Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
0002298-04.2009.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
01/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. APELO PROVIDO.
1. O benefício, de caráter não contributivo, foi regulamentado pela Lei Federal nº 8.742/93, que
traz os requisitos necessários à implantação.
2. Quanto à deficiência, o artigo 20, §2º, da Lei Federal nº 8.742/93, esclarece que “considera-se
pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” –
sendo que, a teor do §10 do preceito em tela, impedimento de longo prazo é aquele que produz
seus efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
3. A incapacidade exigida, por sua vez, não deve que ser encarada como aquela que impeça a
execução de todos os atos da vida diária (hipótese em que se faria necessário o auxílio
permanente de terceiros), mas sim a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do
exercício de trabalho ou ocupação remunerada.
4. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do CPC: “O juiz
apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os
motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando
em conta o método utilizado pelo perito”.
5. Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate depende da existência de
elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do
experto.
6. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas
partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se
vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração
do conjunto probatório trazido a exame.
7. Ausente prova da deficiência o benefício deve ser indeferido.
8. Apelo do INSS provido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0002298-04.2009.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIELEY DA LUZ
REPRESENTANTE: CLEUZA DA LUZ
Advogado do(a) APELADO: ILCA FELIX - SP69974-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002298-04.2009.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIELEY DA LUZ
REPRESENTANTE: CLEUZA DA LUZ
Advogado do(a) APELADO: ILCA FELIX - SP69974-A,
R E L A T Ó R I O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se
deapelaçãointerpostapelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra a r. sentença
(Id.:157746187, fls.89) que julgouprocedente o pedido de concessão do Benefício de Prestação
Continuada, a partir da datado requerimento administrativo, condenando-oao pagamento dos
honorários advocatícios arbitrados em 15% (quinzepor cento) do valor da causa,com juros de
12% (doze por cento) ao ano (art. 406 do Código Civil c.c art. 116,§ 1º do Código Tributário
Nacional, devidos a partir da citação, devendo ser corrigidas desde quando se tornaram devidas
até o efetivo pagamento, pela variação do IGPM-FGV ou outro índice que venha a substituí-lo.
Em suas razões de apelação (Id.:157746187, fls.109/113), sustenta o INSS:
1 - que a requerente não cumpriu ao requisito de miserabilidade, não fazendo jus ao benefício
assistencial pleiteado;
2 - subsidiariamente, pleiteia aredução dos honorários advocatícios.
Pugna pela reforma da sentença.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento da apelação (Id.:158561036).
É o relatório.
O Juiz Federal Convocado Marcelo Guerra:
Trata-se de ação destinada a viabilizar a implantação de benefício de prestação continuada
previsto no artigo 203, V, da Constituição, e na Lei Federal nº. 8.742/93.
A r. sentença julgou o pedido inicial procedente para determinar a concessão do benefício
desde a data do requerimento administrativo, e condenou o INSS ao pagamento de honorários
advocatícios fixados em 15% do valor da causa (fls. 35/41, ID 157746187).
Apelação do INSS (fls. 56/60, ID 157746187), na qual requer a reforma da r. sentença. Aponta a
ausência de incapacidade, atestada em perícia médica.
A E. Relatora apresentou voto no sentido de dar parcial provimento à apelação para reduzir a
verba honorária.
Divirjo, respeitosamente, pelas razões que passo a expor:
O artigo 3º, da Constituição, elenca os objetivos da República Federativa do Brasil, quais sejam:
“I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III -
erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV -
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação”.
Em vista de tais objetivos, a Constituição determinou, no âmbito da Assistência Social, a
implantação de benefício destinado a garantir uma subsistência mínima para os cidadãos
efetivamente necessitados, verbis:
“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei”.
O benefício, de caráter não contributivo, foi regulamentado pela Lei Federal nº 8.742/93, que
traz os requisitos necessários à implantação.
Quanto à deficiência, o artigo 20, §2º, da Lei Federal nº 8.742/93, esclarece que “considera-se
pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”
– sendo que, a teor do §10 do preceito em tela, impedimento de longo prazo é aquele que
produz seus efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
A incapacidade exigida, por sua vez, não deve que ser encarada como aquela que impeça a
execução de todos os atos da vida diária (hipótese em que se faria necessário o auxílio
permanente de terceiros), mas sim a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do
exercício de trabalho ou ocupação remunerada.
Neste sentido, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (5ª Turma, REsp. nº 360.202, j.
04.06.2002, DJ 01.07.2002, p. 377, Rel. Min GILSON DIPP), oportunidade em que se
consignou que "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade
para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para
se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se
esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria
devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do
indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
Quanto ao idoso, a partir da vigência das alterações da Lei Federal nº 10.741, de 1º de outubro
de 2003, exige-se a idade mínima de 65 anos (artigo 20, caput, da Lei Federal nº 8.742/93).
Em ambas as hipóteses (deficiência ou idoso), exige-se prova da impossibilidade de prover a
própria subsistência ou de tê-la provida pela família. O dever de assistência do Estado é,
portanto, subsidiário, e não afasta a obrigação de amparo mútuo familiar. Nesse sentido, a
jurisprudência específica da Sétima Turma desta E. Corte (ApCiv 0003058-98.2019.4.03.9999,
j. 22/10/2020, Dje 03/11/2020, Rel. Des. Fed. PAULO SERGIO DOMINGUES).
Nesse sentido, a hipossuficiência econômica deve ser analisada no contexto familiar, sendo
que, nos termos do artigo 20, §1º, da Lei Federal nº 8.742/93, a “família é composta pelo
requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto”.
No que tange ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar
a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Reclamação nº 4374/PE (Rel. MIN. GILMAR MENDES), reapreciou a decisão
anteriormente proferida na ADI nº 1.232-1/DF, declarando a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. Destaco da respectiva ementa o
seguinte trecho:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem
não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Art. 20, §3º da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se
incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja
renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro
estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria
que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do
benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de
Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do
art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de
constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do
prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de
votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da competência geral de fiscalizar a
compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar
a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do
ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF
para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos
normativos. A oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de controle
abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito
das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da reclamação - no "balançar de olhos" entre
objeto e parâmetro da reclamação - que surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução
interpretativa no controle de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a
determinada decisão do STF, o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de
sua própria decisão. E, inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-
parâmetro da reclamação, se entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão
não se coaduna mais com a interpretação atual da Constituição.
4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo
Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do
critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada,
elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e avaliar
o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a
Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01,
que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio
financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a
ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a
rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-
se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios
assistenciais por parte do Estado brasileiro).
5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da
Lei 8.742/1993.
6. Reclamação constitucional julgada improcedente”.
Por conseguinte, verifica-se que a decisão da Corte Excelsa entendeu que a Lei Assistencial,
ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não
sendo vedado que se demonstre a insuficiência de recursos para prover a manutenção do
deficiente ou idoso por outros meios de prova.
Aliás, sobre esse tópico, o Superior Tribunal de Justiça, em âmbito de recurso representativo de
controvérsia repetitiva, assim já se pronunciou:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
(...)
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido".
(3ª Seção, REsp. nº 1.112.557/MG, DJ 20/11/2009, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO).
Por conseguinte, conclui-se que a referência quantitativa expressa no § 3º, do artigo 20, da
LOAS, pode ser considerada como um dos critérios para a aferição de miserabilidade, sem a
exclusão de outros.
No que diz respeito à exclusão, da renda do núcleo familiar, do valor do benefício assistencial
percebido pelo idoso, conforme disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei Federal nº
10.741/03, colocou-se a questão de tal afastamento aplicar-se tão somente ao benefício
assistencial (nos estritos termos da norma) ou, noutro giro, igualmente abarcar benefício
previdenciário de qualquer natureza, desde que de igual importe. Argumentou-se que a ratio
legis do artigo em questão dizia respeito à irrelevância do valor para o cálculo referenciado e,
portanto, não havia justificativa plausível para a discriminação, inclusive a partir de aplicação
analógica do preceituado no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.
Acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça, já se pronunciou. De início, na Petição nº
7203/PE (Incidente de Uniformização de Jurisprudência), apreciada pela 3ª Seção daquela
Corte em 10 de agosto de 2011 (Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA) e, mais
recentemente, no REsp nº 1.355.052/SP, processado segundo o rito do art. 543-C do CPC/73,
cuja ementa é a seguinte:
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO,
NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no
valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do
benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do
Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código
de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(1ª Seção, REsp nº 1.355.052/SP, j. 25/02/2015, DJe 05/11/2015, Rel. Min. BENEDITO
GONÇALVES).
Logo, não deve ser considerado, no cálculo da renda familiar, o benefício no valor de um salário
mínimo recebido por deficiente (artigo 34, parágrafo único, da Lei Federal nº. 10.741/03) ou
idoso, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamentos
repetitivos.
Todavia, é necessário consignar que a aludida exclusão do rendimento de deficiente ou idoso
não importa na automática concessão do benefício, devendo serem considerados os demais
aspectos socioeconômicos e familiares do requerente.
No caso concreto, a parte autora tinha 6 anos em 2006, ano em que a ação foi ajuizada.
Na petição inicial, afirmou ser surda-muda.
O estudo social foi realizado em 2007 (fls. 5/6, ID 157746187). Na ocasião, a assistente social
afirmou que autora “não é surda-muda, uma vez que pudemos manter um diálogo com a
criança, mesmo ela se mostrando dispersa em suas respostas, isso, segundo sua mãe e a
própria diretora da escola, em virtude da sua deficiência mental”.
O pedido de realização de perícia médica foi indeferido (fls. 28, ID 157746187).
A r. sentença julgou o pedido inicial procedente em 26/08/2008 (fls. 35/41, ID 157746187).
O INSS interpôs apelação (fls. 56/60, ID 157746187).
O julgamento foi convertido em diligência, em 21/05/2012, para a realização de perícia médica
(fls. 78, ID 157746187).
A perícia médica foi realizada em maio de 2018 (fls. 65/96, ID 157746193).
No laudo, o perito descreveu diversos testes aplicados durante a perícia, inclusive gravando
vídeos com a ciência da autora e de sua genitora.
Expôs, ainda, informações prestadas pela mãe da parte autora:
“- Informações da mãe: Teve descolamento de placenta, passava muito nervoso por brigar com
o genitor da Autora. Nasceu de parto normal, a termo, sem intercorrências. Chorou forte ao
nascer e receberam alta no segundo dia (ambas as informações contradizem a possibilidade de
anóxia neonatal ou sofrimento cerebral por redução de circulação sanguínea e de oxigenação).
A Autora reside com a genitora, o padrasto Fernando e os irmãos caçulas Luan e Lucas. Mãe
nega traumatismos cranianos ou convulsões.
- É a segunda de uma prole de 4 filhos (única do sexo feminino). Segundo a genitora, a Autora
era sadia e perfeita, porém, chorava muito entre três meses e um ano de idade. Negaoutros
problemas após, exceto a linguagem. Os primeiros sons iniciaram aos seis meses - “parecia um
papagaio” - denominado "lalação" e adequado para início por volta dos cinco a seis meses de
idade. Falou pai e mãe aos sete anos (paradoxal, quanto à hipótese de atraso de linguagem,
dado a lalação ter iniciado em idade adequada à encontrada na população em geral). Demais
palavras compreensíveis teriam ocorrido aos nove anos (SIC).
- Engatinhou aos sete meses, andava aos doze meses (desenvolvimento motor adequado).
Frequentou APAE em Guia Lopes até os dezesseis anos e parou por conta própria. A mãe
refere ter encaminhamento da Fonoaudiologia da UCDB para tratamento e pedido de novo
aparelho auditivo - SIC. Teria iniciado o uso do aparelho auditivo aos treze anos. O atual
estragou há oito meses. Todos foram concedidos pelo SUS. A PERICIADA OUVIU O PERITO
SEM DIFICULDADES, TENDO O EXAMINADOR UTILIZADO TIMBRE E TOM DE VOZ
ADEQUADOS EM CONVÍVIO SOCIAL CIVILIZADO.
- Menarca (primeira menstruação) aos doze anos. Começou a namorar aos quatorze anos.
Primeira relação sexual aos quinze anos de idade. Possui namorado de vinte e dois anos e a
mãe da Autora o orienta a usar preservativo. A Pericianda afirmou nunca ter beijado na boca.
Depois de muita insistência, referiu morar com o irmão Gabriel (nomes: Wesley, Lucas e Luan e
os meio-irmãos Danielson, Jander e Cássia). Somente namoram na casa da Autora.
- Desde os seis anos possui comportamento heteroagressivo (agressividade com outras
pessoas) e desde os treze anos autoagressivo (agressiva consigo própria). Começa a chorar
quando se sente pressionada ou lhe é negado algo o se é repreendida. Segundo a mãe, a
Autora lê e escreve com certa dificuldade. Não vota. Conseguia ir e voltar sozinha da casa da
avó materna - morava a cinco quadras.
- Segundo a mãe, ela não diferencia notas de 2, 50 ou 100 reais. Não faz compras. Confunde 2
e 100 reais pela cor (SIC). Mas, conseguiu diferenciar notas de 20 e de 50 reais mostradas pelo
Perito e afirmou valer mais a nota de 50 reais, em comparação à de 20 reais.
- Nunca pegou ônibus sozinha. É independente para sua higiene pessoal, vestimenta e
cuidados externos".
Em conclusão, o perito atestou:
“AUSÊNCIA DE ANORMALIDADE AO EXAME FÍSICO GERAL. Bom estado geral, hidratada,
corada, bem nutrida, eupneica, afebril, acianótica, anictérica, marcha normal, sem déficits
motores, discreta disartria (todavia, a fala da Periciada é bem compreensível), audição
adequada para responder a todos os comandos do perito, verbalizados em volume e tom
adequados ao convívio social urbanizado, como constam em três registros audiovisuais)".
Em resposta aos quesitos da parte autora, o perito afirmou, ainda:
“6. Pode o Sr. Perito descrever minuciosamente a situação mental da Pericianda?
NÃO DETECTADAS DISFUNÇÕES neurológicas ou psiquiátricas. A Periciada afirmou não ter
completado o segundo grau, entretanto, afirmou ter prestado a prova do ENEM. É vaidosa,
cuidando pessoalmente de seus cabelos bem tratados, sedosos e brilhantes, demonstrados nos
vídeos realizados, e dotada de grande capacidade de coordenação motora fina, conforme
presente na foto em anexa do trabalho artesanal meticuloso em suas unhas das mãos. Aos
vinte anos de idade, atualmente, iniciou sua vida sexual aos quinze anos, conforme relato de
sua genitora. Seu namorado atual possui vinte e dois anos. A Autora é ativa em sua residência,
auxiliando sua mãe nos afazeres domésticos: a Periciada refere limpar sua casa, ficar deitada,
lava e passa roupa, lava louça banheiro, varre o chão e passa pano. Assiste TV”.
É certo que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do
CPC: “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na
sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do
laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”.
Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria
técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate depende da existência de
elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do
experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos
unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial,
circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a
ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Há precedentes do STJ nesse
diapasão (STJ, 4ª Turma, REsp nº 200802113000, Rel. Min. LUIÍS FELIPE SALOMÃO, DJe:
26/03/2013; 1ª Turma, AGA 200901317319, DJe: 12/11/2010, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES
LIMA).
Ausente prova da deficiência o benefício deve ser indeferido.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS.
Inverto o ônus sucumbencial. Condeno a autora ao ressarcimento das despesas processuais
desembolsadas pela autarquia e fixo honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor
atualizado da causa, suspensa, contudo, a exigibilidade, nos termos dos artigos 11, §2º, e 12,
da Lei nº 1.060/50, e parágrafo §3º do art. 98 do Código de Processo Civil.
A eventual devolução dos valores recebidos deverá ser analisada em sede de execução, nos
termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do Código de Processo Civil, e de acordo com o que
restar decidido no julgamento do Tema nº 692, pelo Superior Tribunal de Justiça.
Oficie-se ao INSS para a cessação do benefício.
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002298-04.2009.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIELEY DA LUZ
REPRESENTANTE: CLEUZA DA LUZ
Advogado do(a) APELADO: ILCA FELIX - SP69974-A,
V O T O
A EXMA DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (Relatora):
Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de
sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de
Processo Civil.
MÉRITO
O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição
Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da
Lei 8.742/1993.
O Benefício da Prestação Continuada (BPC) consiste na garantia de um salário mínimo mensal
ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo
prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as
demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício
assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja
segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a
comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas
com deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
A previsão deste benefício guarda perfeita harmonia com a Constituição de 1988, que
hospedou em seu texto princípios que incorporam exigências de justiça e valores éticos, com
previsão de tarefas para que o Estado proceda à reparação de injustiças.
A dignidade humana permeia todas as matérias constitucionais, sendo um valor supremo. E a
cidadania não se restringe ao seu conteúdo formal, sendo a legitimidade do exercício político
pelos indivíduos apenas uma das vertentes da cidadania, que é muito mais ampla e tem em seu
conteúdo constitucional a legitimidade do exercício dos direitos sociais, culturais e econômicos.
Os Princípios Fundamentais previstos no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, voltados
para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivando a erradicação da
pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, dão suporte às normas públicas
voltadas ao amparo de pessoas em situação de miséria.
No mais, destaco que o julgamentos dos casos de LOAS, pela análise do cabimento ou não da
percepção do Benefício de Prestação Continuada (BPC)contribui para o cumprimento da Meta 9
do CNJ,que prevê a integração da Agenda 2030 da ONU pelo Poder Judiciário, guardando
especialconsonância osObjetivosdo Desenvolvimento Sustentável de número 1e 2(ODS 1e 2)
desta Agenda, qual sejam: "erradicação da pobreza; e fome zero”, especialmentecom as
metas1.3“Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados,
para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis
(...)”; e2.1“Até 2030, acabar com a fome e garantir o acesso de todas as pessoas, em particular
os pobres e pessoas em situações vulneráveis, incluindo crianças, a alimentos seguros,
nutritivos e suficientes durante todo o ano.”
É com esse espírito que o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V da Carta deve
ser compreendido.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, define pessoa com deficiência como aquela que tem
impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em
interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O conceito adotado pela ONU (Organização das Nações Unidas), na Convenção Sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, ingressou formalmente no ordenamento pátrio com a
ratificação desta Convenção e promulgado pelo Decreto nº 6.949/2009. Em 2015, com a Lei
13.146/2015, o conceito de pessoa com deficiência foi ampliado. A norma preceitua que as
barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", não precisam se "somar", bastando a
presença de única limitação. Ao mesmo tempo, verifica-se que as limitações de que trata a Lei
atual ampliam a noção de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida
independente,para aanálise da situação de vulnerabilidade do requerente peloconjunto de
circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele
que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do
benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas
funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e
pessoais a que está sujeito.
Insta salientar, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do
benefício, nos termos da Súmula 48 da TNU:
"A incapacidade não precisa ser permanente para fins de concessão do benefício assistencial
de prestação continuada".
No que diz respeito ao requisito socioeconômico,ainda queo § 3º do artigo 20 da Lei
8.742/1993,com redação dada pela recenteMP1.023/2020,considerecomo hipossuficiente para
consecução deste benefício pessoaincapaz de prover a sua manutenção por integrar família
cuja renda mensalper capitaseja inferior a 1/4(um quarto)dosalário-mínimo(critérioa
sersubmetido àapreciação doCongresso Nacional),fato é que a jurisprudênciaentende bastante
razoável a adoção de½ (meio) salário mínimo como parâmetro, eis queos programas de
assistência social no Brasil utilizamatualmente o valor demeio salário mínimocomo referencial
econômico para a concessão dos respectivos benefícios, tendo referido o Programa Nacional
de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação(Lei n.º 10.689/03), o Programa Bolsa Família -
PBF (Lei n.º 10.836/04), o Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa
Escola (Lei 10.219/2001), Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa
Alimentação (MP 2.206-1/2001) Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002),
Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001).
Neste sentido, o E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567985/MT (18-04-13),
com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e
Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou, incidentertantum, a
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que
estabelecia a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo para a concessão
de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da
miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar
Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor demeio
salário mínimo como referencial econômico.
O§11doartigo 20,incluído pelaLei 13.146/2015, normatizouque a comprovação da
miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente
podemseraferidospor outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita
familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício,
consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de
miserabilidade que a rendaper capitasugere: Precedentes do C.
STJ:AgRgnoAREsp319.888/PR, 1ª Turma, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE
03/02/2017;AgRgnoREsp1.514.461/SP, 2ª Turma, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE
24/05/2016;REsp1.025.181/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE
29/09/2008).
No caso em exame,o laudo médico pericial constatou que arequerente é pessoa com
deficiência (id.:15774693, fls.60/36), portadora de lesãoCONGÊNITA - distúrbio anatômico do
frênulo lingual, tratando-se de limitação de mobilidade da língua de caráter congênito desde o
nascimento, concluindo que aautora possui enfermidades que a incapacitam para o trabalho e,
impedemsua participação plena na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas.Não restando dúvidas sobre a deficiência da autora.
No tocante ao estudo social (ID. 157746187, fls.58) consta que a requerentevivejuntamente
com sua genitora, seu padrasto e um irmão, de favor em uma chácaracedida pelos proprietários
para a requerente morar com a família, justamente por viverem em situação de vulnerabilidade
econômica.O padrasto da requerente trabalha emfazenda e aufere renda de um salário mínimo
mensal, sendo esta a única renda da família.
Nesse sentido, considerando que o núcleo familiar é composto por quatro pessoas, com renda
per capita inferior a 1/2 do salário mínimo mensal, entendo que a autora vive em situação de
vulnerabilidade.
Assim, analisandoos fatores sociais enfrentados pela requerente, quepossui baixo nível de
escolaridade,incapacidade para a vida independente e para o trabalho, éforçoso reconhecer
que as chances da autora ingressar no mercado de trabalho são improváveis.
Dentro desse cenário, evidenciadaa insuficiência de recursos da autora, o quadro de pobreza e
extrema necessidade que se apresenta entendo que a autora demonstrou preencher os
requisitos legais, comprovando estar em situação de vulnerabilidade, fazendojusao benefício
assistencial requerido.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, reduzidos para 10%
do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque
exagerado o percentual fixado na decisão apelada.
A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no âmbito da Justiça Federal (Lei
nº 9.289/96, art. 4º, I), mas (i) não no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul (Lei
Estadual nº 3.779, de 11/11/2009, e Súmula nº 178/STJ), (ii) nem do reembolso das custas
recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no
caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora, (iii) tampouco
do pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido
antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art.
32).
Ante o exposto, DOU PARCIALPROVIMENTO à apelação do INSS, apenas para reduzir os
honorário advocatíciose mantenho, quanto ao mais, a sentença recorrida.
É COMO VOTO.
/gabiv/marnunes
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS
PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. BENEFÍCIO NÃO CONCEDIDO. APELO PROVIDO.
1. O benefício, de caráter não contributivo, foi regulamentado pela Lei Federal nº 8.742/93, que
traz os requisitos necessários à implantação.
2. Quanto à deficiência, o artigo 20, §2º, da Lei Federal nº 8.742/93, esclarece que “considera-
se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas” – sendo que, a teor do §10 do preceito em tela, impedimento de longo prazo é aquele
que produz seus efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
3. A incapacidade exigida, por sua vez, não deve que ser encarada como aquela que impeça a
execução de todos os atos da vida diária (hipótese em que se faria necessário o auxílio
permanente de terceiros), mas sim a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do
exercício de trabalho ou ocupação remunerada.
4. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, na medida em que, a teor do art. 479 do CPC: “O
juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os
motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando
em conta o método utilizado pelo perito”.
5. Contudo, é igualmente certo afirmar que a não adoção das conclusões periciais, na matéria
técnica ou científica que não englobe a questão jurídica em debate depende da existência de
elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do
experto.
6. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente
pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não
se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a
valoração do conjunto probatório trazido a exame.
7. Ausente prova da deficiência o benefício deve ser indeferido.
8. Apelo do INSS provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PROVIMENTO À
APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DO VOTO DO JUIZ CONVOCADO MARCELO
GUERRA, COM QUEM VOTARAM O DES. FEDERAL CARLOS DELGADO E O DES.
FEDERAL LUIZ STEFANINI, VENCIDOS A RELATORA E O DES. FEDERAL PAULO
DOMINGUES QUE DAVAM PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
LAVRARÁ O ACÓRDÃO O JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
