
| D.E. Publicado em 02/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 20/03/2018 18:31:00 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0052906-40.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por MILTON JOSÉ DE FRANÇA, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Contestação às fls. 39/51.
Estudo Social às fls. 65/67.
Perícia judicial às fls. 79/80.
Audiência para oitiva de testemunhas e julgamento, na qual o pedido foi julgado improcedente (fls. 98/103).
O autor interpôs apelação (fls. 105/110).
Com as contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pela conversão do julgamento em diligência, para complementação do Estudo Social ou, no mérito, pelo desprovimento do recurso de apelação (fls. 125/126).
O então relator, monocraticamente, anulou, de ofício, a r. sentença, por ausência de intervenção ministerial em primeira instância e determinou o retorno dos autos à Vara de origem, julgando prejudicado o recurso (fls. 128/129).
Com o retorno dos autos, foi determinada a realização de novo Estudo Social, juntado às fls. 157/158.
O pedido foi julgado improcedente (fls. 170/172).
O autor interpôs apelação, requerendo a reforma total da sentença ou, subsidiariamente, que seja concedido o benefício da data da citação até a data na qual o autor iniciou sua atividade laboral (fls. 175/181).
Decorrido o prazo para a oferta das contrarrazões, os autos subiram novamente a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso de apelação (fl. 189).
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Inicialmente, assinale-se que o benefício em questão é de natureza assistencial e deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.
O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.231/1991.
A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.231/1991:
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício pleiteado, no caso vertente.
No tocante à demonstração da miserabilidade, os Estudos Sociais produzidos indicaram que o núcleo familiar era integrado pela parte postulante, sua mãe e seu pai. O imóvel em que residiam era próprio. À época do primeiro Estudo Social (08/2006) foi informado que a renda mensal constituía no valor de R$ 969,00, proveniente da renda do pai. As testemunhas ouvidas deram conta, ainda, que a mãe do autor trabalhava aos finais de semana também. No segundo Estudo Social, realizado em 08/2015, verificou-se que o autor estava trabalhando em um supermercado, como empacotador, havia 5 anos, e que recebia o valor de R$ 1.000,00. Além disso, o pai do autor recebia, também, salário de R$ 1.000,00 na empresa na qual trabalhava. Consta que os remédios eram, quase sempre, obtidos no Sistema Único de Saúde.
Consoante perícia médica, produzida em 05/2007, seria possível concluir que o estado clínico da parte-autora implicaria a existência de impedimento de longo prazo, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, poderia obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, devendo, assim, ser considerada pessoa com deficiência para os efeitos legais.
Entretanto, verificou-se que, não obstante a deficiência física, o autor está trabalhando. Em consulta ao CNIS/PLENUS, na data de hoje, constata-se que o autor iniciou vínculo laboral com Mercadinho Ipanema Ltda. em 02.08.2010, permanecendo até a data de hoje no mesmo local.
Com relação ao pedido subsidiário, de concessão do benefício assistencial desde a data da citação até a data do início do vínculo laboral, este também não deve ser acolhido.
Quando do Estudo Social realizado em 08/2006, foi juntado aos autos comprovante de salário no valor de R$ 969,68, época na qual o salário mínimo vigente era de R$ 350,00.
Conquanto a economia doméstica não fosse de fartura, a renda auferida se mostrava adequada ao suprimento das necessidades essenciais do núcleo familiar.
Anote-se que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o orçamento da Seguridade Social.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos os requisitos necessários a justificar a concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO.
É COMO VOTO.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 20/03/2018 18:30:57 |
