Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001620-07.2020.4.03.6344
Relator(a)
Juiz Federal MARISA REGINA AMOROSO QUEDINHO CASSETTARI
Órgão Julgador
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
22/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 30/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS. ART. 20 DA LEI Nº 8.742/93.
REQUISITO SUBJETIVO. COMPROVAÇÃO. AFERIÇÃO DA MISERABILIDADE.
COMPROVAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS DE PROVA.
JULGAMENTO DO TEMA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NOS AUTOS
DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 567.985 E 580.963, SOB A SISTEMÁTICA DA
REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO PROVIDO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001620-07.2020.4.03.6344
RELATOR:26º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: VANESSA DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRENTE: RODRIGO CAVALCANTI CONTRERAS - RN5990-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001620-07.2020.4.03.6344
RELATOR:26º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: VANESSA DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRENTE: RODRIGO CAVALCANTI CONTRERAS - RN5990
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora em face da sentença que julgou
improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial.
Alega, em síntese, que preenche os requisitos legais necessários para o reconhecimento do
direito à assistência pleiteada, previstos no artigo 20, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.742/93.
Sustenta que, conforme se extrai do laudo social produzido em juízo, se encontra em situação
de vulnerabilidade social, não possuindo condições de prover seu sustento.
Requer a reforma da sentença, para que seja julgado procedente o pedido, a fim de que lhe
seja concedido o benefício.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001620-07.2020.4.03.6344
RELATOR:26º Juiz Federal da 9ª TR SP
RECORRENTE: VANESSA DOS SANTOS
Advogado do(a) RECORRENTE: RODRIGO CAVALCANTI CONTRERAS - RN5990
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso da parte autora merece ser acolhido.
Estabelece o artigo 20 da Lei nº 8.742/93, combinado com o artigo 34 do Estatuto do Idoso, que
o benefício assistencial é concedido a partir da verificação de dois requisitos: deficiência ou
idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco) anos, e hipossuficiência individual ou familiar
para prover a subsistência da pessoa deficiente ou idosa.
Não obstante, nos termos do que dispõe o § 4º, do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com redação
conferida pela Lei nº 12.435, de 2011, o benefício pleiteado na presente demanda não pode ser
acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da Seguridade Social ou de outro
regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. Na
hipótese de procedência do pedido, a efetiva implantação do Benefício Assistencial de
Prestação Continuada estará condicionada ao desligamento de qualquer outro programa
governamental de transferência direta de renda, cujo valor percebido mensalmente seja inferior
a 01 (um) salário-mínimo, como o “Bolsa Família”, por exemplo, ao qual a parte, eventualmente,
esteja inserida.
Compulsando os autos, verifico que o primeiro requisito foi suficientemente atendido. A perícia
realizada constatou que a recorrente apresenta retardo mental moderado, com
comprometimentos significativos do comportamento, compatíveis com o critério de deficiência
indicado pela Lei nº 13.146, de 2015.
No que tange ao requisito da hipossuficiência econômica, o laudo socioeconômico evidencia
que a parte se encontra em situação de vulnerabilidade social, não possuindo condições de
prover seu sustento.
Nesse ponto, importa registrar que as questões discutidas no presente recurso já foram
pacificadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos Recursos Extraordinários
567.985/MT e 580.963/PR, sob a sistemática da Repercussão Geral.
O Ministro Gilmar Mendes, relator para os acórdãos, consignou que a decisão do Supremo
Tribunal Federal proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF - a qual
considerou, na oportunidade, que o § 3º, do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 não é, por si só,
incompatível com a Constituição Federal - não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em
concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Com fundamento no princípio da proibição de proteção insuficiente, o Tribunal entendeu que o §
3º, do art. 20, da Lei nº 8.742/1993 cumpriu apenas de forma parcial o dever constitucional de
efetivar o inciso V, do art. 203, da Constituição Federal; configurando, assim, omissão
inconstitucional parcial originária.
Por outro lado, a superveniente edição de leis instituidoras de programas de assistência social
no Brasil, que utilizam, atualmente, o valor de ½ salário mínimo como referencial econômico
para a concessão dos respectivos benefícios, revela, em primeiro lugar, um indicador bastante
razoável de que o critério de ¼ do salário mínimo utilizado pela LOAS está defasado e mostra-
se atualmente inadequado como único critério para aferir a miserabilidade exigida pela lei. Em
segundo lugar, constitui um fato revelador de que o próprio legislador vem reinterpretando o art.
203 da Constituição da República segundo parâmetros econômico-sociais distintos daqueles
que serviram de base para a edição da LOAS no início da década de 1990. Esses são fatores
que razoavelmente indicam que, ao longo dos vários anos desde a sua promulgação, o § 3º do
art. 20 da LOAS teve modificada sua interpretação.
Segundo o eminente relator Ministro Gilmar Mendes, trata-se de uma inconstitucionalidade que
é resultado de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios
assistenciais por parte do Estado brasileiro).
Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal negou provimento ao Recurso
Extraordinário nº 567.985 e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, para que seja analisado, em
concreto e caso a caso, a efetiva falta de meios para que o deficiente ou o idoso possa prover a
própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
De outro lado, especificamente quanto à interpretação extensiva ao parágrafo único, do art. 34,
da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), o Supremo Tribunal Federal, na mesma Sessão
Plenária, por maioria, negou provimento ao Recurso Extraordinário nº 580.963 e declarou,
incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial por omissão, sem pronúncia de nulidade, ao
fundamento de que não existe justificativa plausível para discriminação dos portadores de
deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em
relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.
O requisito da hipossuficiência econômica, portanto, há de ser verificado de forma
individualizada pelo magistrado, de acordo com as condições socioeconômicas e
especificidades do caso concreto.
A meu ver, o limite de renda mensal familiar per capita de ½ salário mínimo recentemente
adotado como critério para aferição da miserabilidade em programas sociais como o Fome
Zero, o Renda Mínima e o Bolsa Escola, pode ser adotado como critério de apuração da
miserabilidade para concessão do benefício assistencial - LOAS, desde que os demais
elementos do laudo socioeconômico indiquem a miserabilidade, ou seja, a renda per capta
superior a 1/4 do salário mínimo e até 1/2 salário mínimo per capita, por si só, não pode impedir
a concessão do referido benefício. Ora, referida renda deve ser cotejada e analisada em
conjunto com os demais elementos de prova, em especial a descrição do quadro social do
grupo familiar.
No caso dos autos, constatou-se, mesmo sem considerar as condições particulares do caso,
que decorrem da deficiência da parte autora, que a renda mensal familiar per capita é inferior a
½ salário-mínimo vigente à época da elaboração do estudo socioeconômico.
Conforme se extrai do referido estudo (visita domiciliar realizada em 12/02/2020), o núcleo
familiar é composto pela autora, nascida em 23/12/1979, solteira, desempregada (nunca
trabalhou), por sua genitora, Sra. Tereza dos Santos, nascida em 02/12/1957, com ensino
fundamental incompleto, aposentada por invalidez, e por seu padrasto, Sr. Joel dos Santos,
nascido em 25/07/1956, com ensino médio incompleto, motorista desempregado.
Consta que residem em imóvel alugado, pelo valor de R$ 650,00 mensais. Trata-se de imóvel
grande, com pintura antiga, com piso, laje, alguns vazamentos, apresenta umidade (a genitora
da autora relatou que há cerca de 01 ano perdeu a maioria dos móveis. A residência é
guarnecida com poucos móveis, em más condições de conservação.
No que concerne à subsistência da família, consta que vem sendo provida exclusivamente pela
renda mensal do benefício de aposentadoria por invalidez recebido pela genitora da autora, NB
32/083.986.288-1, no valor de 01 salário mínimo.
Assim, analisando detidamente a prova documental produzida nestes autos, e considerando
que a renda auferida pela genitora da recorrente não resulta em renda per capita superior a ½
salário-mínimo, concluo que ficou evidenciada a situação de hipossuficiência econômica da
parte autora.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso da parte autora, para reformar a sentença recorrida
e condenar o INSS a pagar à parte autora o benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da
Constituição Federal, no valor de um salário mínimo mensal, a partir da data do requerimento
administrativo do benefício, em 28/01/2020. Condeno a autarquia, ainda, ao pagamento das
prestações vencidas desde então, atualizadas até outubro/2021, observada, se o caso, a
prescrição quinquenal.
Presentes os pressupostos, antecipo os efeitos da tutela final, para que o benefício ora
concedido seja implantado e pago no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, independentemente
de trânsito em julgado. Oficie-se com urgência para cumprimento.
A presente medida antecipatória não inclui o pagamento de atrasados, que serão pagos após o
trânsito em julgado, mediante a expedição de ofício requisitório ou precatório, conforme opção a
ser manifestada pela parte autora em momento oportuno.
Os cálculos atinentes ao montante de atrasados ficam a cargo do juízo de origem.
Juros moratórios nos termos do art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da
Lei nº 11.960/09, e correção monetária nos termos da Resolução CJF 658/2020.
Sem condenação em honorários, face ao disposto no artigo 55, da Lei nº 9.099/1995.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS. ART. 20 DA LEI Nº 8.742/93.
REQUISITO SUBJETIVO. COMPROVAÇÃO. AFERIÇÃO DA MISERABILIDADE.
COMPROVAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS DE PROVA.
JULGAMENTO DO TEMA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NOS
AUTOS DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS 567.985 E 580.963, SOB A SISTEMÁTICA DA
REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO PROVIDO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Visto, relatado e discutido
este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Nona Turma Recursal do
Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por maioria, dar
provimento ao recurso da parte autora, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora, vencido o
Excelentíssimo Juiz Federal Danilo Almasi Vieira Santos, que vota por negar provimento ao
recurso. Participaram do julgamento os Excelentíssimos Juízes Federais Marisa Regina
Amoroso Quedinho Cassettari, Danilo Almasi Vieira Santos e Ricardo Geraldo Rezende
Silveira., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
