Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5002073-75.2019.4.03.6141
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
22/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 27/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E
12.435/2011. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
NÃO DEVIDOS. DPU E INSS. UNIÃO. CONFUSÃO.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora demonstrou o preenchimento do requisito da
miserabilidade.
- Os órgãos em questão integram a mesma pessoa jurídica de direito público (União), o que atrai
o fenômeno da confusão - qual seja, quando uma mesma pessoa reúne as qualidades de credor
e devedor, sendo este fato extintivo da obrigação.
- Súmula/STJ 421: “Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela
atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença”.
- Apelação do réu provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002073-75.2019.4.03.6141
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE HIGINO DOS SANTOS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002073-75.2019.4.03.6141
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE HIGINO DOS SANTOS
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o restabelecimento de benefício assistencial previsto no
art. 203, V, da Constituição Federal e anulação de cobrança referente a período supostamente
pago indevidamente.
A r. sentença (id 94413192) julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do
artigo 485, VI do Código de Processo Civil.
A Nona Turma decidiu dar provimento à apelação da parte autora para anular a r. sentença,
tornando-se os autos à origem para regular prosseguimento (id 130555859, a id 125852857).
Com o retorno dos autos à origem foi proferida nova sentença (id 155329974), julgando
procedente o pedido inicial para restabelecer o benefício assistencial e determinar a cessação
da cobrança dos valores recebidos pelo Autor, acrescido de honorários advocatícios fixados no
patamar mínimo legal.
Em razões recursais (id 155329981) requer o INSS a reforma da r. sentença, com a
improcedência do pedido inicial, ao argumento de não padecer o Autor de miserabilidade.
Na hipótese da manutenção do benefício, requer o afastamento da condenação em honorários
advocatícios, visto que a parte autora é representada pela Defensoria Pública da União.
Com contrarrazões.
Subiram a esta instância.
Parecer do Ministério Público Federal (id 156936170) no sentido do desprovimento do apelo
interposto.
É o sucinto relato.
vn
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002073-75.2019.4.03.6141
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APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE HIGINO DOS SANTOS
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais,
passo ao exame da matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem
como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da
Silva, consiste em:
"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos
fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa
humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido
normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-
se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a
nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade
individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre
que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem
social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa
e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados
formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa
humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração
da Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas
como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e
previdência social e o art. 203, IV, que instituiu o benefício do amparo social.
A Lei nº 6.179/74 instituiu, em nosso ordenamento jurídico, a renda mensal vitalícia, passando a
ser amparados pela Previdência Social os maiores de 70 anos e os inválidos, definitivamente
incapacitados para o trabalho, desde que não exercessem atividades remuneradas ou não
auferissem rendimentos. O valor do benefício correspondia à metade do maior salário-mínimo
vigente no país, arredondada para a unidade de cruzeiro imediatamente superior, não podendo
ultrapassar 60% do valor do salário-mínimo do local de pagamento.
Com a promulgação da Carta Magna, em 05 de outubro de 1988, o valor do benefício foi
aumentado para 1 (um) salário-mínimo, pelo art. 203, inciso V:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei."
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada,
dependia da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos.
O art. 139 da Lei n.º 8.213/91 dispunha que a renda mensal vitalícia continuaria integrando o
elenco de benefícios da Previdência Social, até que o artigo constitucional fosse
regulamentado.
A Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, deu eficácia ao inciso V do art. 203 da Constituição
Federal e extinguiu a renda mensal vitalícia em seu art. 40, resguardando, entretanto, o direito
daqueles que o requeressem até o dia 31 de dezembro de 1995, desde que preenchidos os
requisitos previstos na Lei Previdenciária.
A Lei de Assistência foi regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995,
posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei assistencial e o art. 1º de seu decreto regulamentar estabeleceram os requisitos
para a concessão do benefício, quais sejam: ser o requerente portador de deficiência ou idoso,
com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e
nem tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi reduzida para 67 anos, a partir
de 1º de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, posteriormente, para 65 anos,
através do art. 34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003, mantida, inclusive, por ocasião da
edição da Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa portadora de
deficiência, família e ausência de condições de se manter ou de ser provido pela sua família.
Pessoa portadora de deficiência é a incapacitada para a vida independente e para o trabalho,
em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena
e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na redação dada
pela Lei nº 12.470, de 31 de agosto de 2011.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo
mínimo de 2 (dois) anos (§10º).
A incapacidade para a vida independente, por sua vez, não há que ser entendida como aquela
que impeça a execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o
auxílio permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento sem o amparo
de alguém.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do
Ministro Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377),
oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida
laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da
ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção
do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação
continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de
locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, de acordo com a Medida Provisória nº 1.473-34,
de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, definiu-se o conceito de família como o
conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo
teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/2011, fora estabelecido, expressamente para os
fins do art. 20, caput, da Lei assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos
solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo
teto (art. 20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo, anoto
que fora ajuizada a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, pelo Procurador-Geral
da República, julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal, que declarou a
constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
Os debates, entretanto, não cessaram, por ser tormentosa a questão e envolver princípios
fundamentais contidos na Carta da República, situação que culminou, inclusive, com o
reconhecimento, pelo mesmo STF, da ocorrência de repercussão geral.
A Suprema Corte acabou por declarar a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal,
inclusive por considerar defasada essa forma meramente aritmética de se apreciar a situação
de miserabilidade dos idosos ou deficientes que visam a concessão do benefício assistencial
(Plenário, RCL 4374, j. 18.04.2013, DJE de 04/09/2013).
No entanto, é preciso que se tenha a possibilidade de ao menos entrever, a partir da renda
informada, eventual quadro de pobreza em função da situação específica de quem pleiteia o
benefício, até que o Poder Legislativo estabeleça novas regras.
Para tanto, faz-se necessário o revolvimento de todo o conjunto probatório, através do qual se
possa aferir eventual miserabilidade. E assim o é diante do princípio constitucional da dignidade
da pessoa humana, já mencionado no início desta decisão, com vistas à garantia de suas
necessidades básicas de subsistência, o que leva o julgador a interpretar a normação legal de
sorte a conceder proteção social ao cidadão economicamente vulnerável, tal como assentado
no REsp 1112557 julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/73.
Confira-se:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para
o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Por outro lado, observo que a Lei nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, passou a considerar
como de "baixa renda" a família inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo
Federal cuja renda mensal seja de até 2 (dois) salários mínimos, ainda que para os fins
específicos de custeio ali limitado. Na mesma trilha, as Leis que criaram o Bolsa Família
(10.836/04), Programa Nacional de Acesso à Alimentação (10.689/03) e o Bolsa Escola
(10.219/01) estabeleceram parâmetros mais coerentes de renda familiar mínima quanto em
cotejo com aquele estabelecido de ¼ do salário mínimo, agora declarado inconstitucional.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 580.963/PR (DJe 14.11.2013),
assentou a inconstitucionalidade por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do
Idoso, considerando a "inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores
de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social
em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário
mínimo." Assim, entendo que deve ser excluído do cômputo da renda per capita o valor
decorrente de benefício de valor mínimo recebido por idoso ou inválido, pertencente ao núcleo
familiar.
Nesse sentido, o C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1355052, submetido
ao regimento do art. 543-C do CPC, assentou que não se computa o valor de um salário
mínimo percebido por idoso a título de beneficio assistencial ou previdenciário para aferição de
hipossuficiência de núcleo familiar.
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO,
NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no
valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do
benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do
Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código
de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(REsp 1355052 /SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
25/02/2015, DJe 05/11/2015)
Feitas essas considerações, passo à análise do conjunto probatório formado nestes autos.
DO CASO DOS AUTOS
Ante a ausência de impugnação, no apelo do INSS, acerca da deficiência do Autor, deixo de
avaliar o seu preenchimento e passo a analisar o requisito concernente à miserabilidade.
A falta de condições do requerente de prover o seu sustento, ou tê-lo provido pela família,
restou demonstrada.
O estudo social (id 155329940) informou que o Autor vive com sua esposa em imóvel próprio,
“de alvenaria, espaçosa e bem arejada, com sala, cozinha, 02 quartos, 01 banheiro, área de
serviço e área externa... o estado de conservação do imóvel é bom bem como das mobílias da
casa... A higiene e organização do ambiente também é satisfatória”, contendo “Sala: 02 pufs, 01
cadeira de plástico, 01 jogo de sofá, 01 rack, 01 televisão, 01 aparelho de telefone... Cozinha:01
fogão, 01 geladeira, 01 forno de micro-ondas, pia, armários, mesa com cadeiras e
eletrodomésticos... Quarto :01 cama de casal, 01 guarda roupas e 01 ventilador... Quarto :02
cama de solteiro, 01 cama de casal, ventiladores e 01 impressora... Banheiros: Com Box... Área
externa: Pia, churrasqueira e mesa com cadeiras”.
A renda familiar advém de uma aposentadoria auferida pela esposa do Autor, no valor de um
salário-mínimo mensal.
Foram declaradas diversas despesas, totalizando o valor de R$ 802,76, dentre as quais friso as
com medicamentos de R$ 350,00.
Destarte, verifico que o núcleo familiar, constituído por dois integrantes, considerando a receita
e despesas referidas, possui renda per capita inferior à metade do salário-mínimo vigente.
Nestes termos, diante do conteúdo probatório dos autos, entendo que restou demonstrada a
situação de miserabilidade, sendo de rigor a procedência do pedido inicial, nos termos da r.
sentença.
No tocante à obrigação de prestar alimentos por parte de outros familiares do requerente que
não residem no mesmo imóvel, não reconheço eventual afastamento da responsabilidade
estatal, apesar de subsidiária, tendo em vista a ausência de notícia nos autos de possível
recebimento ou solicitação de prestação de tal natureza.
Advirto que, nos termos do art. 2º, III, da Lei 13.982/20, é vedado o pagamento concomitante do
auxílio emergencial e do benefício assistencial ora vindicado nestes autos.
Portanto, diante da notícia de percepção pelo Autor do benefício emergencial e nos termos da
expressa vedação legal referida, nos períodos em que o Autor percebeu auxílio emergencial
deverá ser suspenso o pagamento do benefício assistencial concedido na presente lide.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
A condenação ao pagamento de honorários advocatícios não merece prosperar, pois os órgãos
em questão integram a mesma pessoa jurídica de direito público (União), o que atrai o
fenômeno da confusão - qual seja, quando uma mesma pessoa reúne as qualidades de credor
e devedor, sendo este fato extintivo da obrigação.
Aliás, a questão é objeto da Súmula/STJ 421, na qual se cristalizou o seguinte entendimento:
“Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a
pessoa jurídica de direito público à qual pertença”.
Nesse sentido, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.199.715/RJ,
precedente representativo da controvérsia, decidiu não serem devidos honorários advocatícios
à Defensoria Pública quando atua contra pessoa jurídica de direito público integrante da mesma
Fazenda Pública. Confira-se:
"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA REPETITIVA. PREVIDÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
PAGAMENTO EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
NÃO CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. "Os honorários advocatícios não são devidos à defensoria Pública quando ela atua contra a
pessoa jurídica de direito público à qual pertença" (Súmula 421/STJ).
2. Também não são devidos honorários advocatícios à defensoria Pública quando ela atua
contra pessoa jurídica de direito público que integra a mesma Fazenda Pública.
3. Recurso especial conhecido e provido, para excluir da condenação imposta ao recorrente o
pagamento de honorários advocatícios."
(Corte Especial, RESP 1199715/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 16/02/2011, DJE
12/04/2011).
No mesmo sentido, trago à colação os seguintes precedentes desta Egrégia Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL RECEBIDO DE BOA FÉ. ERRO DA
ADMINISTRAÇÃO. NATUREZA ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES.
1. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos
valores recebidos de boa fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da
irrepetibilidade dos alimentos (MS 26085, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno; RE
587371, Relator Ministro Teori Zavascki, Tribunal Pleno; RE 638115, RE 638115, Relator
Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno).
2. De sua vez, o e. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de ser indevida
a restituição de valores recebidos de boa fé em decorrência de erro da Administração.
3. Não há que se falar em condenação da autarquia em honorários advocatícios em favor da
Defensoria Pública da União, pois o INSS, por ser integrante da Administração Pública Federal
Indireta, é vinculado à União Federal, tal qual a DPU, ambos custeados por recursos federais,
sob pena de configuração de confusão entre credor e devedor, na forma do Art. 381, do CC, e
da Súmula 421, do STJ.
4. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01,
e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
5. Apelação provida.
(TRF3ª Região, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP 0004531-72.2016.4.03.6104, Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, Órgão Julgador 10ª Turma,
Data do Julgamento19/12/2019, Data da Publicação/Fonte Intimação via sistema DATA:
10/01/2020).
“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA
UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO INSS.
1. O inconformismo do INSS cinge-se aos critérios de fixação dos juros de mora e correção
monetária sobre os valores devidos em decorrência de condenação judicial e honorários
advocatícios.
2. No tocante aos consectários legais, não assiste razão à autarquia, porém, eis que esta
Turma firmou entendimento no sentido de que a correção monetária deverá incidir sobre as
prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação,
observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do
Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de
sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV,
conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte, sendo que após a
expedição deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
3. Com relação à fixação de honorários advocatícios para a Defensoria Pública da União, tendo
em vista que a ação foi ajuizada em face do INSS, ambos estão inseridos no conceito de
Fazenda Pública, de modo que verificada a confusão de credor e devedor, inviável o
reconhecimento da obrigação pretendida, como, aliás, encontra-se pacificado na jurisprudência,
por meio da Súmula 421, do STJ.
8. Apelação parcialmente provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.
(TRF3ª Região, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP0004067-39.2015.4.03.6183, Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, Órgão Julgador 10ª
Turma, Data do Julgamento 16/07/2019, Data da Publicação/Fonte Intimação via sistema
DATA: 18/07/2019).
Dentro deste quadro, de rigor o afastamento da condenação do INSS ao pagamento de
honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública da União.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS para afastar a condenação em
honorários advocatícios, na forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E
12.435/2011. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS NÃO DEVIDOS. DPU E INSS. UNIÃO. CONFUSÃO.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que
comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua
família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora demonstrou o preenchimento do requisito da
miserabilidade.
- Os órgãos em questão integram a mesma pessoa jurídica de direito público (União), o que
atrai o fenômeno da confusão - qual seja, quando uma mesma pessoa reúne as qualidades de
credor e devedor, sendo este fato extintivo da obrigação.
- Súmula/STJ 421: “Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando
ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença”.
- Apelação do réu provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
