D.E. Publicado em 18/01/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0027466-71.2010.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: Cuida-se de pedido de concessão de benefício assistencial.
A sentença, proferida em 28.01.2010, julgou procedente o pedido, e condenou o INSS a conceder ao autor o benefício assistencial, previsto no art. 20, §§1º, 2º e 3º da Lei nº 8.742/93, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo (23.04.2003), corrigidos monetariamente e com juros de mora. Fixou honorários advocatícios em 15% sobre o valor das prestações vencidas, até a sentença. Concedeu a tutela antecipada.
Inconformada apela a Autarquia, sustentando, em síntese, o não preenchimento dos requisitos legais necessários para concessão do benefício. Requer alteração dos juros de mora e correção monetária.
Recebido e processado o recurso, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
Acolhendo o parecer do Ministério Público Federal o julgamento foi convertido em diligência para instrução do feito, com a elaboração de novo laudo social e regularização da curatela do autor.
Cumprida a determinação, o Ministério Público Federal opina pelo desprovimento da apelação do INSS.
É o relatório.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0027466-71.2010.4.03.9999/MS
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: A questão em debate consiste em saber se a parte autora faz jus ao benefício que pretende receber, à luz do inciso V do art. 203 da Constituição Federal e art. 20 da Lei nº 8.742 de 07/12/1993. Para tanto, é necessário o preenchimento de dois requisitos estabelecidos pelo artigo 20, da Lei Orgânica da Assistência Social: I) ser pessoa portadora de deficiência que incapacite para o trabalho ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, conforme o artigo 34, do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) e II) não possuir meios de subsistência próprios ou de familiares.
Importante ressaltar que a Lei 12.435/11 alterou o conceito de família, dando nova redação ao art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, não mais remetendo ao art. 16 da Lei nº 8.213/91 para identificação dos componentes do grupo familiar.
Destaco acerca do parâmetro da renda, que por decisão do Plenário do C. STF, em 18.04.2013, por ocasião do julgamento do RE 567985 RG/MT, submetido à Repercussão Geral, de relatoria do e. Ministro Marco Aurélio e relator para o acórdão o e. Min. Gilmar Mendes, foi declarada a inconstitucionalidade por omissão parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, que considera hipossuficiente o idoso ou portador de deficiência cuja renda mensal per capita não atinge ¼ do salário mínimo, nos seguintes termos:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
Acrescente-se, ainda que o artigo 34, da Lei nº 10.741/2003, prevê que é assegurado o pagamento de benefício assistencial ao idoso, a partir de 65 anos, desde que não possua condições de prover o próprio sustento ou tê-lo previsto por sua família. O parágrafo único do dispositivo citado estabelece que o benefício já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins da apuração da renda per capta a que se refere a LOAS.
Inicialmente, o E. Superior Tribunal de Justiça interpretou de forma restritiva o normativo, entendo que deveria ser excluído do cálculo da renda per capta tão somente o benefício assistencial recebido por outro membro do núcleo familiar.
Posteriormente, considerou que também o benefício previdenciário de valor mínimo recebido por maior de 65 anos não deveria ser computado no cálculo da renda familiar per capta.
Recentemente, o C. Superior Tribunal de Justiça assentou no julgamento do RESP n.º 1.355.052/SP que o comando normativo previsto no art. 34, parágrafo único, da Lei n.º 10.741/03 (Estatuto do Idoso) deve ser aplicado, por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por deficiente, em condições de vulnerabilidade social, a fim de que o benefício previdenciário, no valor de um salário mínimo, recebido por idoso que integra o núcleo familiar, não seja computado no cálculo da renda per capta.
Confira-se:
Destaca-se que o E. Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 580.963/MT, julgado sob o rito da repercussão geral, negou provimento a recurso do INSS e declarou incidenter tantum, a inconstitucionalidade por omissão parcial, sem pronuncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único do Estatuto do Idoso.
A Suprema Corte assentou no referido julgado o entendimento de que não há justificativa para a discriminação dos deficientes em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários do amparo social ou de benefício previdenciário no valor mínimo.
Proposta a demanda em 13.02.2006, o autor, nascido em 22.02.1977, instrui a inicial com documentos, dos quais destaco termo de compromisso de curadora provisória concedida à tia do autor Maria Estevão Mendes, expedido nos autos da ação de interdição.
A Autarquia juntou consulta ao sistema Dataprev constando a concessão de benefício de amparo social ao autor no período de 03.09.1996 a 01.01.2003; o recebimento de pensão por morte pela mãe do autor, no valor de R$848,04, desde 17.07.2011; o recebimento de aposentadoria por idade rural, por Eugenio Mendes Romeiro, avô do autor, no valor de R$370,37, desde 22.03.1993; existência de vínculos empregatícios em nome de Ronaldo Cabreira Gonçalves, companheiro da tia do autor, de forma descontínua, de 01.04.1989 a 31.03.2009 e de 01.12.2009 (sem saída), sendo a última remuneração em 06.2015, no valor de R$855,00.
O primeiro estudo social, realizado em 18.02.2009, informa que o requerente vive com o avô, de 80 anos em imóvel próprio. A casa é de alvenaria rebocada, coberta com telhas Eternit, sem forração, pé direito baixo, no contrapiso, com demão de cera, portas externas de madeira, vitrôs de ferro, padrão popular, com aproximadamente 90 metros quadrados, composta de três quartos, sem portas, uma sala, copa, cozinha. A renda é proveniente do benefício previdenciário que o avô recebe no valor de um salário mínimo.
Acolhido o parecer do Ministério Público Federal, veio novo estudo social, realizado em 05.03.2015, complementado em 24.07.2015, informando que o requerente, com 38 anos de idade, reside com a tia e curadora Maria Estevão Mendes, de 50 anos, que convive maritalmente com Ronaldo Cabreira Gonçalves, de 47, a filha do casal Renata Mendes Gonçalves, de 26 e a filha dela Eduarda Beatrice Mendes, de 06 anos. A residência é de propriedade da tia do autor, de alvenaria, apenas no reboco, coberta com telhas de Eternit, sem forro, portas e janelas de esquadrias metálicas, sem portas, divisórias internas, piso de cerâmica, contendo dois quartos, sala, cozinha, copa e banheiro sem chuveiro elétrico. Quintal sem calçamento, murado, com portão de grade na frente. Os móveis são poucos e simples, em médio estado de uso e conservação. A renda familiar é de um salário mínimo do trabalho de Ronaldo, companheiro da tia. As despesas declaradas são: alimentação R$400,00, água R$51,00, energia elétrica R$46,00, gás R$50,00. A tia do autor recebe ajuda com alimentos, frutas da igreja onde frequenta, e de pessoas conhecidas. A mãe do autor, Cecília, com 60 anos, mora sozinha em imóvel próprio, no mesmo bairro. A casa é de alvenaria, muito antiga, coberta com telhas de barro, sem forro, janelas e portas de esquadrias metálicas, piso de cimento queimado, encerado com vermelhão, apresentando rachaduras, composta de sala, três quartos, cozinha e banheiro, sem chuveiro elétrico. Os móveis são poucos, simples e muito antigos. Segundo a mãe do autor, o pai nunca pagou pensão alimentícia para os filhos. Recebe pensão por morte desde o falecimento do marido, no valor de um salário mínimo.
Foi realizada perícia médica, em 09.07.2007, atestando que o autor apresenta sequela de fratura dos ossos da perna complicada por pseudoartrose, ou seja, falta de consolidação óssea e deficiência mental. Conclui pela incapacidade laboral total e permanente para o trabalho.
Neste caso, além da incapacidade, a hipossuficiência está comprovada, eis que o autor não possui renda, e o auxílio recebido pela família, é insuficiente para cobrir as despesas, restando demonstrado que sobrevive com dificuldades.
A sentença deve ser mantida, para que seja concedido o benefício ao requerente, tendo comprovado a incapacidade/deficiência e a situação de miserabilidade, à luz das decisões referidas, em conjunto com os demais dispositivos da Constituição Federal de 1988, uma vez que não tem condições de manter seu próprio sustento nem de tê-lo provido por sua família.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo, momento em que a Autarquia tomou ciência da pretensão da parte autora, podendo-se concluir, pelos elementos constantes dos autos, que naquele momento já estavam presentes os requisitos necessários à concessão do benefício.
Neste caso, observo que deve ser ressaltada a exigência de revisão a cada dois anos, a fim de avaliar as condições que permitem a continuidade do benefício, em face da expressa previsão legal (art. 21, da Lei nº 8.742/93).
No que tange aos índices de correção monetária, importante ressaltar que em vista da necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E. Corte de Justiça, a fim de orientar e simplificar a pesquisa dos procedimentos administrativos e processuais, que regulam o funcionamento da Justiça Federal na Terceira Região, foi editada a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região - Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005, que impôs obediência aos critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal.
Cumpre consignar que não se desconhece o julgamento do Plenário do C. Supremo Tribunal Federal que, em sessão de 25/3/15, apreciou as questões afetas à modulação dos efeitos das declarações de inconstitucionalidade referentes às ADIs nºs. 4.357 e 4.425, resolvendo que tratam apenas da correção e juros na fase do precatório.
Por outro lado, no julgamento do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux, foi reconhecida a existência de nova repercussão geral sobre correção monetária e juros a serem aplicados na fase de conhecimento.
Entendeu o E. Relator que essa questão não foi objeto das ADIs nºs. 4.357 e 4.425, que, como assinalado, tratavam apenas dos juros e correção monetária na fase do precatório.
Assim, como a matéria ainda não se encontra pacificada, a correção monetária e os juros de mora incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado, em obediência ao Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005.
Acerca da matéria:
Esclareça-se que, por ocasião da liquidação, a Autarquia deverá proceder à compensação dos valores recebidos administrativamente ou em função da tutela antecipada, em razão do impedimento de cumulação.
Por fim, cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos do art. 300 c.c. 497, do CPC, é possível a antecipação da tutela.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para estabelecer os critérios de incidência de correção monetária e juros de mora, conforme fundamentado.
Benefício assistencial, no valor de um salário mínimo, com DIB em 23.04.2003 (data do primeiro requerimento administrativo). Mantenho a tutela antecipada.
É o voto.
TÂNIA MARANGONI
Desembargadora Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | TANIA REGINA MARANGONI:10072 |
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Data e Hora: | 13/12/2016 14:53:16 |