Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / MS
5003603-15.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
02/02/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA
NÃO CARACTERIZADA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
1.O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art.
203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa
deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de
carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim
de condições de tê-las providas pela família.
2. Requisito etário preenchido.
3. Quanto ao requisito da miserabilidade, conquanto a economia doméstica não seja de fartura,
ao que tudo indicaa renda auferida se mostraadequada ao suprimento das necessidades
essenciais do núcleo familiar, bem como para a manutenção de veículos e de um comércio
varejista de mercadorias em geral.
4. Embora a parte autora alegue que as duas motocicletas registradas em seu nome já foram
vendidas e que a empresa aberta em nome da sua companheira encontra-se inativa, não juntou
aos autos qualquer documento que comprove tais alegações, não restando preenchido, portanto,
o requisito da hipossuficiência econômica.
5. O direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de sensível
carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a alegação de
meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo Constituinte, isto
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta privação de recursos,
e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o orçamento da Seguridade
Social.
6. Casohaja posterior comprovação do preenchimento dos requisitos e/ou alteração da situação
fática, nada impede que a parte autora, a qualquer tempo, requeira administrativamente ou, se o
caso, judicialmente, o referido benefício.
7. Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada
a condição de beneficiária da assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei
13.105/15).
8. Apelação do INSS provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5003603-15.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LEOPOLDO CONRAD
Advogado do(a) APELADO: VERUSKA INSFRAN FALCAO DE ALMEIDA - MS7930-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5003603-15.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LEOPOLDO CONRAD
Advogado do(a) APELADO: VERUSKA INSFRAN FALCAO DE ALMEIDA - MS7930-A
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):Trata-se de ação proposta
porLEOPOLDO CONRADem face doINSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em
que se objetiva a concessão do benefício assistencial previsto no artigo 203 da Constituição
Federal e artigo 20 da Lei 8.742/1993 (Loas).
Juntados procuração e documentos.
Deferido o pedido de gratuidade da justiça.
Foi realizado Estudo Social.
O INSS apresentou contestação.
Réplica da parte autora.
O MM. Juízo de origem julgou procedente o pedido.
A sentença foi submetida à remessa necessária.
Embargos de declaração da parte autora acolhidos para dispensar a remessa necessária.
Inconformada, a autarquiainterpôs recurso de apelação alegando, em síntese,não estar
preenchido o requisito da hipossuficiência econômica, necessário à concessão do benefício.
Subsidiariamente, requer a alteração dos consectários legais.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal se manifestou pelo provimento da apelação.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5003603-15.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: LEOPOLDO CONRAD
Advogado do(a) APELADO: VERUSKA INSFRAN FALCAO DE ALMEIDA - MS7930-A
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):Inicialmente, assinale-se que o
benefício aqui postulado é de natureza assistencial e deve ser prestado a quem dele necessitar,
independentemente do recolhimento de contribuições.
Encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a
garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e
cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas
necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
...........................................................
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.".
Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei
8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso
hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo
previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no
pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A
partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário
mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.213/1991.
Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998
12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos
arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.
No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.742/1993:
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à
pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família."
Em relação ao idoso, cumpre registrar que, originariamente, a idade mínima para a concessão
do benefício era de 70 (setenta) anos, sendo depois estabelecida uma regra de transição (art.
38 do mesmo estatuto legal), pela qual o critério etário deveria ser reduzido gradativamente,
passando a 67 (sessenta e sete) anos após 24 (vinte e quatro) meses e 65 (sessenta e cinco)
anos após 48 (quarenta e oito) meses, respectivamente. Contudo, a Lei 9.720/1998, objeto de
conversão da Medida Provisória 1599-51/1998, fixou a idade limite em 67 (sessenta e sete)
anos a partir de 1º de janeiro de 1998.
Com o advento do Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003), acabou-se por
fixar a idade de 65 (sessenta e cinco) anos como critério etário mínimo para a percepção do
benefício assistencial:
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para
prover sua subsistência, nem tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de
1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas."
Finalmente, a Lei 12.435/2011 promoveu a atualização do art. 20 da Lei 8.742/1993, prevendo a
idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, e, de outro lado, revogou o art. 38, na redação
dada pela Lei 9.720/1998.
Assim, a pessoa maior de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, a partir do início da vigência do
Estatuto do Idoso, desde que exposta à situação de hipossuficiência material, pode ser
amparada pela Seguridade Social por meio do benefício assistencial de prestação continuada.
No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na
redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência
evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-
se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a
Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento
jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:
"Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as
demais pessoas."
Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei
12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com
deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação
sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:
"PROCESSUAL CIVIL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO - AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU OMISSÃO - EFEITO
MODIFICATIVO OU INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - PREQUESTIONAMENTO.
I - Os embargos servem apenas para esclarecer o obscuro, corrigir a contradição ou integrar o
julgado. De regra, não se prestam para modificar o mérito do julgamento em favor da parte.
II - Não consiste no fator determinante do princípio da seletividade e distributividade a
incapacidade para a vida independente e para o trabalho. A Constituição Federal é expressa
em seu artigo 203, inciso V, que o benefício assistencial será devido à pessoa portadora de
deficiência.
III - Os embargos de declaração interpostos com notório propósito de prequestionamento não
têm caráter protelatório.
IV - Embargos de declaração rejeitados" (TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, AC 0000553-
96.2003.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, julgado em
14/12/2004, DJU DATA:21/02/2005) (Grifou-se)
A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de
Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:
"Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei 8.742/93, incapacidade para a vida independente não é
só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita
de prover ao próprio sustento."
Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011
abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o
trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência.
Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei
13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa
com deficiência:
"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011,
considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 2 (dois)
anos.
No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica
da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:
"Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família
cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo."
Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo
Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão,
por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de
processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas
e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de
benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento,
declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em
julgado assim ementado:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, §
3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal
Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de
prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal
per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido
pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações
de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial
previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o
Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões
judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização
dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto,
não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per
capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de
se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram
editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a
Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever
anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a
ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios
assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se
nega provimento." (RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min.
GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194
DIVULG 02-10-2013 PUBLIC 03-10-2013).
Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo
previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições
sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:
"Agravos regimentais em reclamação. Perfil constitucional da reclamação. Ausência dos
requisitos. Recursos não providos. 1. Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para
preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões (art. 102, inciso I,
alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação de súmula vinculante (art. 103-
A, § 3º, CF/88). 2. A jurisprudência desta Corte desenvolveu parâmetros para a utilização dessa
figura jurídica, dentre os quais se destaca a aderência estrita do objeto do ato reclamado ao
conteúdo das decisões paradigmáticas do STF. 3. A definição dos critérios a serem observados
para a concessão do benefício assistencial depende de apurado estudo e deve ser verificada de
acordo com as reais condições sociais e econômicas de cada candidato à beneficiário, não
sendo o critério objetivo de renda per capta o único legítimo para se aferir a condição de
miserabilidade. Precedente (Rcl nº 4.374/PE) 4. Agravos regimentais não providos." (Rcl 4154
AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 19/09/2013, ACÓRDÃO
ELETRÔNICO DJe-229 DIVULG 20-11-2013 PUBLIC 21-11-2013)
É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para
aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da rendaper
capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro
abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a
seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para
o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido." (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:
"CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.
AGRAVO (CPC, ART. 557, §1º). REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS.
I - Ao negar seguimento à apelação da parte autora, a decisão agravada levou em conta que,
não obstante o preenchimento do requisito etário, não restou comprovada a sua miserabilidade.
II - Não se olvida que o entendimento predominante na jurisprudência é o de que o limite de
renda per capita de um quarto do salário mínimo, previsto no artigo 20, §3º, da Lei 8.742/93, à
luz do sistema de proteção social ora consolidado, se mostra inconstitucional, devendo a
análise da miserabilidade levar em conta a situação específica do postulante ao benefício
assistencial. Todavia, no caso dos autos, observada a situação socioeconômica da parte
autora, não restou comprovada a miserabilidade alegada.
III - Agravo (CPC, art. 557, §1º) interposto pela parte autora improvido" (TRF 3ª Região,
DÉCIMA TURMA, AC 0011936-51.2015.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL
SERGIO NASCIMENTO, julgado em 18/08/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/08/2015)
Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da rendaper capitafamiliar como único
parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão, pela Lei 13.146/2015,
do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a existir previsão legal
expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da
miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do
benefício assistencial de prestação continuada.
Cumpre, então, examinar o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício
pleiteadono caso vertente.
A parte autora contava com a idade de 66 anos quando do requerimento administrativo,
preenchendo assim o requisito etário legal.
No tocante à demonstração da miserabilidade, o Estudo Social produzido indica que o núcleo
familiar é integrado pela parte autora, sua companheira, uma filha menor de idade e um filho
deficiente auditivo. À época (03/2021) foi informado que a renda mensal da família advém do
benefício assistencial recebido pelo filho, no valor de um salário mínimo. Consta, ainda, que a
parte autora sobrevive de "pequenos bicos", mas vem enfrentando dificuldades para conseguir
tais oportunidades informais, o que gera problemas financeiros para manutenção da
alimentação e pagamento de contas de água, luz e gás.O imóvel em que residem é cedido pela
irmã da parte autora. Não foram declaradas as despesas mensais básicas.
Entretanto, conforme pesquisa colacionada aos autos pela autarquia, além de constar a
propriedade de duas motocicletas em nome da parte autora, a sua companheira possui uma
empresa ativa aberta em seu nome desde 2019 e também é proprietária de um veículo.
Dessa forma, é possível concluir que conquanto a economia doméstica não seja de fartura, ao
que tudo indica a renda auferida se mostraadequada ao suprimento das necessidades
essenciais do núcleo familiar, bem como para a manutenção de veículos e de um comércio
varejista de mercadorias em geral.
Ressalte-se, por oportuno, que embora a parte autora alegue que as duas motocicletas
registradas em seu nome já foram vendidas e que a empresa aberta em nome da sua
companheira encontra-se inativa, não juntou aos autos qualquer documento que comprove tais
alegações, não restando preenchido, portanto, o requisito da hipossuficiência econômica.
Anote-se que o direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à
situação de sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua
concessão a alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo
almejado pelo Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos
de manifesta privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse
modo, o orçamento da Seguridade Social.
Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos os requisitos necessários a justificar a
concessão do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto
Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.
Cumpre consignar, por fim, que casohaja posterior comprovação do preenchimento dos
requisitos e/ou alteração da situação fática, nada impede que a parte autora, a qualquer tempo,
requeira administrativamente ou, se o caso, judicialmente, o referido benefício.
Ante o exposto,dou provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença e julgar
improcedente o pedido.
Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a
condição de beneficiáriada assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50 e Lei
13.105/15).
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA
NÃO CARACTERIZADA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
1.O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art.
203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa
deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de
carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem
assim de condições de tê-las providas pela família.
2. Requisito etário preenchido.
3. Quanto ao requisito da miserabilidade, conquanto a economia doméstica não seja de fartura,
ao que tudo indicaa renda auferida se mostraadequada ao suprimento das necessidades
essenciais do núcleo familiar, bem como para a manutenção de veículos e de um comércio
varejista de mercadorias em geral.
4. Embora a parte autora alegue que as duas motocicletas registradas em seu nome já foram
vendidas e que a empresa aberta em nome da sua companheira encontra-se inativa, não juntou
aos autos qualquer documento que comprove tais alegações, não restando preenchido,
portanto, o requisito da hipossuficiência econômica.
5. O direito ao benefício assistencial de prestação continuada está atrelado à situação de
sensível carência material enfrentada pelo postulante, não bastando para a sua concessão a
alegação de meras dificuldades financeiras, sob pena de desnaturar o objetivo almejado pelo
Constituinte, isto é, dar amparo ao deficiente e ao idoso inseridos em contextos de manifesta
privação de recursos, e banalizar a utilização do instituto, sobrecarregando, desse modo, o
orçamento da Seguridade Social.
6. Casohaja posterior comprovação do preenchimento dos requisitos e/ou alteração da situação
fática, nada impede que a parte autora, a qualquer tempo, requeira administrativamente ou, se
o caso, judicialmente, o referido benefício.
7. Honorários advocatícios pela parte autora, fixados em 10% sobre o valor da causa,
observada a condição de beneficiária da assistência judiciária gratuita, se o caso (Lei 1.060/50
e Lei 13.105/15).
8. Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
