Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001910-05.2021.4.03.6306
Relator(a)
Juiz Federal NILCE CRISTINA PETRIS
Órgão Julgador
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
21/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 25/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – IMPROCEDENTE – RECURSO DA PARTE
AUTORA – NÃO CUMPRIMENTO DE EXIGÊNCIAS FORMULADAS NA VIA ADMINISTRATIVA
NÃO PODE OBSTAR O ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO – SENTENÇA ANULADA -
PRESENTESOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL EM FAVOR DE IDOSO – HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA -
DADO PROVIMENTO AO RECURSO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001910-05.2021.4.03.6306
RELATOR:8º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: RAIMUNDO FAUSTINO DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: DEYSE DE FATIMA LIMA - SP277630-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001910-05.2021.4.03.6306
RELATOR:8º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: RAIMUNDO FAUSTINO DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: DEYSE DE FATIMA LIMA - SP277630-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Relatório dispensado nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95.
São Paulo, 26 de janeiro de 2022.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001910-05.2021.4.03.6306
RELATOR:8º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: RAIMUNDO FAUSTINO DE SOUZA
Advogado do(a) RECORRENTE: DEYSE DE FATIMA LIMA - SP277630-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO-EMENTA
PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – IMPROCEDENTE – RECURSO DA
PARTE AUTORA – NÃO CUMPRIMENTO DE EXIGÊNCIAS FORMULADAS NA VIA
ADMINISTRATIVA NÃO PODE OBSTAR O ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO – SENTENÇA
ANULADA - PRESENTESOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL EM FAVOR DE IDOSO – HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA
COMPROVADA - DADOPROVIMENTO AO RECURSO.
Cuida-se de ação objetivando a condenação do INSS ao pagamento de benefício assistencial
ao idoso.
A r. sentença julgou improcedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos: “No
caso em tela, verifico que a parte autora recebe benefício assistencial (NB 707.372.480-4)
desde 20/08/2020 (DER). No entanto, requer o pagamento desde o requerimento administrativo
(NB 702.880.486-1), com DER em 31/01/2017. Verifico que o requerimento formulado em
31/01/2017 foi indeferido pelo INSS por falta de cumprimento de exigências (fl. 42 do arquivo
19). Tendo em vista que o benefício (NB 707.372.480-4) encontra-se ativo e que a presente
ação tem por objeto apenas o pagamento desde o primeiro requerimento administrativo, a
pretensão deduzida não merece acolhimento. ”
Com razão a parte autora. O não cumprimento de exigências formuladas na via administrativa
não podem obstar o acesso ao Poder Judiciário. Sentença anulada. Feito em termos para
julgamento.
Estabelece o artigo 20 da Lei nº 8.742/1993 que o benefício assistencial é concedido a partir da
verificação de dois requisitos: a) deficiência incapacitante para o trabalho ou pessoa idosa com
pelo menos 65 (sessenta e cinco) anos, por força do disposto no art. 33 da Lei nº 10.741/03; b)
hipossuficiência individual ou familiar de prover a subsistência da pessoa deficiente/idosa.
A parte autora almeja a concessão do benefício na condição de idoso.
O artigo 20, parágrafo 3º, da Lei nº 8.742/03 estabeleceu o parâmetro de ¼ do salário mínimo
da renda per capita para aferição da hipossuficiência.
O Supremo Tribunal Federal, nos autos dos Recursos Extraordinários n. 567.985 e n. 580.963,
declarou a inconstitucionalidade parcial por omissão do parágrafo terceiro do artigo 20, da Lei n.
8.742/1993 (Lei do LOAS) e do parágrafo único do artigo 34 da Lei n. 10.741/2003 (Estatuto do
Idoso), não sendo alcançado o quorum de 2/3 para modulação dos efeitos da decisão para que
a norma tivesse validade até 31/12/2015, conforme ementa a seguir:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que:
“considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”.
O requisito financeiro estabelecido pela Lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal
declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a Lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e de avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com
entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a
Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas.
O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003.
O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício assistencial já
concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo da renda
familiar per capita a que se refere a LOAS.
Não exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no
valor de até um salário mínimo, percebido poridosos.
Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em
relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos
idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.
Omissão parcial inconstitucional.
5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo
único, da Lei 10.741/2003.
6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.”
O Supremo Tribunal Federal fundamentou a inconstitucionalidade do parágrafo terceiro do
artigo 20, da Lei n. 8.742/1993 (Lei do LOAS) em razão da ocorrência de um processo de
inconstitucionalização do texto legal.
O Supremo Tribunal Federal fundamentou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo
34 da Lei n. 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), em razão da violação do princípio da isonomia,
pela “inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em
relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistencial social em relação aos
idosos titulares de benefício previdenciário no valor de até um salário mínimo”.
Também foi proclamado o entendimento de que, até edição de norma que venha regular o
tema, os dispositivos legais declarados inconstitucionais permanecerão vigentes, conforme se
extrai dos trechos a seguir do acórdão:
“Eu ressalto, então, todos esses aspectos e digo mesmo: o fato é que hoje o Supremo, muito
provavelmente, não tomaria a mesma decisão que foi proferida em 1998 na ADI 1.232, a partir
desses robustos indícios que estão aí. A jurisprudência atual supera, em diversos aspectos, os
entendimentos naquela época adotados pelo Tribunal quanto ao tratamento da omissão
inconstitucional, inclusive quanto à possibilidade, por exemplo, de, em caso de omissão parcial,
nós valermos da modulação de efeitos, por exemplo, de aplicarmos o artigo 27, deixarmos a lei
em vigor, mas não declararmos a sua nulidade, que é um ponto importante para o qual chama a
atenção o Ministro Marco Aurélio, declarar a nulidade aqui é agravar o estado de
inconstitucionalidade, distanciar-se ainda mais. Mas, hoje, já dispomos, então, dessa
alternativa.
omissis
Entendo que, nesse caso específico, se o Tribunal está afirmando que a lei vai continuar em
vigor e que o legislador terá que suprir omissões, não vejo razão nenhuma para estabelecer
prazo de modulação. Decorre da própria natureza da decisão que o legislador terá que legislar.
Só teria sentido fixar um prazo se houvesse uma consequência pelo seu descumprimento.”
Portanto, o real estado de miserabilidade deve ser aferido em cada caso concreto.
Segundo o laudo socioeconômico, a parte autora possui 70 anos de idade e reside com sua
esposa (52 anos de idade). O casal possui 04 (quatro) filhos.
A renda familiar, atualmente, provém do benefício assistencial auferidopelo autor e do montante
de R$ 220,00 auferido por sua esposaa título de programa governamental.
O núcleo familiar reside em um imóvel próprio composto de apenas um cômodo, simples e
guarnecido por móveis e equipamentos públicos que condizem com a alegada miserabilidade,
sem indícios que atestem o contrário. Ademais, todas as despesas declaradas no laudo social
são voltadas a suprir as necessidades básicas do autor, sem que se verifique qualquer valor
despendido com gastos supérfluos.
Assim, a parte autoracomprova a incapacidade de prover a sua manutenção desde a data do
requerimento administrativo em 31/07/2017 já que desde então a renda familiar e local de
moradia são os mesmos enão há prova nos autos em sentido contrário, além do que. A própria
autarquia previdenciária reconheceu a situação de hipossuficiência econômica do autor e lhe
concedeu o benefício assistencial em 20/08/2020.
Assim, verifica-se que as necessidades básicas da parte autora não estavamsendo atendidas
sendo constatada situação de hipossuficiência socioeconômica desde a DER em 31/01/2017.
Recurso da parte autora a que se dá provimentopara anular a r. sentença proferida e julgar
procedente o pedido formulado na inicial.Condeno o INSS a conceder o benefício assistencial
em favor da parte autora desde a DER em 31/01/2017 até 19/08/2020 e a pagar os atrasados,
mediante ofício requisitório ou precatório, descontando-se os valores eventualmente pagos
administrativamente ou de cumulação vedada em lei e observada a prescrição quinquenal.Juros
de mora e correção monetária nos termos do disposto na resolução 134/2010 do CJF com a
alteração dada pela resolução nº 267/2013 e demais alterações posteriores. Os valores devidos
deverão ser apresentados na fase de execução.
Sem condenação em honorários advocatícios, tendo em vista o disposto no artigo 55 da Lei nº
9099/95.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – IMPROCEDENTE – RECURSO DA
PARTE AUTORA – NÃO CUMPRIMENTO DE EXIGÊNCIAS FORMULADAS NA VIA
ADMINISTRATIVA NÃO PODE OBSTAR O ACESSO AO PODER JUDICIÁRIO – SENTENÇA
ANULADA - PRESENTESOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL EM FAVOR DE IDOSO – HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA
COMPROVADA - DADO PROVIMENTO AO RECURSO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
