Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5595906-59.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/11/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 21/11/2019
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR REJEITADA. IDOSO.
HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. INVERSÃO DO ÔNUS DA
SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
1. Preliminar rejeitada. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa
necessária não conhecida.
2. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
3. Requisito etário preenchido.
4. Não demonstrada a existência de miserabilidade. O conjunto probatório indica que a autora
está amparada pela família que vive em casa própria e possui rendimento formal. O benefício
assistencial não se presta a complementação de renda.
5. Inversão do ônus da sucumbência.
6. Tutela antecipada revogada. Desnecessária a devolução dos valores. Inaplicabilidade do
decidido no REsp nº 1401560/MT aos benefícios assistenciais.
7. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5595906-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ZENAIDE DURAO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5595906-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ZENAIDE DURAO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada
(LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa idosa.
A sentença, prolatada em 22.01.2019, julgou o pedido procedente nos termos que seguem: "Ante
o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido inicial para determinar a implantação do benefício de
amparo social ao idoso à parte autora no valor de um salário mínimo, com pagamento das
prestações vencidas a partir do requerimento administrativo (05/11/2015). Quanto aos juros de
mora incidentes sobre esses débitos, nos termos Supremo Tribunal Federal no julgamento do
Recurso Especial nº 870947, para débitos de natureza não tributária, como no presente caso,
deve ser utilizado o índice de remuneração da poupança, sendo devidos desde a citação. Para a
correção monetária, nos termos do referido julgamento, deverá ser utilizado o índice IPCA-E,
sobre as prestações em atraso, desde as respectivas competências. Considerando a natureza
alimentar do benefício, antecipo a tutela na sentença para determinar a implantação do benefício
de Amparo Social ao Idoso, com DIB em 05/11/2015 (data do requerimento administrativo) e DIP
em 22/01/2019 (data da sentença), oficiando-se à APSADJ em Marília para o cumprimento no
prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária. Deverá a agência responsável pelo
atendimento às determinações judiciais comprovar a implantação do benefício via e-mail
institucional desta comarca, ou seja, chavantes@tjsp.jus.br. Sucumbente o réu, arcará com o
pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 10% do valor da condenação, excetuadas
as prestações vincendas (Súmula 111, do STJ). Não há reembolso de custas ou despesas
processuais, salvo aquelas comprovadas. Em consequência, JULGO EXTINTO O PROCESSO
DE CONHECIMENTO, com análise de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Novo Código
de Processo Civil. É certo que, no presente feito, o valor da condenação demanda unicamente de
mero cálculo aritmético, não se tratando de sentença ilíquida, assim sob este prisma, verifica-se
de plano que o valor da condenação é inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, razão pela qual não
há que se falar em cabimento da remessa oficial (artigo 496, § 3º, do Novo Código de Processo
Civil e Súmula 490 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça). Publique-se. Intimem-se.
Dispensado o registro (Provimento CG n. 27/2016) e o cálculo de apuração do preparo recursal
(Comunicado CG n. 916/2016).".
Apela o INSS requerendo preliminarmente a submissão da sentença ao reexame necessário. No
mérito, pugna pela improcedência do pedido ante a ausência de miserabilidade.
Subsidiariamente, caso mantida a procedência do pedido, requer a reforma da sentença no
tocante aos critérios de atualização do débito.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação do INSS.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5595906-59.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ZENAIDE DURAO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: JOSE BRUN JUNIOR - SP128366-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Rejeito a preliminar arguida pelo INSS.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo
termo inicial do benefício, seu valor e a data da sentença, que o valor total a condenação será
inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496
do Código de Processo Civil de 2015.
Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados
no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Passo ao exame do mérito.
A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos
legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição
Federal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei
nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Da análise dos autos verifica-se que a autora, nascida em 22.10.1945, contava com 70 anos de
idade no momento do ajuizamento da ação, e, portanto, inserida no conceito legal de idosa para
fins de concessão do benefício assistencial.
Assim, restando atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a
redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-
se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de
ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do
salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua:
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover
sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1
(um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº
6.214, de 2007)
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não
será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a
inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento,
ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em,
relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos
idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de
recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido
a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34
do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por
pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um
salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da
Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO
ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador
S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe
05/11/2015)
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi
questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente.
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência
evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir
pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto,
a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação
da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(STJ, Terceira Seção, REsp 1112557/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/2009,
DJe 20/11/2009)
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema
a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em
18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art.
20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização
decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas
modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de
outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93
indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido
reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e
suprimir a inconstitucionalidade apontada.
Dessa forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente
aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício
assistencial.
Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social elaborado em 09.03.2018 (ID-
57792705) revela que a parte autora reside com seu marido em imóvel próprio com as seguintes
características: “Características da residência (há figuras em anexo autorizadas pela periciada e
marido): Casa de alvenaria, com aproximadamente 55 mt², de alvenaria, telhas tipo cerâmica, com
marcas de umidade nas paredes externas, aquecimento solar instalado pela força e luz, piso tipo
cerâmico, área na frente da casa, com telha tipo eternit, contra piso, paredes rebocadas; com
cadeiras; sala com jogo de sofá; raque com painel na parede com TV, poltrona, mesinha de
centro; cozinha com armários, pia com armário, fogão, exaustor, freezer, geladeira, micro ondas,
batedeira, frigobar; lavanderia com tanque de duas cubas, maquina de lavar roupa, baldes,
bacias, mesa de passar roupa, aramados com roupas, produto de limpeza e higiene; área
comprida, fechada, coberta com telha tipo Eternit, com gaiola, mesa, cadeiras, armários, forno de
frango (“frango de vitrine” que declara ter ganho da filha para vender carnes mas a despesa é alta
e declara não valer a pena); banheiro completo com piso e paredes tipo cerâmico, armários,
espelho, barras; 1° quarto com cama de solteiro, criado mudo, penteadeira, guarda roupa; 2°
quarto com cama de casal, guarda roupa que esta pagando a prestação, raque com TV, DVD,
caixas. Edícula com aproximadamente 15 mt² rebocada, contra piso, telhas tipo Eternit, com
cômodo com prateleiras, caixas, sacolas, estrado e cabeceira de cama, colchão, vassouras e
entulhos; área aberta com pia com armário, varal, armário, fruteira, fogão a lenha, pisos
empilhados; banheiro inacabado, com patente, torneira e laterais de cama; no quintal muitos
entulhos. Casa limpa e organizada. Mobiliários (declara a periciada que a maioria ganhou da filha)
e eletrodomésticos em bom estado de conservação. As condições de moradia atendem as
necessidades da família. Rua asfaltada com meio fio e calçada.”
Informaram que a renda da casa advém da aposentadoria do marido da parte autora, no valor de
um salário mínimo (R$ 954,00). Tem-se ainda que a autora faz sorvetes para vender, o que lhe
rende cerca de R$ 100,00/mês.
Relataram despesas com financiamento da casa (R$ 152,57), água (R$ 30,60), energia elétrica
(R$ 141,44), alimentação/supermercado (R$ 220,00), celular (R$ 12,00) e prestação do guarda-
roupas (oito parcelas de R$ 120,00), entre outros gastos.
Consta ainda que ganham roupas e parentes de outra cidade o os filhos, quando visitam trazem
verduras.
Do conjunto probatório não se vislumbra a existência de miserabilidade, não havendo evidências
de que as necessidades básicas da parte autora não estejam sendo supridas.
Anote-se que a autora vive em casa própria que lhe oferece abrigo e conforto, e a família
apresente rendimento formal, o que a princípio, afasta a existência de vulnerabilidade econômica.
Nesse sentido assim a perita social assentou: “Observações: As informações foram prestadas
pela própria periciada e seu esposo; periciada declara que não trabalhou fora; são beneficiados
pelo programa de natureza publica na área da saúde com consultas, exames e medicação; No
momento não necessita de nenhuma alimentação especial, objetos e/ou equipamentos para
melhorar suas condições de saúde/mobilidade; os fatores climáticos não interferem na casa,
localizada longe do centro da cidade; dispõe de apoio do marido e da filha Mariza que reside na
cidade de Cianorte (quando o pai se acidentou e estava em cadeira de roda ficaram quinze dias
com os pais, mandou construir a área da frente para o marido da periciada ficar durante o dia);
conversa com poucos vizinhos e por telefone com a mulher do sobrinho Anali, que mora próximo,
mas quase não se vem; não sabe realizar compras (só o marido), nem mexer em caixa eletrônico;
a tarefa domestica é realizada pela periciada sem ajuda de ninguém; aparenta e declara ter
controle de comportamento de maneira contextual e socialmente estabelecida; vota nas eleições.
Declara fazer e vender sorvetes a principio tirar uns R$ 10,00 por dia outros dias R$ 2,00 e depois
declara que utilizam um freezer antigo que consome muita luz, o que vende de sorvete não paga
a despesa de luz, mas já acostumou e gosta de fazer sorvete.”
Nota-se claramente que a autora está amparada pelo marido, filhos e familiares.
Por certo que nos termos do § 1o do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, para os
efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os
pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e
enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada
pela Lei nº 12.435, de 2011).
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados não integrarem o núcleo familiar para fins de
aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista
que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso
ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a
regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os
pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697
da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado
de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Nesse sentido, aliás, a decisão proferida pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados
Especiais Federais (TNU), datada de 23 de fevereiro de 2017, em sede de pedido de
uniformização de jurisprudência formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS nos
autos do processo nº 0517397-48.2012.4.05.8300, que firmou posicionamento no sentido que "o
benefício assistencial de prestação continuada pode ser indeferido se ficar demonstrado que os
devedores legais podem prestar alimentos civis sem prejuízo de sua manutenção".
Acresça-se que em relação ao filho José e o neto Willian, não obstante estarem desempregados
no momento da visita da assistente social, não há nada que indique impedimento de inserção no
mercado de trabalho. Ademais, habitando a mesma casa, concorrem com os gastos e devem
participar com o seu custeio e manutenção.
Dessa forma, em que pese a ausência de rendimento formal da apelante, depreende-se do
estudo social que coabita residência com boas condições de uso e higiene, havendo possibilidade
das suas necessidades básicas serem supridas pela família.
Enfatizo, o benefício assistencial não se presta à complementação de renda.
Desta forma, diante do conjunto probatório que se apresenta nos autos, verifico que não restou
caracterizada a condição de miserabilidade necessária para concessão do benefício assistencial,
que resta indevido.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de
advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §8º do artigo 85 do
Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe
foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo
Civil/2015.
Por fim, revogo a tutela antecipada. Esclareço, todavia, que tratando-se de benefício assistencial,
entendo indevida a devolução dos valores indevidamente pagos a esse título, não se aplicando
ao caso o entendimento firmado pelo STJ no REsp nº 1401560/MT, referente apenas aos
benefícios previdenciários.
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pelo INSS e, no mérito, DOU PROVIMENTO à sua
apelação e, consequentemente, revogo a antecipação da tutela, nos termos da fundamentação
exposta.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR REJEITADA. IDOSO.
HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. INVERSÃO DO ÔNUS DA
SUCUMBÊNCIA. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA.
1. Preliminar rejeitada. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa
necessária não conhecida.
2. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da
Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco)
anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a
própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da
Lei nº 8.742/93.
3. Requisito etário preenchido.
4. Não demonstrada a existência de miserabilidade. O conjunto probatório indica que a autora
está amparada pela família que vive em casa própria e possui rendimento formal. O benefício
assistencial não se presta a complementação de renda.
5. Inversão do ônus da sucumbência.
6. Tutela antecipada revogada. Desnecessária a devolução dos valores. Inaplicabilidade do
decidido no REsp nº 1401560/MT aos benefícios assistenciais.
7. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar arguida pelo INSS e, no mérito, dar provimento à sua
apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
