Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004957-09.2020.4.03.6310
Relator(a)
Juiz Federal MARCELLE RAGAZONI CARVALHO
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/02/2022
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. LAUDO SÓCIO ECONÔMICO
DESTACA A AUSENTE DE COMPROVAÇÃO DA MISERABILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO
DE AMBOS OS REQUISITOS LEGAIS.
1. Trata-se de recurso interposto pela parte autora, em face da sentença que julgou improcedente
o pedido, em razão da ausência da miserabilidade da parte autora.
2. No caso em tela, o grupo familiar composto pelo autor e seus genitores idosos, a renda per
capita é superior a ½ salário-mínimo.
3. Incidência do art. 46 da Lei 9099 de 95.
4. Recurso da parte autora que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004957-09.2020.4.03.6310
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:42º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: JEFERSON VAZ DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: CLODOALDO ALVES DE AMORIM - SP271710-E
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004957-09.2020.4.03.6310
RELATOR:42º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: JEFERSON VAZ DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: CLODOALDO ALVES DE AMORIM - SP271710-E
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte autora, ora Recorrente, contra a r. sentença que julgou
improcedente seu pedido restabelecimento de benefício assistencial.
A parte autora interpôs o presente recurso repisando os argumentos iniciais. Afirma fazer jus ao
recebimento do benefício, pois, conforme Laudo Socioeconômico produzido em juízo, a renda
familiar é insuficiente para atender as necessidades do Autor, havendo vulnerabilidade e risco
social ao mesmo. Além de ser totalmente dependente de terceiros para todas as atividades.
É o breve relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004957-09.2020.4.03.6310
RELATOR:42º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: JEFERSON VAZ DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: CLODOALDO ALVES DE AMORIM - SP271710-E
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O art. 203, inciso V, da Constituição Federal assegura o benefício de prestação continuada de
um salário mínimo “à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir
meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a
lei”.
Os requisitos necessários para obtenção do benefício são, portanto, os seguintes: (i) a situação
subjetiva de pessoa idosa ou portadora de deficiência; e (ii) a situação objetiva de
miserabilidade.
O requisito de portador de deficiência/impedimento de longo prazo é incontroverso.
Do critério para aferição da miserabilidade.
A lei 8.742/93 prevê que o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo
mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua
família (art. 20).
Para os efeitos da norma, “a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os
pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e
enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto” (§1º).
De acordo com o §3º, observados os demais requisitos, “terão direito ao benefício financeiro de
que trata ocaputdeste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar
mensalper capitaigual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
Recentemente, a Lei 14.176/2021 acrescentou o § 11-A ao art. 20 e o art. 20-B à Lei 8.742, que
passou a dispor:
§ 11-A - O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal
familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o
disposto no art. 20-B desta Lei.
(...)
Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da
situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os
seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita
de que trata o § 11-A do referido artigo:
I - o grau da deficiência;
II - a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e
III - o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei
exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos
especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados
gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que
comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida.
§ 1º A ampliação de que trata o caput deste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais,
definidas em regulamento.
§ 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III do caput
deste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III do caput deste artigo.
§ 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I do caput deste artigo será aferido por meio de
instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei
nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do
art. 40-B desta Lei.
§ 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos de que
trata o inciso III do caput deste artigo será definido em ato conjunto do Ministério da Cidadania,
da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir
de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades,
facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, conforme critérios definidos em
regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios."
E enfim o art. 40-B:
Art. 40-B. Enquanto não estiver regulamentado o instrumento de avaliação de que tratam os§§
1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015(Estatuto da Pessoa com Deficiência),
a concessão do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência ficará sujeita à
avaliação do grau da deficiência e do impedimento de que trata o § 2º do art. 20 desta Lei,
composta por avaliação médica e avaliação social realizadas, respectivamente, pela Perícia
Médica Federal e pelo serviço social do INSS, com a utilização de instrumentos desenvolvidos
especificamente para esse fim.
Apesar de ainda não estar regulamentada, a nova lei vai ao encontro do que já vinha decidindo
a jurisprudência, sendo que o STF já havia decidido há muito pela constitucionalidade da regra
do artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 (RE 567.985-MT, j. em 18.04.2013), nos seguintes termos:
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93. Ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao intérprete
do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à inconstitucionalidade,
presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a miserabilidade, assim
frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade, erradicação da pobreza,
assistência aos desemparados. Em tais casos, pode o Juízo superar a norma legal sem
declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames constitucionais.”
Na esteira do que restou decidido, a comprovação da insuficiência de recursos familiares não
se limita à demonstração da renda per capita mensal inferior a ¼ do salário mínimo, até porque
ao longo do tempo diversas outras leis estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão
de outros benefícios assistenciais (Lei n. 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; Lei n.
10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Informação; e a Lei n.
10.219/2001, que criou o Bolsa Escola), apontando no sentido da aplicação do valor de meio
salário mínimo como padrão da renda familiar per capita para análise do preenchimento do
requisito da hipossuficiência econômica, a ser analisada em conjunto com as demais
circunstâncias do caso concreto.
No mesmo sentido, a Súmula nº 21 (TRU):
"Na concessão do benefício assistencial, deverá ser observado como critério objetivo a renda
per capita de ½ salário mínimo gerando presunção relativa de miserabilidade, a qual poderás
ser infirmada por critérios subjetivos em caso de renda superior ou inferior a ½ salário mínimo."
Vale dizer, presume-se a miserabilidade no caso de renda per capita familiar inferior a ¼ do
salário mínimo; em sendo a renda igual ou inferior a ½ mínimo, essa presunção deixa de ser
absoluta, podendo ser afastada caso as demais circunstâncias do caso concreto assim façam
concluir.
A sentença julgou improcedente o pedido, nos seguintes termos:
“O Laudo Sócio-Econômico elaborado pela perícia deste Juizado e pesquisa realizada no
Sistema DATAPREV apontaram que o pai da parte autora, Sr.
BENEDICTO PIRES DE OLIVIERA, recebe benefício previdenciário (B41), percebendo renda
mensal no valor de R$ 1.769,45.
A família da parte autora é composta por ele e seus pais.
[...]
O benefício assistencial em questão tem como requisito constitucional que a requerente
“comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família” (grifo nosso). Assim, a verificação da dependência deve ser feita em sentido inverso do
usual, ou seja, os componentes do grupo familiar não devem constar como dependentes da
parte autora, mas sim se ela é dependente daqueles com quem vive. Este é o sentido de ter o
sustento provido por sua família.
No benefício assistencial a parte autora ocupa o polo passivo da relação de dependência, vez
que fundamenta seu pedido na impossibilidade de sustentar-se ou ser sustentada, e, portanto,
necessita do socorro do Estado.
Portanto, não restou comprovado pela parte autora o cumprimento da exigência legal referente
à miserabilidade com consequente renda familiar per capta inferior a 1/4 do salário-mínimo,
razão que impede a concessão do benefício assistencial de amparo social.”
É importante salientar que a jurisprudência tem entendido que o art. 34, parágrafo único, da Lei
10.741/2003 (Estatuto do Idoso) pode ser aplicado, por analogia, para se excluir, da renda
familiar per capita, o benefício previdenciário ou assistencial de valor mínimo recebido por
pessoa idosa, para fins de concessão de benefício de prestação continuada a outro membro da
família.
Assim, outro benefício assistencial ou previdenciário, de até um salário-mínimo, pago a outro
membro familiar, não deverá ser considerado para fins de renda per capita; devendo-se excluir
tanto a renda quanto a pessoa do cômputo para aferição do requisito. Vejamos:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RENDA MENSAL PER CAPITA.
EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PERCEBIDO POR MAIOR DE 65 ANOS. 1.
Conforme interpretação feita do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003, o benefício
previdenciário no valor de um salário mínimo recebido por maior de 65 (sessenta e cinco) anos
deve ser afastado do cálculo da renda mensal per capita para a concessão do benefício
assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal. Precedentes. 2. Recurso
especial não provido. (RESP 201200672160, DIVA MALERBI ( DESEMBARGADORA
CONVOCADA TRF 3ª REGIÃO), STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:04/12/2012 ..DTPB:.)
No caso em análise, apesar de idoso, o genitor do autor aufere benefício previdenciário de R$
1. 769,55, portanto, não pode ser excluído. Assim, como constou do laudo social, a renda per
capita é de R$ 589,85, superior a 1/2 salário-mínimo.
Não se ignora as dificuldades pelas quais deve passar o autor e sua família, porém, do registro
fotográfico percebe-se que o recorrente reside em imóvel simples, mas em bom estado de
conservação, guarnecido de móveis e eletrodomésticos também simples, mas em bom estado
de conservação. O genitor do autor possui um veículo Clio – Renault - Ano: 2005. Deste modo
que não restou demonstrada ter a parte autora alguma privação para sua sobrevivência digna,
nem está preenchido o requisito da miserabilidade, necessário à concessão do benefício
excepcional.
Neste sentido, vale ressaltar que o benefício assistencial não se presta como fonte
complementar de renda, destinada a proporcionar maior conforto ao requerente, mas sim
àqueles que realmente dele necessitam para sua sobrevivência.
Ante o exposto, com fulcro no art. 46, da Lei n.º 9.099/95, combinado com o art. 1º, da Lei n.
10.259/01, nego provimento ao recurso da parte autora e mantenho a sentença recorrida por
seus próprios fundamentos.
Fixo os honorários advocatícios em 10% do valor da causa, devidos pela parte recorrente
vencida. Na hipótese, enquanto a parte for beneficiária de assistência judiciária gratuita, o
pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do artigo 98 do Código de
Processo Civil.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. LAUDO SÓCIO ECONÔMICO
DESTACA A AUSENTE DE COMPROVAÇÃO DA MISERABILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO
DE AMBOS OS REQUISITOS LEGAIS.
1. Trata-se de recurso interposto pela parte autora, em face da sentença que julgou
improcedente o pedido, em razão da ausência da miserabilidade da parte autora.
2. No caso em tela, o grupo familiar composto pelo autor e seus genitores idosos, a renda per
capita é superior a ½ salário-mínimo.
3. Incidência do art. 46 da Lei 9099 de 95.
4. Recurso da parte autora que se nega provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a 14ª Turma, por
unanimidade, negou provimento ao recurso do autor, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
