Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0051241-05.2020.4.03.6301
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA MELCHIORI BEZERRA
Órgão Julgador
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/02/2022
Ementa
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS) - DEFICIENTE. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA. RECURSO DO INSS. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1. Pedido de restabelecimento de benefício assistencial ao deficiente, bem como de declaração
de inexigibilidade de valores recebidos a este título.
2. Conforme consignado na sentença:
“(...)
No caso dos autos, a parte autora requer a manutenção do benefício de prestação continuada à
pessoa com deficiência, bem como para que seja declarada a inexigibilidade de cobrança dos
valores recebidos nos anos de 2018 a 2020, somando R$ 25.056,25.
Relativamente ao benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência, NB 1384253480,
cessado em 01/11/2020, conforme se constata da consulta ao sistema TERA ao anexo 52, consta
do laudo médico pericial (anexo 30), feito por perito médico judicial, que se trata de pericianda
com Síndrome de RETT (Encefalopatia), sendo considerada pessoa com deficiência nos termos
do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993, eis que possui impedimento de longo prazo, qual seja,
aquele que produz efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Desta forma, conforme laudo médico, o periciando possui deficiência e doença incapacitante,
desde o nascimento.
Assim, preenchido o primeiro requisito para a concessão do benefício.
De outro lado, quanto ao requisito hipossuficiência financeira, consta do laudo social:
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
“V - MEIOS DE SOBREVIVÊNCIA
Conforme informações prestadas pela genitora a sobrevivencia da família depende:
Renda de aposentadoria do genitor Alípio dos Santos, no valor de um salário mínimo R$ 1100,00
(um mil e cem reais);
Renda esporádica e informal da irmã com vendas de roupas usadas, cujo valor não foi informado,
atividade iniciada recentemente.
VI – RENDA PER CAPITA
1. RECEITAS E DESPESAS:
a - RECEITAS:
R$ 1100,00 – Renda de aposentadoria por idade do genitor Alípio dos Santos – benefício
1658905803.
b - DESPESAS:
R$ 95,42 – Enel fev/21 – conta no nome do genitor;
R$ 54,41 – Sabesp mar/21 – conta no nome do genitor;
R$ 135,92 – Vivo abril/21;
R$ 97,00 – Gás de cozinha;
R$ 90,00 – Alimentação valor da compra semanal – já receberam itens alimentícios do Instituto B.
Nosso Lar e no momento Cartão Alimentação da Prefeitura;
R$ 150,48 – Medicação não fornecida pela rede pública conforme cupom da Drogaria São Paulo;
R$ 1017,78 – Plano de Saúde da autora.
2 – CÁLCULO DA RENDA PER CAPITA FAMILIAR:
Conforme informações prestadas pela genitora:
Considerando o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto nº
6.214, de 26 de setembro de 2007 e alterado pelo Decreto nº 7.617, de 17 de novembro de 2011,
que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com
deficiência e ao idoso de que trata a Lei no 8.742, de 7 de 7 dezembro de 1993, e a Lei no
10.741, de 1º de outubro de 2003, apresentamos o seguinte cálculo da renda per capita:
Componentes do grupo familiar: 4
Renda bruta mensal: R$ 1100,00 (um mil e cem reais)
Renda per capita familiar: R$ 275,00 (duzentos e setenta e cinco reais).
Observação: Renda informal e esporádica da irmã cujo valor não foi declarado, atividade que
iniciou recentemente.”
Vejamos os valores relativos à renda familiar.
Consta do laudo socioeconômico que a única fonte de renda é proveniente da aposentadoria por
idade do genitor Alípio dos Santos.
Da análise aos respectivos CNIS’s dos outros membros da família (anexos 53, 54 e 55), é
possível notar que Sueli Felix do Nascimento dos Santos, genitora da autora, vinha contribuindo
como segurada facultativa, de 01/08/2005 a 31/05/2020, e depois de 01/07/2020 até a
competência de 04/2021, pelo menos. Consta, também, a concessão e a cessação de
aposentadoria no mesmo dia.
A irmã da autora, cessou o vínculo empregatício em 04/12/2020, não mais vertendo contribuições
para o sistema.
Assim, a renda familiar da autora resulta no valor de um salário mínimo, conforme se constata à
fl. 16 do anexo 14, advinda da aposentadoria do seu genitor, bem como da renda do trabalho
informal da irmã da autora.
Desta forma, considerando-se que o núcleo familiar do autor é composto por 4 pessoas, e,
partindo-se do valor recebido pelo genitor da requerente, temos o resultado inferior a meio salário
mínimo por pessoa.
Assim, é correto afirmar que a autora passa por sérios problemas financeiros.
Ademais, trata-se de pessoa com deficiência, que certamente têm despesas extraordinárias com
cuidados médicos e remédios.
Assim, verifico que a autora está abaixo da linha de pobreza, constatando situação de
miserabilidade.
Destarte, faz jus ao restabelecimento do benefício assistencial NB 1384253480, a partir do dia
seguinte à sua cessação ocorrida em 01/11/2020, ou seja, a partir de 02/11/2020.
Quanto ao pedido de suspensão da exigibilidade dos débitos cobrados pelo INSS, verifico a
presença dos requisitos ensejadores exigidos pelo art. 300 do CPC, quais sejam a probabilidade
do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
No caso dos autos, foi apurada irregularidade na manutenção do benefício assistencial à autora,
NB 1384253480, em virtude da renda per capita superior ao limite legal, bem como por constar
que a última atualização junto ao Cadúnico se deu em 31/10/2018.
Isso porque a irmã da autora, percebia renda mensal equivalente a R$ 6.000,00, além de a
genitora bem como o genitor da autora serem aposentados, situação que não mais se verifica nos
dias atuais, já que a irmã da autora se encontra em situação de desemprego e a genitora teve o
seu benefício de aposentadoria cessado.
Há de se levar em conta a questão da boa-fé.
A boa-fé é princípio basilar de nosso direito e um princípio moral, que ilumina tanto o direito
privado como o direito público (particularmente, o direito previdenciário).
Na verdade, a positivação da boa-fé em uma cláusula geral do Código de 2002, no âmbito do
direito obrigacional, reforça sua imprescindibilidade e obrigatoriedade e a sua eficácia como um
princípio orientador de todo o direito, pois todas as relações jurídicas devem nele se pautar a fim
de viabilizar o convívio em sociedade.
Importante destacar a lição de Caio Mario da Silva Pereira, segundo o qual "o princípio da boa-fé,
apesar de consagrado em norma infra-constitucional, incide sobre todas as relações jurídicas na
sociedade. Configura cláusula geral de observância obrigatória, que contém um conceito jurídico
indeterminado, carente de concretização segundo as peculiaridades de cada caso" (in:
Instituições de Direito Civil - Contratos, v. III, 12ª ed. Rio de Janeiro, Forense: 2007, p. 20-21).
Ora, se estamos de acordo que a lealdade entre as pessoas é valor caro ao convívio, temos na
boa-fé um princípio que prestigia esse valor, armando-o com o reconhecimento pelo Estado da
lisura, correção dos particulares quando se relacionam, seja no mundo privado, seja naquele das
relações Estado x cidadão.
Somente nesta ótica estaria viabilizada a aplicação do art. 115, II da Lei n.º 8.213/ 91.
Tal constatação é embasada, ainda, pelo entendimento do Supremo Tribunal Federal, que
podemos vislumbrar na Reclamação 6944/DF (Relatora Ministra Carmen Lúcia, DJ 23/06/2010).
Ao longo da decisão proferida na Reclamação se assentou que os valores recebidos
indevidamente devem ser restituídos ao Poder Público somente se demonstrada a má-fé da parte
beneficiária, uma vez que o princípio da legalidade se conjuga, sistemicamente, com os princípios
da boa-fé e da segurança jurídica, e por isso a anulação de atos administrativos, sobretudo os
geradores de direito, deve se pautar também por estes princípios, por vezes cedendo a estes.
(destaquei)
A jurisprudência proclama que não se pode exigir a devolução de valores indevidamente
recebidos por servidores de boa-fé (Embargos de Divergência no Recurso Especial nº
2005/0152142-8, Rel. Ministro Paulo Medina - 3ª Seção, publicado em 12/03/2007, p. 198),
entendimento esse que, também na linha da jurisprudência, deve ser aplicado em relação aos
segurados de boa-fé, observando-se que os benefícios previdenciários possuem natureza
alimentar.
Aliás, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido que os benefícios recebidos em virtude de erro
administrativo são insuscetíveis de repetição:
“PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO POSTULATÓRIA DE BENEFÍCIO. RESTITUIÇÃO DE VALORES
INDEVIDAMENTE PAGOS. IMPOSSIBILIDADE. Em sede de ação postulatória de benefício
previdenciário, fundada em indevida suspensão de pagamento de proventos, é descabida a
pretensão do INSS de obter a restituição de valores pagos ao segurado por erro administrativo”
(STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Vicente Leal, Resp 179032, fonte: DJU, data 28/05/ 2001).
Tendo em vista que a deficiência da parte autora e que a sua representante legal, sua genitora,
não tem conhecimento técnico para analisar as consequências decorrentes de pertencer a
família, cuja renda per capita supere o limite legal, e que o INSS se manteve inerte durante anos
para apurar tal irregularidade, não há que se falar em má-fé.
Aliás, é o que diz o recentíssimo julgamento do Tema 979/STJ, sobre a devolução de valores
recebidos de boa-fé pelo segurado.
Em julgamento do Recurso Especial interposto pelo INSS em face de decisão proferida pelo TRF
da 5ª Região, julgando que, recebidos os valores de boa-fé e pagos indevidamente, não seriam
passíveis de restituição.
Como solução da controvérsia, o STJ entendeu por negar provimento ao Recurso Especial
interposto pelo INSS, entendendo que pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro
administrativo, são repetíveis os valores, ressalvada a sua boa-fé objetiva, com demonstração de
que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
(...)
No caso dos autos, houve o pagamento do benefício à autora, constatando-se erro da
administração posterior, conforme se constata do relatório de análise às fls. 23/24 e 25 do anexo
14, ou seja, própria administração pública constatou que os valores foram pagos indevidamente.
Ademais, trata-se de pessoa cuja miserabilidade, quando do pedido administrativo, foi
constatada, e por ser a sua representante legal pessoa com poucos estudos e pouca
possibilidade de entendimento sobre recebimento indevido.
Logo, o pedido de anulação da cobrança dos débitos decorrentes do benefício assistencial NB
1384253480, deve ser acolhido.
Em face do exposto julgo procedente o pedido e extingo o processo com julgamento do mérito,
conforme o art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, para declararinexigível a cobrança dos
valores indevidamente recebidos pela parte autora a títulodo benefício assistencial NB
1384283480, devendo o INSS proceder ao cancelamento da referida cobrança, bem como para
condenar o INSS ao restabelecimento dobenefício de prestação continuada em favor de GEISY
FELIX DOS SANTOS, a partir de02/11/2020, dia seguinte à sua cessação. (...)”
3. Recurso do INSS: aduz que a sentença merece ser reformada, pelos seguintes motivos. O feito
foi julgado procedente para declarar a inexigibilidade da cobrança dos valores recebidos e
condenar a Autarquia ao restabelecimento do benefício a partir de 02/11/2020. Como já
comprovado, o pai da recorrida recebe aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo.
Todavia, os rendimentos da mãe e da irmão da recorrida afastam o requisito da miserabilidade.
Ressalte-se que a senhora Tallyta recebeu por um período a remuneração de R$ 6.000,00. A
senhora Sueli efetua recolhimentos sobre o salário de contribuição de R$ 4.000,00. Data venia,
os valores recebidos indevidamente deverão ser devolvidos e o benefício indeferido.
4. De pronto, consigne-se o julgamento, pelo STJ, do tema 979, com a fixação da seguinte tese:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido. Modulação de efeitos: somente deve atingir os
processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir de 23/4/2021, data da
publicação do acórdão no DJe.”Logo, não há mais que se falar em sobrestamento do feito.
5. Requisitos para concessão do benefício: deficiência/idade e hipossuficiência econômica.
6. O STF manifestou entendimento no sentido de que o critério preconizado no art. 20, § 3º, Lei nº
8.742/93 não mais se coaduna com o ordenamento vigente, ante as mudanças econômico-
sociais. (RE 567.985/MT, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes e RE
580.963/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em 18/4/2013).
7. Comprovação da carência financeira, para fins de concessão do benefício assistencial, deve
considerar outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo. Possível
interpretação sistemática com normas que disciplinaram as políticas de amparo e assistência
social promovidas pelo governo federal, que estabelecem o critério de ½ salário mínimo como
patamar definidor da linha da pobreza (Leis n.º 10.836/01 (Bolsa-família), nº 10.689/03 (Programa
Nacional de Acesso à Alimentação), nº 10.219/01 (Bolsa-escola).
8. Por sua vez, o STJ decidiu, em sede de recursos repetitivos, que “em âmbito judicial vige o
princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação
legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve
ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se
pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear
o seu direito de julgar” (Resp 1.112.557/MG). Também possui precedentes no sentido de que
deve ser excluído, do cálculo da renda mensal familiar, os benefícios percebidos por membro do
núcleo familiar no valor de 01 (um) salário mínimo. Precedentes: Resp 1.226.027/PR; AgRg no
Resp 1.392.529/MG, dentre outros.
9. De uma análise conjugada destes precedentes, reputo que há de prevalecer, de qualquer
forma, o conjunto probatório do caso concreto. Com efeito, o critério objetivo, que pode ser
modificado pela exclusão de benefício no valor de um salário mínimo, não é exclusivo, devendo
ser cotejado com o critério subjetivo de cada caso concreto. Neste passo, deve ser realizada uma
análise do critério objetivo, que pode ser confirmado ou infirmado pelo subjetivo, devendo
prevalecer, a meu ver, este último, caso contrarie o primeiro.
10. CASO CONCRETO:
Laudo pericial médico (ortopedia): Perícia realizada em 11.02.2021: parte autora (27 anos).
Segundo o perito: “Autora com 27 anos, acompanhada pela progenitora. Submetida a exame
físico ortopédico. Detectamos ao exame clínico criterioso atual, justificativas para a queixa
alegadas pela pericianda. Creditando seu histórico e exame clínico, concluímos evolução
desfavorável para os males referidos, principalmente Síndrome de RETT (Encefalopatia). A
autora encontra-se em decurso de tratamento médico ambulatorial e fisioterápico, sem
possibilidades de melhora do quadro. I. Com base nos elementos e fatos expostos e analisados,
conclui-se que: Caracterizo situação de incapacidade total e permanente para atividade laboriosa
habitual, com data do início da incapacidade em Desde o nascimento.”
Laudo pericial social: a autora reside com os pais e a irmã, em imóvel próprio desde 1986.
Segundo o laudo, “A casa geminada estilo sobrado simples foi construída respeitando a
Geografia do terreno. Possui uma garagem e a esquerda uma pequena escada de acesso ao
primeiro pavimento que é composto de sala, cozinha, área de serviço e no seguimento uma
escada em declive acessa uma área onde possui um banheiro e mais um cômodo, no segundo
pavimento dois dormitórios e banheiro” (...)”Observou que trata-se de construção antiga, bastante
danificada pelo tempo e pela falta de manutenção, que é justificada pela ausência de condições
financeiras da família. Alguns equipamentos foram resgatados da residência da progenitora da
autora após seu falecimento e alguns receberam de doações de vizinhos”. A sobrevivência da
família é mantida pela aposentadoria do genitor da autora, no valor de R$ 1.100,00 e pela renda
esporádica e informal, auferida pela irmã, com venda de roupas usadas. Despesas: R$ 95,42-
Enel, R$ 54,11 – Sabesp, R$ 135,92 – Vivo, R$ 97,00 – gás de cozinha, R$ 90,00 – alimentação
(compra semanal), R$ 150,48 – medicação não fornecida pela rede pública, R$ 1.017,78 – plano
de saúde da autora. Receberam itens alimentícios do Instituto B. Nosso Lar e no momento Cartão
Alimentação da Prefeitura. Renda per capita: R$ 275,00. O perito concluiu: “Após diagnóstico que
constatou a deficiência da autora a genitora deixou o trabalho fora de casa, para dedicar a filha e
as atividades domésticas. O genitor é aposentado por idade e tem renda de um salário mínimo.
Fazia trabalhos informais em uma imobiliária, mas com o início da pandemia, e aliada a
dificuldade de audição deixou totalmente a atividade. A irmã possui curso superior está
desempregada, tenta vender roupas usadas de porta em porta para obter alguma renda.
Considerando as informações colhidas na visita pericial com relação a composição familiar,
histórico de vida, condições de moradia, meios de sobrevivencia e renda, verificou que a renda
“per capita” é igual a ¼ do salário mínimo, porém não pode afirmar que a autora Geisy Félix dos
Santos e sua família, fica excluída da condição de extrema pobreza. De acordo com os relatos da
genitora, a família até o momento organizava para ter condições de pagar o plano de saúde
particular para autora, ainda acrescentou que, não contava com a renda da irmã Tallyta Félix dos
Santos, pois sua renda era revertida para a sua formação e compra de seus itens pessoais.
Atualmente, a irmã tem buscado alternativas de trabalho para colaborar com as despesas de
casa. Concluindo a pericial social tecnicamente pode afirmar que a sobrevivencia da autora Geisy
Félix dos Santos, depende da renda de aposentadoria por idade do genitor no valor de um salário
mínimo, ou seja R$ 1100,00 (um mil e cem reais), renda informal e esporádica da irmã,
contribuições da escola conveniada da prefeitura que a autora está matriculada com itens da
cesta básica ou cartão alimentação, fornecido pela prefeitura para os alunos, como forma de
compensar a merenda escolar”.
11. Posto isso, a despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou corretamente
todas as questões trazidas no recurso inominado, de forma fundamentada, não tendo o
recorrente apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação.
12. Não obstante a relevância das razões apresentadas pelo recorrente, o fato é que todas as
questões suscitadas foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Origem, razão pela qual a r.
sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da
Lei nº 9.099/95. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
13. Recorrente condenado ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o
valor da condenação.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0051241-05.2020.4.03.6301
RELATOR:33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: GEISY FELIX DOS SANTOS
REPRESENTANTE: SUELI FELIX DO NASCIMENTO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0051241-05.2020.4.03.6301
RELATOR:33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: GEISY FELIX DOS SANTOS
REPRESENTANTE: SUELI FELIX DO NASCIMENTO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0051241-05.2020.4.03.6301
RELATOR:33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: GEISY FELIX DOS SANTOS
REPRESENTANTE: SUELI FELIX DO NASCIMENTO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS) - DEFICIENTE. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA. RECURSO DO INSS. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1. Pedido de restabelecimento de benefício assistencial ao deficiente, bem como de declaração
de inexigibilidade de valores recebidos a este título.
2. Conforme consignado na sentença:
“(...)
No caso dos autos, a parte autora requer a manutenção do benefício de prestação continuada à
pessoa com deficiência, bem como para que seja declarada a inexigibilidade de cobrança dos
valores recebidos nos anos de 2018 a 2020, somando R$ 25.056,25.
Relativamente ao benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência, NB
1384253480, cessado em 01/11/2020, conforme se constata da consulta ao sistema TERA ao
anexo 52, consta do laudo médico pericial (anexo 30), feito por perito médico judicial, que se
trata de pericianda com Síndrome de RETT (Encefalopatia), sendo considerada pessoa com
deficiência nos termos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993, eis que possui impedimento de
longo prazo, qual seja, aquele que produz efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Desta forma, conforme laudo médico, o periciando possui deficiência e doença incapacitante,
desde o nascimento.
Assim, preenchido o primeiro requisito para a concessão do benefício.
De outro lado, quanto ao requisito hipossuficiência financeira, consta do laudo social:
“V - MEIOS DE SOBREVIVÊNCIA
Conforme informações prestadas pela genitora a sobrevivencia da família depende:
Renda de aposentadoria do genitor Alípio dos Santos, no valor de um salário mínimo R$
1100,00 (um mil e cem reais);
Renda esporádica e informal da irmã com vendas de roupas usadas, cujo valor não foi
informado, atividade iniciada recentemente.
VI – RENDA PER CAPITA
1. RECEITAS E DESPESAS:
a - RECEITAS:
R$ 1100,00 – Renda de aposentadoria por idade do genitor Alípio dos Santos – benefício
1658905803.
b - DESPESAS:
R$ 95,42 – Enel fev/21 – conta no nome do genitor;
R$ 54,41 – Sabesp mar/21 – conta no nome do genitor;
R$ 135,92 – Vivo abril/21;
R$ 97,00 – Gás de cozinha;
R$ 90,00 – Alimentação valor da compra semanal – já receberam itens alimentícios do Instituto
B. Nosso Lar e no momento Cartão Alimentação da Prefeitura;
R$ 150,48 – Medicação não fornecida pela rede pública conforme cupom da Drogaria São
Paulo;
R$ 1017,78 – Plano de Saúde da autora.
2 – CÁLCULO DA RENDA PER CAPITA FAMILIAR:
Conforme informações prestadas pela genitora:
Considerando o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto nº
6.214, de 26 de setembro de 2007 e alterado pelo Decreto nº 7.617, de 17 de novembro de
2011, que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à
pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei no 8.742, de 7 de 7 dezembro de 1993, e
a Lei no 10.741, de 1º de outubro de 2003, apresentamos o seguinte cálculo da renda per
capita:
Componentes do grupo familiar: 4
Renda bruta mensal: R$ 1100,00 (um mil e cem reais)
Renda per capita familiar: R$ 275,00 (duzentos e setenta e cinco reais).
Observação: Renda informal e esporádica da irmã cujo valor não foi declarado, atividade que
iniciou recentemente.”
Vejamos os valores relativos à renda familiar.
Consta do laudo socioeconômico que a única fonte de renda é proveniente da aposentadoria
por idade do genitor Alípio dos Santos.
Da análise aos respectivos CNIS’s dos outros membros da família (anexos 53, 54 e 55), é
possível notar que Sueli Felix do Nascimento dos Santos, genitora da autora, vinha contribuindo
como segurada facultativa, de 01/08/2005 a 31/05/2020, e depois de 01/07/2020 até a
competência de 04/2021, pelo menos. Consta, também, a concessão e a cessação de
aposentadoria no mesmo dia.
A irmã da autora, cessou o vínculo empregatício em 04/12/2020, não mais vertendo
contribuições para o sistema.
Assim, a renda familiar da autora resulta no valor de um salário mínimo, conforme se constata à
fl. 16 do anexo 14, advinda da aposentadoria do seu genitor, bem como da renda do trabalho
informal da irmã da autora.
Desta forma, considerando-se que o núcleo familiar do autor é composto por 4 pessoas, e,
partindo-se do valor recebido pelo genitor da requerente, temos o resultado inferior a meio
salário mínimo por pessoa.
Assim, é correto afirmar que a autora passa por sérios problemas financeiros.
Ademais, trata-se de pessoa com deficiência, que certamente têm despesas extraordinárias
com cuidados médicos e remédios.
Assim, verifico que a autora está abaixo da linha de pobreza, constatando situação de
miserabilidade.
Destarte, faz jus ao restabelecimento do benefício assistencial NB 1384253480, a partir do dia
seguinte à sua cessação ocorrida em 01/11/2020, ou seja, a partir de 02/11/2020.
Quanto ao pedido de suspensão da exigibilidade dos débitos cobrados pelo INSS, verifico a
presença dos requisitos ensejadores exigidos pelo art. 300 do CPC, quais sejam a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
No caso dos autos, foi apurada irregularidade na manutenção do benefício assistencial à
autora, NB 1384253480, em virtude da renda per capita superior ao limite legal, bem como por
constar que a última atualização junto ao Cadúnico se deu em 31/10/2018.
Isso porque a irmã da autora, percebia renda mensal equivalente a R$ 6.000,00, além de a
genitora bem como o genitor da autora serem aposentados, situação que não mais se verifica
nos dias atuais, já que a irmã da autora se encontra em situação de desemprego e a genitora
teve o seu benefício de aposentadoria cessado.
Há de se levar em conta a questão da boa-fé.
A boa-fé é princípio basilar de nosso direito e um princípio moral, que ilumina tanto o direito
privado como o direito público (particularmente, o direito previdenciário).
Na verdade, a positivação da boa-fé em uma cláusula geral do Código de 2002, no âmbito do
direito obrigacional, reforça sua imprescindibilidade e obrigatoriedade e a sua eficácia como um
princípio orientador de todo o direito, pois todas as relações jurídicas devem nele se pautar a
fim de viabilizar o convívio em sociedade.
Importante destacar a lição de Caio Mario da Silva Pereira, segundo o qual "o princípio da boa-
fé, apesar de consagrado em norma infra-constitucional, incide sobre todas as relações
jurídicas na sociedade. Configura cláusula geral de observância obrigatória, que contém um
conceito jurídico indeterminado, carente de concretização segundo as peculiaridades de cada
caso" (in: Instituições de Direito Civil - Contratos, v. III, 12ª ed. Rio de Janeiro, Forense: 2007, p.
20-21).
Ora, se estamos de acordo que a lealdade entre as pessoas é valor caro ao convívio, temos na
boa-fé um princípio que prestigia esse valor, armando-o com o reconhecimento pelo Estado da
lisura, correção dos particulares quando se relacionam, seja no mundo privado, seja naquele
das relações Estado x cidadão.
Somente nesta ótica estaria viabilizada a aplicação do art. 115, II da Lei n.º 8.213/ 91.
Tal constatação é embasada, ainda, pelo entendimento do Supremo Tribunal Federal, que
podemos vislumbrar na Reclamação 6944/DF (Relatora Ministra Carmen Lúcia, DJ 23/06/2010).
Ao longo da decisão proferida na Reclamação se assentou que os valores recebidos
indevidamente devem ser restituídos ao Poder Público somente se demonstrada a má-fé da
parte beneficiária, uma vez que o princípio da legalidade se conjuga, sistemicamente, com os
princípios da boa-fé e da segurança jurídica, e por isso a anulação de atos administrativos,
sobretudo os geradores de direito, deve se pautar também por estes princípios, por vezes
cedendo a estes. (destaquei)
A jurisprudência proclama que não se pode exigir a devolução de valores indevidamente
recebidos por servidores de boa-fé (Embargos de Divergência no Recurso Especial nº
2005/0152142-8, Rel. Ministro Paulo Medina - 3ª Seção, publicado em 12/03/2007, p. 198),
entendimento esse que, também na linha da jurisprudência, deve ser aplicado em relação aos
segurados de boa-fé, observando-se que os benefícios previdenciários possuem natureza
alimentar.
Aliás, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido que os benefícios recebidos em virtude de
erro administrativo são insuscetíveis de repetição:
“PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO POSTULATÓRIA DE BENEFÍCIO. RESTITUIÇÃO DE VALORES
INDEVIDAMENTE PAGOS. IMPOSSIBILIDADE. Em sede de ação postulatória de benefício
previdenciário, fundada em indevida suspensão de pagamento de proventos, é descabida a
pretensão do INSS de obter a restituição de valores pagos ao segurado por erro administrativo”
(STJ, 6ª Turma, Rel. Min. Vicente Leal, Resp 179032, fonte: DJU, data 28/05/ 2001).
Tendo em vista que a deficiência da parte autora e que a sua representante legal, sua genitora,
não tem conhecimento técnico para analisar as consequências decorrentes de pertencer a
família, cuja renda per capita supere o limite legal, e que o INSS se manteve inerte durante
anos para apurar tal irregularidade, não há que se falar em má-fé.
Aliás, é o que diz o recentíssimo julgamento do Tema 979/STJ, sobre a devolução de valores
recebidos de boa-fé pelo segurado.
Em julgamento do Recurso Especial interposto pelo INSS em face de decisão proferida pelo
TRF da 5ª Região, julgando que, recebidos os valores de boa-fé e pagos indevidamente, não
seriam passíveis de restituição.
Como solução da controvérsia, o STJ entendeu por negar provimento ao Recurso Especial
interposto pelo INSS, entendendo que pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de
erro administrativo, são repetíveis os valores, ressalvada a sua boa-fé objetiva, com
demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
(...)
No caso dos autos, houve o pagamento do benefício à autora, constatando-se erro da
administração posterior, conforme se constata do relatório de análise às fls. 23/24 e 25 do
anexo 14, ou seja, própria administração pública constatou que os valores foram pagos
indevidamente.
Ademais, trata-se de pessoa cuja miserabilidade, quando do pedido administrativo, foi
constatada, e por ser a sua representante legal pessoa com poucos estudos e pouca
possibilidade de entendimento sobre recebimento indevido.
Logo, o pedido de anulação da cobrança dos débitos decorrentes do benefício assistencial NB
1384253480, deve ser acolhido.
Em face do exposto julgo procedente o pedido e extingo o processo com julgamento do mérito,
conforme o art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, para declararinexigível a cobrança dos
valores indevidamente recebidos pela parte autora a títulodo benefício assistencial NB
1384283480, devendo o INSS proceder ao cancelamento da referida cobrança, bem como para
condenar o INSS ao restabelecimento dobenefício de prestação continuada em favor de GEISY
FELIX DOS SANTOS, a partir de02/11/2020, dia seguinte à sua cessação. (...)”
3. Recurso do INSS: aduz que a sentença merece ser reformada, pelos seguintes motivos. O
feito foi julgado procedente para declarar a inexigibilidade da cobrança dos valores recebidos e
condenar a Autarquia ao restabelecimento do benefício a partir de 02/11/2020. Como já
comprovado, o pai da recorrida recebe aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo.
Todavia, os rendimentos da mãe e da irmão da recorrida afastam o requisito da miserabilidade.
Ressalte-se que a senhora Tallyta recebeu por um período a remuneração de R$ 6.000,00. A
senhora Sueli efetua recolhimentos sobre o salário de contribuição de R$ 4.000,00. Data venia,
os valores recebidos indevidamente deverão ser devolvidos e o benefício indeferido.
4. De pronto, consigne-se o julgamento, pelo STJ, do tema 979, com a fixação da seguinte tese:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do
benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do
caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido. Modulação de efeitos: somente deve atingir os
processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir de 23/4/2021, data da
publicação do acórdão no DJe.”Logo, não há mais que se falar em sobrestamento do feito.
5. Requisitos para concessão do benefício: deficiência/idade e hipossuficiência econômica.
6. O STF manifestou entendimento no sentido de que o critério preconizado no art. 20, § 3º, Lei
nº 8.742/93 não mais se coaduna com o ordenamento vigente, ante as mudanças econômico-
sociais. (RE 567.985/MT, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes e RE
580.963/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em 18/4/2013).
7. Comprovação da carência financeira, para fins de concessão do benefício assistencial, deve
considerar outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo. Possível
interpretação sistemática com normas que disciplinaram as políticas de amparo e assistência
social promovidas pelo governo federal, que estabelecem o critério de ½ salário mínimo como
patamar definidor da linha da pobreza (Leis n.º 10.836/01 (Bolsa-família), nº 10.689/03
(Programa Nacional de Acesso à Alimentação), nº 10.219/01 (Bolsa-escola).
8. Por sua vez, o STJ decidiu, em sede de recursos repetitivos, que “em âmbito judicial vige o
princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de
tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita
não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De
fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob
pena de cercear o seu direito de julgar” (Resp 1.112.557/MG). Também possui precedentes no
sentido de que deve ser excluído, do cálculo da renda mensal familiar, os benefícios percebidos
por membro do núcleo familiar no valor de 01 (um) salário mínimo. Precedentes: Resp
1.226.027/PR; AgRg no Resp 1.392.529/MG, dentre outros.
9. De uma análise conjugada destes precedentes, reputo que há de prevalecer, de qualquer
forma, o conjunto probatório do caso concreto. Com efeito, o critério objetivo, que pode ser
modificado pela exclusão de benefício no valor de um salário mínimo, não é exclusivo, devendo
ser cotejado com o critério subjetivo de cada caso concreto. Neste passo, deve ser realizada
uma análise do critério objetivo, que pode ser confirmado ou infirmado pelo subjetivo, devendo
prevalecer, a meu ver, este último, caso contrarie o primeiro.
10. CASO CONCRETO:
Laudo pericial médico (ortopedia): Perícia realizada em 11.02.2021: parte autora (27 anos).
Segundo o perito: “Autora com 27 anos, acompanhada pela progenitora. Submetida a exame
físico ortopédico. Detectamos ao exame clínico criterioso atual, justificativas para a queixa
alegadas pela pericianda. Creditando seu histórico e exame clínico, concluímos evolução
desfavorável para os males referidos, principalmente Síndrome de RETT (Encefalopatia). A
autora encontra-se em decurso de tratamento médico ambulatorial e fisioterápico, sem
possibilidades de melhora do quadro. I. Com base nos elementos e fatos expostos e
analisados, conclui-se que: Caracterizo situação de incapacidade total e permanente para
atividade laboriosa habitual, com data do início da incapacidade em Desde o nascimento.”
Laudo pericial social: a autora reside com os pais e a irmã, em imóvel próprio desde 1986.
Segundo o laudo, “A casa geminada estilo sobrado simples foi construída respeitando a
Geografia do terreno. Possui uma garagem e a esquerda uma pequena escada de acesso ao
primeiro pavimento que é composto de sala, cozinha, área de serviço e no seguimento uma
escada em declive acessa uma área onde possui um banheiro e mais um cômodo, no segundo
pavimento dois dormitórios e banheiro” (...)”Observou que trata-se de construção antiga,
bastante danificada pelo tempo e pela falta de manutenção, que é justificada pela ausência de
condições financeiras da família. Alguns equipamentos foram resgatados da residência da
progenitora da autora após seu falecimento e alguns receberam de doações de vizinhos”. A
sobrevivência da família é mantida pela aposentadoria do genitor da autora, no valor de R$
1.100,00 e pela renda esporádica e informal, auferida pela irmã, com venda de roupas usadas.
Despesas: R$ 95,42- Enel, R$ 54,11 – Sabesp, R$ 135,92 – Vivo, R$ 97,00 – gás de cozinha,
R$ 90,00 – alimentação (compra semanal), R$ 150,48 – medicação não fornecida pela rede
pública, R$ 1.017,78 – plano de saúde da autora. Receberam itens alimentícios do Instituto B.
Nosso Lar e no momento Cartão Alimentação da Prefeitura. Renda per capita: R$ 275,00. O
perito concluiu: “Após diagnóstico que constatou a deficiência da autora a genitora deixou o
trabalho fora de casa, para dedicar a filha e as atividades domésticas. O genitor é aposentado
por idade e tem renda de um salário mínimo. Fazia trabalhos informais em uma imobiliária, mas
com o início da pandemia, e aliada a dificuldade de audição deixou totalmente a atividade. A
irmã possui curso superior está desempregada, tenta vender roupas usadas de porta em porta
para obter alguma renda. Considerando as informações colhidas na visita pericial com relação a
composição familiar, histórico de vida, condições de moradia, meios de sobrevivencia e renda,
verificou que a renda “per capita” é igual a ¼ do salário mínimo, porém não pode afirmar que a
autora Geisy Félix dos Santos e sua família, fica excluída da condição de extrema pobreza. De
acordo com os relatos da genitora, a família até o momento organizava para ter condições de
pagar o plano de saúde particular para autora, ainda acrescentou que, não contava com a
renda da irmã Tallyta Félix dos Santos, pois sua renda era revertida para a sua formação e
compra de seus itens pessoais. Atualmente, a irmã tem buscado alternativas de trabalho para
colaborar com as despesas de casa. Concluindo a pericial social tecnicamente pode afirmar que
a sobrevivencia da autora Geisy Félix dos Santos, depende da renda de aposentadoria por
idade do genitor no valor de um salário mínimo, ou seja R$ 1100,00 (um mil e cem reais), renda
informal e esporádica da irmã, contribuições da escola conveniada da prefeitura que a autora
está matriculada com itens da cesta básica ou cartão alimentação, fornecido pela prefeitura
para os alunos, como forma de compensar a merenda escolar”.
11. Posto isso, a despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou
corretamente todas as questões trazidas no recurso inominado, de forma fundamentada, não
tendo o recorrente apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação.
12. Não obstante a relevância das razões apresentadas pelo recorrente, o fato é que todas as
questões suscitadas foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Origem, razão pela qual a r.
sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da
Lei nº 9.099/95. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
13. Recorrente condenado ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o
valor da condenação. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Decide a Décima
Primeira Turma Recursal do Juizado Especial Federal Cível da Terceira Região - Seção
Judiciária de São Paulo, por maioria, negar provimento ao recurso, vencida a Juíza Federal
Maíra Felipe Lourenço, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
