
| D.E. Publicado em 07/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038335-49.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão de benefício assistencial (art. 203, inciso V, da Constituição Federal), sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao pagamento das verbas de sucumbência, observada a gratuidade da justiça.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, pugnando, preliminarmente, pela anulação da decisão pelo cerceamento de defesa em razão da ausência de audiência de oitiva de testemunhas. No mérito, requer a reforma da sentença para que seja julgado procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais.
Sem as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal, em seu parecer, opinou pelo não provimento do recurso de apelação interposto.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo o recurso de apelação da parte autora, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
Fica afastada a arguição de cerceamento de defesa, uma vez que a prova oral em nada modificaria o resultado da lide, pois o benefício foi indeferido conforme análise do estudo social. Neste caso, a prova oral não teria o condão de afastar o teor da r. sentença.
Superada tal questão, passa-se ao exame e julgamento do mérito.
Postula a parte autora a concessão de benefício assistencial, no valor de um salário mínimo.
Tal benefício está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, bem como na Lei nº 8.742/93.
Consoante regra do art. 203, inciso V, da CF, a assistência social será prestada à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem "não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família".
A Lei nº 8.742/93, que dispõe sobre a organização da Assistência Social, veio regulamentar o referido dispositivo constitucional, estabelecendo em seu art. 20 os requisitos para sua concessão, quais sejam, ser pessoa portadora de deficiência ou idosa, bem como ter renda familiar inferior a ¼ do salário mínimo.
Considera-se pessoa com deficiência, para fins de concessão do benefício de prestação continuada, aquela que, segundo o disposto no artigo 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela lei nº 13.146/2015, "tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas".
Quanto ao primeiro requisito, deve-se atentar ao laudo pericial (fls. 103/109), atestando que a parte autora é portadora de autismo, necessitando de cuidados de terceiros para a manutenção da vida, o que é suficiente para o cumprimento da exigência legal.
De outra parte, quanto à insuficiência de recursos para prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família, ressalta-se que o objetivo da assistência social é prover o mínimo para a manutenção do idoso ou portador de deficiência, de modo a assegurar-lhe uma qualidade de vida digna. Por isso, para sua concessão não há que se exigir uma situação de miserabilidade absoluta, bastando a caracterização de que o beneficiário não tem condições de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família.
Não se tem dúvida de que o § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 é constitucional, tendo o Supremo Tribunal Federal decidido nesse sentido (ADIN nº 1.232/DF, Relator p/ acórdão Ministro Nelson Jobim, j. 27/08/1998DJ 01/06/2001).
Todavia, o disposto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 não é o único meio de comprovação da miserabilidade do deficiente ou do idoso, devendo a respectiva aferição ser feita, também, com base em elementos de prova colhidos ao longo do processo, observada as circunstâncias específicas relativas ao postulante do benefício. Lembra-se aqui precedente do Superior Tribunal de Justiça, que não restringe os meios de comprovação da condição de miserabilidade do deficiente ou idoso:
A jurisprudência passou, então, a admitir a possibilidade do exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família, interpretação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do CPC (REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28/10/2009; DJ 20/11/2009).
A questão voltou à análise do Supremo Tribunal Federal, sendo que após o reconhecimento da existência de repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4.374 - PE, julgada em 18/04/2013, prevaleceu o entendimento segundo o qual as significativas mudanças econômicas, bem como as legislações em matéria de benefícios previdenciários e assistenciais trouxeram outros critérios econômicos que aumentaram o valor padrão da renda familiar per capita, de maneira que, ao longo de vários anos, desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS, passou por um processo de inconstitucionalização, conforme ementa a seguir transcrita:
No julgamento dos Recursos Especiais Repetitivos nº 1.355.052/SP e nº 1.112.557/MG foi fixada orientação no sentido de que a norma em causa não se mostra como o único critério possível para a apuração da necessidade do recebimento do benefício.
Por sua vez, a Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) incluiu o § 11 ao art. 20 da LOAS, acolhendo outros elementos de prova com condição da miserabilidade e da situação de vulnerabilidade do núcleo familiar do requerente de benefício, além do critério objetivo de renda mensal "per capita" no valor inferior a ¼ do salário mínimo.
Assim, deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante à renda informada, caso a caso.
No presente caso, o estudo social, realizado em junho de 2016 (fls. 92/95), revela que o requerente reside com os genitores, em imóvel cedido pela avó paterna, em boas condições de moradia. A renda da unidade familiar é composta pelo salário auferido pelo pai, no valor de R$ 1.600,00 (mil e seiscentos reais). Não foram relatados gastos e, em relação aos problemas de saúde do requerente, restou consignado que o município de Monte Azul Paulista oferece tratamento por meio de políticas públicas.
Embora o critério estabelecido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não seja o único meio hábil para a comprovação da condição econômica de miserabilidade do beneficiário, ficou demonstrado que a autora não aufere rendimentos, mas tampouco se enquadra dentre os destinatários do benefício assistencial, uma vez que o benefício em questão deve ser reservado àqueles que não possuem meios de sobreviver por si próprios e não tenham, ainda, seus familiares meios de suprir-lhes tal falta, isto é, nos casos extremos em que só resta ao requerente do benefício o auxílio do Estado. Assim, não se insere a parte autora no grupo de pessoas economicamente carentes que a norma instituidora do benefício assistencial visou amparar. Ressalte-se que o benefício assistencial em questão não é fonte de aumento de renda, mas um meio de prover a subsistência daqueles que necessitam do amparo do Estado, por não possuir rendas próprias ou familiares que possam supri-la.
Neste passo, ante a ausência de comprovação, por parte da autora, dos requisitos exigidos para a concessão do benefício assistencial, nos termos do artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, bem como na Lei nº 8.742/93, a improcedência do pedido é de rigor.
Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, na forma da fundamentação.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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