restou comprovada no caso concreto.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso da parte autora.
Condeno a PARTE RECORRENTE VENCIDA em honorários advocatícios que fixo em 10%
(dez por cento) do valor da condenação; caso o valor da demanda ultrapasse 200 (duzentos)
salários mínimos, arbitro os honorários sucumbenciais na alíquota mínima prevista nos incisos
do parágrafo 3º do artigo 85 do CPC. Na ausência de proveito econômico, os honorários serão
devidos no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, cuja execução
deverá observar o disposto no artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil, por força do
deferimento da gratuidade nos autos.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI N.
8742/93. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. IMÓVEL
PRÓPRIO E COM POTENCIAL DE RENDA. DESPESA COM PACOTE DE TELEVISÃO.
JULGAMENTO DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 567.985 E 580.963.
MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA
PROVIMENTO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por
unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
