
| D.E. Publicado em 30/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em juízo de retratação, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0032170-59.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, para obtenção do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da CF.
Deferida a antecipação da tutela às fls. 136/137.
O juízo de 1º grau julgou procedente o pedido e condenou o INSS ao pagamento do benefício de prestação continuada, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data da citação, em 29.11.2011, com correção monetária e juros de mora nos termos do art. 1º-F da Lei 11.960/09 e honorários advocatícios fixados em 10% das parcelas vencidas até a data da sentença.
Em apelação, o INSS sustenta que a autora não preenche os requisitos para a concessão do benefício, razão pela qual a apelada não faz jus ao benefício assistencial, postulando a reforma do julgado.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo improvimento da apelação.
Em julgamento monocrático de fls. 219/223, nos termos do art. 557 do CPC/1973, deu-se provimento à apelação, cassando a antecipação da tutela.
A autora interpôs agravo legal, requerendo a reconsideração do decisum.
O acórdão de fls. 261/263, da Nona Turma desta Corte, por unanimidade, negou provimento ao recurso.
A parte autora interpôs Recurso Especial e Extraordinário, que, inicialmente, não foram admitidos, ensejando a interposição de agravo, com fulcro no art. 544, do CPC/1973.
Remetidos eletronicamente os autos do agravo ao STJ, deu-se a devolução do recurso à origem, para que seja observada a sistemática prevista no art. 543-C, caput, e §§ 1º e 7º, do CPC/1973.
Em razão do decidido no RESP Nº 1.355.052/SP, vieram-me os autos em obediência à disposição dos arts. 543-B, § 3º, e 543-C, § 7º, II, do CPC/1973.
É o relatório.
VOTO
Apelação interposta pela autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da CF.
Após a interposição de recurso especial retornaram-me os autos para o reexame disposto nos arts. 543-B, § 3º, e 543-C, § 7º, II, do CPC/1973.
No caso, às fls. 261/263, negou-se provimento ao agravo interposto contra a decisão monocrática que negou seguimento à apelação.
Assim, tendo em vista o advento do julgamento pelo STJ, incide a norma prevista no art. 543 -C, §7º, II e §8º, do CPC/1973, com redação dada pela Lei n. 11.672/08:
Verifica-se que o fundamento do improvimento da apelação, deu-se em razão do não preenchimento do requisito da hipossuficiência econômica.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº 1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ (REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190):
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em 03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento" (destaquei).
Continuo mantendo o entendimento anterior porque, a meu ver, a fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e justiça sociais que o art. 193 da CF elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade, representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art. 194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salário mínimo vigente, para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real necessidade de concessão do benefício.
O estudo social feito em 22.11.2011, às fls. 121/135, indica que a autora reside com o marido, Sebastião Luiz da Silva, de 88 anos, em casa própria, de madeira, sem forro e pintura desgastada, contendo seis cômodos, sendo três quartos, sala, cozinha e banheiro. Os móveis que guarnecem a casa estão em péssimo estado de conservação. As despesas à época eram: alimentação R$ 450,00; água R$ 25,55; energia R$ 48,10; gás R$ 49,00; Hadad R$ 27,00; IPTU R$ 18,00; Farmácia R$ 100,00; telefone R$ 51,24. A autora é diabética, necessitando de alimentação diferenciada, no entanto, não é possível, uma vez que a única renda do casal advém da aposentadoria do marido, no valor de R$ 719,00 (setecentos e dezenove reais) mensais.
A consulta ao CNIS (doc. anexo) indica que o marido da autora é beneficiário de aposentadoria por idade, desde 21.07.1993, no valor atual de R$ 1.010,65 (mil e dez reais e sessenta e cinco centavos) mensais.
Ainda que a renda familiar per capita seja pouco superior à metade do salário mínimo, levando-se em consideração as informações do estudo social e as demais condições apresentadas, entendo que não se justifica o indeferimento do benefício.
A situação é precária e de miserabilidade, dependendo a autora do benefício assistencial para suprir as necessidades básicas, sem condições de prover o seu sustento com a dignidade exigida pela Constituição Federal.
Assim, preenche a autora todos os requisitos necessários ao deferimento do benefício.
Considerando que não há prova do requerimento na via administrativa, o benefício é devido a partir da citação, nos termos do art. 219 do CPC.
A correção monetária das parcelas vencidas incide na forma das Súmulas 08 deste Tribunal, e 148 do STJ, bem como da Lei 6.899/81 e da legislação superveniente, descontando-se eventuais valores já pagos.
Os juros moratórios são fixados em 0,5% ao mês, contados da citação, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do CPC, até o dia anterior à vigência do novo CC (11.01.2003); em 1% ao mês a partir da vigência do novo CC, nos termos de seu art. 406 e do art. 161, § 1º, do CTN; e, a partir da vigência da Lei 11.960/09 (29.06.2009), na mesma taxa aplicada aos depósitos da caderneta de poupança, conforme seu art. 5º, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97.
As parcelas vencidas serão acrescidas de juros moratórios a partir da citação. As parcelas vencidas a partir da citação serão acrescidas de juros moratórios a partir dos respectivos vencimentos.
Os honorários advocatícios são fixados em 10% da condenação, entendida esta como as parcelas vencidas até a data da sentença, excluídas as vincendas, nos termos da Súmula 111 do STJ.
Em juízo de retratação, nos termos do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1036, 1037, §4º, 1038, caput, I, e §§ 1º e 2º, do CPC/2015), acolho o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal e, em novo julgamento, NEGO PROVIMENTO à apelação, mantendo a sentença na sua integralidade.
Oficie-se ao INSS para o imediato restabelecimento da tutela antecipada.
É o voto.
MARISA SANTOS
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 17/08/2016 16:36:04 |
