Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5001311-96.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TANIA REGINA MARANGONI
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
17/11/2017
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 19/12/2017
Ementa
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS NECESSÁRIOS PARA A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
HONORÁRIOS PERICIAIS. ASTREINTES. CUSTAS.
- O benefício assistencial está previsto no art. 203 da Constituição Federal, c.c. o art. 20 da Lei nº
8.742/93 e é devido à pessoa que preencher os requisitos legais necessários, quais sejam: 1) ser
pessoa portadora de deficiência que a incapacite para o trabalho, ou idoso com 65 (sessenta e
cinco) anos ou mais, conforme o artigo 34, do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.471/2003) e 2) não
possuir meios de subsistência próprios ou de seus familiares, cuja renda mensal per capita deve
ser inferior a ¼ do salário mínimo.
- A autora, nascida em 10.09.1975, instrui a inicial com documentos.
- Veio o estudo social, realizado em 26.09.2014, complementado em 17.05.2016, informando que
a requerente, com 40 anos de idade, ensino fundamental incompleto, reside, atualmente, sozinha,
em imóvel cedido pela família, composto por quarto, cozinha e banheiro. Não possui telefone,
nem móveis e eletrodomésticos. A requerente informou que no decorrer de sua vida produtiva
laborava na prestação de serviços domésticos e trabalho em área rural. Relata que em sua
convivência com o ex-companheiro encontrava-se na condição de pedinte, por imposição dele,
uma vez que não possuíam fonte de renda em razão do desemprego. A autora continua
desempregada, não aufere renda, recebe, apenas, auxílio assistencial do Estado no valor de
R$170,00.
- Foi realizada perícia médica, em 03.10.2015, atestando que a autora é portadora do vírus HIV
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
com quadro de síndrome da imunodeficiência adquirida controlada com medicação. Conclui pela
ausência de incapacidade laborativa.
- Embora o laudo pericial produzido em juízo conclua pela ausência de incapacidade laborativa,
há que ser considerada a baixa escolaridade e a ausência de formação profissional da autora,
que, associados aos problemas de saúde, dificultam sua inserção no mercado de trabalho, de
modo que deve ser reconhecida sua incapacidade total e permanente para o labor, amoldando-se
ao conceito de pessoa deficiente, nos termos do artigo 20, § 2º, da Lei n.º 8.742/93, com redação
dada pela Lei n.º 12.435/2011.
- Nos termos do art. 479 c.c art. 371, ambos do CPC, o juiz apreciará livremente a prova,
independente de que sujeito a houver produzido e poderá considerar ou deixar de considerar as
conclusões do laudo pericial, levando em conta o método utilizado pelo perito. Ademais, o
magistrado poderá formar sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos.
- Nos casos de portadores do vírus HIV, ainda que a doença esteja assintomática, o exercício da
atividade laborativa torna-se difícil, dado que aliado ao risco de agravamento da doença, ao
preconceito (especialmente em cidades menores), a pessoa infectada apresenta transtornos
depressivos e ansiosos que dificultam sua interação com outras pessoas.
- Aliado a esses fatores deve ser considerado ainda que os coquetéis disponíveis na rede pública
de saúde para os portadores do vírus podem causar fadiga, náusea e outros efeitos colaterais
que tornam o exercício da atividade laborativa, senão impossível, extremamente penosa para o
trabalhador.
- Além da incapacidade/deficiência, a hipossuficiência está comprovada, eis que, a autora não
possui renda e os valores recebidos são insuficientes para cobrir as despesas, restando
demonstrado que sobrevive com dificuldades.
- A sentença deve ser mantida, para que seja concedido o benefício à requerente, tendo
comprovado a incapacidade/deficiência e a situação de miserabilidade, à luz das decisões
referidas, em conjunto com os demais dispositivos da Constituição Federal de 1988, uma vez que
não tem condições de manter seu próprio sustento nem de tê-lo provido por sua família.
- O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação, momento em que a Autarquia
tomou ciência da pretensão da parte autora.
- Deve ser ressaltada a exigência de revisão a cada dois anos, a fim de avaliar as condições que
permitem a continuidade do benefício, em face da expressa previsão legal (art. 21, da Lei nº
8.742/93).
- A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
- A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a data da
sentença.
- No tocante às custas, observo que a Lei Federal n.º 9.289/96, em seu art. 1º, §1º, determina que
a cobrança é regida pela legislação estadual respectiva nas ações ajuizadas perante a justiça
estadual, quando no exercício de jurisdição federal.
- A Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009, que trata do Regimento de Custas Judiciais do Estado
de Mato Grosso do Sul, em seu art. 24, isenta a União, Estados e Municípios e respectivas
autarquias e fundações do recolhimento de taxas judiciárias. Contudo, consta do § 1º que tal
isenção não se aplica ao INSS, e do § 2º que, em relação à Autarquia Previdenciária, as custas
processuais serão pagas apenas ao final, pelo vencido.
- O Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 232, de 13/07/2016, estabelecendo os
valores de honorários pagos ao perito, no âmbito da Justiça de primeiro e segundo graus, quando
se tratarem de beneficiários da gratuidade da justiça, fixando o valor de R$ 370,00 para as
perícias médicas, consoante se verifica na tabela anexa ao referido ato normativo.
- A multa diária é o meio coercitivo criado para o cumprimento de obrigação e encontra amparo
no § 1º do artigo 536 do Código de Processo Civil/2015, que conferiu ao Magistrado tal faculdade,
como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida.
- Por ocasião da liquidação, a Autarquia deverá proceder à compensação dos valores recebidos
administrativamente ou em função da tutela antecipada, em razão do impedimento de cumulação.
- Cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos do art. 300 c.c.
497, do CPC, é possível a antecipação da tutela.
- Apelação do INSS provida em parte. Mantida a tutela antecipada.
Acórdao
APELAÇÃO (198) Nº 5001311-96.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. TÂNIA MARANGONI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: ROSA RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: WILSON FERNANDES SENA JUNIOR - MS1299000A
APELAÇÃO (198) Nº 5001311-96.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. TÂNIA MARANGONI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELANTE:
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: ROSA RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: WILSON FERNANDES SENA JUNIOR - MS12990
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI: Cuida-se de pedido de
concessão de benefício assistencial.
A sentença, proferida em 21.06.2016, julgou procedente o pedido, e condenou o INSS a conceder
à autora o benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da CF, no valor de um salário mínimo,
desde a citação, acrescidos de juros de mora e correção monetária. Fixou honorários
advocatícios em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a sentença. Condenou o INSS
ao pagamento das custas e honorários periciais fixados em R$400,00. Concedeu a tutela
antecipada e fixou multa diária de R$250,00 por atraso na implantação do benefício.
Inconformada apela a Autarquia Federal sustentando, em síntese, o não preenchimento dos
requisitos legais necessários para a concessão do benefício. Subsidiariamente, requer a
alteração do termo inicial, redução dos honorários advocatícios e periciais, isenção de custas.
Pugna pela suspensão da tutela antecipada e revogação da multa diária (astreintes).
Recebido e processado o recurso, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
lguarita
APELAÇÃO (198) Nº 5001311-96.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. TÂNIA MARANGONI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, PROCURADORIA-
REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELANTE:
Advogado do(a) APELANTE:
APELADO: ROSA RIBEIRO
Advogado do(a) APELADO: WILSON FERNANDES SENA JUNIOR - MS12990
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL TÂNIA MARANGONI:
A questão em debate consiste em saber se a parte autora faz jus ao benefício que pretende
receber, à luz do inciso V do art. 203 da Constituição Federal e art. 20 da Lei nº 8.742 de
07/12/1993. Para tanto, é necessário o preenchimento de dois requisitos estabelecidos pelo artigo
20, da Lei Orgânica da Assistência Social: I) ser pessoa portadora de deficiência que incapacite
para o trabalho ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, conforme o artigo 34, do
Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) e II) não possuir meios de subsistência próprios ou de
familiares.
Importante ressaltar que a Lei 12.435/11 alterou o conceito de família, dando nova redação ao art.
20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, não mais remetendo ao art. 16 da Lei nº 8.213/91 para identificação
dos componentes do grupo familiar.
Destaco acerca do parâmetro da renda, que por decisão do Plenário do C. STF, em 18.04.2013,
por ocasião do julgamento do RE 567985 RG/MT, submetido à Repercussão Geral, de relatoria
do e. Ministro Marco Aurélio e relator para o acórdão o e. Min. Gilmar Mendes, foi declarada a
inconstitucionalidade por omissão parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº
8.742/93, que considera hipossuficiente o idoso ou portador de deficiência cuja renda mensal per
capita não atinge ¼ do salário mínimo, nos seguintes termos:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na
ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais
contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos
critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não
pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita
estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se
contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas
leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios
que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O
Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do
processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas,
econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade,
do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
A autora, nascida em 10.09.1975, instrui a inicial com documentos.
Veio o estudo social, realizado em 26.09.2014, complementado em 17.05.2016, informando que a
requerente, com 40 anos de idade, ensino fundamental incompleto, reside, atualmente, sozinha,
em imóvel cedido pela família, composto por quarto, cozinha e banheiro. Não possui telefone,
nem móveis e eletrodomésticos. A requerente informou que no decorrer de sua vida produtiva
laborava na prestação de serviços domésticos e trabalho em área rural. Relata que em sua
convivência com o ex-companheiro encontrava-se na condição de pedinte, por imposição dele,
uma vez que não possuíam fonte de renda em razão do desemprego. A autora continua
desempregada, não aufere renda, recebe, apenas, auxílio assistencial do Estado no valor de
R$170,00.
Foi realizada perícia médica, em 03.10.2015, atestando que a autora é portadora do vírus HIV
com quadro de síndrome da imunodeficiência adquirida controlada com medicação. Conclui pela
ausência de incapacidade laborativa.
Neste caso, embora o laudo pericial produzido em juízo conclua pela ausência de incapacidade
laborativa, há que ser considerada a baixa escolaridade e a ausência de formação profissional da
autora, que, associados aos problemas de saúde, dificultam sua inserção no mercado de
trabalho, de modo que deve ser reconhecida sua incapacidade total e permanente para o labor,
amoldando-se ao conceito de pessoa deficiente, nos termos do artigo 20, § 2º, da Lei n.º
8.742/93, com redação dada pela Lei n.º 12.435/2011.
Importante frisar que, nos termos do art. 479 c.c art. 371, ambos do CPC, o juiz apreciará
livremente a prova, independente de que sujeito a houver produzido e poderá considerar ou
deixar de considerar as conclusões do laudo pericial, levando em conta o método utilizado pelo
perito. Ademais, o magistrado poderá formar sua convicção com outros elementos ou fatos
provados nos autos.
Nos casos de portadores do vírus HIV, ainda que a doença esteja assintomática, o exercício da
atividade laborativa torna-se difícil, dado que aliado ao risco de agravamento da doença, ao
preconceito (especialmente em cidades menores), a pessoa infectada apresenta transtornos
depressivos e ansiosos que dificultam sua interação com outras pessoas.
Aliado a esses fatores deve ser considerado ainda que os coquetéis disponíveis na rede pública
de saúde para os portadores do vírus podem causar fadiga, náusea e outros efeitos colaterais
que tornam o exercício da atividade laborativa, senão impossível, extremamente penosa para o
trabalhador.
Nesse sentido já decidiu este E. Tribunal, conforme se verifica da leitura da ementa abaixo
transcrita:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS PREENCHIDOS.
PORTADORA DE AIDS ASSINTOMÁTICA. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL.
INCAPACIDADE LABORATIVA TIDA COMO TOTAL, PERMANENTE E INSUSCETÍVEL DE
REABILITAÇÃO. ART. 151 DA LEI 8.213/91: DESNECESSIDADE DE CUMPRIMENTO DE
CARÊNCIA. AFASTAMENTO DO TRABALHO EM RAZÃO DE DOENÇA INCAPACITANTE.
PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA NÃO CONFIGURADA. VALOR DA RENDA MENSAL.
TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
I - Para a aquisição do direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, é necessária a
comprovação do preenchimento simultâneo de requisitos essenciais: a incapacidade laborativa
total, permanente e insuscetível de reabilitação, a qualidade de segurado e sua manutenção à
época do requerimento, carência de doze contribuições mensais, demonstração de que o
segurado não era portador da alegada doença ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
II - O laudo pericial atestou que, embora a apelante fosse comprovadamente portadora da
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), estava em tratamento médico e não apresentava
sintomas, concluindo que não havia incapacidade laborativa.
III - O juiz não está adstrito às conclusões do laudo pericial para a formação de sua convicção,
devendo analisar os aspectos sociais e subjetivos do autor para decidir se possui ou não
condições de retornar ao mercado de trabalho, para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência. No caso de portadores de AIDS, as limitações são ainda maiores, mormente para
pessoas sem qualificações, moradoras de cidade do interior e portadora de doença incurável e
contagiosa, fatalmente submetidas à discriminação da sociedade. Ademais, devem preservar-se
do contato com agentes que possam desencadear as doenças oportunistas, devendo a
incapacidade ser tida como total, permanente e insuscetível de reabilitação para o exercício de
qualquer atividade.
IV - Cumprimento do período de carência e condição de segurada da Previdência Social
devidamente demonstrados. Não há como detectar a data exata do início da contaminação ou da
incapacidade do portador de AIDS, por tratar-se de moléstia cujo período de incubação é variável
de meses a anos. O art. 151 da lei de benefícios dispensa o cumprimento do período de carência
ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social for acometido dessa
doença. Ainda que a apelante tenha ingressado com a ação cinco anos após a última
contribuição, não há que se falar que decorreu o prazo hábil a caracterizar a quebra de vínculo
com a Previdência Social e a conseqüente perda da qualidade de segurada, nos termos do artigo
15 da lei de benefícios, conjugada à interpretação jurisprudencial dominante, pois comprovado
que deixou de obter colocação e de contribuir para com a Previdência em virtude de doença
incapacitante.
V - Sentença reformada, para condenar o INSS a pagar à apelante o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez.
VI - A renda mensal inicial deverá ser calculada segundo o art. 44 da Lei 8213/91, com a redação
dada pela Lei nº 9.032/95, c/c os arts. 28, 29 e 33 da Lei nº 8.213/91 em regular liquidação de
sentença, em valor nunca inferior a um salário-mínimo (art. 201, parágrafo 2º, da Constituição
Federal).
VII - Inexistindo prévio requerimento administrativo onde demonstrada a incapacidade laborativa,
o termo inicial é fixado a partir da data do laudo pericial, quando reconhecida, no feito, a presença
dos males que impossibilitam o exercício de atividade vinculada à Previdência Social.
Precedentes.
VIII - As prestações em atraso deverão ser corrigidas monetariamente a partir de cada
vencimento, segundo as disposições da Lei nº 6.899/81, legislação superveniente, Súmulas nº 08
desta Corte e nº 148 do STJ.
IX - Incidirão os juros de mora a partir do laudo, à base de 6% ao ano até a vigência do novo
Código Civil e, após, à razão de 1% ao mês.
X - Honorários advocatícios de dez por cento sobre o montante da condenação, devendo incidir
sobre as parcelas devidas até o Acórdão. Inteligência do art. 20, § 3º do CPC, da jurisprudência
desta Turma e do STJ- Súmula 111.
XI - Honorários periciais fixados em R$ 200,00, de acordo com a Tabela II da Resolução
281/2002, do Conselho da Justiça Federal.
XII - Diante da gravidade da doença e do fato da apelante aguardar a prestação jurisdicional há 9
anos, configurados o relevante fundamento e o justificado receio de ineficácia do provimento final,
a justificar a concessão liminar da tutela, na forma do artigo 461, § 3º, CPC.
XIII - Apelação provida, com a concessão da antecipação da tutela jurisdicional, determinando
que o INSS proceda à imediata implantação da prestação em causa, intimando-se a autoridade
administrativa a fim de que cumpra a ordem judicial no prazo de trinta dias, sob pena de multa
diária, que será oportunamente fixada em caso de descumprimento.
(TRF 3a. Região - Apelação Cível - 517864 - Órgão Julgador: Nona Turma, Data: 10/05/2004 -
Rel. JUÍZA MARISA SANTOS).
Assim, além da incapacidade/deficiência, a hipossuficiência está comprovada, eis que, a autora
não possui renda e os valores recebidos são insuficientes para cobrir as despesas, restando
demonstrado que sobrevive com dificuldades.
A sentença deve ser mantida, para que seja concedido o benefício à requerente, tendo
comprovado a incapacidade/deficiência e a situação de miserabilidade, à luz das decisões
referidas, em conjunto com os demais dispositivos da Constituição Federal de 1988, uma vez que
não tem condições de manter seu próprio sustento nem de tê-lo provido por sua família.
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação, momento em que a Autarquia
tomou ciência da pretensão da parte autora.
Neste caso, observo que deve ser ressaltada a exigência de revisão a cada dois anos, a fim de
avaliar as condições que permitem a continuidade do benefício, em face da expressa previsão
legal (art. 21, da Lei nº 8.742/93).
A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
Quanto ao índice de correção monetária aplicável, não obstante o teor da Lei nº 11.960/2009,
anoto que o tema permanece controvertido, conforme se verifica da leitura do voto do Exmo.
Ministro Luiz Fux no RE 870.947, razão pela qual determino seja aplicado o índice de correção
monetária em vigor quando da execução do julgado, de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal então vigente.
A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a data da sentença.
No tocante às custas, observo que a Lei Federal n.º 9.289/96, em seu art. 1º, §1º, determina que
a cobrança é regida pela legislação estadual respectiva nas ações ajuizadas perante a justiça
estadual, quando no exercício de jurisdição federal.
A Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009, que trata do Regimento de Custas Judiciais do Estado
de Mato Grosso do Sul, em seu art. 24, isenta a União, Estados e Municípios e respectivas
autarquias e fundações do recolhimento de taxas judiciárias. Contudo, consta do § 1º que tal
isenção não se aplica ao INSS, e do § 2º que, em relação à Autarquia Previdenciária, as custas
processuais serão pagas apenas ao final, pelo vencido.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, CPC. PENSÃO POR MORTE. CUSTAS
PROCESSUAIS. DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO
C. STJ E DESTA CORTE. AGRAVO DESPROVIDO.
- A decisão agravada está em consonância com o disposto no artigo 557 do Código de Processo
Civil, visto que supedaneada em jurisprudência consolidada do C. Superior Tribunal de Justiça e
desta Corte. - A autarquia previdenciária não tem isenção no pagamento de custas na justiça
estadual (Súmula 178 - STJ). Desta forma, nas ações em trâmite na Justiça do Estado de Mato
Grosso do Sul, como é o caso dos autos, não há, na atualidade, previsão de isenção de custas
para o INSS na norma local. Ao revés, atualmente vige a Lei Estadual/MS 3.779, de 11.11.2009,
que prevê expressamente o pagamento de custas pelo INSS. - As razões recursais não
contrapõem tal fundamento a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a
reproduzir argumento visando a rediscussão da matéria nele contida. - Agravo desprovido.
(AC 00242211820114039999, DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, TRF3 - SÉTIMA
TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/02/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Assim, neste caso, vencida a Autarquia Federal, são devidas as custas e despesas em
reembolso.
Acerca dos honorários periciais, o Egrégio Conselho da Justiça Federal editou a Resolução nº
281/2002, dando novas diretrizes acerca do pagamento de honorários periciais, especificamente
para os casos de assistência judiciária gratuita, cujas disposições foram mantidas nas
Resoluções n.º 440, de 30.05.2005, n.º 541, de 18.01.2007, n.º 558, de 22/05/2007 e n.º 305, de
07/10/2014, que a sucederam.
Atualmente, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 232, de 13/07/2016,
estabelecendo os valores de honorários pagos ao perito, no âmbito da Justiça de primeiro e
segundo graus, quando se tratarem de beneficiários da gratuidade da justiça, fixando o valor de
R$ 370,00 para as perícias médicas, consoante se verifica na tabela anexa ao referido ato
normativo.
A multa diária é o meio coercitivo criado para o cumprimento de obrigação e encontra amparo no
§ 1º do artigo 536 do Código de Processo Civil/2015, que conferiu ao Magistrado tal faculdade,
como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida.
Essa multa pode ser a qualquer tempo revogada ou modificada, de acordo com o poder
discricionário do Juiz e não irá subsistir, desde que a Autarquia cumpra a obrigação no prazo
estabelecido, devendo a decisão ser mantida neste aspecto.
Esclareça-se que, por ocasião da liquidação, a Autarquia deverá proceder à compensação dos
valores recebidos administrativamente ou em função da tutela antecipada, em razão do
impedimento de cumulação.
Por fim, cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos do art. 300
c.c. 497, do CPC, é possível a antecipação da tutela.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para fixar o valor dos honorários
periciais, conforme estabelecido na Resolução 232, de 13/07/2016 do CNJ, nos termos da
fundamentação desta decisão, que fica fazendo parte integrante do dispositivo.
Benefício assistencial, no valor de um salário mínimo, com DIB em 16.09.2013 (data da citação).
Mantenho a tutela antecipada. Ciente a parte do decidido pelo E. Superior Tribunal de Justiça, em
decisão proferida no julgamento do RESP n.º 1.401.560/MT (integrada por embargos de
declaração), processado de acordo com o rito do art. 543-C do CPC/73.
É o voto.
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS NECESSÁRIOS PARA A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
HONORÁRIOS PERICIAIS. ASTREINTES. CUSTAS.
- O benefício assistencial está previsto no art. 203 da Constituição Federal, c.c. o art. 20 da Lei nº
8.742/93 e é devido à pessoa que preencher os requisitos legais necessários, quais sejam: 1) ser
pessoa portadora de deficiência que a incapacite para o trabalho, ou idoso com 65 (sessenta e
cinco) anos ou mais, conforme o artigo 34, do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.471/2003) e 2) não
possuir meios de subsistência próprios ou de seus familiares, cuja renda mensal per capita deve
ser inferior a ¼ do salário mínimo.
- A autora, nascida em 10.09.1975, instrui a inicial com documentos.
- Veio o estudo social, realizado em 26.09.2014, complementado em 17.05.2016, informando que
a requerente, com 40 anos de idade, ensino fundamental incompleto, reside, atualmente, sozinha,
em imóvel cedido pela família, composto por quarto, cozinha e banheiro. Não possui telefone,
nem móveis e eletrodomésticos. A requerente informou que no decorrer de sua vida produtiva
laborava na prestação de serviços domésticos e trabalho em área rural. Relata que em sua
convivência com o ex-companheiro encontrava-se na condição de pedinte, por imposição dele,
uma vez que não possuíam fonte de renda em razão do desemprego. A autora continua
desempregada, não aufere renda, recebe, apenas, auxílio assistencial do Estado no valor de
R$170,00.
- Foi realizada perícia médica, em 03.10.2015, atestando que a autora é portadora do vírus HIV
com quadro de síndrome da imunodeficiência adquirida controlada com medicação. Conclui pela
ausência de incapacidade laborativa.
- Embora o laudo pericial produzido em juízo conclua pela ausência de incapacidade laborativa,
há que ser considerada a baixa escolaridade e a ausência de formação profissional da autora,
que, associados aos problemas de saúde, dificultam sua inserção no mercado de trabalho, de
modo que deve ser reconhecida sua incapacidade total e permanente para o labor, amoldando-se
ao conceito de pessoa deficiente, nos termos do artigo 20, § 2º, da Lei n.º 8.742/93, com redação
dada pela Lei n.º 12.435/2011.
- Nos termos do art. 479 c.c art. 371, ambos do CPC, o juiz apreciará livremente a prova,
independente de que sujeito a houver produzido e poderá considerar ou deixar de considerar as
conclusões do laudo pericial, levando em conta o método utilizado pelo perito. Ademais, o
magistrado poderá formar sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos.
- Nos casos de portadores do vírus HIV, ainda que a doença esteja assintomática, o exercício da
atividade laborativa torna-se difícil, dado que aliado ao risco de agravamento da doença, ao
preconceito (especialmente em cidades menores), a pessoa infectada apresenta transtornos
depressivos e ansiosos que dificultam sua interação com outras pessoas.
- Aliado a esses fatores deve ser considerado ainda que os coquetéis disponíveis na rede pública
de saúde para os portadores do vírus podem causar fadiga, náusea e outros efeitos colaterais
que tornam o exercício da atividade laborativa, senão impossível, extremamente penosa para o
trabalhador.
- Além da incapacidade/deficiência, a hipossuficiência está comprovada, eis que, a autora não
possui renda e os valores recebidos são insuficientes para cobrir as despesas, restando
demonstrado que sobrevive com dificuldades.
- A sentença deve ser mantida, para que seja concedido o benefício à requerente, tendo
comprovado a incapacidade/deficiência e a situação de miserabilidade, à luz das decisões
referidas, em conjunto com os demais dispositivos da Constituição Federal de 1988, uma vez que
não tem condições de manter seu próprio sustento nem de tê-lo provido por sua família.
- O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação, momento em que a Autarquia
tomou ciência da pretensão da parte autora.
- Deve ser ressaltada a exigência de revisão a cada dois anos, a fim de avaliar as condições que
permitem a continuidade do benefício, em face da expressa previsão legal (art. 21, da Lei nº
8.742/93).
- A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
- A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a data da
sentença.
- No tocante às custas, observo que a Lei Federal n.º 9.289/96, em seu art. 1º, §1º, determina que
a cobrança é regida pela legislação estadual respectiva nas ações ajuizadas perante a justiça
estadual, quando no exercício de jurisdição federal.
- A Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009, que trata do Regimento de Custas Judiciais do Estado
de Mato Grosso do Sul, em seu art. 24, isenta a União, Estados e Municípios e respectivas
autarquias e fundações do recolhimento de taxas judiciárias. Contudo, consta do § 1º que tal
isenção não se aplica ao INSS, e do § 2º que, em relação à Autarquia Previdenciária, as custas
processuais serão pagas apenas ao final, pelo vencido.
- O Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 232, de 13/07/2016, estabelecendo os
valores de honorários pagos ao perito, no âmbito da Justiça de primeiro e segundo graus, quando
se tratarem de beneficiários da gratuidade da justiça, fixando o valor de R$ 370,00 para as
perícias médicas, consoante se verifica na tabela anexa ao referido ato normativo.
- A multa diária é o meio coercitivo criado para o cumprimento de obrigação e encontra amparo
no § 1º do artigo 536 do Código de Processo Civil/2015, que conferiu ao Magistrado tal faculdade,
como forma de assegurar efetividade no cumprimento da ordem expedida.
- Por ocasião da liquidação, a Autarquia deverá proceder à compensação dos valores recebidos
administrativamente ou em função da tutela antecipada, em razão do impedimento de cumulação.
- Cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos do art. 300 c.c.
497, do CPC, é possível a antecipação da tutela.
- Apelação do INSS provida em parte. Mantida a tutela antecipada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
