Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0005042-08.2019.4.03.6317
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. IDOSA. 68 ANOS. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO NA
DER. RENDA FAMILIAR PER CAPITA ZERO. DESPESAS ORDINÁRIAS CUSTEADAS PELO
EX-EMPREGADOR A TÍTULO DE CARIDADE. CASA CEDIDA EM CONDIÇÕES REGULARES
COM MÓVEIS E ELETRODOMÉSTICOS APENAS ESSENCIAIS. MISERABILIDADE
COMPROVADA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA.
RECURSO DA PARTE RÉ DESPROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005042-08.2019.4.03.6317
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIA HELENA PEREZ
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Advogado do(a) RECORRIDO: MIGUEL JOSE CARAM FILHO - SP230110-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005042-08.2019.4.03.6317
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIA HELENA PEREZ
Advogado do(a) RECORRIDO: MIGUEL JOSE CARAM FILHO - SP230110-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual objetiva a concessão do benefício assistencial
de prestação continuada, previsto na Lei 8.742/93.
O juízo singular proferiu sentença e julgou procedente o pedido.
Inconformada, a autarquia ré interpôs o presente recurso. Postulou a ampla reforma da
sentença.
Contrarrazões pela parte autora.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005042-08.2019.4.03.6317
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIA HELENA PEREZ
Advogado do(a) RECORRIDO: MIGUEL JOSE CARAM FILHO - SP230110-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, nego efeito suspensivo ao recurso, pois não restou demonstrado o risco de dano
irreparável a que se refere o art. 43 da Lei n.9.099/95.
Passo à análise do recurso.
Observo que o benefício de prestação continuada de um salário mínimo foi assegurado pela
Constituição Federal nos seguintes termos:
“Art.203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, conforme dispuser a lei”.
Apesar de a Lei 10.741/2003 considerar idoso o indivíduo com idade igual ou superior a 60
anos (art. 1º), estabeleceu como idade mínima para o recebimento desse benefício assistencial
65 anos (art. 34, caput), requisito também previsto no art. 20, caput, da Lei 8.742/1993, com
redação dada pela Lei 12.435/2011.
No caso concreto, o requisito etário foi atendido na DER (02/07/2019, não contestada pelo
INSS), pois a autora nasceu em 31/07/1952 (ID 197397243, p. 4).
Quanto à hipossuficiência econômica, a Lei 8.742/1993 instituiu um critério objetivo,
considerando incapaz de prover a própria manutenção a pessoa portadora de deficiência ou
idosa pertencente a família cuja renda mensal per capita seja a inferior a ¼ do salário mínimo.
O Superior Tribunal de Justiça vinha decidindo pela possibilidade de utilização de outros
critérios para a aferição da miserabilidade do postulante. Em julgamento de recurso especial
repetitivo, fixou a seguinte tese:
“A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo” (STJ, 3ª Seção, REsp 1.112.557/MG, rel. min. Napoleão Nunes
Maia Filho, j. 28/10/2009, public. 20/11/2009, Tema 185).
Anos mais tarde, o Pretório Excelso alterou sua posição a respeito do critério legal de
miserabilidade, firmando a seguinte tese de repercussão geral:
“É inconstitucional o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece a renda familiar
mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo como requisito obrigatório para
concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da
Constituição” (STF, Plenário, RE 567.985/MT, rel. min. Marco Aurélio, rel. para acórdão min.
Gilmar Mendes, j. 18/4/2013, DJe 2/10/2013, Tema 27).
Para melhor compreensão desse entendimento, transcrevo trecho da ementa (grifo no original):
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que ‘considera-se incapaz de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a
1/4 (um quarto) do salário mínimo’.
O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias
com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a
Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da
Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento”.
Tratando-se de decisão proferida em controle concreto de constitucionalidade, a eficácia se
restringe ao caso analisado e ao campo dos precedentes judiciais, não tendo o condão de
retirar o dispositivo legal do ordenamento jurídico, tal como se dá no controle abstrato (art. 102,
§ 2º, da CF). De toda forma, apesar de o Pretório Excelso ter declarado a inconstitucionalidade
parcial do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993, não lhe aplicou a sanção de nulidade.
Como relata Frederico Amado (“Curso de Direito e Processo Previdenciário”. 9. ed. Salvador:
JusPodivm, 2017, p. 57), tentou-se modular a eficácia da decisão para 31/12/2015, a fim de que
o Congresso Nacional tivesse tempo de alterar a Lei Orgânica da Assistência Social, porém não
foi alcançado o quórum de 2/3.
A posição do STF foi encampada pelo legislador em 2015, quando da edição do Estatuto da
Pessoa com Deficiência, que acrescentou o § 11 ao art. 20 da Lei 8.742/1993, in verbis:
“§ 11. Para concessão do benefício de que trata ocaputdeste artigo, poderão ser utilizados
outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de
vulnerabilidade, conforme regulamento”.
Como se nota, o critério da renda mensal inferior a 1/4 do salário-mínimo continua em vigor no
ordenamento jurídico, mas deve ser analisado em conjunto com outros elementos para que se
possa detectar a hipossuficiência econômica do requerente. Para tanto, nos termos da Súmula
79 da TNU, aprovada em 15/4/2015:
“Nas ações em que se postula benefício assistencial, é necessária a comprovação das
condições socioeconômicas do autor por laudo de assistente social, por auto de constatação
lavrado por oficial de justiça ou, sendo inviabilizados os referidos meios, por prova
testemunhal”.
A conclusão acima é chancelada pela Turma Nacional de Uniformização, que, em julgamento
de recurso representativo da controvérsia, fixou a seguinte tese:
“O critério objetivo consubstanciado na exigência de renda familiar per capita inferior a ¼ do
salário-mínimo gera uma presunção relativa de miserabilidade, que pode, portanto, ser afastada
por outros elementos de prova” (TNU, PEDILEF 5000493-92.2014.4.04.7002, rel. juiz federal
Daniel Machado da Rocha, j. 14/4/2016, public. 15/4/2016, Tema 122).
Sem embargo dessas constatações, proliferaram no território nacional inúmeras decisões em
Ações Civis Públicas que passaram a impor ao INSS adoção de critérios regionais e
diferenciados para a concessão do benefício.
Esse fato contribuiu para nova e recente alteração legislativa a respeito do tema (Lei 14.176/21)
que deu a seguinte redação ao §11 do artigo 20 da Lei 8.472/93
O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal
familiarper capitaprevisto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o
disposto no art. 20-B desta Lei.
.....................................................................................................................” (NR)
“Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da
situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os
seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensalper capitade
que trata o § 11-A do referido artigo:
I – o grau da deficiência;
II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e
III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei
exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos
especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados
gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que
comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.
§ 1º A ampliação de que trata ocaputdeste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais,
definidas em regulamento.
§ 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III
docaputdeste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III docaputdeste artigo.
§ 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I docaputdeste artigo será aferido por meio de
instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos§§ 1º e 2º do art. 2º da Lei
nº 13.146, de 6 de julho de 2015(Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do
art. 40-B desta Lei.
§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos de que
trata o inciso III docaputdeste artigo será definido em ato conjunto do Ministério da Cidadania,
da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir
de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades,
facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, conforme critérios definidos em
regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios.”
Nestes termos, o deferimento da prestação deverá observar a existência dessas situações que
permitem a superação do limite de ¼ de salário mínimo como renda per capita no núcleo
familiar.
Por último, anoto que o STJ, no julgamento do Tema 640 ampliou o alcance da norma que
consta do artigo 34 do Estatuto do Idoso. Eis a decisão do Tribunal:
STJ – Tema 640 (Recursos Repetitivos) – Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto
do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa
com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
Dessa forma, nos casos de núcleos familiares compostos simultaneamente por idosos e
deficientes, o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo não e computado no
cálculo da renda per capita.
No que tange ao grupo familiar, assinalo que com o advento da Lei 12.435/2011, a família é
integrada pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a
madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores
tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Em relação a esse ponto, não se pode perder de vista o princípio da subsidiariedade, pelo qual
a atuação do Estado só se justifica quando o indivíduo e os grupos sociais intermediários são
incapazes de resolver determinado problema.
Apesar de a Constituição Federal não empregar essa expressão, a norma jurídica pode ser
extraída, no campo da assistência social, tanto do art. 203, V, quanto de outros dispositivos
analisados de forma sistemática.
Segundo o art. 193, “A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o
bem-estar e a justiça sociais”.
Dentro do Título VIII (“Da Ordem Social”) está o capítulo relativo à seguridade social, que se
divide em três subsistemas: saúde, previdência e assistência social (art. 194, caput).
O Capítulo VII do mesmo Título, por sua vez, trata da família, criança, adolescente, jovem e
idoso. O art. 226 reconhece a família como base da sociedade e lhe assegura especial proteção
do Estado. O art. 229 contempla o princípio da solidariedade familiar, assim expresso: “Os pais
têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de
ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
Do exposto, pode-se afirmar que o indivíduo é o principal responsável pelo atendimento de suas
necessidades. Caso enfrente situação que não lhe permita prover o seu sustento, deverá ser
amparado por sua família, nos termos da lei de regência (art. 5º, II, da CF). Na hipótese de os
familiares legalmente obrigados a colaborar com o sustento do membro carente também não
terem condições de fazê-lo, aí sim o indivíduo poderá acionar o Estado, para deste receber
assistência social.
Vê-se, portanto, que o BPC-LOAS não é instrumento para afastar o dever de prestar alimentos
de modo a “socializar” os gastos da família com seus idosos e dependentes portadores de
deficiência. Além disso, não tem por finalidade complementar a renda familiar ou proporcionar
maior conforto à parte interessada, mas amparar a pessoa deficiente ou idosa em efetivo
estado de miserabilidade.
Estabelecidas essas premissas, sublinho que, no caso concreto, do exame do estudo
socioeconômico, constata-se que há situação de miserabilidade a ser tutelada.
Nos termos do § 1º do art. 20 da Lei 8.742/1993, o grupo familiar é composto apenas pela
autora.
Não há recebimento de qualquer renda ou benefício previdenciário. As despesas ordinárias são
custeadas pelo ex-empregador da autora, que é também o proprietário do imóvel cedido em
que ela vive.
Por conseguinte, a renda per capita é zero, fato que, por si só, denota a miserabilidade da
autora.
Embora o imóvel em que viva esteja em boas condições de habitabilidade, consiste em uma
casa cedida a título de caridade, não havendo, portanto, qualquer garantia de estabilidade
mesmo a curto prazo. A residência encontra-se guarnecida de móveis e eletrodomésticos
apenas essenciais, que não destoam da alegada condição de miserabilidade, conforme
demonstra também o acervo fotográfico acostado ao laudo socioeconômico (ID 197397275).
Acrescento, por fim, que a autora possui ensino fundamental incompleto, não recebe nenhum
tipo de benefício e possui duas filhas, as quais, além de não residirem no mesmo município,
possuem suas próprias famílias e despesas. Não há quaisquer elementos que permitam
concluir que possam arcar com as despesas básicas da mãe idosa, sem prejuízo do próprio
sustento.
No ponto, assim restou fundamentada a sentença:
“(...) Cabe observar do relatório social que a autora reside sozinha em imóvel cedido pelo ex-
empregador, composto por 4 (quatro) cômodos. Não possui outros bens ou renda própria;
sobrevive da ajuda de terceiros, doações de alimentos e, atualmente, do recebimento de auxílio
emergencial pago pelo Governo Federal.
Consta do laudo socioeconômico (anexos 33/34):
“No tocante à saúde, Maria Helena Perez é pessoa em tratamento medicamentoso,
acompanhada na Rede Pública de Saúde, pela especialidade cardiologia e aparentemente as
enfermidades estão controladas.
Do ponto de vista das condições de habitação, constatamos que, a autora reside sozinha, há
referida confirmou que reside sozinha e sobrevive atualmente como auxílio emergencial e
recebe doações de cesta básica, mantimentos e pagamentos de contas básicas do Sr. Cleber
Rodrigues Watanabe proprietário do imóvel que cedeu a moradia para a autora. No geral a
residência encontra-se em bom estado de manutenção e conservação, e conta com móveis e
utensílios em bom estado também. A autora trabalhou por muitos anos como cuidadora de um
familiar do Sr Cleber Rodrigues Watanabe e que após o falecimento do seu familiar, cedeu a
moradia para a autora morar sem cobrança de aluguel.
No tocante ao convívio familiar, através da análise documentos foi possível identificarmos que,
a autora é simples reside sozinha e está sobrevivendo com ajuda de amigos, segundo a autora
as filhas residem em outros endereços localizado no Estado do Paraná e em Santa Catarina
conforme relato da autora, e são ausentes e não ajudam, seu ex esposo é falecido e a autora
não recebe qualquer benefício social, ou pensão.
Em relação à superação da situação socioeconômica atual segundo relatos apresentado,
aspectos insolúveis; a questão do enfrentamento da doença no seu cotidiano, tratamento
contínuo, idade avançada, ausência de qualificação profissional, dependendo de terceiros a
autora encontra-se prejudicada, sua recolocação no mercado de trabalho acredito ser irreal, já
que com 68 anos de idade e com enfermidades natural da idade, pressão arterial alterada sofre
com limitação, Porém é bem assistida por amigos, reside em um local com toda infraestrutura
de serviços públicos e a moradia encontra-se em bom estado geral.
Concluindo a perícia social com base nas informações que nos foram prestadas tecnicamente
podemos afirmar que a autora não possui uma fonte de renda e que suas necessidades estão
prejudicadas. Atualmente recebe ajuda com doações, alimentação, mantimentos e pagamentos
de contas. Suas despesas são pagas pelo proprietário do imóvel na qual trabalhou por anos
como cuidadora de um familiar.
E assim segundo relato da autora não possui renda e sobrevive com ajuda de terceiros e que,
portanto, a autora encontra-se em situação de vulnerabilidade e risco social, porém é bem
assistida no local onde reside com alimentação, habitação, vestimentas, utensílios, móveis.”
Portanto, desprovida de qualquer renda que lhe garanta subsistência, a autora faz jus ao
benefício assistencial. Em consonância com a Súmula 22 da TNU, ao qual me curvo, as
diferenças são devidas a partir da data do requerimento administrativo (02/07/2019).
(...)”
A partir dos elementos que dos autos constam, conclui-se que a autora é idosa e não tem
condições de prover seu sustento. Não há familiares que possam ajudá-la sem prejuízo de sua
subsistência ou de seus dependentes. Nesse cenário, justifica-se a intervenção do Poder
Público por meio do pagamento do BPC-LOAS.
Preenchidos os requisitos legais, o benefício assistencial deve ser deferido.
Nessa esteira, a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do art.
46 da Lei 9.099/1995. Destaco que o Supremo Tribunal Federal, sob a sistemática da
repercussão geral, chancelou essa prática, fixando a seguinte tese:
“Não afronta a exigência constitucional de motivação dos atos decisórios a decisão de Turma
Recursal de Juizados Especiais que, em consonância com a Lei 9.099/1995, adota como
razões de decidir os fundamentos contidos na sentença recorrida” (STF, Plenário Virtual, RE
635.729 RG/SP, rel. min. Dias Toffoli, j. 30/6/2011, DJe 23/8/2011, Tema 451).
Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso da parte ré, nos termos da fundamentação
acima.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré ficará
dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida
pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência
judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso
nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. IDOSA. 68 ANOS. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO
NA DER. RENDA FAMILIAR PER CAPITA ZERO. DESPESAS ORDINÁRIAS CUSTEADAS
PELO EX-EMPREGADOR A TÍTULO DE CARIDADE. CASA CEDIDA EM CONDIÇÕES
REGULARES COM MÓVEIS E ELETRODOMÉSTICOS APENAS ESSENCIAIS.
MISERABILIDADE COMPROVADA. BENEFÍCIO CONCEDIDO. SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA PARTE RÉ DESPROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte ré, nos
termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA