
| D.E. Publicado em 27/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, cassando a tutela antecipada deferida anteriormente, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A21708236AF01D |
| Data e Hora: | 14/11/2017 19:01:06 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023180-40.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por MARIA DE FÁTIMA GALVÃO PEREIRA, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Contestação às fls. 39/56.
Estudo Social às fls. 90/91.
Perícia Judicial às fls. 131/136.
O pedido foi julgado procedente, condenando-se o INSS a conceder o benefício assistencial a partir de 10.08.2014, corrigido monetariamente, bem como a arcar com honorários advocatícios, arbitrados em 15% sobre o valor da causa, corrigido do ajuizamento. Foi deferida a tutela antecipada (fls. 174/177).
Sentença não submetida ao reexame necessário.
O INSS interpôs apelação alegando inexistência de miserabilidade, razão pela qual não foram preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício (fls. 185/191).
Decorrido o prazo para oferta de contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento da apelação (fls. 198/199).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): O benefício assistencial de prestação continuada (ou amparo social) deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do prévio recolhimento de contribuições. Encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.213/1991.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.742/1993:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que, originariamente, a idade mínima para a concessão do benefício era de 70 (setenta) anos, sendo depois estabelecida uma regra de transição (art. 38 do mesmo estatuto lega)l, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos após 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos após 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-51/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003), acabou-se por fixar a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário mínimo para a percepção do benefício assistencial:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão, pela Lei 13.146/2015, do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a existir previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
Não houve apelação quanto à incapacidade, razão pela qual deixo de analisá-la.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o "Estudo Social" produzido indica que o núcleo familiar é integrado apenas pela parte postulante, seu esposo, sua filha e sua neta. À época (01/2014) foi informado que a renda mensal consistia em R$ 678,00, proveniente da aposentadoria do esposo. Consta, ainda, que o imóvel em que residem é próprio, fruto de doação da Prefeitura. As despesas básicas mensais declaradas somavam R$ 470,00.
Entretanto, em consulta ao CNIS/PLENUS, constatou-se que a autora era beneficiária de aposentadoria por idade, com DIB em 28.01.2013, tendo recebido pagamentos desde 01.05.2014 até 31.01.2016, momento a partir do qual passou a receber o benefício assistencial concedido na r. sentença - com DIB em 10.08.2014 e DIP em 01.02.2016 -, por força de tutela antecipada.
Tendo em vista que a data de início do benefício concedido à autora na sentença não foi questionado em nenhuma oportunidade, seja em embargos de declaração ou em apelação, deve-se analisar a possibilidade de manutenção do benefício tão somente a partir de 10.08.2014, porquanto não vislumbro a presença de quaisquer erros materiais passíveis de correção de ofício.
O benefício assistencial tem caráter subsidiário à proteção previdenciária e a outros meios de subsistência. Existindo renda, seja por meio de ajuda familiar ou de recebimento de benefício previdenciário, há que se afastar a concessão do benefício em comento. Assim, no caso em apreço, inviável a cumulação dos benefícios por expressa proibição legal, razão pela qual deixo de analisar os demais requisitos.
Ademais, caso haja preenchimento posterior de todos os requisitos e/ou alteração da situação fática, nada impede que a parte autora requeira administrativamente ou, se o caso, judicialmente, o referido benefício.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, cassando a tutela antecipada deferida anteriormente.
Observo que, apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT, entendo que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE 734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de valores recebidos de boa fé, em razão de sua natureza alimentar.
Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a condição de beneficiário da assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei 13.105/15).
É o voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A21708236AF01D |
| Data e Hora: | 14/11/2017 19:01:03 |
