
| D.E. Publicado em 14/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida, e, no mérito, negar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003129-37.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Cuida-se de ação previdenciária proposta em 18/03/2015 com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no inciso V, do artigo 203 da Constituição Federal. Sustentou-se, em síntese, o preenchimento dos requisitos legais para obtenção do benefício em comento.
Documentos acostados à exordial (fls. 14-23).
Deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita (fl. 26).
Citação em 24/04/2015 (fl. 28).
Estudo socioeconômico (fls. 95-103).
Parecer do Ministério Público do Estado de São Paulo, opinando pela procedência da ação (fls. 130-135).
A r. sentença, prolatada em 26/10/2016, julgou procedente o pedido, e condenou o réu ao pagamento do benefício, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data do pedido administrativo, 10/03/2015 (fl. 23). Determinada ainda, a instauração de inquérito policial por delito de abandono material em face dos filhos da autora (fls. 137-138).
Apelação do INSS. Preliminarmente, noticiou o falecimento da autora, em 19/04/2016, e requereu a extinção do processo sem julgamento de mérito, ante a impossibilidade de habilitação de herdeiros (art. 485, inciso IX do novo CPC). Para o caso de não acolhimento da matéria preliminar, pugnou, em suma, pela reforma integral do julgado, julgando-se improcedente o pedido (fls. 152-176).
Com contrarrazões (fls. 162-176), subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Suspensão do curso do processo, para habilitação de herdeiros da autora, com fulcro no art. 313. I. do CPC/2015 (fl. 182).
Requerimento de habilitação formulado pelos sucessores da falecida (fls. 189-221).
Decisão monocrática concernente à habitação supramencionada (fls. 224-226), e respectiva certidão de decurso de prazo, in albis, para interposição de recurso pelas partes (fl. 229).
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003129-37.2018.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de recurso interposto pelo réu (INSS) contra sentença que julgou procedente pedido de benefício assistencial a pessoa idosa
Inicialmente, rejeito a preliminar arguida, relacionada à habilitação de sucessores da autora, porquanto, com a decisão proferida às fls. 224-226, e não impugnada pelas partes (fl. 229), restou preclusa a questão.
Passo ao julgamento do mérito.
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no artigo 203, V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
De outro giro, os artigos 20, § 3º, da Lei 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei 10.741/03.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto nº 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da mencionada Lei 8.742/93 foi arguida na ADIN nº 1.232-1/DF que, pela maioria de votos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada improcedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
Evidencia-se que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensáveis elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação 4374, e Recursos Extraordinários - REs 567985 e 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Também restou consolidado no colendo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a comprovação do requisito da renda familiar per capita não-superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não exclui outros fatores que tenham o condão de aferir a hipossuficiência econômica da parte:
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
In casu, a parte autora, nascida em 02/12/1949 (fl.14), logrou comprovar o requisito etário, ao demonstrar possuir 65 anos de idade, já à época do aforamento da demanda.
O estudo social, elaborado em 14/10/2015 (fls. 95-103), revela que à época, a autora, com 65 anos de idade, residia com seu cônjuge, Arnaldo Júlio Bangarte, 75 anos de idade, aposentado.
A família residia há nove anos em casa própria (em imóvel pertencente a herdeiros, sendo eles o autor e mais dois irmãos), construída em alvenaria, constituída por dois quartos, sala, cozinha, e banheiro, em precário estado de conservação; as roupas eram lavadas em tambores plásticos, não havia tanque; piso de cimento (tipo "vermelhão").
A residência encontrava-se guarnecida com mobília bastante simples. No quarto havia uma cama para o casal, guarda-roupas e um pequeno ventilador; na sala, um jogo de sofá e um aparelho de televisão de modelo antigo; na cozinha havia geladeira, armário e uma mesa, sem eletrodomésticos, e no outro quarto havia duas camas de solteiro (segundo a autora, para receber os netos).
Já a despesa mensal do núcleo familiar compreendia gastos com alimentação (R$ 600,00), energia elétrica (R$ 20,00), água (R$ 12,00), gás (R$ 50,00), e medicamentos (R$ 100,00), totalizando R$ 782,00 por mês.
A renda familiar resumia-se aos proventos de aposentadoria percebidos pelo cônjuge da autora, no valor de um salário mínimo mensal, na época estabelecido em R$ 788,00, bem como do valor de R$ 157,00 por mês, proveniente do programa federal de transferência de renda denominado "Bolsa Família".
Esclareço que, por expressa disposição legal (art. 4º, § 2º, II, do Decreto nº 6.214/07), o valor percebido pela família do autor, proveniente de programa de transferência de renda (Bolsa-Família) não pode ser considerado para fins de apuração da renda per capta.
Ainda, ressalto que, consoante fundamentado acima, a renda de um salário mínimo percebida pelo cônjuge da parte autora, proveniente de benefício previdenciário (aposentadoria) deve ser desconsiderada para fins de apuração da renda per capita.
Sendo assim, considerando-se a inexistência de renda familiar, há elementos o bastante para se afirmar que se trata de família que vive em estado de miserabilidade. Certamente os recursos obtidos pela família da parte autora são insuficientes para cobrir gastos ordinários e tratamentos que lhes sejam imprescindíveis.
Nessas condições, não é possível à parte autora ter vida digna ou, consoante assevera a Constituição Federal, permitir-lhe a necessária dignidade da pessoa humana ou o respeito à cidadania, que são, às expressas, tidos por princípios fundamentais do almejado Estado Democrático de Direito.
Portanto, é de se concluir que a autora tem direito ao amparo assistencial, devendo ser mantida, no mérito, a r. sentença prolatada. Resta deixar consignado o termo final do benefício ora concedido: 18/04/2016 (fl. 195), em razão do óbito da parte autora originária em 19/04/2016.
Isso posto, rejeito a preliminar arguida, e, no mérito, nego provimento à apelação autárquica.
É COMO VOTO.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 25/02/2019 16:51:30 |
