
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5368436-03.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: JOAO VICTOR DOS SANTOS NETO
Advogado do(a) APELANTE: JOAO BATISTA TESSARINI - SP141066-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5368436-03.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: JOAO VICTOR DOS SANTOS NETO
Advogado do(a) APELANTE: JOAO BATISTA TESSARINI - SP141066-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei."
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(REsp 1355052 /SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015)
Feitas essas considerações, passo à análise do conjunto probatório formado nestes autos.
DO CASO DOS AUTOS
A ausência de condições do Autor de prover o seu sustento, ou tê-lo provido pela família, não restou demonstrada.
O estudo social (id 148438463), de 14.10.2019, informou que o Autor reside com sua esposa e um filho, “em imóvel próprio, o qual é de alvenaria, se encontrando em ótimo estado de conservação e higiene, contando com três quartos, sala, copa/cozinha, banheiro e área de serviço... os cômodos são forrados de alvenaria e o piso de lajotas... o primeiro quarto é guarnecido com o segundo quarto é guarnecido com a sala é guarnecida com a copa/cozinha é guarnecida com o banheiro conta com a área de serviço conta com
Há um terceiro quarto, que não pôde ser analisado pela Assistente Social, pois “estava fechado, alegam que é da namorada de Marcio e fica trancado com chave” contendo, conforme relato do Autor e sua esposa, “uma cama box casal e um guarda roupa”.
A renda familiar advém dos rendimentos auferidos pelo filho do Autor, em atividade informal (“bicos”), cujo valor não foi informado.
Foram alegadas despesas de R$ 1.184,00, dentre as quais friso as com IPTU de R$ 107,00, água de R$ 70,00, luz de R$ 105,00 e telefone de R$ 57,00.
Verifico que há nos autos cópias de contas de água com valor superior a cem reais e de energia elétrica acima de R$ 170,00 (id 148438445).
O Autor não apresentou elementos acerca da fonte de renda para custeio de tais gastos, de valores expressivos, já que menciona que seu filho recebe “valores ínfimos” em sua atividade (id 148438470).
Assim sendo, diante do conteúdo probatório dos autos, dispondo o requerente de estrutura e aparato de bens visivelmente acima da média brasileira (casa própria, com três quartos, sendo um deles cedido a terceiro, em ótimo estado de conservação, com móveis novos e em boas condições, com dois televisores de cinquenta polegadas), em que pese mencionar sobreviver com renda insuficiente, entendo que o Autor não está submetido a risco social.
O benefício assistencial é destinado a pessoas em condição de miserabilidade, que destoa da apresentada pelo Autor, pois demonstrou viver em situação socioeconômica favorável se comparada à realidade nacional.
Desta forma, ausente requisito essencial à concessão do benefício assistencial, de rigor a rejeição do pedido inicial, nos termos da r. sentença.
Reforço que, nos termos da fundamentação, a verificação da condição de hipossuficiência não se prende à mera análise aritmética da renda familiar, sendo “necessário o revolvimento de todo o conjunto probatório, através do qual se possa aferir eventual miserabilidade”.
Saliento que futuras alterações na composição do núcleo familiar (diante da notícia de que o filho do Autor contrairá matrimônio e passará a viver em moradia diversa), não têm o condão de modificar o julgamento da presente demanda, visto que baseado na verificação da condição socioeconômica do requerente consoante provas e conclusões obtidas no laudo pericial, este produzido por profissional Assistente Social, podendo gerar, ocasionalmente e tão somente, o surgimento de nova discussão, judicial ou administrativa, conforme o caso, em face de eventual pretensão resistida.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do Autor e mantenho a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, na forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora não comprovou o preenchimento do requisito essencial à concessão do benefício assistencial.
- Apelação da parte autora desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
