
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001519-31.2022.4.03.6111
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDERSON SOBRAL MARQUES
REPRESENTANTE: MARIA DO SOCORRO SOBRAL MARQUES
Advogados do(a) APELADO: AGUINALDO RENE CERETTI - SP263313-N, LEANDRO RENE CERETTI - SP337634-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001519-31.2022.4.03.6111
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDERSON SOBRAL MARQUES
REPRESENTANTE: MARIA DO SOCORRO SOBRAL MARQUES
Advogados do(a) APELADO: AGUINALDO RENE CERETTI - SP263313-N, LEANDRO RENE CERETTI - SP337634-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS, em face do v. acórdão que deu provimento à apelação da parte autora, para declarar a inexigibilidade da obrigação de devolver os valores indevidamente recebidos a título de benefício assistencial.
Alega a autarquia, em síntese, que o v. acórdão incorre em a omissão em relação às teses veiculadas pela autarquia previdenciária. Sustenta a repetibilidade dos valores percebidos pela autora, ainda que de caráter alimentar e de boa-fé.
Sem contrarrazões, os autos vieram conclusos.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001519-31.2022.4.03.6111
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANDERSON SOBRAL MARQUES
REPRESENTANTE: MARIA DO SOCORRO SOBRAL MARQUES
Advogados do(a) APELADO: AGUINALDO RENE CERETTI - SP263313-N, LEANDRO RENE CERETTI - SP337634-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO: Sabido não se prestarem os embargos de declaração à alteração do pronunciamento judicial quando ausentes omissão, obscuridade, contradição ou erro material a ser sanado (art. 1.022 do NCPC), competindo à parte inconformada lançar mão dos recursos cabíveis para alcançar a reforma do ato judicial (STJ, ED no AG Rg no Ag em REsp n. 2015.03.17112-0/RS, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJE de 21/06/2016)
A via integrativa é efetivamente estreita e os embargos de declaração não se vocacionam ao debate em torno do acerto da decisão impugnada, sendo a concessão de efeito infringente providência excepcional e cabível, apenas, quando corolário natural da própria regularização do vício que embalou a oposição daquele remédio processual, o que não é o caso dos autos.
De fato, procedendo-se à leitura do voto condutor do julgado, vê-se que a questão trazida aos autos pela parte embargante restou abordada de forma clara e coerente, in verbis:
DA DEVOLUÇÃO DE VALORES
Como é conhecido de todos, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou o entendimento admitindo a possibilidade de a Administração Pública rever os seus atos, quando eivados de nulidades e vícios, mediante o exercício de autotutela para fins de proceder a anulação ou revogação, nos termos das Súmulas 346 e 473, in verbis:
Súmula 346: "A administração pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos" (STF, Sessão Plenária 13/12/1963)
Súmula 473: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial" (STF, Sessão Plenária 03/12/1969).
Com o advento do artigo 114 da Lei n. 8.112, de 11/12/1990, a ordem jurídica passou a conter norma legal expressa concedendo suporte ao princípio da autotutela administrativa, estabelecendo que: "A administração deverá rever seus atos, a qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade”.
Nessa senda, a Lei n. 9.784, de 29/01/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, passou a disciplinar o dever de a Administração anular os seus atos quando maculados por vícios de ilegalidade, bem assim revogá-los por razões de conveniência e oportunidade, na forma preconizada pelos artigos 53 e 54, in verbis:
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.
De outro giro, o Código Civil disciplina a obrigação de devolução de valores recebidos ilicitamente, na forma do que dispõem os seus artigos 876, 884 e 927, in verbis:
Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.
(...) Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
(...) Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Na esfera previdenciária, o artigo 115, inciso II, daLei n. 8.213, de 24/07/1991, estabelece que cabe à Autarquia Previdenciária efetuar a cobrança de valores pagos indevidamente, identificados em regular processo administrativo, nos seguintes termos:
Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
Ademais, se comprovada a hipótese de dolo, fraude ou má-fé, a restituição das importâncias recebidas indevidamente deverá ser efetuada de uma só vez, consoante o artigo 154, § 2º, do Decreto n. 3.048, de 06/05/1999.
Nessa senda, a controvérsia sobre os limites aplicáveis à restituição conduziu o C. Superior Tribunal de Justiça a afetar o tema para perscrutar a respeito da seguinte questão: "Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social".
O assunto foi pacificado no julgamento do REsp 1.381.734/RN, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, no bojo do qual foi cristalizado o Tema 979/STJ: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido".
Além disso, houve modulação dos efeitos, em obséquio ao princípio da segurança jurídica, mormente em razão do interesse social e da repercussão do julgamento, razão por que o C. STJ fixou a aplicação do Tema 979/STJ somente aos processos distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do v. acórdão, ocorrida em 23/04/2021.
Eis a ementa, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além dcaráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
STJ, REsp 1.381.734 - RN, 1ª Seção, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, j. em 10.03.2021, DJe 23.04.2021
DO CASO CONCRETO
O benefício assistencial foi concedido ao autor em 11/01/2006, tendo recebido notificação do INSS informando que em razão de supostamente ter recebido o benefício indevidamente em alguns períodos, possui um débito de R$ 86.902,33 (oitenta e dois mil novecentos e dois e trinta e três centavos) para com o INSS, concedendo-lhe o prazo de 60 dias para efetuar o pagamento do débito (ID 266746639).
Sustenta o autor que a irregularidade apontada pelo INSS teria residido no fato de ter recebido benefício após superação de renda per capta no período de 05/08/2015 a 24/02/2016, no qual seu genitor, Benedito Rubens Marques, abriu empresa individual para venda de legumes e hortaliças.
O procedimento administrativo apresentado nos autos, indica o recebimento de aposentadoria por tempo de contribuição do genitor do autor, a partir de 17/07/2008, com salário base de R$ 2.617,72.
Como se verifica do id 266747394 - Pág. 3 e seguintes, apenas em 2018 o INSS constatou o recebimento de aposentadoria por tempo de contribuição, assim como a existência de contribuições como empresário individual por parte do genitor do beneficiário.
Frise-se que essa situação não foi ocultada e nem foram omitidas contribuições previdenciárias referentes à atividade desenvolvida pelo genitor, com vistas a manter em erro a autarquia.
Assim, e considerando que a família é composta de três membros - o autor, o genitor e a genitora - a renda familiar per capita é R$ 872,57 ou de R$ 807,46, conforme salário base ou a renda aferida.
Dessa forma, considerando que a renda per capita é superior a ¼ do salário mínimo, critério legal, e também consideravelmente superior a 1/2 salário mínimo, razão assiste à autarquia em suspender o benefício.
No entanto, não é a hipótese de devolução da quantia pretendida pelo INSS.
Não se vislumbra conduta lesiva do autor à obtenção e à manutenção do benefício, que nem sequer foi apontada pelo INSS, cujo pedido de devolução da quantia está fundamentado na superação da renda per capita, ocorrida dois anos após à concessão.
Além disso, como bem pontuado pela DD. Procuradora Regional da República na manifestação de ID 276812601, é muito mais simples ao INSS constatar tal situação mediante simples pesquisa interna, considerando-se que o artigo 21 da Lei n. 8.742/1992 lhe impõe o dever de a cada 2 (dois) anos avaliar a continuidade das condições que deram origem ao benefício, o que não ocorreu.
Confira-se a redação do referido artigo:
Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. (Vide Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário.
§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou utilização.
§ 3o O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 5º O beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada concedido judicial ou administrativamente poderá ser convocado para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, sendo-lhe exigida a presença dos requisitos previstos nesta Lei e no regulamento. (Incluído pela Lei nº 14.176, de 2021)
Desse modo, configurado o erro operacional do INSS, não pode transferir sua obrigação ao segurado, que sempre agiu de boa-fé, devendo arcar com o ônus financeiro de sua inércia.
Com efeito, à míngua de prova da ocorrência de má-fé, o C. STJ definiu no precedente obrigatório contido no Tema 979/STJ que é de rigor a aplicação do princípio da irrepetibilidade do benefício, em função da presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração.
Tem-se, destarte, que o julgado debruçou-se sobre a insurgência, devendo a insatisfação da postulante daí decorrente ser formulada na via recursal própria e não na seara integrativa, restrita à verificação dos vícios listados no art. 1.022 do NCPC, ausentes, in casu.
A respeito da alegação de omissão do v. acordão em apreciar todas as teses trazidas pela autarquia, é assente no C. Superior Tribunal de Justiça que o juiz não está obrigado a rebater, uma a uma, as questões trazidas pela parte, configurando-se a negativa de prestação jurisdicional somente nos casos em que o Tribunal de origem deixa de emitir posicionamento acerca de matéria essencial, o que não ocorreu no caso (AgRg nos EDcl no REsp 1.817.950/SP, relator Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 19/5/2020, DJe 25/5/2020).
Verifica-se assim que o julgado embargado apreciou a matéria objeto dos presentes embargos de declaração de forma adequada, denotando-se dos argumentos expendidos nas razões dos declaratórios o nítido objetivo infringente que a parte embargante pretende emprestar ao presente recurso, postulando, por vias transversas, o rejulgamento da matéria e a reforma do julgado embargado, pretensão manifestamente incompatível com a natureza dos embargos de declaração.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO DA TNU QUE NÃO ENFRENTOU O DIREITO MATERIAL CONTROVERTIDO. NÃO CONHECIMENTO. MERO INCONFORMISMO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DO PARTICULAR REJEITADOS.
1. O inconformismo da parte embargante não se amolda aos contornos da via dos embargos de declaração, previsto no art. 1.022 do CPC/2015, porquanto o acórdão ora combatido não padece de vícios de omissão, contradição, obscuridade ou erro material, não se prestando o manejo de tal recurso para o fim de rediscutir os aspectos jurídicos anteriormente debatidos.
2. Com efeito, o acórdão embargado abordou a tese lançada pela parte embargante em seu agravo interno, embora em sentido contrário à sua pretensão, o que não caracteriza omissão, tampouco contradição no julgado.
3. Constata-se, portanto, que a parte embargante pretende renovar a discussão acerca de questão que já foi decidida e fundamentada, o que não é possível por meio dos embargos de declaração.
4. Rever as matérias aqui alegadas acarretaria rediscu tir entendimento já manifestado e devidamente embasado. Os embargos declaratórios não se prestam à inovação, à rediscussão da matéria tratada nos autos ou à correção de eventual error in judicando.
5. Embargos de declaração do particular rejeitados.
(EDcl no AgInt no PUIL n. 1.332/RS, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF5), Primeira Seção, julgado em 30/11/2021, DJe de 2/12/2021.)
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELO INSS. INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DESCRITOS NO ART. 1.022 DO CPC/2015. PRETENSÃO DIRECIONADA À REDISCUSSÃO DE QUESTÃO JÁ ENFRENTADA E DECIDIDA NO ACÓRDÃO EMBARGADO. IMPOSSIBILIDADE.
1. De acordo com o previsto no artigo 1.022 do CPC/2015, são cabíveis embargos de declaração nas hipóteses de obscuridade, contradição ou omissão do acórdão impugnado, bem assim para corrigir-lhe erro material; entretanto, não se verifica, no caso concreto, a existência de quaisquer das mencionadas deficiências, porquanto o acórdão embargado enfrentou e decidiu, de maneira integral e com fundamentação suficiente, toda a controvérsia veiculada no especial apelo.
2. Não podem ser acolhidos embargos declaratórios que, a pretexto de alegados vícios no acórdão embargado, traduzem, na verdade, seu inconformismo com a decisão ali tomada, buscando, indevidamente, o rejulgamento de matéria já decidida.
3. Embargos de declaração do INSS rejeitados.
(EDcl no REsp n. 1.761.119/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Corte Especial, julgado em 16/10/2019, DJe de 12/11/2019.) (destaquei)
Com efeito, não vislumbro qualquer vício sanável na via dos embargos declaratórios, faltando razão à embargante ao pretender, a título de integração do julgado, que sejam reapreciadas questões jurídicas debatidas, com a adoção de posicionamento antagônico àquele deduzido no julgado embargado, quando este decidiu, de forma fundamentada, a controvérsia posta nos autos.
Assim, o inconformismo veiculado pelos embargantes extrapola o âmbito da devolução admitida na via dos embargos declaratórios, na esteira da jurisprudência deste E. Tribunal.
Por fim, de se notar que o simples intuito de prequestionamento, por si só, não basta para a oposição dos embargos declaratórios, sendo necessário demonstrar a ocorrência de uma das hipóteses previstas no art. 1.022 do NCPC, o que não se verifica na espécie.
Nessa esteira, tanto o C. Superior Tribunal de Justiça, como o C. Supremo Tribunal Federal, assentam a prescindibilidade da menção a dispositivos legais ou constitucionais para que se considere prequestionada a matéria, bastando que o Tribunal expressamente se pronuncie sobre ela (REsp 286.040, DJ 30/6/2003; EDcl no AgRg no REsp 596.755, DJ 27/3/2006; EDcl no REsp 765.975, DJ 23/5/2006; RE 301.830, DJ 14/12/2001).
Nesse sentido, rejeito os embargos de declaração, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
Previdenciário. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. TEMA 979 DO STJ. RESSALVA. BOA FÉ OBJETIVA DEMONSTRADA NA HIPÓTESE. devOLUÇÃO. DESCABIMENTO.
1. A decisão abordou totalmente a insurgência, devendo a insatisfação da parte autora ser formulada na via recursal própria e não na seara integrativa, restrita à verificação dos vícios listados no art. 1.022 do CPC, os quais se encontram ausentes.
2. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do Tema 979, pacificou orientação, segundo a qual, com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
3. O E. STJ evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração.
4. No caso dos autos, houve boa-fé objetiva do beneficiário, com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. Logo, tem aplicação a ressalva constante da parte final da citada tese, não havendo se falar em devolução de valores percebidos a título de benefício assistencial, razão pela qual resta mantida a sentença.
5. Embargos de declaração do INSS rejeitados.
