Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001566-59.2020.4.03.6338
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA ORTIZ TAVARES COSTA ZANONI
Órgão Julgador
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
25/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 02/12/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL - PESSOA IDOSA - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
LEI N. 8742/93. REQUISITO DA IDADE COMPROVADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA.
AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. JULGAMENTO DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
567.985 E 580.963. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. RECURSO DA PARTE
AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001566-59.2020.4.03.6338
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: JOSEFA ERNESTINA COUTO
Advogado do(a) RECORRENTE: FLAVIA HELENA PIRES - SP263134-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001566-59.2020.4.03.6338
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: JOSEFA ERNESTINA COUTO
Advogado do(a) RECORRENTE: FLAVIA HELENA PIRES - SP263134-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora pleiteou a concessão de benefício assistencial ao idoso. Houve a elaboração de
laudo socioeconômico.
O juízo singular julgou improcedente o pedido formulado na inicial, por ausência de
miserabilidade.
Desta forma, recorre a parte autora pleiteando a ampla reforma da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001566-59.2020.4.03.6338
RELATOR:15º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: JOSEFA ERNESTINA COUTO
Advogado do(a) RECORRENTE: FLAVIA HELENA PIRES - SP263134-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O benefício de prestação continuada de um salário mínimo foi assegurado pela Constituição
federal nos seguintes termos:
“Art.203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, conforme dispuser a lei”.
Assim, a norma constitucional estabelece como parâmetro para o exercício do direito ao
benefício assistencial a coexistência de dois pressupostos, de um lado, sob o aspecto subjetivo,
ser a pessoa idosa ou com deficiência, e de outro lado, sob o aspecto objetivo a
hipossuficiência econômica. A Lei n° 8.742, de 07.12.93, cuidou, originariamente, do Benefício
Assistencial, que veio sofrer alterações da Lei n. 12.435, de 06/07/2011, e da Lei n. 12.470, de
31/08/2011, cuja leitura deve ser feita dentro dos parâmetros da norma constitucional.
Requisito etário. A Lei n° 8.742, de 07.12.93, estabelecia na redação original do artigo 20 a
idade de 70 (setenta) anos para preenchimento do requisito etário. Contudo, a idade a ser
considerada foi reduzida para 65 (sessenta e cinco) anos de idade - artigo 33 da Lei n.
10.741/03 -, idade mantida com a nova redação do artigo 20.
A parte autora comprovou o requisito etário, pois nasceu em 30/05/1952.
Passo para a análise da hipossuficiência financeira.
Requisito dahipossuficiênciaeconômica. A lei exige para a concessão do benefício assistencial
que a renda mensal da família per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo.
Inicialmente, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do dispositivo legal
na ADIN nº. 1.232/DF, o que não impediu, contudo, que a exigência legal fosse mitigada
considerando as peculiaridades do caso concreto. A Corte Suprema pronunciou-se
recentemente acerca do tema, nos julgamentos dos Recursos Extraordinários nºs. 567.985 e
580.963, proferidos dentro da sistemática da repercussão geral, onde restou assentada não só
a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia do parágrafo 3° do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993
(RE n. 567.985/MS), mas também a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia
de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/2003 (RE n. 580.963/PR).
Nas decisões mencionadas, o STF esclareceu que ao longo dos últimos anos houve uma
proliferação de leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros
benefícios assistenciais (Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; Lei n. 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Informação; e a Lei n. 10.219/2001, que criou o
Bolsa Escola) e apontou a utilização do valor de meio salário mínimo como valor padrão da
renda familiar per capita para análise do preenchimento do requisito da hipossuficiência
econômica que deve ser analisado em conjunto com as peculiaridades do caso concreto.
Reconheceu, ainda, ao analisar o Art. 34 parágrafo único da Lei n. 10.741/03, que não há
justificativa plausível para a discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos,
bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de
benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.
Assim, adoto o critério de meio salário mínimo para análise do preenchimento do requisito da
hipossuficiência econômica.
Núcleo familiar. A redação atualizada da Lei n° 8.742, de 07.12.9, contempla como núcleo
familiar o requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, e na ausência de um deles, a madrasta
ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde
que vivam sob o mesmo teto - ex vi do art. 20, § 1º. De forma que não pode ser computada a
renda de familiares que constituíram nova família.
Assim, em princípio, os filhos que constituíram família, que tem dever de sustento de sua prole,
com despesas domésticas que consomem a renda, estão desobrigados do dever de sustento
imposto pelo artigo 229 da Constituição Federal. De forma que é fundamental a análise do caso
concreto à luz do princípio da razoabilidade, para considerar a situação econômica dos
ascendentes e descendentes, quando se verificar sinais de riqueza que imponha o dever de
alimentos.
De outro lado, evidenciado que a família possui parcas condições econômicas, emerge a
previsão do comando constitucional do capítulo relativo à assistência social, quando refere que
a assistência social será prestada pelo Estado ao Idoso ou deficiente que comprove não possuir
meios de prover sua subsistência ou tê-la provida por sua família - ex vi do inciso V do artigo
230 da Constituição Federal.
Pela pertinência, transcrevo os fundamentos da r. sentença recorrida:
Quanto ao requisito da miserabilidade:
No caso dos autos, conforme laudo pericial juntado aos autos e considerando o disposto no §1º
do artigo 20 da lei 8742/93 (Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo
requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o
padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que
vivam sob o mesmo teto), o grupo familiar é composto de 01 pessoa (a autora).
A renda familiar per capita, já considerado o disposto no § único do art. 34 do Estatuto do Idoso,
computa-se em R$ 0,0.
Afirma a parte autora encontrar-se separada de fato do ex-esposo, sendo que este reside em
um comodo contíguo à residência. Ainda, observo que o Sr. Antonio recebe um benefício
previdenciário no valor de um salário mínimo.
Esta conclusão é condizente com a condição de vida do grupo familiar, conforme informações
carreadas no laudo sócioeconômico apresentado, e é corroborada por consultas ao sistema
CNIS, juntadas aos autos.
Quanto ao requisito da impossibilidade do apoio familiar:
Todavia, a parte autora não preenche o requisito constitucional previsto no art. 3o., relativo a
integrar família incapaz de prover seu sustento.
Conforme entendimento adiantado na fundamentação, após apurada a renda per capita, é
necessária também a aferição da capacidade financeira da família da parte autora (aqui
entendida de forma ampla) em prover o seu sustento, visto que a assistência estatal é
subsidiária à assistência que deve ser provida pelos entes familiares (parte final do art.203, V,
da CF88). Ou seja, apenas na impossibilidade da família sustentar seus idosos ou deficientes é
que deve a sociedade arcar com este custo, na esteira da principiologia constitucional (Princípio
da Solidariedade, art. 3º, I, da CF88), transpassando o direito de família (Princípio da
Solidariedade Familiar, art. 1.694 do Código Civil).
Conforme consultas ao sistema CNIS e ao laudo social, juntados aos autos, resta demonstrado
que ostenta capacidade financeira para adimpli-la, visto que os filhos da autora, Devid e
Daniele, receberam juntos em fevereiro de 2021 o valor de R$ 14.333,25, de modo que
destacado percentual mínimo desse valor, facilmente seria aferida soma aproximada ao valor
do benefício assistencial pleiteado pela autora.
Comprovado que a autora integra família que apresenta capacidade financeira de suprir sua
subsistência, não resta cumprido o requisito constitucional relativo a integrar família que não
possui meios de prover a subsistência de seu ente idoso ou deficiente.
Logo, não preenchidos os requisitos legais, a parte autora NÃO tem direito ao benefício de
prestação continuada.
Em recurso inominado, a autora sustenta que “Os filhos da requerente são casados e possuem,
cada um deles, sua própria família.
Assim como se observa das informações presentes no Laudo Socioeconômico, a requente não
possui qualquer tipo de renda que lhe garanta acesso mínimo ao atendimento de suas
necessidades humanas fundamentais, estando reconhecidamente em situação de
Vulnerabilidade e Risco Social, dependendo da ajuda e doações de terceiros para sobreviver.”
Saliento que, embora os filhos sejam casados e tenham formado família, possuem possibilidade
de auxiliá-la materialmente, pois, consoante consulta CNIS, o filho é funcionário do Munícipio de
Diadema e percebe salário de R$10.500,00 e a filha de 3.800,00.
Nos termos do art. 1696 do Código Civil, o direito à prestação de alimentos é recíproco entre
pais e filhos, sendo certo que a assistência social assegurada pelo art. 203 da Constituição
Federal de 1988 apenas é devida quando demonstrado que a manutenção do idoso ou do
portador de deficiência não pode ser provida por sua família, pois o dever do Estado é
subsidiário em relação ao dever familiar.
Em que pese a renda per capita seja inferior a meio salário mínimo, pela descrição do laudo
social, em especial as fotos anexadas e o auxílio financeiro dos filhos que residirem no mesmo
terreno da autora, nota-se que as necessidades básicas da autora estão sendo supridas.
De forma que, entendo que restou caracterizada uma situação de pobreza, simplicidade, mas
não de miserabilidade capaz de ensejar a concessão do benefício pleiteado.
Assim, não obstante as razões recursais apresentadas, tenho por irretocáveis os fundamentos
adotados pela sentença, mantendo-a com arrimo no art. 46 da Lei 9.099/95.
No que diz respeito ao prequestionamento de matérias que possam ensejar a interposição de
recurso especial ou extraordinário, com base nas Súmulas n. 282 e 356, do Supremo Tribunal
Federal, as razões do convencimento do Juiz sobre determinado assunto são subjetivas,
singulares e não estão condicionadas aos fundamentos formulados pelas partes. Nesse sentido
pronuncia-se a jurisprudência:
Não se configurou a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal
de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.
Não é o órgão julgador obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes
em defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as
questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução. (REsp 1766914/RJ, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2018, DJe 04/12/2018)
Ante o exposto, nego provimento ao recurso da parte autora.
Condeno a PARTE RECORRENTE VENCIDA em honorários advocatícios que fixo em 10%
(dez por cento) do valor da condenação; caso o valor da demanda ultrapasse 200 (duzentos)
salários mínimos, arbitro os honorários sucumbenciais na alíquota mínima prevista nos incisos
do parágrafo 3º do artigo 85 do CPC. Na ausência de proveito econômico, os honorários serão
devidos no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, cuja execução
deverá observar o disposto no artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil, por força do
deferimento da gratuidade nos autos.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL - PESSOA IDOSA - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
LEI N. 8742/93. REQUISITO DA IDADE COMPROVADO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA.
AFERIÇÃO NO CASO CONCRETO. JULGAMENTO DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS
567.985 E 580.963. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. RECURSO DA PARTE
AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por
unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
