
| D.E. Publicado em 25/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004358-16.2011.4.03.6139/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por ANDERSON PINTO DOS SANTOS, incapaz, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Contestação às fls. 38/44.
Estudo Social às fls. 63/64 e 114.
Perícia Judicial às fls. 84/88.
O pedido foi julgado improcedente (fls. 223/235).
A parte autora interpôs apelação (fls. 237/243).
Decorrido o prazo para a oferta das contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento parcial da apelação para que seja concedido o benefício nos períodos de 18.01.2006 a 31.07.2006, 05.08.2007 a 30.09.2007, 07.08.2010 a 31.10.2011, 20.03.2012 a 01.05.2012, 01.07.2013 a 31.07.2013 e 05.01.2014 a 15.01.2014 (fls. 250/257).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): O benefício assistencial de prestação continuada (ou amparo social) deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do prévio recolhimento de contribuições. Encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.213/1991.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.742/1993:
Em relação ao idoso, cumpre registrar que, originariamente, a idade mínima para a concessão do benefício era de 70 (setenta) anos, sendo depois estabelecida uma regra de transição (art. 38 do mesmo estatuto lega)l, pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente, passando a 67 (sessenta e sete) anos após 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco) anos após 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de conversão da Medida Provisória 1599-51/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete) anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003), acabou-se por fixar a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário mínimo para a percepção do benefício assistencial:
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão, pela Lei 13.146/2015, do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a existir previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado no caso vertente.
Consoante perícia médica produzida é possível concluir que o estado clínico da parte-autora implica a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, assim, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o "Estudo Social" produzido indica que o núcleo familiar é integrado pela parte postulante, seus pais, dois irmãos maiores de idade e 6 sobrinhos menores de idade. À época do primeiro Estudo Social (09/2007) foi informado que a renda mensal consistia em R$ 700,00, proveniente do salário do irmão José Roberto. Consta informação, ainda, que o pai do autor e o irmão Luciano estavam desempregados, bem como, que a mãe do autor não trabalhava fora. Também recebiam renda de R$ 112,00 proveniente do Programa Bolsa Família. O imóvel é próprio. As despesas básicas mensais declaradas somavam R$ 534,00. Quando do segundo Estudo Social (01/2010) foi informado que a renda mensal era de R$ 650,00, recebidos pelo pai do autor e R$ 350,00 do trabalho esporádico de um dos irmãos. As despesas básicas mensais eram de R$ 658,00.
Entretanto, em consulta ao CNIS/PLENUS, em abril/2017, constatou-se o seguinte:
1. O pai do autor, Sr. Abel, teve os seguintes vínculos empregatícios (após o ajuizamento da ação):
a) 08/2006 a 08/2007 - remunerações médias de R$ 1.100,00;
b) 10/2007 a 08/2010 - remunerações médias de R$ 1.300,00;
c) 11/2011 a 03/2012 - remunerações médias de R$ 1.400,00;
d) 05/2012 e 06/2012 - remuneração de R$ 1.329,15;
e) 06/2012 a 06/2013 - remunerações médias de R$ 2.100,00;
f) 08/2013 a 01/2014 - remunerações médias de R$ 1.600,00;
g) 01/2014 até os dias de hoje - remunerações que variavam de R$ 1.500,00 a R$ 2.200,00.
2. O irmão Luciano teve os seguintes vínculos empregatícios (após o ajuizamento da ação):
a) 03/2007 e 04/2007 - remuneração de R$ 380,00;
b) 12/2010 a 03/2011 - remunerações médias de R$ 1.100,00;
c) 11/2011 a 03/2012 - remunerações de R$ 1.184,00;
d) 06/2012 a 06/2013 - remunerações médias de R$ 1.300,00;
e) 08/2013 - remuneração de R$ 675,18.
2. O irmão José Roberto teve os seguintes vínculos empregatícios (após o ajuizamento da ação):
a) 05/2009 a 12/2009 - remunerações de R$ 730,00 (sendo que o ex-empregador informou às fls. 169/174 que em 11/2009 recebeu R$ 1.023,00 e em 12/2009 recebeu R$ 2.235,00);
b) 03/2012 e 04/2012 - remunerações de R$ 1.023,24;
c) 08/2013 a 09/2014 - remunerações médias de R$ 1.300,00;
d) 11/2016 até os dias de hoje - remunerações de R$ 1.711,30.
Assim, conquanto a economia doméstica não seja de fartura, a renda auferida durante todo o período se mostrava adequada ao suprimento das necessidades essenciais do núcleo familiar, mesmo havendo uma rotatividade na renda familiar.
Anote-se que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o combalido orçamento da Seguridade Social.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos todos os requisitos necessários à concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO.
É o voto.
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 16/05/2017 18:33:16 |
