Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001316-11.2020.4.03.6343
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA ORTIZ TAVARES COSTA ZANONI
Órgão Julgador
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
25/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 02/12/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL - PESSOA IDOSA - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
LEI N. 8742/93. REQUISITO DA IDADE COMPROVADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA.
AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. JULGAMENTO DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
567.985 E 580.963. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. RECURSO DA PARTE
AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001316-11.2020.4.03.6343
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MIRIAM VIEIRA AMARANTE
Advogado do(a) RECORRENTE: LAERCIO LEMOS LACERDA - SP254923-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001316-11.2020.4.03.6343
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MIRIAM VIEIRA AMARANTE
Advogado do(a) RECORRENTE: LAERCIO LEMOS LACERDA - SP254923-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora pleiteou a concessão de benefício assistencial ao idoso. Houve a elaboração de
laudo socioeconômico.
O juízo singular julgou improcedente o pedido formulado na inicial, por ausência de
miserabilidade.
Desta forma, recorre a parte autora pleiteando a ampla reforma da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001316-11.2020.4.03.6343
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MIRIAM VIEIRA AMARANTE
Advogado do(a) RECORRENTE: LAERCIO LEMOS LACERDA - SP254923-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício de prestação continuada de um salário mínimo foi assegurado pela Constituição
federal nos seguintes termos:
“Art.203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, conforme dispuser a lei”.
Assim, a norma constitucional estabelece como parâmetro para o exercício do direito ao
benefício assistencial a coexistência de dois pressupostos, de um lado, sob o aspecto subjetivo,
ser a pessoa idosa ou com deficiência, e de outro lado, sob o aspecto objetivo a
hipossuficiência econômica. A Lei n° 8.742, de 07.12.93, cuidou, originariamente, do Benefício
Assistencial, que veio sofrer alterações da Lei n. 12.435, de 06/07/2011, e da Lei n. 12.470, de
31/08/2011, cuja leitura deve ser feita dentro dos parâmetros da norma constitucional.
Requisito etário. A Lei n° 8.742, de 07.12.93, estabelecia na redação original do artigo 20 a
idade de 70 (setenta) anos para preenchimento do requisito etário. Contudo, a idade a ser
considerada foi reduzida para 65 (sessenta e cinco) anos de idade - artigo 33 da Lei n.
10.741/03 -, idade mantida com a nova redação do artigo 20.
A parte autora comprovou o requisito etário, pois nasceu em 18/12/1953.
Passo para a análise da hipossuficiência financeira.
Requisito dahipossuficiênciaeconômica. A lei exige para a concessão do benefício assistencial
que a renda mensal da família per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo.
Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do dispositivo legal
na ADIN nº. 1.232/DF, o que não impediu, contudo, que a exigência legal fosse mitigada
considerando as peculiaridades do caso concreto. A Corte Suprema pronunciou-se
recentemente acerca do tema, nos julgamentos dos Recursos Extraordinários nºs. 567.985 e
580.963, proferidos dentro da sistemática da repercussão geral, onde restou assentada não só
a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia do parágrafo 3° do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993
(RE n. 567.985/MS), mas também a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia
de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/2003 (RE n. 580.963/PR).
Nas decisões mencionadas, o STF esclareceu que ao longo dos últimos anos houve uma
proliferação de leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros
benefícios assistenciais (Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; Lei n. 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Informação; e a Lei n. 10.219/2001, que criou o
Bolsa Escola) e apontou a utilização do valor de meio salário mínimo como valor padrão da
renda familiar per capita para análise do preenchimento do requisito da hipossuficiência
econômica que deve ser analisado em conjunto com as peculiaridades do caso concreto.
Reconheceu, ainda, ao analisar o Art. 34 parágrafo único da Lei n. 10.741/03, que não há
justificativa plausível para a discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos,
bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de
benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.
Assim, adoto o critério de meio salário mínimo para análise do preenchimento do requisito da
hipossuficiência econômica.
Núcleo familiar. A redação atualizada da Lei n° 8.742, de 07.12.9, contempla como núcleo
familiar o requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, e na ausência de um deles, a madrasta
ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde
que vivam sob o mesmo teto - ex vi do art. 20, § 1º. De forma que não pode ser computada a
renda de familiares que constituíram nova família.
Assim, em princípio, os filhos que constituíram família, que tem dever de sustento de sua prole,
com despesas domésticas que consomem a renda, estão desobrigados do dever de sustento
imposto pelo artigo 229 da Constituição Federal. De forma que é fundamental a análise do caso
concreto à luz do princípio da razoabilidade, para considerar a situação econômica dos
ascendentes e descendentes, quando se verificar sinais de riqueza que imponha o dever de
alimentos.
De outro lado, evidenciado que a família possui parcas condições econômicas, emerge a
previsão do comando constitucional do capítulo relativo à assistência social, quando refere que
a assistência social será prestada pelo Estado ao Idoso ou deficiente que comprove não possuir
meios de prover sua subsistência ou tê-la provida por sua família - ex vi do inciso V do artigo
230 da Constituição Federal.
Pela pertinência, transcrevo os fundamentos da r. sentença recorrida:
No caso dos autos, segundo o laudo sócio econômico, em perícia realizada em 02/02/2021, a
autora Miriam Vieira Amarante, 67 anos, do lar, reside com seu cônjuge Antônio Fabriciano do
Amarante, 74 anos, aposentado.
Entrevistada, a autora informa que o casal subsiste do benefício previdenciário percebido pelo
seu marido, no valor de R$ 1.442,72 (B42/110.359.369-0, evento n. 23).
A autora possui três filhos: Willian, Elisabeth e Sandra; informa que os filhos tem suas próprias
famílias, compromissos e vida independente. Aduz que o filho William trabalha em laboratório e
a medicação que utiliza fica a preço de custo, porém, assevera ressarcir o filho conforme suas
condições socioeconômicas permitem.
No que toca à moradia, a autora reside em imóvel próprio há cerca de 28 (vinte oito) anos,
assim descrito pela Jurisperita:
‘(...) O imóvel periciado é composto por 05 cômodos de alvenaria, com espaço físico amplo,
bem ventilado, iluminação natural boa, higiene adequada. Mobiliário antigo, mas, em bom
estado de conservação. Trata-se de um sobrado, assim distribuído. 1º Piso: Sala: há dois sofás
de dois lugares, 01 rack com TV e mesa de centro. Cozinha (azulejada): 01 fogão a gás com
seis bocas, 01 geladeira, 01 forno de micro ondas, 01 armário, 01 mesa com seis cadeiras e 01
pia com gabinete. 2º Piso: Dormitório da autora: há 01 cama de casal, 01 guarda-roupa. OBS:
os demais dormitórios estão vazios. Banheiro: 01 chuveiro elétrico, 01 vaso sanitário e 01
lavatório com gabinete. Área de serviço externa: há 01 tanque de alvenaria e 01 máquina de
lavar’ A perita social conclui o laudo asseverando que a parte autora se encontra em situação
de vulnerabilidade.
Em manifestação ao laudo, o MPF opina pela improcedência da lide (arquivo 25).
No caso concreto, a parte pugna pela concessão do benefício assistencial NB 88/706.029.266-
8, indeferido pelo réu por conta da renda per capita superior a ¼ do salário mínimo.
Preliminarmente, cabe salientar que a Turma Regional de Uniformização (3ª Região) não tem
adotado como critério único a aferição da renda per capita para fins assistenciais. Além disso, a
mesma TRU tem ressaltado o dever legal de prestação de alimentos pelos familiares (art 1694
CC).
...
Saliento que o benefício assistencial não tem como objetivo a complementação da renda
familiar ou mesmo proporcionar maior conforto ao beneficiário. Destina-se ao idoso ou
deficiente em estado de penúria/miserabilidade, que comprove os requisitos legais, sob pena de
ser concedido indiscriminadamente, em prejuízo daqueles que realmente necessitam, na forma
da lei.
No mais, verifica-se dos extratos previdenciários colacionados aos autos que o filho da autora
(William) aufere renda superior a R$ 8.000,00 (CNIS, fls. 06, arq. 33), de modo que entendo
possível que preste assistência financeira à mãe, nos termos da Súmula n. 23 da TRU/SP c/c
art.229 da CF, sem prejuízo da própria aposentação do esposo, tudo na linha do parecer
ministerial.
Logo, dentro do princípio da persuasão racional, em face da renda da família, atrelada as
condições atuais da parte autora, não verifico estar corroborada a contento a hipossuficiência
econômica necessária para a concessão do benefício rogado, razão pela qual a pretensão
deduzida não merece acolhimento.
Em recurso inominado, a autora sustenta que “Analisando a sentença, verifica-se que um dos
argumentos lançados pelo Juízo de Piso para julgar improcedente o pedido, foi a possibilidade,
de que o filho maior e não componente do grupo familiar, poderia prestar amparo financeiro à
parte autora: ... Ora, Exas, em que pese tal argumento, o Juízo decidiu “IN THESE”, e fora da
realidade socioeconômica da parte autora, como exarado na sentença, o que viola toda a
legislação processual pátria, e, portanto, obriga que seja reformada tal decisão.” Aduz, ainda,
que “Doravante, considerando o valor previdenciário percebido pelo esposo da recorrente no
montante de R$ 1442,72 reais, sendo deduzidos os consumos de R$ 1.134,56 reais, o que
sobra para subsistência do núcleo familiar são míseros R$ 308,16 reais.”
Saliento que, embora os filhos sejam casados e a autora informe que não prestam auxílio
econômico, nos termos do art. 1696 do Código Civil, o direito à prestação de alimentos é
recíproco entre pais e filhos, sendo certo que a assistência social assegurada pelo art. 203 da
Constituição Federal de 1988 apenas é devida quando demonstrado que a manutenção do
idoso ou do portador de deficiência não pode ser provida por sua família, pois o dever do
Estado é subsidiário em relação ao dever familiar.
Ademais, observo que a renda familiar (R$ 1.368,66) é superior às despesas informadas (R$
1.174,42).
Registro que a mens juris é ofertar o mínimo necessário para a sobrevivência da pessoa que
vive em situação de miserabilidade e não complementar a renda familiar.
Pela descrição do laudo social, em especial as fotos anexadas, nota-se que as necessidades
básicas da autora estão sendo supridas.
De forma que, entendo que restou caracterizada uma situação de pobreza, simplicidade, mas
não de miserabilidade capaz de ensejar a concessão do benefício pleiteado.
Assim, não obstante as razões recursais apresentadas, tenho por irretocáveis os fundamentos
adotados pela sentença, mantendo-a com arrimo no art. 46 da Lei 9.099/95.
No que diz respeito ao prequestionamento de matérias que possam ensejar a interposição de
recurso especial ou extraordinário, com base nas Súmulas n. 282 e 356, do Supremo Tribunal
Federal, as razões do convencimento do Juiz sobre determinado assunto são subjetivas,
singulares e não estão condicionadas aos fundamentos formulados pelas partes. Nesse sentido
pronuncia-se a jurisprudência:
Não se configurou a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal
de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.
Não é o órgão julgador obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes
em defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as
questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução. (REsp 1766914/RJ, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2018, DJe 04/12/2018)
Ante o exposto, nego provimento ao recurso da parte autora.
Condeno a PARTE RECORRENTE VENCIDA em honorários advocatícios que fixo em 10%
(dez por cento) do valor da condenação; caso o valor da demanda ultrapasse 200 (duzentos)
salários mínimos, arbitro os honorários sucumbenciais na alíquota mínima prevista nos incisos
do parágrafo 3º do artigo 85 do CPC. Na ausência de proveito econômico, os honorários serão
devidos no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, cuja execução
deverá observar o disposto no artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil, por força do
deferimento da gratuidade nos autos.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL - PESSOA IDOSA - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
LEI N. 8742/93. REQUISITO DA IDADE COMPROVADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA.
AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. JULGAMENTO DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
567.985 E 580.963. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. RECURSO DA PARTE
AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por
unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
