
| D.E. Publicado em 27/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, determinando a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0029188-96.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por SEBASTIÃO PEREIRA DE MACEDO, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Contestação às fls. 86/96.
Estudo Social às fls. 101/107.
Perícia Judicial às fls. 134/138.
O pedido foi julgado improcedente (fls. 179/181).
A parte autora interpôs apelação (fls. 186/204).
Decorrido o prazo para a oferta de contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação (fls. 220/222).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Inicialmente, assinale-se que o benefício aqui postulado é de natureza assistencial e deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.231/1991.
A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.231/1991:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que originariamente o dispositivo em análise estabelecia a idade mínima de 70 (setenta) anos como requisito para a obtenção do benefício, sendo estabelecida, ao mesmo tempo, regra de transição no art. 38 do mesmo estatuto legal, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos contados 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos em 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-50/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso, mediante a edição da Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, acabou-se por eleger a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário para a percepção do benefício assistencial, nos seguintes termos:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
Consoante perícia médica produzida, a autora, à época (09/2016), o autor apresentava incapacidade total e temporária em razão de insuficiência mental devida à psicose não orgânica e transtornos esquizofrênicos. Foi diagnosticado em 01/2014 sendo que teve internações psiquiátricas em 05/2015 e 07/2016. Consta que sua incapacidade durará até que compense suas patologias e estabilize o quadro psicológico.
Não obstante sua incapacidade ser temporária, podendo melhorar com o tratamento adequado, depreende-se que ela se estende por mais de 2 anos, haja vista que o diagnóstico foi realizado em 01/2014, não havendo que se falar em estabilidade até 09/2016, período no qual houve duas internações, o que a enquadraria como impedimento de longo prazo. Ademais, o benefício em comento "deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem", conforme disposição prevista no art. 21 da Lei 8.742/1993.
Assim, é possível concluir que o estado clínico da parte-autora implica a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, assim, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o Estudo Social produzido indica que o autor mora com a irmã, seu cunhado e 4 sobrinhos menores de idade. À época (07/2016) foi informado que a renda mensal constituía em R$ 650,00, proveniente do salário do cunhado como trabalhador rural, já descontado diretamente do salário o valor referente ao aluguel, bem como, R$ 80,00 provenientes do Programa Renda Cidadã. Consta que a assistente social entrou em contato com o CRAS de Santa Rita d'Oeste e foi confirmado que a família era por eles acompanhada e que, realmente, eram vulneráveis. As despesas básicas mensais totalizavam o valor de R$ 1.381,00.
Por outro lado, deve-se verificar se a irmã casada do autor - e seu marido - devem ser considerados ou não como integrantes do seu núcleo familiar, ainda que vivam todos sob o mesmo teto.
Nos termos do art. 20, §1º, da Lei 8.742/93, na redação dada pela Lei 12.435/2011, "a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto". Segundo entendimento do c. STJ e da 3ª Seção desta Corte, não obstante o rol estipulado na referida norma não seja taxativo, os irmãos casados e seus respectivos cônjuges e filhos, mesmo que estejam na mesma residência, compõem núcleo familiar distinto. Nesse sentido:
Levando-se em conta tais precedentes e desconsiderando, portanto, as rendas auferidas pela irmã e pelo cunhado, deve-se reconhecer a hipossuficiência do autor, nos termos do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/1993, visto que não possui qualquer renda própria.
Nessas condições, deve ser-lhe concedido o benefício assistencial, que será devido desde a data do requerimento administrativo (02.02.2016, fl. 27), momento em que o INSS tomou ciência da pretensão da parte autora.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Este relator vinha entendendo que o termo final da base de cálculo dos honorários advocatícios seria a data da sentença de primeiro grau, de acordo com a literalidade da Súmula 111 do E. STJ. Entretanto, considerando a orientação majoritária desta Corte, bem como do próprio C. Superior Tribunal de Justiça, curvo-me a tais posicionamentos para concluir que o termo final deve ser fixado na data do pronunciamento favorável à concessão do benefício. Neste sentido:
Assim, os honorários advocatícios devem ser fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até data do acórdão, nos termos da Súmula 111 do E. STJ e, de acordo com o entendimento firmado por esta 10ª Turma.
Custas processuais pelo INSS, isento, observando-se que deverá, porém, reembolsar as eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora SEBASTIÃO PEREIRA DE MACEDO, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para implantação imediata do benefício assistencial (LOAS), com D.I.B. em 02.02.2016 e R.M.I. no valor de um salário mínimo, tendo em vista o artigo 497 do novo Código de Processo Civil.
É COMO VOTO.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 17/04/2018 19:08:02 |
