Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000661-45.2020.4.03.6341
Relator(a)
Juiz Federal PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
Órgão Julgador
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
22/09/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 29/09/2021
Ementa
VOTO-EMENTA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20, DA LEI 8.742/93
(LOAS).
1. Pedido de concessão de benefício assistencial julgado parcialmente procedente para condenar
o réu a conceder em favor da parte autora o benefício assistencial de prestação continuada ao
deficiente, a partir da data da realização da perícia médica judicial, em 27/08/2020.
2. RECURSO DO INSS (em síntese): alega que a sentença seria “extra petita”, uma vez que a
parte autora requereu a concessão do benefício desde a DER e a sentença concedeu desde a
data de realização da perícia médica. Aduz que houve cerceamento de defesa “ao julgar fato
diverso do narrado na inicial, sem antes, ao menos, ouvir a parte prejudicada, o douto juízo
recorrido, além de proferir decisão extra petita, violou o contraditório, impedindo que a defesa se
pronunciasse sobre a possibilidade de concessão de benefício em data posterior àquela referida
na inicial, mesmo ausente uma condição da ação (o interesse de agir)”. Alega a inexistência de
condição de miserabilidade da parte autora. Requer a devolução dos valores recebidos a título de
antecipação de tutela.
3. O direito ao benefício assistencial exige o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição
de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação
original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo (2 anos) de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas,
consoante redação do referido dispositivo dada a partir de 31/08/2011 pela Lei n.º12.470/2011)
ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b)
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de
desamparo) da parte autora e de sua família.
4. Quanto ao requisito da vulnerabilidade socioeconômica, destaca-se que: i) o conceito legal de
família engloba o requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a
madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores
tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º, da LOAS); ii) o conceito legal de
incapacidade econômica, até então previsto pelo artigo 20, § 3º, da LOAS, de forma objetiva em
¼ (um quarto) do salário mínimo per capita, que já era entendido como apenas um dos possíveis
critérios de fixação pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça e pela Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais (Súmula n. 11), sem excluir a análise das provas
produzidas em cada caso concreto pelo juiz, teve sua inconstitucionalidade declarada de forma
incidental pelo Pretório Excelso no RE 567985/MT. No mesmo julgado, o Supremo Tribunal
Federal determinou a utilização de novo critério de referência, qual seja metade do salário
mínimo, em razão do advento de leis posteriores mais benéficas como, por exemplo, as Leis nºs
10.836/04, 10.689/03, 10.219/01 e 9.533/97.
5. Cerceamento de defesa e nulidade afastados. O pedido da autora permite e engloba a análise
da data de início do benefício pretendido. Não há que se falar em sentença “extra petita”.
Desnecessidade de intimação do INSS para ser ouvido a respeito da possibilidade de concessão
de benefício em data posterior àquela referida na inicial.
6. Requisito da deficiência incontroverso.
7. Análise do requisito da miserabilidade. Com base nas provas dos autos, em especial os
documentos apresentados e o estudo socioeconômico realizado, verifica-se que o núcleo familiar
é composto pela autora (27 anos de idade, do lar) e seu cônjuge (38 anos de idade). A receita do
núcleo familiar é proveniente do salário do marido da autora, no valor de 1.217,65. A parte autora
afirmou ao perito assistente social, durante a perícia realizada em 13/05/2020, que devido à
pandemia de COVID-19, o marido teria sido dispensado do emprego e estaria cumprindo aviso
prévio. No entanto, o INSS juntou aos autos consulta ao CNIS, constando que o cônjuge da
autora permaneceu empregado pela mesma empresa (Boechat Resinagem Comércio e
Transportes Eireli) até, ao menos, março de 2021 (evento 36). Além de a renda per capita do
grupo familiar ultrapassar meio salário mínimo, observa-se que, em verdade, a autora não se
encontra em situação de miserabilidade. As descrições e fotografias do imóvel cedido em que
reside a autora demonstram a existência de condições dignas de vida, o que é corroborado pelo
laudo pericial socioeconômico (evento 16). Confira-se a descrição constante do laudo
socioeconômico:
“IV - INFRAESTRUTURA E CONDIÇÕES GERAIS DE HABITABILIDADE E MORADIA
A autora e o marido, residem em casa cedida pelo pai e mãe. Essa residência fica dentro do
quintal da mãe, fora a moradia da autora ainda tem mais uma casa vazia no quintal, ou seja no
terreno existe a casa da mãe, a casa da autora e uma casa vazia. A construção da casa da
autora é de alvenaria, medindo aproximadamente 68 metros quadrados, distribuídos em 02
quartos, sala/cozinha conjugadas, banheiro, piso frio, forro de pvc "todos os cômodos tem
dimensões adequadas”. É provida de água encanada e tratada, rede de esgoto e energia elétrica,
não é possível calcular o valor do imóvel.
Na visita domiciliar realizada observou-se que a casa apresenta higiene e organização
habitacional razoável, equipada com móveis em estado de conservação regular, mas que atende
as necessidades básicas da Autora.
Segue em anexo, fotografias da moradia e cópia da autorização para produção de imagens
fotográficas, assinada pelo autor. Conforme prevê os termos do art. 473, §3°, do Código de
Processo Civil.”.
O benefício em questão não serve para mitigar dificuldades financeiras e nem para
complementação de renda, mas apenas para socorrer os que se encontram em estado de
miserabilidade, o que não é o caso.
8. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS para julgar improcedente o
pedido inicial. Casso a tutela concedida. Oficie-se ao INSS.
9. Devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada: tendo em vista a proposta de
revisão de tese no julgamento do Tema nº 692 pelo Superior Tribunal de Justiça, determino o
sobrestamento do presente feito, até o julgamento da controvérsia pelo STJ.
10. Sem condenação em verbas de sucumbência, tendo em vista a inexistência de recorrente
vencido (artigo 55, da Lei nº 9.099/95).
11. É como voto.
PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000661-45.2020.4.03.6341
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIO EDUARDO NEGRINI FERRO - SP163717-N
RECORRIDO: FRANCINE LOPES DE FREITAS
Advogado do(a) RECORRIDO: JORGE MARCELO FOGACA DOS SANTOS - SP153493-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000661-45.2020.4.03.6341
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIO EDUARDO NEGRINI FERRO - SP163717-N
RECORRIDO: FRANCINE LOPES DE FREITAS
Advogado do(a) RECORRIDO: JORGE MARCELO FOGACA DOS SANTOS - SP153493-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000661-45.2020.4.03.6341
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIO EDUARDO NEGRINI FERRO - SP163717-N
RECORRIDO: FRANCINE LOPES DE FREITAS
Advogado do(a) RECORRIDO: JORGE MARCELO FOGACA DOS SANTOS - SP153493-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
VOTO-EMENTA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20, DA LEI 8.742/93
(LOAS).
1. Pedido de concessão de benefício assistencial julgado parcialmente procedente para
condenar o réu a conceder em favor da parte autora o benefício assistencial de prestação
continuada ao deficiente, a partir da data da realização da perícia médica judicial, em
27/08/2020.
2. RECURSO DO INSS (em síntese): alega que a sentença seria “extra petita”, uma vez que a
parte autora requereu a concessão do benefício desde a DER e a sentença concedeu desde a
data de realização da perícia médica. Aduz que houve cerceamento de defesa “ao julgar fato
diverso do narrado na inicial, sem antes, ao menos, ouvir a parte prejudicada, o douto juízo
recorrido, além de proferir decisão extra petita, violou o contraditório, impedindo que a defesa
se pronunciasse sobre a possibilidade de concessão de benefício em data posterior àquela
referida na inicial, mesmo ausente uma condição da ação (o interesse de agir)”. Alega a
inexistência de condição de miserabilidade da parte autora. Requer a devolução dos valores
recebidos a título de antecipação de tutela.
3. O direito ao benefício assistencial exige o preenchimento dos seguintes requisitos: a)
condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a
redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo (2 anos) de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem
obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas, consoante redação do referido dispositivo dada a partir de 31/08/2011 pela Lei
n.º12.470/2011) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade
de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica
ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
4. Quanto ao requisito da vulnerabilidade socioeconômica, destaca-se que: i) o conceito legal
de família engloba o requerente, seu cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um
deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º, da LOAS); ii) o conceito
legal de incapacidade econômica, até então previsto pelo artigo 20, § 3º, da LOAS, de forma
objetiva em ¼ (um quarto) do salário mínimo per capita, que já era entendido como apenas um
dos possíveis critérios de fixação pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça e pela Turma
Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (Súmula n. 11), sem excluir a
análise das provas produzidas em cada caso concreto pelo juiz, teve sua inconstitucionalidade
declarada de forma incidental pelo Pretório Excelso no RE 567985/MT. No mesmo julgado, o
Supremo Tribunal Federal determinou a utilização de novo critério de referência, qual seja
metade do salário mínimo, em razão do advento de leis posteriores mais benéficas como, por
exemplo, as Leis nºs 10.836/04, 10.689/03, 10.219/01 e 9.533/97.
5. Cerceamento de defesa e nulidade afastados. O pedido da autora permite e engloba a
análise da data de início do benefício pretendido. Não há que se falar em sentença “extra
petita”. Desnecessidade de intimação do INSS para ser ouvido a respeito da possibilidade de
concessão de benefício em data posterior àquela referida na inicial.
6. Requisito da deficiência incontroverso.
7. Análise do requisito da miserabilidade. Com base nas provas dos autos, em especial os
documentos apresentados e o estudo socioeconômico realizado, verifica-se que o núcleo
familiar é composto pela autora (27 anos de idade, do lar) e seu cônjuge (38 anos de idade). A
receita do núcleo familiar é proveniente do salário do marido da autora, no valor de 1.217,65. A
parte autora afirmou ao perito assistente social, durante a perícia realizada em 13/05/2020, que
devido à pandemia de COVID-19, o marido teria sido dispensado do emprego e estaria
cumprindo aviso prévio. No entanto, o INSS juntou aos autos consulta ao CNIS, constando que
o cônjuge da autora permaneceu empregado pela mesma empresa (Boechat Resinagem
Comércio e Transportes Eireli) até, ao menos, março de 2021 (evento 36). Além de a renda per
capita do grupo familiar ultrapassar meio salário mínimo, observa-se que, em verdade, a autora
não se encontra em situação de miserabilidade. As descrições e fotografias do imóvel cedido
em que reside a autora demonstram a existência de condições dignas de vida, o que é
corroborado pelo laudo pericial socioeconômico (evento 16). Confira-se a descrição constante
do laudo socioeconômico:
“IV - INFRAESTRUTURA E CONDIÇÕES GERAIS DE HABITABILIDADE E MORADIA
A autora e o marido, residem em casa cedida pelo pai e mãe. Essa residência fica dentro do
quintal da mãe, fora a moradia da autora ainda tem mais uma casa vazia no quintal, ou seja no
terreno existe a casa da mãe, a casa da autora e uma casa vazia. A construção da casa da
autora é de alvenaria, medindo aproximadamente 68 metros quadrados, distribuídos em 02
quartos, sala/cozinha conjugadas, banheiro, piso frio, forro de pvc "todos os cômodos tem
dimensões adequadas”. É provida de água encanada e tratada, rede de esgoto e energia
elétrica, não é possível calcular o valor do imóvel.
Na visita domiciliar realizada observou-se que a casa apresenta higiene e organização
habitacional razoável, equipada com móveis em estado de conservação regular, mas que
atende as necessidades básicas da Autora.
Segue em anexo, fotografias da moradia e cópia da autorização para produção de imagens
fotográficas, assinada pelo autor. Conforme prevê os termos do art. 473, §3°, do Código de
Processo Civil.”.
O benefício em questão não serve para mitigar dificuldades financeiras e nem para
complementação de renda, mas apenas para socorrer os que se encontram em estado de
miserabilidade, o que não é o caso.
8. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS para julgar improcedente o
pedido inicial. Casso a tutela concedida. Oficie-se ao INSS.
9. Devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada: tendo em vista a proposta de
revisão de tese no julgamento do Tema nº 692 pelo Superior Tribunal de Justiça, determino o
sobrestamento do presente feito, até o julgamento da controvérsia pelo STJ.
10. Sem condenação em verbas de sucumbência, tendo em vista a inexistência de recorrente
vencido (artigo 55, da Lei nº 9.099/95).
11. É como voto.
PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma
Recursal decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
